Alegremo-nos, mas é bom saber que... depois vem a conta!

A conta dos sonhos da Olimpíada
ficará no Brasil

Elio Gaspari

Chutando para cima, poderá ficar em R$ 500 milhões
CERIMÔNIA DE ABERTURA DOS JOGOS OLÍMPICOS RIO 2016
Maracanã, sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Daqui até o fim dos jogos, centenas de jovens subirão nos pódios, baixarão a cabeça e receberão as medalhas de ouro da Olimpíada do Rio. Serão momentos de sonho, felicidade e alegria. Da alegria dos jovens que sorriam para o mundo durante o desfile dos atletas na festa da abertura. Nada reduzirá a beleza dessas cenas. Para os brasileiros, ficarão os momentos de sonho e a conta. Alguém ainda fará o cálculo da fatura dos custos diretos e indiretos transferidos à Viúva. Chutando para cima, poderá chegar a R$ 500 milhões.

O Maracanã, joia da privataria do governo do Rio e da Odebrecht, tornou-se um magnífico elefante branco, incomparável em noites de festa. A manutenção das instalações olímpicas custará R$ 59 milhões anuais num Estado cuja rede de saúde pública entrou em colapso. A máquina de marquetagem que prometeu Olimpíada sem dinheiro público voava nas asas dos jatinhos de Eike Batista, o homem mais rico do Brasil, candidato ao pódio mundial. Era o tempo em que os governantes torravam o dinheiro achando que o pré-sal cobriria qualquer projeto.

Nos dias em que os problemas da Vila Olímpica dominaram o noticiário, foi frequente o argumento de que os críticos da festa carregavam o eterno "complexo de vira-lata".

Criação de Nelson Rodrigues, ele refletia "a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo". Bola dentro, mas às vezes a questão é mais complicada. Há cães de raça, mas há também adoráveis vira-latas.

A sorte, essa trapaceira, fez com que o repórter José Maria Tomazela mostrasse uma nova dimensão da problemática canina. Ele expôs a ação de uma quadrilha de Sorocaba (SP) que mutilava e pintava filhotes de vira-latas, transformando-os em chihuahuas e pinschers. Vendiam chihuahuas por R$ 300.

Viu-se assim outro ângulo da questão: há gente que vende chihuahuas e entrega vira-latas maquiados a pessoas que resolveram acreditar neles.

Fonte: Folha de S. Paulo – Poder – Domingo, 7 de agosto de 2016 – Pág. A8 –  Internet: clique aqui.

Há com o que se orgulhar, no entanto...

O Rio, visto com isenção, está muito melhor
com a Olimpíada

Janio de Freitas

O trabalho realizado para a Olimpíada é nada menos do que
um feito de grandeza incomum no país
LINHA 4 DO METRÔ DO RIO DE JANEIRO
Obras na estação Nossa Senhora da Paz - uma das muitas obras para a Olimpíada

"Só sai notícia ruim" –a observação, não queixa, vale como uma síntese do prefeito Eduardo Paes para os últimos meses que antecederam a Olimpíada. O Rio será sempre uma cidade malhada pelo que em outras grandes cidades é escondido, é disfarçado, como a violência. E, em outras mais, é visto com tolerância ou indiferença. O Rio não é uma cidade vaidosa, não altera por mágoa a sua hospitalidade sincera, nem retribui do mesmo jeito. Como dizem, continua na dela. Mas às vezes essas coisas, de parte a parte, resultam em injustiças propriamente, não raro por interesses políticos ou comerciais.

Informo, por isso, que o trabalho realizado para a Olimpíada é nada menos do que um feito de grandeza incomum no país, em qualquer tempo. A exibição jornalística dos conjuntos de estádios, pistas, moradias e de urbanização não deu ideia sequer aproximada do que são. Nem nas suas proporções, nem na qualidade de áreas esportivas, muitas delas sem nada a perder para as mais elogiadas do exterior.

Dois aspectos se combinaram para outra raridade nacional e histórica:
1º) No decorrer das obras, e até agora, não houve escândalo de preço, de reajuste, de suborno, de "por fora" (tratativas e custos que couberam ao Estado têm, estas sim, citação na Lava Jato).
2º) Além disso, grande parte das obras foi concluída antes do prazo fixado. E as demais, com exceções mínimas, no tempo hábil. Caso, por exemplo, de todo um bairro, a Vila Olímpica, que motivou justo escarcéu por comprovada falha de equipamento e acabamento. Estava entregue pela prefeitura, porém, desde junho, cabendo ao Comitê Organizador (CO) a verificação geral que faltou. O CO calou-se, Eduardo Paes ainda paga.
FABI
jogadora da seleção brasileira de vôlei de quadra:
Londres e Atenas haviam problemas ainda mais sérios do que aqueles do Rio de Janeiro

Claro que há falhas, de diferentes tipos. Não inevitáveis, mas, as surgidas até aqui, compreensíveis. Fabi, com o currículo repleto por todas as modalidades de disputas internacionais de vôlei, alarmou-se com o tratamento de caso único dado ao apartamento despreparado das australianas: "Na Olimpíada de Londres, os atletas não cabiam nas camas". A Olimpíada de Atenas precisou do socorro de última hora dos Estados Unidos, em equipamentos, móveis e, ora essa, muitos dólares.

As águas da Guanabara e da Lagoa Rodrigo de Freitas correram, aqui e no exterior, para as primeiras páginas e a TV. Tiveram a ajuda decisiva de imagens tomadas nas bordas em que a ondulação mais concentra sujeira. Experimentada em treinos estrangeiros, a lagoa está aprovada. As regatas de vela não serão só na baía, onde as raias são muito mais limpas do que o divulgado, e têm provas em mar aberto, visíveis nas águas translúcidas entre Copacabana e Ipanema-Leblon.

A Olimpíada não é só o maior acontecimento esportivo do mundo. É também o que exige a mais numerosa e mais complexa infraestrutura. E o Brasil em crise está bem no que entrega à Olimpíada.

O legado? Só o tempo dirá. Não somos um povo esportivo. Poucas escolas têm (mau) esporte. As condições sociais e urbanas restringem as oportunidades de esportes, mesmo como diversão. Os clubes e os possíveis patrocinadores não são estimulantes da formação esportiva. Do governo federal não há o que esperar. O aproveitamento razoável das novas instalações dependerá, portanto, dos governantes estadual e municipal, embora não seja difícil.

Mas não se trata só de Olimpíada. Houve uma confluência pouco comum de oportunidades e propósitos. E de administração capaz de integrá-los. Correram simultâneas as obras esportivas e, entre muitas outras, inovações importantes para a mobilidade da população, linhas muito úteis de metrô e BRT, a renovação de vários bairros que tiveram vida ilustre até começos do século passado, e a modernização urbanística e panorâmica do centro da cidade.

"Só sai notícia ruim"? Mas o Rio, visto com certa isenção, está muito melhor. A criminalidade se oferece para quem queira malhar com motivo, como se não fosse assunto de todo o país.

Fonte: Folha de S. Paulo – Poder / Colunistas – Domingo, 7 de agosto de 2016 – Pág. A12 –  Internet: clique aqui.

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