«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 3 de maio de 2024

Pior que é verdade!

 A cultura do ódio está na moda!

 Mirian Goldenberg

Antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é autora de “A Invenção de uma Bela Velhice” 

Mirian Goldenberg com a mão enfaixada

Gente estúpida; gente hipócrita, assim cantou Gilberto Gil

Domingo, 17 de março, 16 horas: estava caminhando no calçadão de Ipanema quando um morador de rua, carregando três sacos de lixo, correu na minha direção com uma barra de ferro gritando: “Passa a bolsa, passa o dinheiro”. Assustada, corri e tropecei no meio-fio. Caí, esfolei os joelhos e machuquei a mão esquerda. Um engraçadinho brincou: “Por que você não perguntou se ele aceitava Pix?”. 

No dia seguinte, às 7 horas, estava na porta de uma clínica ortopédica perto da minha casa. Quando a clínica abriu, às 8 horas, fui a primeira a entrar. O ortopedista chegou atrasado e só me atendeu às 8h47. Nesse horário, 17 pessoas já estavam na pequena sala de espera. 

Eu e meu marido éramos os únicos de máscara, em meio a um festival de tosses e espirros. Uma mulher perguntou: “Por que vocês estão usando máscara?”. Respondi que a minha sogra, de 89 anos, teve uma gripe violenta, estava anêmica, com baixa imunidade e foi internada no hospital. A mulher, em tom de deboche, disse: “Para que usar máscara? Que bobagem, a pandemia já acabou há muito tempo. É só uma gripezinha”. 

Pessoas que se recusam a usar máscaras, quando necessário, possuem transtornos antissociais

A filha dela, que estava brincando com o celular, esbarrou na simpática senhora, de 94 anos, com quem eu estava conversando. Imediatamente, a menina pediu desculpas. A mãe gritou com ela: “Por que você está pedindo desculpas? Você não fez nada de errado. Deixa de ser idiota!”. 

Meu marido ficou chocado: “Que mulher estúpida. Ela deveria ter orgulho da filha que se desculpou educadamente. Uma mãe que grita com a criança, como se pedir desculpas para uma senhora de 94 anos fosse um pecado mortal. Está ensinando a filha a ser desrespeitosa e grosseira com as pessoas de mais idade. Que absurdo! O mundo está de cabeça para baixo!”.

Entrei na sala do ortopedista. Contei que caí e que os três dedos do meio da minha mão esquerda estavam doendo muito. “Você tem que fazer uma tomografia. Vou imobilizar sua mão e receitar analgésicos e anti-inflamatórios”. A consulta durou exatamente três minutos. 

Fiz a tomografia: não quebrou nada, mas o inchaço dos três dedos continuou e a dor também. Quinze dias com a mão enfaixada e, depois, mais sete dias apenas com o dedo do meio imobilizado. Depois de retirar a tala do dedo médio, o ortopedista, em uma consulta de dois minutos, orientou que eu fizesse dez sessões de fisioterapia. “Precisa?” “Precisa, se não fizer a recuperação vai demorar muito mais”. 

Sándor Ferenczi (1873-1933) foi um psicanalista húngaro, um dos mais íntimos colaboradores de Freud. Tornou-se famoso pelas experiências psicanalíticas

Ele prescreveu: “laser e massagem suave. Sinovite: terceiro dedo da mão esquerda”. Descobri que sinovite é uma inflamação na membrana sinovial, a camada fina de tecido que reveste as articulações, que pode ocorrer como resultado de traumas, como quedas e acidentes. 

Dia 10 de abril foi a minha primeira sessão de fisioterapia na clínica indicada. O fisioterapeuta que me atendeu fez laser e uma massagem suave na mão esquerda. A dor melhorou bastante e já consegui mexer os dedos no mesmo dia. 

Voltei no dia seguinte: outro fisioterapeuta me atendeu. Ele fez uma massagem tão bruta que gritei de dor. Falei que o ortopedista tinha recomendado massagem suave. O fisioterapeuta respondeu: “Médico não entende nada disso. Eu sou fisioterapeuta, sei que se não forçar os dedos você vai demorar muito mais a recuperar os movimentos”. 

Ele continuou mais alguns minutos forçando os dedos, apesar da minha dor. Os três dedos incharam muito, ficaram roxos e não consegui mais mexer a mão esquerda. Nunca mais voltei à clínica e os três dedos continuam, até hoje, inchados e roxos. 

Meu marido ficou indignado com a brutalidade do fisioterapeuta. 

“Essas pessoas são vampiras, sugadoras da saúde do nosso corpo e da nossa alma. Quanto mais ódio e violência elas destilam, mais se sentem poderosas e superiores. Peguei ranço de gente virulenta, caga-regras, que só quer destruir, desvalorizar e diminuir os demais; gente que grita, xinga, ofende, humilha, desqualifica a nossa dor. Você acaba se sentindo uma merda, uma bosta, impotente, à mercê de tanta gente estúpida, hipócrita, agressiva, arrogante e autoritária.”

E, como sempre, ele me deu uma boa ideia: “Por que você não escreve uma coluna para a Folha contando alguns casos do nosso cotidiano no Rio de Janeiro? O título poderia ser: ‘A cultura do ódio está na moda! Gente estúpida; gente hipócrita, assim cantou Gilberto Gil’”. 

Fonte: Folha de S. Paulo – colunas e blogs – Quinta-feira, 02 de maio de 2024 – Pág. B8 – Internet: clique aqui (Acesso em: 03/05/2024).

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