«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 16 de junho de 2023

11º Domingo do Tempo Comum – Ano A – Homilia

 Evangelho: Mateus 9,36—10,8 

Frei Alberto Maggi

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas) 

A nossa missão é transmitir vida onde ela não existe

O evangelho que nos é oferecido pela liturgia deste domingo, encontra-se logo no início do segundo grande discurso ou sermão ou catequese de Jesus no Evangelho de Mateus (cf. 9,35—10,42). Esse discurso tem como tema principal e central a missão dos discípulos de Jesus. O mestre prepara seus principais seguidores, os Doze, para o serviço ao Reino de Deus (céus, como prefere denominar Mateus). O nosso texto deste domingo, subdivide-se em três partes distintas:

1ª) Mt 9,35-38: a compaixão de Jesus pela multidão carente e a necessidade de missionários.

2ª) Mt 10,1-4: a indicação do nome dos Doze escolhidos e a sua autoridade.

3ª) Mt 10,5-15: instruções práticas aos missionários.

O texto da liturgia dominical salta o primeiro versículo desse discurso missionário (v. 35) somente contempla o início dessa terceira parte, parando no versículo 8. Vamos ler e refletir. 

Mateus 9,36a: «Vendo Jesus as multidões, compadeceu-se delas, porque estavam cansadas e abatidas, como ovelhas que não têm pastor.»

O efeito do olhar de Deus é sempre compaixão. Pela primeira vez, no Evangelho, aparece o verbo “ter compaixão”, que no Antigo Testamento é atribuído exclusivamente a Deus e nunca aos seres humanos. O verbo, que significa uma ação destinada a transmitir vida onde ela não existe, nos Evangelhos, é atribuído exclusivamente a Jesus.

Em sua obra, Jesus pode ver a situação dramática em que se encontra o povo. Enquanto Moisés havia estabelecido que deveria haver sempre um homem capaz para que “a comunidade do Senhor não seja um rebanho sem pastor” (Nm 27,17; cf. Zc 10,2), agora ninguém cuida deste povo que, por falta de orientação, está gradualmente perdendo as forças. 

Mateus 9,36b-38: «Então disse a seus discípulos: “A Messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Pedi, pois, ao dono da messe que envie trabalhadores para a sua colheita!”»

Dada a escassez de pastores e a dispersão das ovelhas, o leitor esperaria que a oração de Jesus fosse para que o Senhor enviasse pastores para seu rebanho. Em vez disso, Jesus fala de trabalhadores para a colheita. O único pastor do rebanho é o Senhor. Nesta atividade ele precisa de colaboradores, trabalhadores. Por isso os discípulos são informados da situação e devem tomar consciência, através da oração dirigida ao Pai, da sua missão de colaboradores na difusão do Reino.

Diferentemente dos representantes da instituição religiosa que se apropriaram do rebanho para satisfazer sua ambição de poder e se consideram donos da messe, os discípulos reconhecem que o único Senhor do rebanho e da messe é Deus, e seu papel, como trabalhadores, é só de colaboradores. 

Mateus 10,1: «Jesus chamou os doze discípulos e deu-lhes poder para expulsarem os espíritos maus e para curarem todo tipo de doença e enfermidade.»

Pela primeira vez aparece o número “doze” referindo-se aos discípulos que seguem Jesus. O número 12 recorda as tribos de Israel e, aplicado aos discípulos, representa o Israel seguindo Jesus. É um sinal de esperança diante da situação na qual estava o povo, agora, reduzido a apenas duas tribos.

Em função de sua missão, esse grupo de discípulos recebe de Jesus a autoridade sobre os “espíritos impuros”. Esta é a primeira vez que a expressão “espíritos impuros” aparece em Mateus.

Ser impuro ou imundo é a condição que impede a comunicação com Deus, o todo puro.

Todos os fenômenos relativos ao nascimento (Lv 12), à morte (Nm 19,11; Dt 26,14; Jr 16,5), à vida sexual, tornam o homem impuro (Lv 15,16-18; 1Sm 21,5-6).

O espírito é uma força externa ao homem. Se ele aceita, sua influência atua em sua interioridade. Quando esta força vem de Deus é chamada santa (Espírito Santo), quando vem de elementos contrários a Deus é considerada uma força impura.

Jesus não encarrega os doze de ensinar doutrinas, mas de transmitir uma força vital capaz de libertar e curar. Com efeito, através do anúncio da mensagem do Reino, os discípulos poderão libertar os seres humanos de tudo o que domina (“espírito impuro”) e limita a sua vida (“doenças/enfermidades”). A atividade dos doze será uma extensão daquela de Jesus (cf. Mt 9,35). 

Mateus 10,2-4: «Estes são os nomes dos doze apóstolos: primeiro, Simão chamado Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João; Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o cobrador de impostos; Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu; Simão, o Zelota [cananeu], e Judas Iscariotes, que foi o traidor de Jesus.»

É a única vez que o termo “apóstolos” aparece no Evangelho de Mateus. O termo grego apostolôn significa simplesmente “enviados” e não indica uma função ou categoria de pessoas, mas sua atividade sempre voltada para fora da comunidade (cf. Rm 16,7). Jesus nunca lhes dará alguma tarefa para com os outros membros do grupo.

O primeiro da lista é Simão que é apelidado, como já havia aparecido em Mt 4,18, Pedro (Petros = pedra). Nos Evangelhos, Jesus nunca se dirigirá a Simão como “Pedro” (exceto em Lc 22,34). Seguem-se outros três discípulos, igualmente já conhecidos: André, Tiago e João, e recorda-se novamente o vínculo de parentesco que os une (“irmãos”, cf. Mt 4,18-22).

A lista continua com uma série de sete nomes de discípulos, dos quais o único já conhecido é Mateus, o cobrador de impostos (cf. Mt 9,9). O evangelista também inclui no grupo de Jesus os pecadores, aqueles que, por sua condição, foram excluídos de Israel. Com exceção de Mateus, os outros seis não têm nenhum papel nos evangelhos e seus nomes nas listas dos outros evangelistas são diferentes (em Lc 6,16, Judas de Tiago ocupa o lugar de Tadeu). Eles representam as pessoas anônimas que seguem Jesus.

O termo “Kananaios” aplicado a Simão não indica sua origem étnica “cananeu” (em grego chananaios), mas significa “fanático, cheio de zelo” (em Lucas é chamado “o Zelote”, Lc 6,15), ou seja, pertencente ao partido armado.

A presença no grupo de discípulos de dois personagens antagônicos como um zelote, que lutou contra os estrangeiros e os não observantes, e um cobrador de impostos, não observador da religião e trabalhando para os estrangeiros, significa que...

... na comunidade do Reino não há preconceitos sociais nem tem mais valor a militância política e religiosa.

Sempre colocado em último lugar na lista, Judas Iscariotes, cujo nome lembra a “Judeia”, região onde Jesus será assassinado, é apontado como o traidor. Judas é conhecido como Iscariotes, do hebraico ish (homem) e Keriot, uma aldeia da Judeia (Js 15,25). Judas é o homem da aldeia, termo que nos Evangelhos tem sempre um significado negativo, recordando o apego à tradição. O primeiro e o último da lista têm uma característica comum: ambos negarão Jesus. O evangelista quer insinuar que todo o grupo de discípulos abandonará Jesus no momento da provação. 

Mateus 10,5-7: «Jesus enviou estes Doze, com as seguintes recomendações: “Não deveis ir aonde moram os pagãos, nem entrar nas cidades dos samaritanos! Ide, antes, às ovelhas perdidas da casa de Israel! Em vosso caminho, anunciai: ‘O Reino dos Céus está próximo’.»

Jesus envia os seus discípulos a pregar o Reino de Deus. Ainda imbuídos da tradição de um Messias vitorioso e de um Israel dominador de pagãos e exterminador de hereges, Jesus proíbe os seus discípulos de irem aos pagãos e aos samaritanos (cf. Lc 9,51-53). A missão deles é limitada, naquele momento, a Israel. As “ovelhas perdidas” é uma denúncia clara da ação dos pastores que não pastorearam de verdade!

Depois da morte de Jesus, quebrado o sonho de um Messias dominador, os discípulos poderão, finalmente, ir aos pagãos (Mt 28,19: “todas as nações”). 

Mateus 10,8: «Curai os doentes, ressuscitai os mortos, purificai os leprosos, expulsai os demônios. De graça recebestes, de graça deveis dar!”»

A missão dos discípulos é realizar todas as ações de Jesus para prolongá-las no tempo.

Jesus curou os enfermos (Mt 8,16; 9,35), ressuscitou a filha de um dos líderes (Mt 9,18-26), purificou o leproso (Mt 8,2-4) e expulsou os demônios (Mt 9,32). Os discípulos continuam a atividade de Jesus no presente.

De graça recebestes, de graça deveis dar!” Proibição absoluta de taxar o amor recebido gratuitamente: como o Pai ama sem condições (cf. “Mateus” = dom de Deus), assim deve ser transmitida a Boa Nova. Termina a imagem de um Deus exigente e começa a do Pai generoso. Essa gratuidade implementada pelos discípulos serve para testemunhar a libertação de todas as preocupações materiais (Mt 6,25-33) e a plena confiança no amor do Pai

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«Ai de mim, se eu não anuncio o evangelho!»

(1Coríntios 9,16c)

Quem não é missionário, não é cristão! Quem não sente vontade e vai ao encontro dos outros para comunicar a experiência viva que fez de Cristo, não é cristão! Quem não sai correndo contar para os demais aquilo que aprendeu com o Cristo, não é cristão! Ser cristão não é ter uma vivência intimista, voltada para dentro, portanto, fechada do mistério de Cristo em sua vida, muito pelo contrário! O Povo de Deus, seja aquele do Antigo Testamento (cf. 1ª Leitura deste domingo: Ex 19,2-6a), seja aquele do Novo Testamento (cf. Mt 10,1-4), representado pelos Doze discípulos, é escolhido e enviado para ser uma luz, um exemplo, um guia para todo o mundo. 

O Evangelho de hoje nos revela e ensina quais são os fundamentos, os alicerces da missão cristã, isso é importantíssimo! Vejamos:

1º) O movente, o elemento provocador da missão: a dor, a opressão, o abandono dos mais pobres da sociedade. Diante deles, as entranhas de Jesus se revolviam, se condoíam, ou seja, ele tinha uma profunda e sincera compaixão pela situação das pessoas! Basta ler, por exemplo: Mt 9,36; 14,14; 15,32; 18,27; 20,34. Por isso, ele se põe a ensinar aonde há ignorância e a aliviar o sofrimento onde há enfermidades e dores.

2º) Os enviados, os “apóstolos”: como o comentário de Frei Maggi apontou acima, Jesus convida e envia em missão todo tipo de pessoa (cf. Mt 10,2-4)! De pessoas detestadas e mal afamadas na sociedade (Mateus, o cobrador de impostos) até revoltosos e violentos (Simão, o Zelote). De pescadores (Simão Pedro, Tiago, André e João) a camponeses de aldeias pequenas (Judas Iscariotes). O fundamental é serem próximos a Jesus, irem atrás dele, que significa ser discípulo, ser aluno, querer aprender com o Mestre.

3º) A autoridade missionária: a autoridade e poder que Jesus concede aos seus missionários não é de dominação e submissão de ninguém! Mas para expulsar espíritos impuros e curar enfermos. Portanto, na mentalidade de Jesus, ter “autoridade” é ter BONDADE e SENSIBILIDADE diante do sofrimento dos que se encontram mal. Quanta diferença em relação àquilo que vivemos, hoje, em nossa Igreja, não é mesmo?

4º) O conteúdo da pregação missionária: o versículo 7, do capítulo 10 de Mateus, deixa claro que o conteúdo do anúncio é o Reino dos Céus (= de Deus). No entanto, quando seguimos a leitura, no versículo 8, lemos o que isso significa: “Curai os doentes, ressuscitai os mortos, purificai os leprosos, expulsai os demônios”. Isso quer dizer algo muito simples e claro:

«... anunciar o Reino de Deus não é dar catequese, ensinar doutrinas, impor mandamentos e organizar cerimônias sagradas. Anunciar o Reino é libertar as pessoas de suas tristezas e sofrimentos, dar vida aos que estão mortos, espalhar felicidade» (J. M. Castillo).

Traduzindo isso em modo concreto para os tempos de hoje, a missão do Povo de Deus, a missão dos discípulos é atuar para que a nossa sociedade viva na paz, no respeito, igualdade de direitos e segurança para todos e em tudo. 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Ó Pai, que nos fizeste povo profético e sacerdotal, chamado a ser sinal visível da nova realidade do teu Reino, concede-nos viver em plena comunhão contigo no sacrifício de louvor e no serviço aos nossos irmãos, para tornar-nos missionários e testemunhas do Evangelho. Que a tua compaixão seja a nossa compaixão, a tua urgência missionária seja a nossa urgência; sim, Senhor, envia-me! Amém.»

(Fonte: 11ª Domenica del Tempo Ordinario: orazione finale. In: CILIA, Anthony O.Carm [a cura di]. Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico A. Leumann [TO]: Elledici, 2010)

Fonte: Comentário a Mateus 9,36—10,8 foi fornecido diretamente pelo autor.

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