«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 15 de junho de 2020

O mágico das mortes


Fazendo vítimas desaparecerem

Andrei Roman
CEO da Consultoria Atlas, Ph.D. em Ciência Política pela Universidade de Harvard

Incapaz de produzir um milagre para proteger a vida,
o Governo brasileiro inventou o “wizard”, burocrata que faz as vítimas “desaparecerem” das estatísticas oficiais
Coveiros enterram vítima de coronavírus em Breves, no Pará
UESLEI MARCELINO / REUTERS

Em artigo publicado pelo EL PAÍS em março, argumentava que o Brasil tinha adotado até aquele momento o que era provavelmente “uma das mais fracas e lentas reações à pandemia de todo planeta":
a) A demora inexplicável no fechamento das fronteiras aéreas [responsabilidade que cabe ao Governo Federal],
b) a falta de uma política de rastreio das pessoas que tinham entrado em contato com pacientes confirmados de covid-19 [responsabilidade do Ministério da Saúde],
c) a orientação de somente testar casos sintomáticos graves e, certamente,
d) as divergências sobre a adoção do isolamento social entre o Ministério da Saúde e o presidente da República, entre tantos outros fatores,
deixaram o Brasil na posição de contar com um milagre como única possibilidade de salvação frente ao contágio exponencial do vírus.

Escondendo os mortos e a irresponsabilidade

Mas o milagre nunca chegou, e o Brasil encerra a primeira semana de junho com o maior número de mortes diárias do mundo. Incapaz de produzir um milagre para proteger a vida, o Governo inventou o Mágico das Mortes, burocrata que faz as vítimas “desaparecerem” das estatísticas oficiais. Aos brasileiros reduzidos a uma estatística por conta da irresponsabilidade dos governantes não resta mais nem sequer isto — a inclusão dentro da estatística. Em uma estratégia política perversa, eles precisam ser completamente apagados.

Depois de ter tirado do ar o portal de divulgação de dados sobre a covid-19,
fato inédito no mundo (por várias horas, Brasil virou o único país com
divulgação suspensa no mapa da Universidade Johns Hopkins,
o principal centralizador global de dados sobre a evolução da pandemia),
o Ministério da Saúde lançou um novo portal, de onde 80% dos indicadores
inicialmente divulgados desapareceram.

Como se isso não fosse grave o suficiente, na noite deste domingo o número de mortes divulgado inicialmente às 21h — 1.382 — foi revisado para 525 óbitos na divulgação das 23h. O ministério não explicou o que determinou uma queda de 62% nos óbitos diários no espaço de somente duas horas. A discrepância parece estar relacionada à adoção de uma nova metodologia focada na data de ocorrência em vez da data do registro dos óbitos. No entanto, como a causa de muitos óbitos por covid-19 não é estabelecida no dia de ocorrência, mas posteriormente, a alteração de metodologia lança dúvidas sobre a contabilização futura dessas mortes. Já que o ministério também desistiu de reportar o total de óbitos registrados desde o começo da pandemia, o novo cálculo levanta o risco de omissão das estatísticas oficiais de óbitos cuja origem não for confirmada no dia de ocorrência. Na melhor das hipóteses, se os dados diários forem revisados posteriormente como deveriam em função da confirmação de diagnósticos, trata-se de uma pedalada sanitária: empurrar para o futuro a divulgação de dados dramáticos para o país, confundindo o público em relação à gravidade da crise.

As mentiras contadas pelas redes sociais

Infelizmente, a óbvia tentativa de manipulação dos dados sobre a pandemia faz parte de um esforço maior de falsificação nas mais diversas frentes e junto aos mais diversos aliados. Foi mais fácil tentar colar a ideia de que o número de mortes causadas pela covid-19 no Brasil estaria manipulado pelos governadores depois que fábricas de fake news disseminaram via redes sociais o boato de que caixões vazios estariam sendo enterrados em Manaus ou que médicos estariam classificando sistematicamente como vítimas de covid-19 pacientes que morreram por outras causas.

Há muito mais óbitos e contaminados

Estudos epidemiológicos conduzidos no país confirmam sem sombra de dúvidas a mesma conclusão observada internacionalmente: existe uma brutal subnotificação de casos da covid-19, tanto em termos de casos como de óbitos. O estudo Epicovid19 conduzido pela Universidade Federal de Pelotas para o Governo do Rio Grande do Sul, um dos Governos estaduais com a melhor gestão da crise até o momento, revelou com base numa amostra aleatória de testes que o número de casos de coronavírus no Estado é nove vezes maior do que o registro oficial. Uma versão nacional da mesma pesquisa indica uma subnotificação levemente menor: o número real de casos estaria “somente” sete vezes maior do que o divulgado. As evidências científicas em relação à subnotificação de casos e mortes são tão contundentes que nenhum tipo de artifício retórico, fake news ou alteração metodológica no acompanhamento da evolução epidemiológica poderá esconder essa realidade.

Brasil ao lado de tiranias e corruptos

A manipulação dos dados sobre casos e óbitos na pandemia do coronavírus coloca o Brasil na mesma categoria de regimes corruptos e autoritários com fama de pária no cenário internacional.
* Venezuela fabrica dados sobre eleições e inflação;
* Nicarágua falsifica dados sobre manifestantes assassinados pelo Governo;
* Rússia inventa dossiês de supostos crimes conduzidos pelos opositores ao Governo para justificar a perseguição política;
* Irã mente que não derrubou um avião comercial com 176 passageiros a bordo (neste último caso, o regime foi posteriormente obrigado a reconhecer sua culpa diante das evidências).
É nessa “seleta” companhia de tiranias abomináveis que o Brasil se encontra cada vez mais: uma aventura vergonhosa e que precisa acabar o quanto antes.

Fonte: El País Brasil – Pandemia de Coronavírus/Tribuna – Segunda-feira, 8 de junho de 2020 – Publicado às 09h18 (Horário de Brasília – DF) – Internet: clique aqui.

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