«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Os opositores

Quem são os críticos de Papa Francisco?
O que criticam? O que os move?

Sonja Strube
Settimana News
15-05-2019

Talvez na história da Igreja nunca um papa tenha sido objeto de tantos ataques e até de pedidos de demissão como o Papa Francisco.
As acusações são pesadas: erros doutrinais e heresia
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PAPA FRANCISCO

Sonja Strube, professora de teologia e pedagogia religiosa no Instituto de Teologia Católica da Universidade de Osnabrück [Alemanha, Baixa Saxônia] e especialista em temas relacionados ao populismo de direita, publicou em katholisch.de de 5 de maio último, uma análise que descreve o perfil psicológico e político dessas pessoas e mostra o quanto elas são perigosas para a Igreja e para a sociedade.

Eis o artigo.

Desde a eleição do Papa Francisco, um vento mais fresco sopra na Igreja católica: novamente são possíveis as discussões abertas, onde por um longo tempo apenas reinava um silêncio de chumbo. Ao mesmo tempo, no entanto, o Papa Francisco é continuamente atacado por pequenos grupos reacionários de um modo que deixa sem palavras.

Ele é acusado de algo que há séculos nunca havia sido censurado a um pontífice, isto é, difundir falsas doutrinas, ser um "papa haereticus", de forma que as suas reformas, decisões e encíclicas não podem reivindicar qualquer consentimento.

Essas discussões são promovidas nos relativos fóruns privados da internet, presentes inclusive na Igreja católica romana, bem como no âmbito da língua alemã, nos EUA e em outros países. Atualmente circula online também uma petição que convida o Papa Francisco a se aposentar.

Esses círculos encontram um apoio especial nas direitas políticas, desde AfD (Alternative für Deutschland - partido político eurocéptico, ndr) às mídias de direita, até Steve Bannon (ex-estrategista-chefe do presidente dos EUA, Donald Trump, ndr).

A censura agressiva, que às vezes degenera no escárnio, provém exatamente de ambientes que, com João Paulo II e Bento XVI, se definiam os únicos "fiéis ao Papa".

No centro das censuras contra o Papa Francisco estão a exortação Amoris laetitia e toda mínima modificação da moralidade sexual tradicional da Igreja. Mas muitas outras suas posições são duramente atacadas e rotuladas de "extrema esquerda" como, por exemplo, sobre os migrantes, a justiça e a mudança climática global. Até mesmo o convite à virtude cristã tão venerada da misericórdia para esses círculos é um espinho nos olhos.

O problema da doutrina e da heresia que, à primeira vista, poderiam parecer uma questão teologicamente muito complexa, indica duas coisas:
* a existência de uma pequena, mas agressiva, corrente subterrânea de caráter fundamentalista-autoritário na Igreja católica romana, e
* um interesse político em apodera-se ou pelo menos dividir esta Igreja através de alguns protagonistas da área da direita política.
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Missa celebrada segundo o rito pré-Concílio Vaticano II (1962-1965)

Quem são esses "ex-fiéis do Papa" que se opõem ao Papa Francisco?

Ao analisar os fóruns da internet que denunciam o Papa Francisco de forma tão dura, obtêm-se informações sobre o comportamento de seus autores e de seus usuários (informações que são reveladoras).

Muitos daqueles que publicam comentários são pessoas claramente instruídas, escrevem sem dificuldade textos longos e elaborados, referem-se aos antigos filósofos e aos padres da Igreja, fazem citações em latim. A simplicidade mental, a falta de instrução e até mesmo condições de vida precárias não parecem ser problemas para essas pessoas.

Predominam pessoas mais velhas do que a média. Além disso, a mídia e seus usuários frequentemente manifestam proximidade com partidos e grupos políticos da direita como a CDU/CSU.

Apesar dos níveis educacionais, uma forte recusa da teologia científica permeia seus comentários, tanto que, muitas vezes, parecem se opor até mesmo a um discurso democrático.

A verdade religiosa, Deus e sua vontade são considerados como uma afirmação bem definida e uma posse sólida (a pessoa "tem" a verdade) e não como algo inefável e muito maior, que os homens só podem pressagiar e se aproximar tateando. Em última análise, nossa perspectiva humanamente limitada é "trocada" com a perspectiva de Deus - a própria posição, a própria visão de mundo é "trocada" pela vontade de Deus.

Em geral, nesses ambientes manifesta-se cada vez mais claramente uma oposição global para o Vaticano II, tentando anular em toda a linha as suas decisões e as suas reformas e tornar o antimodernismo eclesiástico do final do século XIX e início do século XX a única forma vinculante do catolicismo romano.

Também o estilo dos discursos e as apresentações dos fóruns da internet "críticos em relação a Francisco" mostram uma série de peculiaridades:
* uma visão extremamente negativa do mundo combinada com relatos de indignação e escândalos;
* uma forte desvalorização verbal daqueles que pensam de maneira diferente, frequentemente acompanhados de escárnio;
* a formulação de ideias morais rígidas, quase exclusivamente no campo da sexualidade, com o pedido de censuras e de duras punições.

Há propostas explícitas de punição por parte dos tribunais, às vezes até fantasias de vingança de natureza apocalíptica e retóricas de conspiração, acompanhadas por uma marcada polêmica contra a misericórdia, contra as imagens da ternura de Deus e contra qualquer forma criativa de praxe religiosa.

O autoritarismo como fraqueza de consciência

Tudo o que pode ser observado na mídia católica de direita encontra uma explicação psicológica convincente nos estudos de Theodor W. Adorno sobre a "personalidade autoritária".

Na década de 1940, diante do fascismo e do nazismo, Adorno explorou a personalidade autoritária antidemocrática e descreveu-a acima de tudo como "submissão autoritária" a autoridades externas e a rígidos sistemas de normas associados a uma "agressão autoritária" em relação àquelas pessoas que ousam transgredir tais normas.

Entre as características importantes que ele observa, há:
* uma forte "defesa do subjetivo, do imaginário, do sensível",
* a superstição e os estereótipos,
* a ambição do poder,
* a "ostentação da força física",
* a destrutividade e o cinismo,
* a tendência a acreditar "em eventos devastadores e perigosos no mundo", bem como
* a "projeção dos impulsos inconscientes para o mundo exterior", juntamente com
* uma fixação sobre o conjunto dos temas relativos à sexualidade.

Na maneira vigorosa, forte e aterradora em que as pessoas autoritárias agem e operam (razão pela qual é preciso colocar um freio nelas), Adorno diagnostica claramente na base de uma acentuada fraqueza do "eu" e da "consciência". As pessoas autoritárias carecem de confiança em seu modo de pensar, em seu mundo dos sentimentos e em sua capacidade de juízo moral.

Os substitutos são pontos externos fixos e estruturas pré-definidas, uma rígida adesão a convenções e uma submissão a autoridades "morais" relevantes - sejam estas leis, dogmas, líderes religiosos e políticos.

Aqueles que não se submetem igualmente às autoridades auto-eleitas demonstram que também se pode viver de maneira diferente, colocando assim em discussão a sua submissão.

O mundo circundante é considerado hostil, mau, imoral, com nuances de conspiração, de modo que, diante dele, é necessário armar-se e defender-se. Como orientações, são necessárias hierarquias claras e um ordenamento preciso para os polos "bom" ou "mau". Como não é possível confiar na própria vida interior, é rejeitado e desvalorizado tudo o que é crítico-reflexivo e interiormente emotivo.
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CONCÍLIO VATICANO II
Responsável pela abertura e o diálogo da Igreja Católica com o mundo moderno

... e como razão para a oposição a Francisco

Assim, os diferentes aspectos da teologia e da forma de agir do Papa Francisco, combatidos por seus adversários, tornam-se plausíveis.

Os crentes com uma estrutura pessoal autoritária exigem uma estrita observância de regras, normas e dogmas consideradas eternamente imutáveis e para compensar de tal forma a fraqueza das suas consciências e dos seus "eu" através de um quadro normativo externo.

A ideia de uma misericórdia doada gratuitamente mina a rigidez das regras. Além disso, requer compaixão, tocando assim o "campo minado" das emoções, algo a ser cuidadosamente evitado.

A razão pela qual a mudança das ênfases no campo da moral sexual é percebida como particularmente ameaçadora é explicada - de acordo com Adorno - com a importância que tem sua maneira de enfrentar as próprias necessidades sexuais pessoais.

A veemente rejeição da moderna teologia científica e do diálogo ecumênico e inter-religioso podem ser explicadas como uma defesa contra a insegurança que nasce da multiplicidade de possíveis perspectivas e do reconhecimento daqueles que pensam diferentemente como parceiros iguais do diálogo.

O pensamento teológico relacional e contextualizado - teologias contextuais e teologias da libertação, mas também as reflexões sociais e as morais sociais - são rejeitados como "relativismo".

A religião, nessa perspectiva, deve servir, principalmente à estabilização psíquica interior, por meio de um universo de valores claramente estruturado de ideias "eternas", e a atenção não deve ser focalizada sobre a ambivalência do mundo.

Sempre que o Papa Francisco (ou outros teólogos e teólogas) raciocinam numa perspectiva pastoral e contextual, abrem espaços discricionais ou fortalecem a consciência pessoal e provocam um processo de amadurecimento, os crentes dotados de uma personalidade autoritária têm seus problemas em enfrentar os dilemas morais e suas fraquezas de consciência.

Do papa, como pessoa em autoridade, esses crentes esperam que ele confirme seu comportamento autoritário com normas, na posição de fiador de seu quadro normativo, e proponha ideias religiosas rígidas na política da Igreja e que, em virtude de sua função, as torne obrigatórias para todos.

Como o Papa Francisco intencionalmente desapontou as expectativas autoritárias, ele teria de ser desacreditado como objeto de submissão autoritária; além disso, devido à sua recusa em personificar o papel que lhe corresponde, atraiu sobre si mesmo uma dupla raiva:
a) "a agressão autoritária" contra ele como "transgressor de regras", no sentido de que ele admite exceções, e
b) a indignação porque agora o próprio rígido quadro normativo deve “se virar” sem o papa como fiador.
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THEODOR W. ADORNO
Viveu de 1903 a 1969: filósofo, sociólogo, musicólogo e compositor alemão.
É um dos expoentes da chamada Escola de Frankfurt

Um perigo para a Igreja e a sociedade

O autoritarismo na forma descrita por Theodor W. Adorno possui um forte potencial esclarecedor quando se trata de descrever grupos e correntes antimodernistas e fundamentalistas, mas também estruturas problemáticas, tradições de pensamento e de ação dentro da Igreja e compreender suas dinâmicas destrutivas.

Além disso, no que diz respeito à violência sexual, a sua ocultação e até mesmo o abuso espiritual, tornam atualmente um problema o significado das estruturas autoritárias da Igreja.

O autoritarismo constitui também uma categoria central para explicar as posições populistas e extremistas de direita. Isso explica a proximidade que muitas vezes existe entre os círculos religiosos autoritários e políticos de direita. E ressalta o perigo que pode derivar para a Igreja de grupos estruturados de maneira autoritária.

Do ponto de vista eclesiástico-político, surge a necessidade de uma clara rejeição do populismo e do extremismo misantrópico de direita, bem como da supremacia de grupos estruturados de maneira autoritária e seu background ideológico dentro da Igreja.

Traduzido do italiano por Luisa Rabolini. Acesse a versão original deste artigo, clicando aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Sexta-feira, 17 de maio de 2019 – Internet: clique aqui

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