«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

O LADO SOMBRIO DA TECNOLOGIA

Entrevista com SUSAN GREENFIELD

SIMONE COSTA
VEJA

A neurocientista inglesa alerta para o fato de que 
os efeitos positivos dos estímulos da internet, 
redes sociais e videogames, em excesso, 
provocam riscos para o cérebro
SUSAN GREENFIELD - neurocientista inglesa
Especialista em doenças degenerativas do cérebro, a pesquisadora SUSAN GREENFIELD, de 62 anos, é presença constante nos principais debates sobre os efeitos da tecnologia na mente humana. Autora de três livros que se tornaram best-sellers, ela defende a tese de que passar tempo demais na frente de computadores, games, tablets e smartphones causa alterações cerebrais da mesma natureza daquelas advindas do Alzheimer, embora não tão destruidoras.

Susan se refere mais precisamente à dificuldade de discernir eventos passados de situações presentes e até de projeções futuras, disfunção cognitiva comumente associada ao Alzheimer. 

Susan Greenfield foi a primeira mulher a presidir a Royal Institution, o mais antigo centro de pesquisa independente do mundo. Depois de doze anos, ela deixou o cargo alegando que vinha sendo vítima de uma campanha machista. 

Feita baronesa em 2001, a professora de Oxford é conhecida também por ser uma ativa popularizadora da ciência na Inglaterra, produzindo e apresentando documentários que lhe valeram a fama de ser a versão local de Carl Sagan, o lendário cosmólogo americano, morto em 1996.


Qual é o paralelo entre a doença de Alzheimer e os efeitos sobre o cérebro do uso exagerado de aparelhos conectados à internet?

Susan Greenfield: Fui mal interpretada em uma entrevista e passaram a me atribuir algo que eu não disse. O Alzheimer, à medida que avança, provoca a perda de células cerebrais, conduzindo o paciente a um estado de alienação crescente. Não afirmei que a tecnologia provoca a morte dos neurônios. Não há prova científica disso. O que realmente disse e reafirmo é que computadores, tablets, smartphones, enfim, todos os dispositivos interativos, quando usados excessiva e ininterruptamente, deixam a mente em um estado de confusão sobre o aqui e o agora muito semelhante aos efeitos do Alzheimer. As pessoas nesse estado perdem momentaneamente a noção clara do que seja passado, presente ou futuro. Alguém imerso nesse universo virtual está sempre de prontidão para responder rapidamente a um e-mail ou uma mensagem de bate-papo. Essa disponibilidade instantânea para os apelos digitais interativos  dominada pelos sentidos e não pela cognição, deixa a mente em um estado semelhante ao provocado pelo Alzheimer ou mesmo pelo autismo. Ainda não existem evidências de que o cérebro sadio submetido de maneira intermitente a esses estímulos sofrerá transformações fisiológicas permanentes. No entanto, essa é uma hipótese a considerar seriamente a longo prazo.

A senhora saberia definir o limite máximo de tempo de imersão diária no mundo virtual ao qual alguém deveria obedecer?

Susan Greenfield: Pelos dados que temos em mãos hoje, ainda não somos capazes de definir esse limite. A questão não é propriamente o tempo que se passa on-line. O cerne do problema é deixar de exercer, por causa da internet, outras atividades essenciais para o desenvolvimento pleno do cérebro e para a manutenção da saúde mental. Passar cinco horas seguidas jogando videogame ou no Facebook pode ser bem estimulante, mas são cinco horas a menos para abraçar alguém, caminhar pela praia, conversar cara a cara com um amigo em um bar ou restaurante. O cérebro de um bebê é um recipiente passivo de sensações, que gradualmente começam a se organizar, o que permite a interpretação por associação das informações que ele recebe. A partir daí, o cérebro formula conceitos com base nas memórias e no conhecimento. É assim que cada um forma a própria identidade. A diversidade e a frequência dessas interações corriqueiras são essenciais para a construção da individualidade não apenas na primeira infância, mas durante toda a vida. As crianças se formam subindo em árvores, sentindo o calor da luz solar no rosto, correndo atra´s dos amigos em um parque. O perigo é satisfazer-se com um simulacro [= imitação] digital das sensações reais. 


VIDEOGAMES
A noção predominante entre os estudiosos, porém, é que os estímulos digitais estão aumentando a eficiência do cérebro humano. Essa noção é equivocada?

Susan Greenfield: Obviamente, qualquer atividade contribui pra o desenvolvimento cerebral. Estudos feitos nas últimas décadas comprovaram a capacidade de o cérebro reorganizar-se e reinventar-se a todo momento por meio de estímulos externos. É a neuroplasticidade. Os videogames desenvolvem a coordenação motora e a memória. Isso está comprovado. Nos adultos, sobretudo nos idosos, a interatividade mostrou-se uma excelente ferramenta para estimular a neurogênese, a formação de novas células cerebrais, e até promover certo bem-estar mental. Há relatos científicos de diminuição dos sintomas da depressão em virtude de relacionamentos que o paciente retomou ou criou nas redes sociais. Minha mãe é viúva, tem 85 anos e mora sozinha. Meu irmão e eu gostaríamos muito que ela tivesse uma conta no Facebook. Mas, infelizmente, ela se recusa. Meu ponto, então, não é a condenação da era da informação. O que eu reafirmo é que a exemplo de um carro, que nos serve tanto mas com o qual podemos atropelar e matar alguém, obter os benefícios e evitar os males das novas tecnologias depende apenas do usuário.

A comunidade científica levou a sério seu alerta sobre o perigo de os videogames, na infância, estarem produzindo adultos "sem ética e atrofiados emocionalmente"?

Susan Greenfield: Essa é uma constatação irrefutável. Pense na fábula da princesa presa na torre. Existe uma enorme diferença entre a experiência de ler sobre Rapunzel em um livro e a de participar de um game em que o objetivo é resgatá-la. O livro apresenta à criança a narração plena da história da princesa. A vida dela faz parte de um contexto. Já no game a princesa é apenas um objetivo, não importa nem como ela chegou a ser aprisionada na torre, não se constrói em nenhum momento um vínculo emocional com a personagem, tampouco se discutem as questões éticas de aprisionar alguém ou as virtudes de caráter ou de coração do ato de salvá-la. A única coisa que importa é ganhar o jogo. Parece-me evidente que são duas vias bem distintas. 

O convívio nas redes sociais aceita uma latitude maior na conduta ética das pessoas?

Susan Greenfield: Sem dúvida. No mundo virtual, as pessoas podem se comportar de um modo como jamais fariam no mundo real. Elas perdem seus constrangimentos naturais, o que normalmente barra os maus comportamentos. Na rede, muita gente se expõe como jamais faria nem mesmo no ambiente familiar ou na frente dos amigos mais íntimos. Essa liberalidade começou com os e-mails, mas atingiu o ápice com o Facebook. Os limites do certo e do errado estão cada vez mais difíceis de ser definidos. O livro O Senhor das Moscas, obra-prima de William Golding [edição brasileira: Nova Fronteira/Sinergia, 2006, 224 pp], conta a história de um naufrágio de estudantes. Presos em um ilha e submetidos a enormes privações, eles perdem o verniz civilizatório e se tornam selvagens. Por alguma razão, estar nas redes sociais pode produzir o mesmo efeito de desconsideração com os outros que acometeu os estudantes do livro de Golding presos na ilha.

Essa regressão tem raízes na química cerebral?

Susan Greenfield: Sim. O prazer de estar on-line ou jogando um game libera dopamina em excesso. A dopamina participa do sistema de recompensa do cérebro, aquele que nos faz querer repetir algo prazeroso. Ela é liberada quando se come algo saboroso, como chocolate, e durante o sexo, por exemplo. Cada vez que a criança muda de fase no videogame, mais dopamina é liberada. A interatividade estimula o cérebro a produzi-la em demasia. Isso é um problema. O excesso desse neurotransmissor afeta diretamente o córtex pré-frontal, região do cérebro que é a sede da consciência, em que a pessoa processa o conceito que faz de si mesma e as noções de tempo e de espaço.


REDES SOCIAIS
Antes eram as revistas em quadrinhos, depois a televisão, agora a internet e os games. Será que cada era tem seu falso inimigo do cérebro das crianças?

Susan Greenfield: Existe uma diferença crucial. As novas tecnologias são muito mais invasivas e têm um impacto infinitamente maior até mesmo que o da televisão. As pessoas agora estão sendo levadas a ter uma percepção da vida como uma sucessão de pequenas tarefas desconectadas entre si, exatamente como no game da Rapunzel. O ser humano é produto de histórias, da preservação de memórias, enfim, da narrativa. Não há mais narrativa. Tudo não passa de ação e reação.

Mas a senhora não acha que tem sido gigantesca a contribuição das tecnologias interativas para a educação?

Susan Greenfield: Uma pesquisa divulgada no ano passado, na Inglaterra, derruba essa tese. Três quartos dos professores ingleses reclamam da crescente dificuldade de concentração dos alunos. Quase todos os pais entrevistados afirmaram que os filhos gastam o triplo do tempo na frente de uma tela em comparação com o que dedicam a um livro. Não concordo com os especialistas que sugerem distribuir tablets aos alunos. Isso não resolve. A única maneira de prender a atenção das crianças nos dias de hoje é ter professores inspiradores. A tecnologia é fundamental e excitante, mas, sozinha, não identifica nem desenvolve talentos. 

A senhora foi criticada por colegas pelo fato de seu documentários e palestras serem populares demais. O que acha disso?

Susan Greenfield: Costumo citar Carl Sagan, a quem admiro muito, quando me criticam por falar de ciência de maneira fácil e acessível. Ele costumava dizer que era um suicídio viver numa sociedade dependente de ciência e tecnologia e não saber nada sobre ciência e tecnologia. Entendo os colegas que, por personalidade ou opção, são mais resguardados. Mas acho que eles não deveriam criticar quem está disposto a simplificar e divulgar assuntos científicos. No fundo, penso que os cientistas que não gostam de popularizar a ciência têm medo de, ao falar de igual para igual com as pessoas leigas, perder a autoridade e o status. 


ROYAL INSTITUTION - em Londres (Inglaterra)
É verdade que os integrantes da Royal Society chegaram a anunciar que pediriam demissão se a senhora fosse indicada para compor seus quadros?

Susan Greenfield: Aconteceram coisas terríveis nesse episódio. Uma delas foi a falta de ética de meus colegas. As regras de escolha de membros da Royal Society deveriam ser confidenciais. Quem afirmou que sairia se eu fosse escolhida deveria ter sido expulso. Além disso, vivemos em uma democracia. Se os membros não concordavam com meu nome, era só chegar a um consenso interno. Não era preciso me expor perante a opinião pública, como fizeram. O que houve, de fato, foi chantagem. As táticas utilizadas pelos meus colegas foram pobres e não democráticas. Infelizmente, a ciência é uma área na qual ainda impera o machismo. Isso é lastimável.

Em um artigo para o jornal The Guardian, a senhora afirmou que a gravidez era um contrassenso. Por quê?

Susan Greenfield: Referia-me à questão profissional. São poucas as mulheres na minha área que conseguem chegar aonde eu cheguei. É difícil desde o início. No colégio, as meninas recebem menos incentivos do que os meninos para seguir a carreira científica. Afinal, ciência é coisa de homem. Quando conseguem superar essa barreira, elas encontram outro obstáculo: a gravidez. Não sou contra ter filhos, mas, na ciência, quem se afasta, mesmo que por pouco tempo, perde a vez, infelizmente. Eu optei por não ter filhos. Meu irmão nasceu quando eu era uma adolescente de 13 anos. Essa já foi uma experiência maternal suficiente para mim.

A senhora deixou a presidência da Royal Institution* pelo mesmo motivo que quase a impediu de entrar?

Susan Greenfield: Fui a primeira mulher a comandar a instituição. Foi uma experiência única. Aprendi a ser uma administradora, consegui reerguer a Royal Institution e ao mesmo tempo modernizá-la. Também me aperfeiçoei como acadêmica. No fim de minha gestão, tive problemas sobre os quais estou proibida de falar por ordem judicial. Mas, apesar de tudo o que fiz até hoje como profissional, minha grande realização como cientista ocorreu no campo pessoal, por mais esquisito que isso possa soar. Graças a meu trabalho, consegui realizar um sonho familiar. Apresentei minha mãe, bailarina, e meu pai, engenheiro elétrico, à rainha Elizateth II.


Assista a um vídeo clicando no link indicado mais abaixo.

Nesse vídeo Susan Greenfield responde às seguintes questões:
  • O autismo e o déficit de atenção estão cada vez mais comuns. Deveríamos culpar a internet e a TV?
  • Como a internet muda e afeta o cérebro?
  • Que tipo de adultos as crianças dessa geração vão se tornar?
  • Como a questão da identidade será afetada?
  • A maior parte das pessoas continua levando suas vidas fora do ciberespaço. Isso vai mudar no futuro?
  • Qual a diferença entre a geração de 'nativos digitais' e 'imigrantes digitais'?
  • Qual a sua opinião sobre o Google Glass e o impacto de aparelhos que permitam estar conectado o tempo todo?
  • Vamos viver como 'cobaias bem alimentadas'?
  • Por que ler é melhor que navegar na internet e jogar videogame?
  • Que problemas o uso excessivo de tecnologia digital pode causar?
  • Existe um limite de tempo seguro para navegar na internet?
  • As atualizações do Facebook podem causar o mesmo efeito no cérebro que as drogas?
ACESSE:


* A Royal Institution da Grã-Bretanha (muitas vezes abreviado como o Royal Institution ou RI) é uma organização científica dedicada ao ensino e pesquisa, com sede em Londres. A Royal Institution foi fundada em 1799 pelos principais cientistas britânicos da época, incluindo Henry Cavendish e seu primeiro presidente, George Finch, o 9º Conde de Winchilsea, para ""Difundir o conhecimento e facilitar a introdução geral, de úteis invenções mecânicas e melhorias; e para o ensino, por meio de cursos de palestras filosóficas e experiências, a aplicação da ciência para os fins comuns da vida" (Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Royal_Institution).

Fonte: Revista VEJA - edição 2303 - Ano 46 - nº 2 - 9 de janeiro de 2013 - Edição impressa - páginas 15 a 17.

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