«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 8 de setembro de 2020

É importante saber que...

Maria Madalena, a primeira apóstola

Luigi Sandri
«Confronti»
Setembro de 2020

Entrevista com Marcello Farina
Padre católico, ex-professor de filosofia da Fundação Bruno Kessler para os Estudos Religiosos e da Universidade de Trento

Uma reflexão renovada na Igreja sobre o mandato que Jesus confiou a
Maria de Magdala – “Anuncia aos apóstolos a minha ressurreição” – faz ressurgir em todo o seu esplendor a missão daquela mulher,
subvertendo o status quo eclesial
Maddalena e le altre. Sul ministero femminile | Confronti 
O livro da comunidade de base de São Paulo em Roma sobre “Maddalena e le altre” [Madalena e as outras] – no qual se afirma que o Evangelho também confere às mulheres o mandato de presidir a Ceia do Senhor – está provocando reações.

O atual Sínodo alemão certamente levará em consideração essa onda quando, em breve, abordar o problema dos ministérios femininos. E, na França, não diminuiu a agitação provocada pela teóloga Anne Soupa, que propôs a sua candidatura como arcebispa de Lyon, sabendo muito bem que ela tem um “limite” insuperável: é mulher.
Tradução do título e subtítulo:
"Madalena e as outras. A Igreja, as mulheres, os ministérios
na experiência de uma história"

Na Itália, o caderno La Lettura do jornal Corriere della Sera do dia 2 de agosto publicou duas páginas sobre “A décima terceira apóstola”, partindo do documentado, original e provocativo “Maria Maddalena. Equivoci, storie, rappresentazioni” [Maria Madalena. Equívocos, histórias, representações, em tradução livre] (Ed. Il Mulino, 127 páginas), no qual a teóloga Adriana Valerio demonstra a deturpação que levou a fazer da discípula predileta de Jesus “a pecadora”.

Se Madalena é a primeira apóstola, quais são – portanto – as consequências? Se a ressurreição de Cristo é uma pedra angular da fé, aquela que a anuncia não poderia ter um papel de segunda ordem, mas sim de fonte.

Portanto, urge um concílio de novo tipo, com homens e mulheres, para tornar realidade a mensagem esquecida do Evangelho.

Eis a entrevista.

Por que é importante refletir sobre as palavras de Jesus a Madalena: “Vá dizer aos meus apóstolos que eu ressuscitei”?

Marcello Farina: Quase imediatamente, e não séculos depois, os Evangelhos foram lidos com uma lente masculina, e, portanto, tudo o que não combinava com ela era, de algum modo, minimizado, senão até esquecido. Afinal, por que a figura de Madalena foi delineada desde o início como uma prostituta? Esse é o modo tipicamente masculino de ver a mulher com estereótipos negativos. E, séculos mais tarde, condensando em uma única pessoa as várias Marias de que fala o Evangelho, Madalena foi reduzida ao protótipo da pecadora: uma visão machista?

Para colocar as coisas novamente na sua devida luz, bastaria dar espaço ao período pascal, que é o momento no qual se funda a Igreja: a qual, de fato, não nasce antes da ressurreição de Jesus, mas sim depois. Ela é o eco da ressurreição. Entre os anunciadores da ressurreição, a primeira em absoluto – como Lucas relata esplendidamente – é precisamente Maria de Magdala:

“Maria!” – “Mestre!”. “Vá dizer aos meus que eu ressuscitei”.

Se a ressurreição de Cristo é a pedra angular da fé, aquela que a anuncia não poderia ter um papel de segunda ordem, mas deveria ser até considerada a primeira apóstola. Urge, portanto, realizar uma reconstrução total dos personagens do anúncio evangélico.

Como concretizar, hoje, essa necessária reavaliação de Maria Madalena?

Marcello Farina: Se déssemos peso e valor efetivos àquilo que o batismo é, deveríamos simplesmente realizá-lo. Cada um, no batismo, torna-se, a seu modo, não para si ou para um pequeno grupo, mas para toda a comunidade, sacerdote, rei e profeta. É o batismo que confere a dignidade de cristão, não a ordem sagrada. O Papa Francisco com uma bela frase diz: “Não somos batizados bispos ou padres, mas somos batizados sacerdotes, reis e profetas”. Existe, portanto, um sacerdócio original, diante do qual o outro se torna um ministerium, isto é, um serviço.

É interessante refletir sobre o que a Igreja Católica no Japão fez a partir do século XVII, quando todos os missionários estrangeiros, começando pelos jesuítas, tiveram que abandonar o país. Por quase 300 anos no império nipônico, os católicos, sem padres, batizaram e celebraram a Eucaristia, ou seja, se comportaram como uma Igreja plena, completa, sem a necessidade de senhores e servos.

Portanto, hoje não deveria haver nenhum escândalo se a Eucaristia fosse celebrada por uma mulher.
Tradução do título e subtítulo:
"Maria Madalena. Equívocos, histórias, representações"

Nenhum escândalo, absolutamente. Madalena vem antes dos discípulos, e não depois. Infelizmente, porém, as mulheres foram expropriadas de um direito radical: isso dependeu da cultura greco-romana da época, que, em grande parte, foi acolhida pelos cristãos e envolvia o fato de as mulheres terem que ficar em casa. Isso aconteceu sobretudo com a “cristandade”, ou seja, quando, com Teodósio, a partir de 380, o cristianismo foi proclamado como única religião do império. E a hierarquia católica aprendeu com a corte imperial a usar brasões e outros símbolos de poder que, em parte, permanecem até hoje.

A Igreja copiou do sistema constantiniano-teodosiano, quando os plenipotenciários eram somente homens. A mulher de Justiniano, Teodora, que no século VI compartilhava com ele o poder imperial, é uma exceção absoluta, fora de qualquer regra. E o Novo Testamento? As palavras de Paulo – “As mulheres se calem nas assembleias” –, independentemente, aqui, se são dele ou não, mostram como uma certa atitude foi acolhida pelos cristãos. É verdade que ele também afirma: “Em Cristo, não há nem homem nem mulher”, o que é muito importante. Mas não se pode negar que as cartas apostólicas mostram frequentemente uma transferência da mentalidade masculina greco-romana.

Portanto, essas comunidades, como a de São Paulo em Roma, que celebram a Eucaristia até mesmo presidida por uma mulher, são coerentes com o Evangelho?

Marcello Farina: É claro, é uma celebração totalmente evangélica. Naturalmente, deve ser gradual a passagem de uma Igreja machista para uma Igreja onde as mulheres também podem celebrar a Eucaristia. É preciso uma certa sabedoria e prudência humanas. Enquanto isso, se poderia começar com as diaconisas. Na primeira Igreja, os diáconos e as diaconisas tinham um papel muito importante. Eles não tinham um papel “temporário”, provisório: era um papel estável. Além disso, as mulheres poderiam muito bem ser criadas cardeais, um papel que, no entanto, não tem nenhuma base evangélica; é uma escolha nascida na história. Não tem nada a ver com os sacramentos, sobre os quais, aliás, haveria – criticamente – muito a dizer. O Concílio de Trento, por exemplo, recolhendo várias tradições, estabeleceu finalmente que são sete. Mas, destaco, quando não podem ser fundamentados no Evangelho, eles não existem. De todos os modos, hoje quase todas e todos os exegetas afirmam que, na Última Ceia, também havia mulheres. E, portanto, Jesus deu o testamento a cada uma dessas pessoas: celebrem a Ceia do Senhor!

Portanto, seria preciso reconhecer que as mulheres podem celebrar e presidir a Eucaristia.

Marcello Farina: Sem dúvida: isso é decisivo e evangélico. Além disso, há também os “sinais dos tempos”: como é possível excluir a mulher dos ministérios em um mundo no qual, cada vez mais, se afirma a sua plena dignidade? Por que uma mulher não pode partir o pão eucarístico que é o coração da vida cristã?

Seria necessário um novo concílio, com a participação de mulheres e homens, para realizar as mudanças necessárias, grandes e complexas?

Marcello Farina: Sim, um concílio desse tipo me parece necessário, não só para reafirmar a plena dignidade de homens e mulheres em todos os ministérios da Igreja, mas também para pôr fim à monarquia papal. Ele deve afirmar – e, de fato, Francisco tentou fazer algumas tentativas – a sinodalidade da Igreja, que ou é sinodal ou não é. Infelizmente, nós a construímos sobre o modelo imperial romano. Sinodalidade significa que a Igreja não pode ser governada sem o concerto de todas as Igrejas. É verdade – como se viu com o Sínodo para a Amazônia de 2019 – que ele também pode falhar, ou ser anulado pela Cúria Romana, ou pelo papa.

No entanto, a sinodalidade da Igreja deve ser afirmada em princípio e na prática.
Se a Igreja fosse sinodal em 1994, o Papa Wojtyla nunca poderia afirmar,
sem escutar a sua Igreja – como fez na carta apostólica Ordinatio sacerdotalis –,
que as mulheres “in aeternum” não poderão receber a ordenação.

Além disso, como muitas Igrejas ligadas à Reforma têm pastoras e bispas, ele deveria tê-las escutado antes de decidir. A sua “ordem” foi, ao que me parece, um abuso de poder.

Traduzido do italiano por Moisés Sbardelotto.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Terça-feira, 8 de setembro de 2020 – Internet: clique aqui (acesso em: 08/09/2020).

A ordenação de mulheres é possível

Foi o que afirmou a Pontifícia Comissão Bíblica

Johannes Beutler
Jesuíta e biblista alemão
Publik-Forum
06-09-2020

Ainda em 1976, a Pontifícia Comissão Bíblica
havia chegado à conclusão de que a
ordenação das mulheres é possível.
Por que os seus argumentos não são ouvidos?
 
JOHANNES BEUTLER
Nos anos 1970, quando a Igreja Anglicana começou a ordenar primeiro mulheres padres e depois mulheres bispas, Roma ficou nervosa. O Papa Paulo VI temia que pedidos semelhantes também fossem impostos à Igreja Católica e, por isso, encarregou tanto a Comissão Teológica Internacional quanto a Pontifícia Comissão Bíblica de esclarecer a questão da ordenação das mulheres.

Naturalmente, esperava-se que ambas as comissões reforçassem e confirmassem a secular tradição da Igreja. Mas a Pontifícia Comissão Bíblica chegou em 1976 a um resultado que não agradou ao papa.

Doze dos 16 membros com direito a voto sustentaram a opinião de que as Escrituras estão abertas à possibilidade da ordenação das mulheres. A lista dos membros da comissão contém os nomes de estimados estudiosos da Bíblia de diversas nações. Apesar disso, o Vaticano preferiu não publicar o documento final. Que só foi conhecido graças a uma indiscrição e depois publicado nos Estados Unidos.

Em vez disso, os resultados da Comissão Teológica Internacional foram repassados para o decreto Inter insignioris, publicado em outubro de 1976, e ao qual o Papa João Paulo II se referiria mais tarde. O prefeito da Congregação da Fé daquela época, o cardeal Franjo Šeper, indicou os motivos contra a ordenação de mulheres:

1º) Acima de tudo, a práxis de Jesus, que havia chamado como apóstolos apenas homens.
2º) Depois, a práxis dos apóstolos e da Igreja primitiva, o ensino e a práxis constante da Igreja.
3º) Por fim, um argumento simbólico: apenas um padre do sexo masculino poderia (nas celebrações) representar o homem Cristo perante a comunidade.

O último argumento é o mais fraco. Pressupõe a relação de Cristo com a Igreja segundo a imagem homem-mulher (Carta aos Efésios 5,2ss.), sem que se possa detectar no texto qualquer referência ao gênero dos padres.

Os argumentos da Pontifícia Comissão Bíblica

A Pontifícia Comissão Bíblica em 1976, em vez disso, chegou à conclusão de que não há nenhuma linha direta que leve do círculo dos 12 aos ministérios da Igreja das origens. O círculo dos 12 [apóstolos] tem principalmente um significado simbólico como reconstituição do povo de Israel com as suas 12 tribos.

Já a equiparação dos 12 com os apóstolos é redutiva e não permite entender a multiplicidade dos apóstolos na Igreja primitiva. Desde o início, as mulheres também assumiram responsabilidades no anúncio e na direção das comunidades. Pensemos apenas na diaconisa Febe ou na apóstola Júnia.

Nem um pouco impressionado com isso, o Papa João Paulo II declarou que a exclusão das mulheres do ministério era um ensinamento da Igreja que deveria ser mantido. E repetiu os argumentos da Comissão Teológica, mas sem o motivo simbólico, segundo o qual o padre deve ser homem para representar Jesus homem.

Esse argumento esquecido se encontra, porém, como único argumento (!) no documento do Papa Francisco na conclusão do Sínodo sobre a Amazônia, no qual ele exclui outros acessos ao ministério.

Por isso, já é hora de o magistério romano retomar o diálogo com a pesquisa bíblica e não simplesmente continuar a ignorá-la. É verdade que, contra o princípio luterano, segundo o qual a Escritura é suficiente para esclarecer questões de fé, a Igreja Católica sempre deu grande valor à convicção de que a revelação deve ser extraída não só da Escritura, mas também da tradição e do magistério.

No entanto, a partir do Concílio Vaticano II, a função da Sagrada Escritura não é mais apenas a de fornecer os argumentos para a teologia sistemática. Ela deve ser levada em consideração pela sua própria visão. Portanto: é preciso ousar mais a Bíblia!

Traduzido da versão italiana por Moisés Sbardelotto.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Terça-feira, 8 de setembro de 2020 – Internet: clique aqui (acesso em: 08/09/2020).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.