«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

33º Domingo do Tempo Comum – Ano A – Homilia

 Evangelho: Mateus 25,14-30 

Frei Alberto Maggi

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas) 

Deus nos quer livres como ele, não pessoas atemorizadas

Com Jesus a relação com Deus, com o Pai, muda. Não mais servos do Senhor, mas filhos do Pai. Mas uma ideia errada de Deus pode arruinar a existência de uma pessoa e impedir a transição de servo para filho. É o que estamos refletindo, desde o domingo passado, mediante três parábolas que Jesus começou a contar-nos:

* parábola das virgens prudentes e imprudentes (Mt 25,1-13) ― domingo passado;

* parábola dos talentos (Mt 25,14-30) ― este domingo e

* parábola do juízo universal (Mt 25,31-46) ― próximo domingo. 

Mateus 25,14-17: «Jesus contou esta parábola a seus discípulos: “Um homem ia viajar para o estrangeiro. Chamou seus empregados e lhes entregou seus bens. A um deu cinco talentos, a outro deu dois e ao terceiro, um; a cada qual de acordo com a sua capacidade. Em seguida viajou. O empregado que havia recebido cinco talentos saiu logo, trabalhou com eles, e lucrou outros cinco. Do mesmo modo, o que havia recebido dois lucrou outros dois.»

Jesus está falando sobre o reino, o Reino dos Céus. No mundo oriental, todos os empregados de uma pessoa importante são chamados de servos, mesmo que, como neste caso, sejam funcionários de alto escalão. Este senhor não deixa seus bens sob custódia, mas os transfere. O verbo “entregar” usado pelo evangelista significa “dar” sem depois receber de volta. O talento era uma medida de valor muito importante, um talento oscilava entre 26 e 36 kg de ouro; um talento correspondia aproximadamente a 6.000 denários, ou seja, 20 anos de salário de um trabalhador, portanto uma fortuna. “... a cada qual de acordo com a sua capacidade”, literalmente, “força”. O senhor, o mestre conhece seus oficiais e conhece suas habilidades. E aquele que recebeu dois talentos faz o mesmo. O primeiro ganha mais cinco, e o outro dobra igualmente, ganha mais dois, agem como senhores, como se o talento fosse deles. 

Mateus 25,18: «Mas aquele que havia recebido um só, saiu, cavou um buraco na terra, e escondeu o dinheiro do seu patrão.»

Cuidado, não é que com um só talento esse funcionário tenha recebido pouco, pois um talento equivale a cerca de 30 kg de ouro ou 20 anos de salário para um trabalhador, portanto uma enorme fortuna. No entanto, ele continua servo em sua mentalidade, não se sente como um senhor. Ao enterrar este talento é como se ele estivesse enterrando a sua própria vida, mas também o faz porque, segundo a lei rabínica, se alguém enterrasse o dinheiro que lhe foi dado, em caso de roubo, não era obrigado a devolver.

Então ele toma todos os cuidados, não acredita na generosidade do seu senhor. 

Mateus 25,19-23: «Depois de muito tempo, o patrão voltou e foi acertar contas com os empregados. O empregado que havia recebido cinco talentos entregou-lhe mais cinco, dizendo: ‘Senhor, tu me entregaste cinco talentos. Aqui estão mais cinco que lucrei’. O patrão lhe disse: ‘Muito bem, servo bom e fiel! como foste fiel na administração de tão pouco, eu te confiarei muito mais. Vem participar da minha alegria!’ Chegou também o que havia recebido dois talentos, e disse: ‘Senhor, tu me entregaste dois talentos. Aqui estão mais dois que lucrei’. O patrão lhe disse: ‘Muito bem, servo bom e fiel! Como foste fiel na administração de tão pouco, eu te confiarei muito mais. Vem participar da minha alegria!’»

O evangelista fala no presente, para representar uma ação que continua na comunidade de Jesus, “e queria acertar contas com eles”. Ele não vem para receber de volta o que doou, mas para ver o que fizeram com isso. Pois bem, neste momento o senhor, o patrão, não pede de volta aquilo que deu, mas se alegra e exclama: “Muito bem, e esta exclamação se assemelha à do Criador no livro do Gênesis quando Deus admira a sua obra (cf. Gn 1,31). O patrão fala de “administração de tão pouco”, mas é uma enormidade, uma fortuna imensa, 150 kg de ouro, uma fortuna extraordinária, e o dono diz que foi pouco. Convida-o a fazer parte de todos os seus bens, de toda a sua vida e faz com que passe da condição de servo à de senhor, livre como ele. Da mesma forma para aquele que recebeu dois talentos. 

Mateus 25,24-28: «Por fim, chegou aquele que havia recebido um talento, e disse: ‘Senhor, sei que és um homem severo, pois colhes onde não plantaste e ceifas onde não semeaste. Por isso, fiquei com medo e escondi o teu talento no chão. Aqui tens o que te pertence’. O patrão lhe respondeu: ‘Servo mau e preguiçoso! Tu sabias que eu colho onde não plantei e que ceifo onde não semeei? Então, devias ter depositado meu dinheiro no banco, para que, ao voltar, eu recebesse com juros o que me pertence’. Em seguida, o patrão ordenou: ‘Tirai dele o talento e dai-o àquele que tem dez!»

Porém, a situação é diferente para quem recebeu um talento. Ele raciocina com base no que sabe, mas é um conhecimento errado. Esta é uma imagem distorcida que não é justificada pela narrativa. Na narrativa vemos um senhor que não é generoso, mas loucamente generoso, que não só não quer de volta a enorme fortuna que deixou aos seus funcionários, mas na verdade os torna parte de todo o seu patrimônio, de toda a sua vida. “Eu estava com medo”. É aqui que o evangelista quer chegar, uma imagem distorcida de Deus, o temor de Deus pode ser fatal para a pessoa, que tem medo de agir por receio de reprovação, ou de errar. João dirá na primeira carta: “Não há medo no amor. Quem teme não é perfeito no amor” (1Jo 4,18).

Enquanto os outros tomavam posse da riqueza que lhes fora confiada e agiam livremente, ele permaneceu servo, e ele mesmo sublinha: “... escondi o teu talento no chão. Aqui tens o que te pertence”. Ele nunca considerou isso seu. O senhor não concorda com a imagem que o servo tem dele, é uma imagem distorcida.

O medo de errar, no indivíduo, paralisou a sua ação, o seu crescimento.

E aqui está a sentença: “Tirai dele o talento”. Ele não sabia o que fazer com isso, era uma fortuna e ele não sabia como usá-la, aliás para ele essa fortuna que o senhor lhe havia dado tornou-se motivo de angústia, ansiedade e preocupação. Aí o senhor lhe diz “não adianta você ficar com ele”, e complementa: “e dai-o àquele que tem dez!”.

Esse indivíduo não está sendo punido por ter feito algo de ruim, ele simplesmente não fez nada

Mateus 25,29-30: «Porque a todo aquele que tem será dado mais, e terá em abundância, mas daquele que não tem, até o que tem lhe será tirado. Quanto a este servo inútil, jogai-o lá fora, na escuridão. Aí haverá choro e ranger de dentes!’”.»

“... a todo aquele que tem”. Já encontramos este verbo “ter” no Evangelho de Mateus na parábola dos quatro terrenos (Mt 13), e indica produzir, aquele que produz, “quem tem”, ou seja, quem produz e frutifica com o que lhe é dado: “será dado mais, e terá em abundância, mas daquele que não tem, até o que tem lhe será tirado”.

Quem produz amor recebe do Pai uma capacidade muito maior de amar. Por outro lado, quem não ama, quem não orienta a vida para os outros, atrofia e fica sem nada.

Este servo inútil...”, inútil porque não soube o que fazer com essa fortuna, “jogai-o lá fora, na escuridão”. Na verdade, ele já está aí porque ao enterrar o talento ele se enterrou!Aí haverá choro e ranger de dentes!”, é uma expressão um tanto equivalente ao nosso português: “arrancar os cabelos”. É o desespero por ter falhado na existência. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«Não tenho medo de Deus. Tenho medo do homem.»

(Svetlana Aleksiévitch: nascida em 1948 – jornalista e escritora bielorrussa, Nobel de Literatura de 2015)

É incrível como a imagem que fazemos de Deus é determinante para o tipo de relação que estabelecemos seja com ele, seja com as demais pessoas! O medo insano foi a ruína do terceiro servo da parábola dos talentos, que acabamos de refletir em seus detalhes. Um deus que agisse como um policial, um investigador, um juiz, um capataz de fazenda, observando atentamente, anotando todas as nossas faltas e desvios, bem como, nos punindo por tudo o que fizéssemos de errado na vida, não seria um deus merecedor de nosso amor, de nosso carinho e, muito menos, do apelativo “deus”! 

O senhor da parábola, imagem do próprio Deus, não se irritou com o funcionário que enterrou, ou seja, anulou o talento recebido porque a sua produtividade, o seu rendimento não foi o esperado! Não, o que irritou o senhor foi a paralisia, o comodismo, a autodefesa, o fechamento em si mesmo e, principalmente, a imagem deturpada que ele tinha de seu senhor! No fundo ― aquele servo e muitos de nós ainda hoje ―, tinha medo de sua liberdade! Isso mesmo!

Ser livre é ser capaz de suportar o fardo da responsabilidade por aquilo que somos e fazemos!

E isso nem todos estão dispostos a viver! Por isso, o Deus do medo, o Deus juiz é tão popular e permanece em tantas mentes e corações, mesmo, após a vinda de Jesus a esta terra! Esse Deus não existe, ele é produto de nossa invenção. Afinal, esse Deus do medo, da punição, do castigo é um Deus que nos dá segurança. Pois, um fiel que tem medo de Deus submete-se como um rebanho de ovelhas, aguenta todo tipo de jugo, pois sente-se “seguro” em meio ao “caos” deste mundo. Daí, a preocupação de certos fiéis em ter respostas prontas e claras para tudo, pois a sua liberdade eles a entregaram a um guia, um guru, um padre, um pastor, um monge tibetano, um mestre filosófico, enfim, a alguém que pensa por eles e lhes indica o caminho da vida. 

É mais fácil viver, assim, não há dúvida! Porém, essa é a atitude condenada por Jesus na parábola deste domingo! Ela leva a uma vida inútil, estéril, pois não produz nada de novo. Trata-se de devolver a Deus aquilo que já era dele, ou seja, é negar-se a dar-lhe algo que seja fruto de nossa vivência, de nossos esforços, de nossas quedas e soerguimentos. No fundo, é negar-se a viver, a jogar-se na existência, sem medo! 

O sentido dessa parábola está otimamente retratado pelas corretas palavras de Papa Francisco, logo no início de seu pontificado:

«... prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos. Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo, sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida. Mais do que o temor de falhar, espero que nos mova o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa proteção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mc 6,37)» (Evangelii Gaudium, 49).


 Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Obrigado, Pai, pelo dom do Espírito que me faz pertencer a Cristo, a ponto de ser um com Ele. Obrigado, Pai, porque no Espírito Santo me fizeste filho em teu Filho Jesus. Obrigado, Pai, porque, no Espírito que me deste, posso te chamar: "Papai". Obrigado, Pai, pelo Espírito que habita em mim: aquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos também me dará a vida que não morre! Obrigado, Pai, porque, pela força do Espírito Santo, tu me deste a capacidade de viver não na escravidão e no medo, mas na liberdade e na alegria dos filhos de Deus. Amém.»

(Fonte: MESTERS, Carlos, O.Carm. 33ª Domenica del Tempo Ordinario: orazione iniziale. In: CILIA, Anthony, O.Carm. [a cura di]. Lectio divina sui vangeli festivi per l’anno liturgico A. Leumann [TO]: Elledici, 2010, p. 596.)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci” – Videomelie e trascrizioni – 33ª Domenica del Tempo Ordinario – Anno A – 15 novembre 2020 – Internet: clique aqui (Acesso em: 14/11/2023).

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