«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Uma mulher católica pergunta...

 “Santidade, do que vós, no Vaticano, tendes medo?”

 Cristina Romero Gaskell

Leiga católica espanhola, residente em Bonn, Alemanha 

Em uma carta dirigida ao Papa Francisco, uma católica espanhola interroga a Igreja pelo fato dela agarrar-se, tanto, a certas posições sem sentido

CRISTINA ROMERO GASKELL - autora desta carta dirigida ao Papa Francisco

[Extrato] “A maioria de nós, os poucos católicos praticantes que restam na Europa, já está muita cansada de ordens antiquadas, que não servem para enfrentar as ameaças reais que estão sobre nós. Eu, na verdade, estava decidida a sair da Igreja, em sinal de protesto como estão fazendo aqui na Alemanha centenas de milhares de pessoas, exauridas de contribuir a uma organização que não confiam, não obstante, até agora, algo em mim ainda resiste, porque a religião católica, com seus ritos e orações, não é um acessório de fácil substituição, mas sim algo integral em minha vida. Ao mesmo tempo, encontro-me em discordância com tantas prescrições sem sentido”, escreve Cristina Romero Gaskell. 

Eis a carta. 

Sua Santidade: sou uma católica espanhola de 51 anos, residente em Bonn, Alemanha. Escrevo-lhe pela necessidade de manifestar minha humilde discordância com o empenho da Igreja em se agarrar a dogmas atávicos, meu pesar é por ver como este barco, tão nobre e necessário, vai ao abismo, e minha confusão é por não saber se o abandono ou sigo nele e tento mudar seu rumo. 

Santo Padre, estou segura de que vós, os que dirigis a Igreja, trabalham com a mais nobre das intenções. Estais fazendo tudo que é possível por preservar os preceitos que durante incontáveis gerações serviram de pilares para sustentar este edifício eclesial e o fazeis com tanto empenho e dedicação porque estais convencidos de que esses preceitos são manifestação da vontade divina e, portanto, sagrados e inalteráveis. Isso é, não é que a Igreja como instituição não queira mudar seus dogmas. É que, pensa, não poder fazê-lo porque lhe dão uma ordem e um sentido queridos por Deus a nossa vida. 

O problema é que esta teoria acarreta muito sofrimento desnecessário para os católicos, muita opressão e discriminação, que são estados contrários ao que Deus deseja para seus filhos. Minha amiga Gisela, por exemplo, está – em teoria – condenada a passar o resto de sua vida sem comungar porque seu primeiro casamento não deu certo. Nós, mulheres, parece que nunca poderemos presidir uma missa, ainda que nos sintamos chamadas a isso e apesar de que há uma necessidade urgente de padres. 

E os casais homossexuais jamais poderão ser abençoados por um padre já que seu amor – isso sim que é o auge –, pois vocês acabam de nos explicar, segue sendo pecado. Como pode ser pecado comprometer-se a passar o resto de sua vida amando uma pessoa?

Não vos ocorre pensar que essas normas que vós, com tanto ardor, defendeis poderão não ser suportes da instituição que presidis, mas sim cadeados e correntes que amarram os pobres fiéis? Ou demônios que os espantam?

Somos seguidores de um homem que tinha pouca paciência para com as normas absurdas (“O sábado é feito para o homem” – cf.: Mc 2,27) e que, diante de nossa tendência a complicarmos a vida, nos deu pautas claras e simples: ama, perdoa, busca o Reino de Deus e sua justiça. 

Santo Padre, há tanta necessidade no mundo... vós bem o sabeis e com razão nos pedis com admirável vontade e lucidez que lutemos contra a mudança climática e que trabalhemos para colocar fim à injustiça. Para isso é que necessitamos de nossos guias espirituais, para nos advertir que nosso egoísmo nos destrói e para nos animarmos a seguir o caminho da verdadeira felicidade servindo ao próximo. 

Padre, e para nos tirar o medo existencial que nos asfixia, o medo do sofrimento, da Covid-19, da morte, do vazio, da falta de sentido, da vitória do mal sobre o bem, todos esses, se esvanecem perante o poder do Cristo ressuscitado.

Essa é a mensagem que este mundo estressado precisa escutar e que Jesus nos repetiu algumas vezes: não tenham medo. 

Santidade, e vós, no Vaticano, do que tendes medo?

Porque às vezes eu me pergunto se essa teimosia em não se adaptar aos tempos não tem raízes no medo do desconhecido ou de perder o poder.

Outro questionamento que me faço é: como vós podeis saber o que Deus quer? O bom Deus quer que usemos preservativos para evitar a superpopulação. E possivelmente não teria nada contra que seus padres e suas freiras casassem, se assim quisessem. E, certamente, não diferencia os seus filhos que mantêm relações sexuais antes ou depois do casamento. Que diferença faz? 

A maioria de nós, os poucos católicos praticantes que restam na Europa, já está muita cansada de ordens antiquadas, que não servem para enfrentar as ameaças reais que estão sobre nós.

Eu, na verdade, estava decidida a sair da Igreja, em sinal de protesto como estão fazendo aqui na Alemanha centenas de milhares de pessoas, exauridas de contribuir a uma organização que não confiam, não obstante, até agora, algo em mim ainda resiste, porque a religião católica, com seus ritos e orações, não é um acessório de fácil substituição, mas sim algo integral em minha vida. Ao mesmo tempo, encontro-me em discordância com tantas prescrições sem sentido. 

Por isso, dirijo-me a vós, porque necessito – todos nós, católicos europeus do século XXI, necessitamos – uma comunidade, uma Igreja, aberta às novas verdades que vamos descobrindo como humanidade. Muito do que antes pensávamos ser pecado hoje em dia nos damos conta que não faz mal a ninguém. Talvez, seja o próprio Deus quem vai nos iluminando o entendimento, que vai abrindo os nossos olhos. Mas que ironia que vós, máximos representantes, vos empenhais em mantê-los fechados! Não pode ser, Santo Padre, é uma negação à evidência, que de fato se torna incompreensível para nós todos. 

Padre Francisco, entendo que não é uma tarefa fácil ser capitão deste navio e muito obrigado pelo louvável trabalho até agora. Não sei o quanto vós podeis realmente mudar e até que ponto vós tendes que se adaptar às demandas dos setores conservadores, mas por favor, fazei tudo que puderdes para renovar nossa amada Igreja mãe, porque de que serve aos pastores manter a pureza do dogma se a consequência é que acabam sendo uns poucos velhos de cabelos grisalhos entrincheirados atrás de um muro de atavismo enquanto as ovelhas vão se dispersando pelo mundo? 

Desejo que o Espírito Santo o fortaleça e o oriente nesta difícil missão que lhe foi confiada. 

Atenciosamente,

Cristina Romero Gaskell

Bonn (Alemanha) 

Traduzido do espanhol por Wagner Fernandes de Azevedo; corrigido e editado (com grifos e destaques) por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo. O original foi publicado em Religión Digital, seção Opinión, dia 16 de abril de 2021, para acessar, clique aqui. 

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Sexta-feira, 16 de abril de 2021 – Internet: clique aqui (acesso em: 17/04/2021).

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