«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 29 de junho de 2020

Ama teu inimigo

Mudando atitudes com atitude

Daniel Martins de Barros
Psiquiatra

Os afetos são contagiosos.
Bom humor gera bom humor.
Tristeza gera tristeza.
PÍLULAS DE BEM-ESTAR | DANIEL MARTINS DE BARROS - YouTube
DANIEL MARTINS DE BARROS

Antes da quarentena, minha filha andava às voltas com uma nova amiga na escola a quem estava chamando repetidamente de chata. Segundo ela, a garota, de seis anos, provocava todo mundo, mentia, criava caso. Infelizmente, com a suspensão da aula não tivemos tempo de observar o resultado de um experimento que propus a ela. Apostei que se ela começasse a tratar bem a garota, se aproximasse dela, se brincassem juntas no intervalo, ela deixaria de ser chata.

A situação é óbvia para quem está de fora: nova na escola, a garota se sentiu excluída, experimentando emoções negativas. Reagindo de acordo afastou as outras crianças, sentindo-se mais rejeitada, tornando-se mais hostil. Ela não é chata. Está chata.

Contei para minha filha que fiz essa experiência já adulto: uma coisa muito parecida aconteceu num grupo de amigos. Uma das pessoas começou a ficar irritada, foi se isolando, arrumando problemas, até um ponto que parecia insustentável. Propus a outros colegas que começássemos a tratá-la bem independentemente da forma como fôssemos tratados. Mesmo céticos, muitos aderiram e, em questão de dias, o clima entre as pessoas foi transformado.

Não é mágica. Os afetos são contagiosos. Bom humor gera bom humor. Tristeza gera tristeza. E com a hostilidade é ainda pior: não é apenas contagiosa, é também uma provocação para reagirmos de forma também hostil numa tentativa de defesa, o que só aumenta a agressividade do outro lado.

Decidir ir contra nossos instintos e agir de forma oposta, pagando o mal com o bem, tem o poder de quebrar essa cadeia. É uma forma de libertação: os envolvidos tornam-se livres para não agredir, pois 99% da humanidade não irá tratar mal quem as trata bem (com aquele 1% de psicopatas a estratégia pode não dar certo. Mas como não sabemos em princípio quem são eles, normalmente vale a tentativa. Meu colega certamente não era (nem a amiguinha de minha filha).
O homem pode escolher entre fazer o bem ou o mal? 
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo por ocasião de seus 90 anos, a cantora Elza Soares fez uma observação interessante sobre o momento. “O Brasil sempre foi um país do amor, e as pessoas estão se esquecendo disso. De onde pode ter saído tanto ódio?”. E completou:

“Quando soubermos que não somos nada, e que somos todos iguais,
seremos mais leves, teremos mais amor e voltaremos a ter esperança”.

É uma boa pergunta. E uma boa solução.

De onde saiu tanto ódio? Não sei se é possível localizar precisamente a origem. Nem se é útil: depois que um deu um tapa na cara do outro e o outro passou rasteira no um, descobrir quem começou não ajuda a desfazer a lógica retributiva que toma conta das pessoas. Só quando compreendermos plenamente que de olho por olho todos acabarão cegos, como diz o ditado, fica claro que o amor de fato é a única saída.

É difícil falar em amor atualmente. Passeatas contra e pró-governo colocam frente a frente pessoas tão antagônicas que o ódio parece inevitável. Ameaças de morte pululam nas redes sociais entre opositores, como se a aniquilação do outro lado fosse a única solução para o dissenso. São inimigos declarados, entrincheirados. Seria utópico esperar mais amor? Pode ser, mas não impossível. Muito menos irracional. Ao contrário, amar seu inimigo é provavelmente o cálculo mais racional que podemos fazer. Obviamente não se trata de ter apreço ou simpatia por pessoas que defendem uma visão de mundo em tudo oposta à nossa. Trata-se só de se recusar a ir para o lado de lá.

O lado do ódio, da morte, do desprezo pelo outro é o lado que diminui a vida,
que apequena a humanidade,
que nos reduz a nossa animalidade instintiva.

Se cedemos ao ódio a nossos inimigos, eles vencem; roubam de nós o que temos de mais precioso: a possibilidade de transcender nossa natureza em direção a um patamar mais sublime, aquele que leva o mundo para estágios mais evoluídos da consciência humana. Desejar sua morte é ir contra o movimento que nos fez abandonar sacrifícios humanos, escravidão, discriminação legalizada.

Pode parecer difícil. Mas pense na alternativa: até aqui, qual bem nos fez odiar nossos inimigos?

Fonte: O Estado de S. Paulo – SaúdePandemia do Coronavírus – Segunda-feira, 29 de junho de 2020 – Pág. A12 – Internet: clique aqui.

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