«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

domingo, 19 de outubro de 2014

SÍNODO DOS BISPOS - O QUE SE CONCLUIU?

Texto expõe divisão
sobre gays e divórcio

José Maria Mayrink

Em mensagem divulgada antes,
Igreja havia se calado sobre acolhida aos homossexuais
Papa Francisco, de costas, diante da Plenária do Sínodo dos Bispos
Vaticano, 5 a 19 de outubro de 2014

O relatório final da 3ª Assembleia-Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos, que discutiu nas últimas duas semanas os desafios pastorais para a família, mantém o princípio da Igreja Católica de que o casamento é indissolúvel e significa união entre homem e mulher, mas abre espaço para o acolhimento dos católicos que vivem à margem da doutrina. O texto expôs a divisão da Igreja em relação aos divorciados e homossexuais.

Trecho divulgado na semana passada, em versão preliminar, que dizia que “as pessoas homossexuais têm dons e qualidades que podem oferecer à comunidade cristã” acabou suprimido após a votação dos cardeais e bispos. Houve 118 votos a favor e 62 contrários à declaração.

No relatório final, a recomendação da Igreja é que “homens e mulheres com tendências homossexuais devem ser acolhidos com respeito e delicadeza”. O texto também adverte que se deve evitar qualquer termo de injusta discriminação. O documento ainda poderá ser modificado, pois passará por nova rodada de discussões em 2015.

Uma mensagem do Sínodo [ver abaixo], aprovada ontem pela manhã, havia sido mais sucinta e até omissa ao referir-se às questões mais polêmicas: fez uma curta alusão aos divorciados e calou-se sobre a acolhida aos homossexuais.

Casais separados ou que moram juntos numa convivência informal, sem contrato civil ou celebração religiosa do matrimônio, mereceram atenção especial no documento.

A questão mais polêmica no Sínodo, conforme informação do relatório, que divulgou o número de votos alcançados em cada um dos 62 parágrafos votados, foi a possibilidade de acesso dos divorciados recasados aos sacramentos da Penitência (confissão) e Eucaristia (comunhão), matéria do parágrafo 52. De um total de 178 votantes, 104 foram a favor e 74, contra.

O parágrafo admite que, em situações particulares e condições bem precisas, levando-se em conta a irreversibilidade da ligação dos casais e suas obrigações morais em relação aos filhos, se permita o acesso aos sacramentos, sob a responsabilidade do bispo. “Alguns padres (padres sinodais ou participantes) sustentaram que as pessoas divorciadas e recasadas ou que vivem juntas possam recorrer com proveito à comunhão espiritual. Outros padres se perguntaram por que então não podem ter acesso à (comunhão) sacramental”, diz o parágrafo 53, que também dividiu os votos, com 112 a favor e 64 contra.
Contexto da família
Dividido em três partes, além da Introdução e da Conclusão, o relatório dedica 28 parágrafos à análise do contexto da família no mundo de hoje e ao evangelho da família sob o olhar de Cristo. Os outros 34 parágrafos tratam das perspectivas pastorais para enfrentar os desafios.
Questões polêmicas à parte, as discussões das duas últimas semanas abrangeram um vasto leque de situações da família que desafiam a evangelização cristã. Há contextos culturais e religiosos, adverte o texto, que representam desafios particulares.
“Em algumas sociedades vigora ainda a prática da poligamia e, em alguns contextos tradicionais, o costume dos casamentos por etapas. Em outros contextos, permanece a prática de matrimônios combinados”, diz o documento.
O relatório chama a atenção para a situação das crianças que nascem fora do matrimônio e para aquelas que crescem com só um dos pais ou num contexto familiar ampliado ou reconstituído (por novas uniões dos casais). Adverte ainda para a violência sofrida pelos filhos com a dissolução da família, muitas vezes por dificuldades econômicas. Os bispos afirmam no texto que deve ser valorizada a dignidade da mulher que assume o encargo da família, quando abandonada pelo marido.
Pornografia
O Sínodo denuncia a difusão da pornografia e da comercialização do corpo, “favorecida pelo uso distorcido da internet, assim como a situação das pessoas que são obrigadas a praticar a prostituição”.
“A Igreja desempenha um papel precioso de apoio às famílias, com base na iniciação cristã, por meio de comunidades acolhedoras”, afirma o relatório final, ressaltando que, mais do que no passado, se deve ajudar os pais na educação, acompanhando meninos, rapazes e jovens “em seu crescimento por caminhos personalizados capazes de lhes dar o sentido pleno da vida e de suscitar escolhas e responsabilidades, à luz do Evangelho”.
O texto final da 3ª Assembleia-Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos que se encerra hoje [domingo, 19 de outubro], com uma missa solene no Vaticano, será enviado às igrejas locais ou dioceses do mundo inteiro para rediscussão. A conclusão sairá em outubro do próximo ano, quando os bispos se reunirão numa segunda etapa – a Assembleia Ordinária –, mais uma vez sob a presidência do papa.
Para ler o Relatório Final (em latim: Relatio Synodida 3ª Assembleia-Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos, clique aqui (somente em língua italiana)
Fonte: O Estado de S. Paulo – Metrópole – Domingo, 19 de outubro de 2014 – Pg. A28 – Edição impressa.
 Mensagem da 3ª Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos
Foi divulgada hoje, 18 de outubro, mensagem da 3ª Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, que se realiza no Vaticano, de 5 a 19 de outubro, com o tema "Os desafios pastorais da família no contexto da evangelização".
No texto, os padres sinodais recordam os desafios enfrentados pela família na atualidade, como a fidelidade no amor conjugal, o enfraquecimento da fé e dos valores, o individualismo, o empobrecimento das relações, o stress, as dificuldades econômicas. Lembram, também, das famílias pobres e refugiadas "atingidas pela brutalidade das guerras e da opressão". Ao mesmo tempo, recordam que "o amor do homem e da mulher" ensina "que cada um dos dois tem necessidade do outro para ser si mesmo, mesmo permanecendo diferente ao outro na sua identidade, que se abre e se revela no dom mútuo". E que, neste caminho, "que às vezes é um percurso instável, com cansaços e caídas, se tem sempre a presença e o acompanhamento de Deus".
Plenário do Sínodo dos Bispos sobre a Família
Leia, abaixo, a íntegra da mensagem:
Mensagem da 3ª Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos
Nós, Padres Sinodais reunidos em Roma junto ao Santo Padre na Assembleia Geral Extraordinária do Sínodo dos Bispos, nos dirigimos a todas as famílias dos diversos continentes e, em particular, àquelas que seguem Cristo Caminho, Verdade e Vida. Manifestamos a nossa admiração e gratidão pelo testemunho cotidiano que vocês oferecem a nós e ao mundo com a sua fidelidade, fé, esperança e amor.
Também nós, pastores da Igreja, nascemos e crescemos em uma família com as mais diversas histórias e acontecimentos. Como sacerdotes e bispos, encontramos e vivemos ao lado de famílias que nos narraram em palavras e nos mostraram em atos uma longa série de esplendores mas também de cansaços.
A própria preparação desta assembleia sinodal, a partir das respostas ao questionário enviado às Igrejas do mundo inteiro, nos permitiu escutar a voz de tantas experiências familiares. O nosso diálogo nos dias do Sínodo nos enriqueceu reciprocamente, ajudando-nos a olhar toda a realidade viva e complexa em que as famílias vivem. A vocês, apresentamos as palavras de Cristo: "Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele e ele comigo” (Ap 3,20). Como costumava fazer durante os seus percursos ao longo das estradas da Terra Santa, entrando nas casas dos povoados, Jesus continua a passar também hoje pelos caminhos das nossas cidades. Nas vossas casas se experimentam luzes e sombras, desafios exaltantes mas, às vezes, também provações dramáticas. A escuridão se faz ainda mais densa até se tornar trevas, quando se insinuam no coração da família o mal e o pecado.
Existe, antes de tudo, os grandes desafios da fidelidade no amor conjugal, do enfraquecimento da fé e dos valores, do individualismo, do empobrecimento das relações, do stress, de um alvoroço que ignora a reflexão, que também marcam a vida familiar. Se assiste, assim, a não poucas crises matrimoniais enfrentadas, frequentemente, em modo apressado e sem a coragem da paciência, da verificação, do perdão recíproco, da reconciliação e também do sacrifício. Os fracassos dão, assim, origem a novas relações, novos casais, novas uniões e novos matrimônios, criando situações familiares complexas e problemáticas para a escolha cristã.
Entre estes desafios queremos evocar também o cansaço da própria existência. Pensemos ao sofrimento que pode aparecer em um filho portador de deficiência, em uma doença grave, na degeneração neurológica da velhice, na morte de uma pessoa querida. É admirável a fidelidade generosa de muitas famílias que vivem estas provações com coragem, fé e amor, considerando-as não como alguma coisa que é arrancada ou infligida, mas como alguma coisa que é doada a eles e que eles doam, vendo Cristo sofredor naquelas carnes doentes.
Pensemos às dificuldades econômicas causadas por sistemas perversos, pelo “fetichismo do dinheiro e na ditadura de uma economia sem rosto e sem um objetivo verdadeiramente humano” (Evangelii Gaudium 55), que humilha a dignidade das pessoas. Pensemos no pai ou na mãe desempregados, impotentes diante das necessidades também primárias de suas famílias, e aos jovens que se encontram diante de dias vazios e sem expectativas, e que podem tornar-se presa dos desvios na droga e na criminalidade.
Pensemos também na multidão das famílias pobres, àquelas que se agarram em um barco para atingir uma meta de sobrevivência, às famílias refugiadas que sem esperança migram nos desertos, àquelas perseguidas simplesmente pela sua fé e pelos seus valores espirituais e humanos, àquelas atingidas pela brutalidade das guerras e das opressões. Pensemos também nas mulheres que sofrem violência e são submetidas à exploração, ao tráfico de pessoas, às crianças e jovens vítimas de abusos até mesmo por parte daqueles que deveriam protegê-las e fazê-las crescer na confiança e nos membros de tantas famílias humilhadas e em dificuldade. “A cultura do bem-estar anestesia-nos e (...) todas estas vidas ceifadas por falta de possibilidades nos parecem um mero espetáculo que não nos incomoda de forma alguma” (Evangelii Gaudium, 54). Fazemos apelo aos governos e às organizações internacionais para promoverem os direitos da família para o bem comum.
Cristo quis que a sua Igreja fosse uma casa com a porta sempre aberta na acolhida, sem excluir ninguém. Somos, por isso, agradecidos aos pastores, fiéis e comunidades prontos a acompanhar e a assumir as dilacerações interiores e sociais dos casais e das famílias.
Existe, contudo, também a luz que de noite resplandece atrás das janelas nas casas das cidades, nas modestas residências de periferia ou nos povoados e até mesmos nas cabanas: ela brilha e aquece os corpos e almas. Esta luz, na vida nupcial dos cônjuges, se acende com o encontro: é um dom, uma graça que se expressa – como diz o Livro do Gênesis (2,18) – quando os dois vultos estão um diante o outro, em uma “ajuda correspondente”, isto é, igual e recíproca. O amor do homem e da mulher nos ensina que cada um dos dois tem necessidade do outro para ser si mesmo, mesmo permanecendo diferente ao outro na sua identidade, que se abre e se revela no dom mútuo. É isto que manifesta em modo sugestivo a mulher do Cântico dos Cânticos: “O meu amado é para mim e eu sou sua...eu sou do meu amado e meu amado é meu”, (Ct 2,16; 6,3).
Para que este encontro seja autêntico, o itinerário inicia com o noivado, tempo de espera e de preparação. Realiza-se em plenitude no Sacramento onde Deus coloca o seu selo, a sua presença e a sua graça. Este caminho conhece também a sexualidade, a ternura, e a beleza, que perduram também além do vigor e do frescor juvenil. O amor tende pela sua natureza ser para sempre, até dar a vida pela pessoa que se ama (cf. João 15,13). Nesta luz, o amor conjugal único e indissolúvel persiste, apesar das tantas dificuldades do limite humano; é um dos milagres mais belos, embora seja também o mais comum.
Este amor se difunde por meio da fecundidade e do ‘gerativismo’, que não é somente procriação, mas também dom da vida divina no Batismo, educação e catequese dos filhos. É também capacidade de oferecer vida, afeto, valores, uma experiência possível também a quem não pode gerar. As famílias que vivem esta aventura luminosa tornam-se um testemunho para todos, em particular para os jovens.
Durante este caminho, que às vezes é um percurso instável, com cansaços e caídas, se tem sempre a presença e o acompanhamento de Deus. A família de Deus experimenta isto no afeto e no diálogo entre marido e mulher, entre pais e filhos, entre irmãos e irmãs. Depois vive isto ao escutar juntos a Palavra de Deus e na oração comum, um pequeno oásis do espírito a ser criado em qualquer momento a cada dia. Existem, portanto, o empenho cotidiano na educação à fé e à vida boa e bonita do Evangelho, à santidade. Esta tarefa é, frequentemente, partilhada e exercida com grande afeto e dedicação também pelos avôs e avós. Assim, a família se apresenta como autêntica Igreja doméstica, que se alarga à família das famílias que é a comunidade eclesial. Os cônjuges cristãos são, após, chamados a tornarem-se mestres na fé e no amor também para os jovens casais.
O vértice que reúne e sintetiza todos os elos da comunhão com Deus e com o próximo é a Eucaristia dominical quando, com toda a Igreja, a família se senta à mesa com o Senhor. Ele se doa a todos nós, peregrinos na história em direção à meta do encontro último quando “Cristo será tudo em todos” (Cl 3,11). Por isto, na primeira etapa do nosso caminho sinodal, refletimos sobre o acompanhamento pastoral e sobre o acesso aos sacramentos pelos divorciados recasados.
Nós, Padres Sinodais, vos pedimos para caminhar conosco em direção ao próximo Sínodo. Em vocês se confirma a presença da família de Jesus, Maria e José na sua modesta casa. Também nós, unindo-nos à Família de Nazaré, elevamos ao Pai de todos a nossa invocação pelas famílias da terra:
Senhor, doa a todas as famílias a presença de esposos fortes e sábios, que sejam vertente de uma família livre e unida.
Senhor, doa aos pais a possibilidade de ter uma casa onde viver em paz com a família.
Senhor, doa aos filhos a possibilidade de serem signo de confiança e aos jovens a coragem do compromisso estável e fiel.
Senhor, doa a todos a possibilidade de ganhar o pão com as suas próprias mãos, de provar a serenidade do espírito e de manter viva a chama da fé mesmo na escuridão.
Senhor, doa a todos a possibilidade de ver florescer uma Igreja sempre mais fiel e credível, uma cidade justa e humana, um mundo que ame a verdade, a justiça e a misericórdia.
Fonte: CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – Imprensa – Internacional – Sínodo dos Bispos sobre a Família – Sábado, 18 de outubro de 2014 – Internet: clique aqui.
Fé na tolerância
 ELISABETTA POVOLEDO E LAURIE GOODSTEIN

The New York Times

 Embora já “suavizado”, texto que prega aceitação de gays abre debate histórico no Vaticano
Papa Francisco saúda um mãe com seu filho
Numa mudança de tom que provavelmente será debatida nas paróquias de todo o mundo, uma assembleia de bispos convocada pelo papa Francisco no Vaticano divulgou um documento preliminar na segunda- feira pedindo à Igreja que receba e aceite homossexuais, pessoas unidas fora do casamento e casais que se divorciaram, e também filhos dessas famílias menos tradicionais. O relatório dos bispos não altera a doutrina nem os ensinamentos da Igreja, e foi alvo de acalorado debate e revisão.
Mas é o primeiro sinal de que a igreja institucional pode seguir a direção estabelecida por Francisco nos primeiros 18 meses do seu papado, afastando-se da condenação das situações familiares não convencionais e tratando-as com mais compreensão, abertura e misericórdia. Os sínodos anteriores produziram pouco, mas alguns dos participantes deste o compararam ao histórico Concílio Vaticano II convocado há pouco mais de 50 anos, que produziu mudanças monumentais na liturgia da igreja, sua relação com outras fés e a concepção do papel dos padres e dos leigos.
O relatório de 12 páginas, redigido por uma comissão selecionada por Francisco, diz que, sem abandonar os ensinamentos da igreja a respeito do sacramento do casamento, os pastores devem reconhecer que há “aspectos positivos nas uniões civis e nas uniões fora do casamento”. Trata-se de uma ruptura com a pregação católica tradicional segundo a qual esses casais estariam “vivendo em pecado”. O relatório diz também que os gays têm “dons e qualidades a oferecer à comunidade cristã”, e alguns casais gays proporcionam um ao outro “auxílio mútuo ao ponto do sacrifício” e “precioso apoio na vida do parceiro”.
O documento foi lido em voz alta para os quase 200 bispos, padres e leigos reunidos. A leitura foi seguida por respostas e objeções de 41 bispos, prenunciando as disputas futuras. O sínodo colocou os bispos que concordam com Francisco contra aqueles que insistem que a Igreja corre o risco de trair suas doutrinas definitivas a respeito do casamento e da homossexualidade.
Bruno Forte - arcebispo de Chieti-Vasto e teólogo italiano
O arcebispo Bruno Forte, secretário especial do sínodo, disse em seguida em entrevista coletiva que, embora a Igreja não aprove as uniões entre gays nem o casamento entre homossexuais, é preciso “respeitar a dignidade de todos” e que “a ideia fundamental é a centralidade da pessoa independentemente de sua orientação sexual”.
O relatório será debatido e modificado na semana seguinte por grupos de trabalho de bispos que vão submeter cada sessão a escrutínio, e então um relatório final será divulgado para ser debatido em todo o mundo no decorrer dos próximos 12 meses. Haverá um segundo sínodo em Roma em outubro de 2015, mas, ao final de todas as consultas e debates, é o papa Francisco quem vai definir o rumo a ser seguido.
Luis Antonio G. Tagle - Cardeal-Arcebispo de Manila (Filipinas)
O cardeal Luis Antonio G. Tagle, de Manila, disse que alguns bispos sentiam o “espírito” do Concílio Vaticano II neste sínodo. Para ele, o relatório seria um parâmetro para que eles pudessem “ver o que precisa ser aprofundado, esclarecido, e quais outros temas devem ser abordados, se ainda não foram. Assim sendo, o drama vai continuar.”
Um dos temas mais polêmicos do sínodo diz respeito a conceder o sacramento da comunhão aos católicos que tenham se divorciado e casado novamente sem que o primeiro casamento tenha sido anulado pela Igreja, um processo que costuma ser demorado e caro. A Igreja ensina que o casamento é indissolúvel. O documento reconhecia que os bispos estavam divididos quanto à questão da comunhão, que permanece aberta para debate. Mas o texto pede que a igreja trate com respeito os católicos divorciados e aqueles que se casaram novamente, “evitando termos e comportamentos que possam fazer com que se sintam alvo de discriminação”.
Alguns bispos conservadores que se opõem a qualquer tipo de mudança manifestaram suas opiniões. O cardeal americano Raymond Leo Burke disse que “tendências preocupantes” estavam emergindo do sínodo porque estão “dando margem à possibilidade de adoção de práticas que desviam da verdade da fé”. Já os “progressistas” no sínodo, que desejam mudanças na Igreja, “ocupam posições fortalecidas, nas quais foram instalados pelo papa Francisco”, disse Sandro Magister, especialista em Vaticano que escreve para a revista italiana L’Espresso, “O papa não é imparcial.”
Francis DeBernardo, diretor executivo do New Ways Ministry, grupo que defende os católicos gays, afirmou: “Esse reconhecimento é uma reversão total de afirmações anteriores da Igreja, segundo as quais essa orientação era vista como ‘distúrbio objetivo’, enxergando gays e lésbicas nas comunidades católicas como problemas, pessoas suspeitas”. Nos Estados Unidos, muitas paróquias recebem silenciosamente os casais gays, numa abordagem ao estilo “não pergunte, não conte”. Mas houve relatos de casais gays que não puderam participar da comunhão; paroquianos gays que foram expulsos de coros e conselhos paroquiais; professores gays afastados de escolas; e crianças gays proibidas de participar das escolas paroquiais.
Alguns analistas disseram que o documento do sínodo, ainda um texto preliminar aberto a futuras modificações, influenciará os pastores enquanto for debatido nos próximos meses. Segundo o reverendo James Martin, repórter especial da revista jesuíta America, “embora se trate de um documento interino, o texto representa uma revolução na maneira da Igreja se referir aos nossos irmãos e irmãs homossexuais”.
Entretanto, o documento inicial do sínodo reflete aquilo que parece ser um consenso definitivo entre a maioria dos bispos contra o casamento de pessoas do mesmo sexo. O documento também critica a pressão exercida pelas Nações Unidas e por alguns países ocidentais para convencer países africanos e de outros continentes a rescindir leis que restringem os direitos dos gays em troca de auxílio financeiro. O texto diz que é inaceitável “que entidades internacionais condicionem a oferta de auxílio à introdução de regras inspiradas pela ideologia de gêneros”.
Mas esse foi um raro arroubo político. No geral, o documento preliminar estabelece um tom pastoral que ecoa as palavras do Papa Francisco. De acordo com o texto, a Igreja deve abordar “problemas do mundo real”, cuidar das “famílias feridas” e compreender que situações irregulares como o divórcio são com frequência impostas, e não fruto de escolhas.
TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL.
Fonte: O Estado de S. Paulo – Suplemento ALIÁS – Domingo, 19 de outubro de 2014 – Pg. E9 – Internet: clique aqui.

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