«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 14 de julho de 2014

COPA: OLHANDO POR OUTRO LADO...

Ao menos fora de campo, Brasil ganhou a Copa

Simon Kuper*

Organizar o evento é a parte fácil, a Fifa tem um roteiro;
o que fez deste Mundial o melhor a que assisti foi o ambiente
Simon Kuper - colunista do jornal londrino "Financial Times"

Pelo menos fora de campo o Brasil ganhou a Copa do Mundo. Para nós, estrangeiros, tudo parece ter funcionado muito bem.

Os estádios foram perfeitos e não desabaram (se bem que uma passarela no Maracanã quase desmoronou antes de Argentina x Bósnia), os aeroportos deram conta e o trânsito não foi péssimo, mesmo que o Brasil tenha tido que fechar escolas e universidades e decretar feriados  para que isso fosse possível.

Em suma, a organização foi ótima. Mas essa é a parte fácil. Já assisti a sete Copas, seis Eurocopas e uma Olimpíada, e, nos últimos tempos, a organização sempre é boa.

A Fifa sabe organizar Copas. Ela tem um roteiro. Se o país anfitrião o segue mais ou menos, as coisas funcionam.

Uma Copa do Mundo é um evento enorme apenas na TV: a Copa do Brasil será o evento de maior audiência da história. Mas a presença física do torneio é mais modesta.

Os espectadores foram brasileiros, em sua imensa maioria. Apenas cerca de 700 mil estrangeiros vieram, pouco mais que a média mensal normal. Como disse o governo, o movimento nos aeroportos foi menor do que no Natal.

A polícia lotou áreas turísticas para proteger a nós, estrangeiros. Tudo transcorreu razoavelmente sob controle.

Estádios também são mais ou menos fáceis de construir hoje em dia. Os daqui se parecem muito com os da Alemanha em 2006 ou os da África do Sul em 2010. Ninguém vai a uma Copa para curtir os estádios, de qualquer forma.

Portanto, a boa organização não é algo que, de repente, indique que o Brasil seja um país desenvolvido e maravilhosamente administrado.

Não. O que fez desta Copa a melhor à qual já assisti foi o ambiente. Sei que os brasileiros estão fartos dos chavões estrangeiros sobre, sol, areia e samba. Mas procurem, por favor, entender o efeito de Copacabana sobre um cidadão do norte da Europa.

Alguns dos meus melhores momentos aqui foram as caminhadas que fiz descalço à beira-mar no Rio, em Fortaleza e em Salvador. Desconfio que muitos torcedores estrangeiros sintam o mesmo.

O outro elemento fundamental do ambiente: os brasileiros. Já fui a Copas bem organizadas como a dos EUA [Estados Unidos da América] em 1994 e a do Japão em 2002, quando a maioria dos habitantes locais nem sabia que estava ocorrendo um Mundial.

Os brasileiros viveram a Copa. E quase todo mundo que conheci aqui me tratou com simpatia. Essa atitude amistosa é um trunfo nacional.

Na noite do 7 a 1 caminhei pelos Jardins [região de São Paulo, capital], e, em vez de protestos, vi muitos brasileiros gargalhando. A maioria de vocês reagiu à humilhação com dignidade. Nós, visitantes, pudemos ter um vislumbre do Brasil, ainda tão pouco conhecido no exterior.

Não haverá legado econômico. Quase todos os economistas acadêmicos concordam: sediar uma Copa não enriquece o país anfitrião.

A boa imagem conquistada pelo Brasil neste mês não vai se traduzir em mais turismo ou investimentos estrangeiros no futuro. Fora de campo, o Brasil viveu uma boa Copa. Essa é uma recompensa por si só. Desfrutem dela.

* Simon Kuper é colunista do jornal “Financial Times” (Londres), onde trabalha desde 1994. É autor de diversos livros sobre futebol, incluindo “Soccernomics” (2009), escrito em parceria com Stefan Szymanski.

Fonte: Folha de S. Paulo – Poder/A Copa como ela é/Opinião – Domingo, 13 de julho de 2014 – Pg. A9 – Internet: clique aqui.


O AUTOENGANO DA TORCIDA
Brasileiros acreditaram no improvável

Entrevista com Eduardo Giannetti

Morris Kachani

Para o escritor e economista Eduardo Giannetti, 57 anos, a derrota do Brasil para a Alemanha se assemelha ao jogo do Santos contra o Barcelona, pelo Mundial de Clubes de 2011, quando o time brasileiro foi batido por 4 a 0. “Foi o mesmo tipo de situação humilhante, em que você passa a torcer para o jogo acabar logo.”

Giannetti enxerga no 7 a 1 uma ferida “pesadamente narcísica”: “Abrimos mão da poesia e do lúdico para ganhar produtividade e tentar virar europeus, sem consegui-lo. Então perdemos uma coisa, mas não ganhamos outra”.

Atual consultor da campanha de Eduardo Campos à Presidência e colunista do jornal Folha de S. Paulo, Giannetti é autor de livros como “Auto-engano” (Editora Companhia das Letras), que traz uma visão original sobre a necessidade que temos de nos iludir em determinados momentos, e as implicações éticas envolvidas nesta escolha. O economista diz que não havia motivo para acreditarmos na seleção. “O autoengano ocorre quando se passa a desejar ardentemente que algo aconteça.”
Eduardo Giannetti - economista e escritor

Eis a entrevista.

Folha - O que dizer a essa altura sobre o jogo Brasil x Alemanha?
Eduardo Giannetti - A superioridade tática e técnica dos alemães foi incontestável. Tão esmagadora que fez bater o desânimo em nossos jogadores, minando a autoconfiança que restava. A houve apagão. O time se deu conta de que vencer era uma causa impossível. O escritor Jonathan Swift dizia que quase todas as formas de entretenimento mimetizam situações de luta e enfrentamento. Mas, para haver drama, é preciso que haja paridade.

Como digerir o 7 a 1?
Eduardo Giannetti - Este jogo lembrou o do Santos contra o Barcelona, na final do Mundial em 2011, quando o Barcelona fez quatro e poderia ter feito mais. Foi o mesmo tipo de situação humilhante, em que você passa a torcer para o jogo acabar logo. Por isso não concordo com a análise de que com Neymar teria sido diferente. Contra o Barcelona não foi.
Este Brasil era um time acéfalo [sem cabeça, sem liderança]. Vejo a mesma linhagem na derrota de 1998. É a experiência de não reconhecimento da seleção - isso que é insuportável. O sentimento de um estranhamento profundo, completamente diferente do que vivemos na Copa de 82, por exemplo. Aquele time enchia os olhos, uma história que dá para encarar.

Houve autoengano da torcida?
Eduardo Giannetti - O que nos deixou iludidos foi a Copa das Confederações. Mas, olhando friamente em retrospectiva, não havia motivos para acreditar. Este foi um autoengano: achamos que éramos competitivos. O autoengano ocorre quando você passa a desejar ardentemente que algo aconteça. Esse desejo é mobilizador - você começa a achar motivos para que ele se realize.

Se o futebol uma metáfora da vida, ou de uma nação, o que representa essa derrota?
Eduardo Giannetti - Esse jogo abriu uma enorme ferida narcísica. Para o dramaturgo Bernard Shaw, o patriotismo é a convicção de que seu país é superior a todos os outros porque você nasceu nele. No caso do Brasil, o futebol é um espaço que escolhemos para nos representar simbolicamente e, desta vez, fracassamos de uma maneira bisonha. Entramos com uma energia simbólica focada no triunfo e saímos vexados. Vai demorar para cicatrizar esta ferida pesadamente narcísica.

Narcísica em que sentido?
Eduardo Giannetti - A imaginação brasileira exacerbada e oscila muito. Ou somos maravilhosos, abençoados por Deus e bonitos por natureza, ou então um desastre, um fracasso. São os dois lados da mesma moeda. O complexo de vira-lata, por exemplo, o avesso do ufanismo. Mas a diferença com 50 é que desde então o Brasil mostrou que é capaz. Somos penta. Então temos uma memória de nosso potencial. Em 2002 ganhamos da Alemanha na final. Então já não se trata do complexo de vira-lata.

Perdemos a identidade?
Eduardo Giannetti - O problema agora é que abrimos mão da poesia e do lúdico para tentar virar europeus, sem consegui-lo. Então perdemos uma coisa, mas no ganhamos outra. Perdemos a identidade e, ao mesmo tempo, não conseguimos conquistar a técnica produtivista dos alemães.
Este é o impasse da cultura brasileira hoje: queremos ter um PIB per capita alemão abrindo mão da alegria e da espontaneidade inconsequente. É preciso elaborar essa diversidade e o Brasil é mestre nisso. A questão é: queremos ser o país do futebol com uma produtividade alemã? Por que abrir mão de nosso improviso? O Neymar talvez nos represente. Mas Hulk, não.
O Brasil está em um impasse. É preciso escolher se queremos ser uma cópia dos EUA e da Alemanha, se estamos dispostos a sacrificar outros valores em nome de uma meta econômica e tecnológica. Ou se propomos uma sociedade original que, embora não alcance esse padrão, ofereça soluções criativas ao mundo, como se fosse um ensaio para a construção de uma civilização brasileira.

Muita gente diz que esta está sendo a melhor das Copas.
Eduardo Giannetti - Antes da Copa, achava que teríamos uma vantagem dentro das quatro linhas. Mas sabia que, em termos de organização do evento, no daria para comparar com a Alemanha, por exemplo. A expectativa com relação à Copa aqui era tão ruim que qualquer mediocridade que evitasse um grande desastre já faria o mundo considerar o evento um sucesso. Deixamos a desejar. Os custos dos estádios, as mortes, o atraso, a questão da mobilidade. Investir em 12 estádios foi uma soberba e mostra como lidamos com o dinheiro público.
O desbaratamento da máfia dos ingressos é o bom contraponto. Então, no saldo geral, do ponto de vista da organização da Copa, não demos um vexame de 7 a 1. Digamos que nossa performance como organizadores foi semelhante à trajetória do time até a semifinal.

Existe algum eco do 7 a 1 sobre o cenário político?
Eduardo Giannetti - Não há evidência de que o resultado da Copa possa influir na intenção de voto. Mas acho complicado o país ter sincronizado perpetuamente as eleições presidenciais para três meses após a Copa. O que é grave é que o futebol acaba sugando e desviando a atenção e a energia do país em um momento no qual o engajamento civil deveria estar em primeiro plano. Para a democracia, isso no bom.

E em termos de insatisfação social?
Eduardo Giannetti - Se havia um substrato ruim com a situação do Brasil, a humilhação alimenta ainda mais esse sentimento. O Brasil não se reconhece mais. É necessário um reencontro de nossa expressão no futebol e na política. Existe uma crise de representação no plano simbólico. O time não nos representa. Assim como boa parte da classe política.
Sem querer partidarizar, mas a frustração de Dilma tem a ver com isso. Quando o Lula fala, o brasileiro se sente forte, valorizado, potente. Já a Dilma deprime, faz a gente se sentir mal. O tom dela é quase o avesso ao do Lula.
Com JK [Juscelino Kubitschek, Presidente do Brasil entre 1956-1961] atingimos esse limiar em termos de autoconfiança. O Lula também tem esse espírito. Brinca com coisas sérias. Já jogamos futebol assim. Agora tentamos ser sérios e damos vexame. Não é nosso modo de ser. De certa forma, o Felipão é a Dilma.

Fonte: Folha de S. Paulo – Ilustríssima – Domingo, 13 de julho de 2014 – Pg. 3 – Internet: clique aqui.

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