sexta-feira, 19 de abril de 2024

4º Domingo da Páscoa – Ano B – Homilia

 Evangelho: João 10,11-18 

Frei Alberto Maggi *

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas) 

Pastor verdadeiro é aquele que dá a vida

No livro do profeta Ezequiel, no capítulo 34, há uma repreensão do Senhor contra os pastores do seu povo, por quê? Porque não o fazem por amor, fazem-no por interesse próprio, não protegem as ovelhas, mas, na verdade, as exploram. Então o Senhor os ameaça: “Eu mesmo me ponho contra os pastores. Vou reclamar deles as minhas ovelhas e lhes cassar o ofício de pastor. [...] Eu mesmo buscarei minhas ovelhas e delas tomarei conta” (Ez 34,10.11). É a isto que Jesus se refere nesta passagem que a liturgia nos apresenta hoje; é o décimo capítulo, do versículo onze em diante, do Evangelho de João. 

João 10,11:** «Naquele tempo, disse Jesus: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida por suas ovelhas.»

Jesus afirma “Eu sou o bom pastor”, “Eu sou” é o nome divino, portanto Jesus reivindica a plenitude da condição divina; “bom pastor”, o termo “bom” não se refere à bondade de Jesus, para a qual o evangelista usará o termo grego “agatós”, daí o nome Ágata, que significa “bondade”. Aqui, porém, Jesus declara que é o Pastor, e usa o termo grego “kalós, do qual deriva caligrafia, bela escrita, que significa “o belo”, “o verdadeiro”. Portanto, “bom” significa “o verdadeiro pastor”. Jesus afirma ser o pastor anunciado por Deus no livro do profeta Ezequiel e, por isso, este anúncio não foi muito esperado, foi temido porque os outros pastores entendem que é o fim para eles.

E Jesus tem a insígnia para reconhecer quem é o verdadeiro pastor, porque ele dá a vida pelas suas ovelhas. Este dom da vida não surge de um perigo para as ovelhas, mas o precede; esta é a característica de Jesus com seus seguidores. 

João 10,12-13: «O mercenário, que não é pastor e não é dono das ovelhas, vê o lobo chegar, abandona as ovelhas e foge, e o lobo as ataca e dispersa. Pois ele é apenas um mercenário e não se importa com as ovelhas.»

Em seguida, Jesus passa aos mercenários que não são maus pastores, não são pastores, de modo algum! São mercenários, são aqueles que o fazem por interesse. Assim, Jesus contrasta o verdadeiro pastor que se destaca pela sua generosidade, com os outros que se destacam pela sua conveniência; tudo o que eles fazem é para sua comodidade e interesse! 

João 10,14-15: «Eu sou o bom pastor. Conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem, assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai. Eu dou minha vida pelas ovelhas.»

Eu sou o bom pastor” ― repete Jesus ― “Conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas me conhecem”, é uma dinâmica de amor recebido e de amor comunicado que torna possível nas “ovelhas” a mesma transmissão da vida divina que existe entre Jesus e o Pai. “Ovelhas” que, naturalmente, são imagem do povo. Novamente Jesus afirma que dá a vida, novamente Jesus afirma que o dom generoso da sua vida não depende de que suas ovelhas estejam em perigo, mas até o precede. Esta é a presença constante do Senhor dentro de nós. 

João 10,16-18: «Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil: também a elas devo conduzir; escutarão a minha voz, e haverá um só rebanho e um só pastor. É por isso que o Pai me ama, porque dou a minha vida, para depois recebê-la novamente. Ninguém tira a minha vida, eu a dou por mim mesmo; tenho poder de entregá-la e tenho poder de recebê-la novamente; esta é a ordem que recebi do meu Pai”.»

Então Jesus faz um anúncio: “Tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil”. Anteriormente (cf. Jo 10,1-4), Jesus havia dito que a sua função de pastor era deixar as ovelhas saírem do recinto, mas não para novamente fechá-las, mas libertá-las. A cerca, se por um lado protege, por outro tira a liberdade. Então com Jesus tudo isso acabou, acabou a era das cercas, por mais sagradas que sejam.

Jesus não veio para tirar pessoas/ovelhas do redil, Israel, para encerrá-las em outro recinto mais sagrado e mais bonito. Não! Jesus veio para dar plena liberdade: um rebanho, um pastor. O que Jesus quis dizer? O único verdadeiro santuário no qual a grandeza e o esplendor do amor de Deus se manifestarão, de agora em diante, será Jesus e sua comunidade. Jesus diz “também eu devo guiar” as demais ovelhas que não pertencem a este redil. O verbo “dever” indica um imperativo da vontade divina, e prossegue dizendo “escutarão a sua voz”. Por que escutam a sua voz?

Porque, na voz de Jesus, cada homem ouve a resposta ao seu desejo de plenitude de vida.

E eles se tornarão”, aqui escreve literalmente o evangelistaum rebanho, um pastor”, não há conjunção “um rebanho e um pastor”; a presença do rebanho implica a do pastor. A comunidade de Jesus, com a presença de Jesus, é o único verdadeiro santuário de onde irradia e se manifesta o seu amor, a sua misericórdia, a sua compaixão, e toma o lugar do templo. Mas qual é a diferença? Enquanto no templo era o povo que tinha que ir, aqui há um rebanho, um pastor, então há uma dinâmica de movimento que vai em direção ao povo, a todos que precisam deste amor, desta compaixão e desta compreensão. Este é o distintivo de Jesus como verdadeiro pastor da sua comunidade. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«Deve-se doar com a alma livre, simples, apenas por amor, espontaneamente!»

(Martinho Lutero: 1483-1546 ― monge agostiniano e professor de Teologia germânico que tornou-se uma das figuras centrais da Reforma Protestante)

Em um país no qual existem tantas igrejas, tantas denominações religiosas que se autodenominam “cristãs”, este Evangelho é mais atual do que nunca! Nesta segunda parte do “discurso do pastor” ― sendo que a primeira (Jo 10,1-10) descrevia aqueles que visitam o aprisco das ovelhas ―, Jesus deixa claro que o contraste que ele deseja fazer não é entre o pastor bom e o pastor mau! 

O contraste é mais profundo, é entre o “pastor verdadeiro, autêntico, belo” (grego: kalós) e o “assalariado, contratado” (grego: misthôtós). Este último trabalha pelo dinheiro, pelo ganho que pode obter com a sua tarefa. Jesus observa bem que ele não é pastor e não é dono das ovelhas (cf. Jo 10,12). Por isso, ele não possui a característica principal do “pastor belo” que é amar tanto suas ovelhas, a ponto de dar a vida por elas, se necessário for! 

Aqui, há algo muito importante e fundamental a ser observado: Deus é amor (cf. 1Jo 4,8.16), ele é quem por primeiro nos ama e nos entrega seu próprio Filho por amor (cf. Jo 3,16; Rm 5,8; Gl 2,20; 1Jo 4,9-11.19). Portanto, o seu Filho Jesus é, ao mesmo tempo, aquele que nos revela esta sua identidade ― o amor ― e é a força que torna possível o amor entre as ovelhas. Porque é o amor que sustenta a comunidade! Por isso, não pode haver verdadeira comunidade cristã, onde o fundamento seja outro que o amor! Especialmente, se a preocupação central de quem está à frente dessa comunidade é o dinheiro, o ganho, o bem-estar, a fama, o poder! Diante deste critério, é forçoso reconhecer que há muitos “assalariados” na função de líderes das Igrejas, mas nem todos são “pastores” de fato, isto é, nem todos são exemplares, como é Jesus, o “pastor belo”. 

Afinal, o “bom pastor ou belo pastor” não tem um significado “cultual”, mas “exemplar”! O que está na base de toda e qualquer vocação, no interior da Igreja, não pode ser jamais o interesse e bem-estar pessoais, mas o amor! Pois “sem amor não há pessoa, não há família, não há comunidade, não há futuro possível. Com amor tudo é possível” (Equipe Bíblica Verbo). Por isso, não nos enganemos ― nós do clero e lideranças leigas em geral ― podemos ter o encargo oficializado pela Igreja, mas para sermos pastores autênticos, devemos ser conhecidos e reconhecidos pelas ovelhas, pelo povo (cf. Jo 10,14)! 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Sempre à frente das ovelhas, em terrenos planos e em terrenos acidentados, no calor e na tempestade, de dia e de noite. Sempre e em todo lugar à frente das ovelhas. Mesmo quando o lobo chega e se há perigo do ladrão: mesmo assim ele está à frente. O pastor escolheu não ter para si um espaço de vida e de liberdade, não ter outra alegria senão a alegria e a saciedade do rebanho. O pastor entregou os olhos à busca de erva e água para as ovelhas, à defesa do lobo e do agressor, ao cuidado de cada uma e à unidade do seu rebanho. Ele deu os seus ouvidos para prestar atenção ao balido dos cordeiros, para ouvir vozes próximas e distantes. Ele entregou as mãos e os pés pela vida e alegria de cada uma e de todas as ovelhas que sem ele não teriam nada, nem comida, nem segurança, nem paz, nem companhia. Eu sou tua ovelha. Tu és o nosso pastor, Jesus.» Amém.

(Fonte: Vigilio Covi. Orazione finale. In: CILIA, Anthony O.Carm. Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico B. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 237)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – IV Domenica di Pasqua – 25 aprile 2021 – Internet: clique aqui (Acesso em: 15/04/2024).

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