«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 30 de junho de 2023

Solenidade de São Pedro e São Paulo Apóstolos – Ano A – Homilia

 Evangelho: Mateus 16,13-19 

Frei Alberto Maggi

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas) 

Estátuas de São Pedro (esquerda - escultor Giuseppe De Fabris) e São Paulo (direita - escultor Adamo Tadolini) ao lado da escadaria de acesso à Basílica de São Pedro, no Vaticano, ambas datam de 1847

O fundamento da Igreja é Cristo!

Para afastar seus discípulos do fermento dos fariseus, ou seja, da doutrina dos fariseus e saduceus (cf. Mt 16,6.12 — passagem anterior a deste domingo), Jesus os afasta da instituição religiosa judaica e os conduz para o extremo norte do país. É o que Mateus escreve, no capítulo 16, versículos 13-20. 

Mateus 16,13a: «Jesus foi à região de Cesareia de Filipe...»

Cesareia de Filipe fica no extremo norte do país, é a cidade construída por um dos filhos de Herodes o Grande, Filipe, e, para diferenciá-la da outra Cesareia marítima, foi chamada de Cesareia de Filipe.

No tempo de Jesus, a cidade estava em construção. Este é um detalhe a se ter em conta, perto da cidade existia uma das três nascentes do rio Jordão, que também se acreditava ser a entrada do reino dos mortos. Portanto, são elementos que devem ser levados em consideração para a compreensão do que nos diz o evangelista. 

Mateus 16,13b: «... e ali perguntou aos seus discípulos: “Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?”»

Bem, Jesus leva seus discípulos para longe da Judeia e até da Galileia para fazer-lhes uma pergunta. O evangelista põe em contraste os homens com o Filho do homem, o homem que tem a condição divina, portanto o homem que tem o espírito e o que não tem. Jesus quer perceber qual foi o efeito da pregação dos discípulos que ele enviou para anunciar a novidade do reino. 

Mateus 16,14: «Eles responderam: “Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias; Outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas”.»

A resposta é decepcionante:

* João Batista: porque se acreditava que os mártires seriam ressuscitados imediatamente.

* Elias: segundo a tradição, esse profeta não havia morrido, mas havia sido elevado ao céu e voltaria quando chegasse o futuro messias.

* Jeremias: ainda segundo a tradição, escapou de uma tentativa de apedrejamento.

* Algum dos profetas: esperava-se um dos profetas anunciados por Moisés, porém todos os personagens diziam respeito ao que é antigo.

Ninguém, nem os discípulos nem as pessoas a quem se dirigiam, entenderam a novidade trazida por Jesus.

Mateus 16,15-16: «Então Jesus lhes perguntou: “E vós, quem dizeis que eu sou?” Simão Pedro respondeu: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”.»

Então Jesus diz: “Mas vocês”, dirigindo-se a todo o grupo. Jesus dirige-se a todo o grupo de discípulos, mas é só um que toma a iniciativa. Simão é o nome, Pedro é um apelido negativo que indica sua teimosia, e quando o evangelista lhe apresenta este apelido, significa que há algo contrário ao anúncio de Jesus. Finalmente, há um dos discípulos que compreendeu que Jesus não o filho de Davi, aquele que impõe o reino com violência, mas é o filho de Deus (literalmente) vivificante, ou seja, ele comunica a vida. 

Mateus 16,17: «Respondendo, Jesus lhe disse: “Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu.»

Por que Pedro é bem-aventurado? Porque ele é puro de coração e por isso pode ver a Deus. No entanto, mesmo dizendo que ele é “bem-aventurado/feliz”, chama-o de “filho de Jonas”. “Filho”, na cultura judaica, não indica apenas quem nasceu de alguém, mas quem se assemelha a ele no comportamento. E Jesus o chama de “filho de Jonas”. Jonas é único entre os profetas do Antigo Testamento que fez exatamente o contrário do que o Senhor lhe havia ordenado. Na verdade, o Senhor havia lhe dito: “Jonas, vá a Nínive pregar a conversão, senão eu a destruirei” (cf. Jn 1,2) e Jonas fez o contrário. Em vez de ir para o leste, ele embarcou no navio e rumou para o oeste (cf. Jn 1,3). Então, finalmente, Jonas foi convertido (cf. Jn 2; 3,1-3a). Assim, neste filho de Jonas, Jesus retrata Pedro: ele sempre fará o contrário do que Jesus lhe pedirá, mas, no final, ele se converterá

Mateus 16,18: «Por isso eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e o poder do inferno nunca poderá vencê-la.»

Por isso eu te digo que tu és Pedro”, o termo grego usado pelo evangelista é “Petros”, que indica um tijolo, uma pedra, que pode ser apanhada e utilizada para a construção. “E sobre esta pedra”, agora, Jesus usa a palavra grega “petra”, que não é o feminino de “petros”. O evangelista usa o termo grego “petra” que significa a rocha que é boa para as construções. É o mesmo termo que Jesus, no capítulo 7, escolheu para a casa edificada na rocha (cf. Mt 7,24).

Portanto, Jesus diz a Simão: “Você é um tijolo. Sobre esta rocha”, e a rocha é Jesus, “construirei a minha Igreja”. O termo grego “ekklesía” (igreja) nada tem de sagrado, mas é um termo profano que indica a reunião, a assembleia dos convocados.

Portanto, Jesus não vem construir uma nova sinagoga, mas uma nova realidade que não tem conotações religiosas, e para isso usa este termo leigo.

E os poderes”, literalmente “os portões”; os portões de uma cidade indicavam sua força, seu poder. “Dos infernos”, ou seja, do reino dos mortos. Lembro que essa cena se passava perto de uma das grutas que se pensava ser a entrada do reino dos mortos: “nunca poderá vencê-la”. Quando uma comunidade é construída sobre Jesus, o filho do Deus vivo, a vida é comunicada, portanto, as forças negativas, as forças da morte, não terão poder. 

Mateus 16,19: «Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus; tudo o que tu desligares na terra será desligado nos céus”.»

Dar as chaves a alguém significava responsabilizá-lo pela segurança de quem estava dentro. Já dissemos outras vezes que o Reino dos Céus, no Evangelho de Mateus, não significa um reino nos céus, mas é o Reino de Deus. Por isso, Jesus não dá a Pedro as chaves de acesso ao além, não o encarrega de abrir ou fechar, mas o responsabiliza por aqueles que estão no interior deste reino, que é a alternativa que Jesus veio propor.

Tudo o que tu ligares na terra”, aqui o evangelista usa uma linguagem rabínica, o que significa declarar uma doutrina autêntica ou não, “será ligado nos céus”, isto é, em Deus, “e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus”. O que Jesus diz, agora, a Pedro, mais tarde, no capítulo 18, ele dirá a todos os discípulos.

As últimas palavras que Jesus usará, neste evangelho, representam o envio dos discípulos para ir e ensinar “tudo o que eu vos ordenei” (Mt 28,20a). Assim, no ensinamento de Jesus, esta mensagem que comunica vida tem a aprovação divina, da parte dos céus. Mas aqui está a surpresa: “Ele ordenou aos discípulos que não contassem a ninguém que ele era o Cristo” (Mt 16,20).

Quando Jesus ordena significa que há resistência. Houve uma parte positiva na resposta de Pedro ao reconhecer Jesus como o Filho do Deus que comunica a vida, o Deus vivo, mas qual é a parte negativa? As pessoas têm dito que você é o Cristo, ou seja, o Messias esperado pela tradição. Então Jesus diz: “Você não deve contar isso a ninguém”, porque ele não é o messias esperado pela tradição.

Jesus é o Cristo, ele é o messias, mas de uma forma completamente diferente, ele não usará o poder, mas sim o AMOR; não o comando, mas o SERVIÇO. E isso agora vai provocar o embate com Simão. Aquele que foi chamado de pedra de construção se tornará uma pedra de escândalo (cf. Mt 16,22-23). 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«De fato, ninguém pode colocar outro alicerce diferente do que já está colocado: Jesus Cristo.»

(1Coríntios 3,11)

Ao querer saber de seus discípulos a visão que o povo tinha dele, Jesus não o faz por uma mera curiosidade pessoal, mas como alguém que deseja sentir os efeitos de sua própria pregação, bem como, daquela de seus discípulos enviados em missão no capítulo 10 deste mesmo Evangelho. É fundamental que revisemos e avaliemos, constantemente, a nossa prática missionária e evangelizadora. 

Algumas coisas importantes podemos destacar nesse processo de avaliação pretendido por Jesus:

a) A maior dificuldade das pessoas, seja o povo em geral, sejam os seguidores mais próximos a Jesus, é aceitar o NOVO! Ir além daquilo que já se conhece, ir além das tradições e hábitos arraigados! Para a maioria, Jesus não passava de um profeta à moda antiga! Não se reconhecia os sinais dos tempos presentes nas palavras e gestos de Jesus. É isso que se passa conosco, ainda hoje! Sim, estamos desperdiçando um kairós (tempo oportuno, propício) muito especial que é o pontificado de um Papa que não quis centralizar em si todo o poder na Igreja, mas esforça-se por torná-la, de verdade, sinodal, participativa, acolhedora, hospital de campanha, Igreja em saída, enfim, Igreja Povo de Deus de verdade, como já indicara o Concílio Vaticano 2º. No entanto, o medo do novo ou, pior ainda, o simples comodismo e apego a certos privilégios têm impedido que vivamos um tempo de maiores transformações e reformas em nossa Igreja!

b) Nosso conhecimento de Jesus não é pela razão, mas pela revelação de Deus! Tanto é verdade que Jesus diz a Simão que ele é bem-aventurado porque reconheceu que ele era o Messias (Cristo) e o Filho do Deus vivo não pelos seus próprios méritos ou inteligência, mas porque o “Pai que está nos céus” lhe havia revelado essa grande novidade. Algo semelhante Jesus constata em:

* Mt 13,16: “Bem-aventurados, porém, são os vossos olhos, porque veem, e os vossos ouvidos, porque escutam!” — veem e escutam a proclamação do Reino de Deus, a pessoa do Messias.

* Mt 11,25: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos”.

c) O fundamento e o alicerce sejam da Igreja, sejam da missão a ela confiada jamais é um ser humano sozinho, Simão Pedro ou qualquer um outro! A base, a rocha, o sustentáculo de nossa fé e de nossa comunidade estão apenas e tão somente, em Jesus Cristo! Ainda bem! Pois todos os seres humanos são falíveis, são pecadores, são passíveis de irem contra o projeto de Reino trazido pelo Cristo. Prova disso é a advertência que Jesus fará a Pedro, na cena seguinte (cf. Mt 16,21-23).

d) Por isso, o poder de ligar e desligar, isto é, de discernir o que é certo ou errado na doutrina, na evangelização e na vivência nas comunidades não é dado, somente, a Simão Pedro, mas a toda a Igreja. O papel de Pedro, recebendo as chaves do Reino dos Céus é proteger, cuidar, zelar da comunidade.

Na Igreja, e isso já deveria ter ficado claro tanto na teoria quanto na prática, não existe poder que não seja aquele de servir, amar, ser bom e misericordioso!

Diante do que refletimos nesse Santo Evangelho de hoje, podemos nos pôr as seguintes questões com o auxílio de José Antonio Pagola:

* Esforçamo-nos por conhecer, cada vez melhor, Jesus Cristo, ou nos fechamos em nossos velhos esquemas chatos de sempre?

* Somos comunidades vivas, interessadas em pôr Jesus no centro de nossa vida e de nossas atividades ou vivemos presos na rotina e na mediocridade?

* Sentimos que somos, de verdade, discípulos de Jesus?

* Estamos aprendendo a viver segundo o seu estilo de vida em meio à sociedade atual ou nos deixamos levar por algum atrativo que venha mais ao encontro de nossos interesses?

* Fechamo-nos em nossas celebrações, indiferentes ao sofrimento dos mais desvalidos e esquecidos: os que sempre foram os prediletos de Jesus? 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Santos Pedro e Paulo, que levastes no mundo o nome de Cristo e a ele destes o extremo testemunho do amor e do sangue, protegei de novo e sempre esta Igreja, pela qual vivestes e sofrestes. Conservai-a na verdade e na paz, aumentai em todos os seus filhos a fidelidade inquestionável à Palavra de Deus, a santidade da vida eucarística e sacramental, a unidade serena na fé, a concórdia na caridade recíproca, a construtiva obediência aos pastores. Que a Igreja continue a ser no mundo o sinal vivo, alegre e operante do designo redentor de Deus e da sua aliança com os homens. Assim ela vos implora, com a voz trêmula do humilde atual Vigário de Cristo, que vos olhou, ó Santos Pedro e Paulo, como modelo e inspiração. E, então, guardai-a, esta Igreja bendita, com a vossa intercessão, agora e sempre, até o encontro definitivo e beatificante com o Senhor que vem. Amém.»

(Fonte: Paulo VI. Orazione finale. In: CILIA, Anthony O.Carm. [a cura di] Lectio divina sui vangeli festivi per l’anno liturgico B. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 650.)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci” – Videomelie e trascrizioni –Solenità dei Santissimi Apostoli Pietro e Paolo – 29 giugno 2014 – Internet: clique aqui (Acesso em: 28/06/2023).

Conhecendo esse gigante

 A China decifrada de forma magistral

 Elias Jabbour

Professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ – Publicado: blog da Boitempo (12.06.2023) 

ISABELLA M. WEBER

O público brasileiro terá contato com o livro mais profundo, instigante e magistral escrito sobre a China nos últimos anos

Desde que a China reagiu de forma avassaladora à crise financeira de 2008 – com seus imensos conglomerados empresariais estatais operando de forma simultânea milhares de projetos e mudando depressa a face do território chinês e inaugurando esquemas de divisão social do trabalho –, eu tenho advogado que teorias ortodoxas e heterodoxas perderam a capacidade de explicar o fenômeno chinês. Se o conceito se manifesta no movimento real e uma elevação do domínio humano sobre a natureza tem-se expressado no país com o surgimento de formas superiores de planificação econômica, é evidente que todo um novo marco teórico, conceitual e categorial deve ser construído no sentido de compreendermos o “novo” que surge diante de nós na China

Meu encontro com a obra de Isabella Weber, nossos debates virtuais e a atual amizade se deram justamente no período em que já estava cristalizada em minha cabeça, após romper com a ortodoxia e a hetorodoxia, que em 1978 surgia na China uma nova classe de formações econômico-sociais de orientação socialista. Sua principal característica, em visão de processo histórico, estava na reinvenção do socialismo através de instituições de mercado. 

Como a China escapou da terapia de choque: o debate da reforma de mercado foi o maior choque de conteúdo que recebi sobre a China desde que fixei algumas noções em meu pensamento. Nenhum economista no mundo moderno mostrou a capacidade de Isabella Weber ao buscar na história antiga da China uma resposta adequada sobre as razões que abasteceram os inimigos da “terapia de choque” no grande debate intelectual que se seguiu no país após as reformas de 1978. Uma das características do que Marx chamou de “modo de produção asiático” foi justamente o controle de preços estratégicos pelo Estado chinês, algo que Isabella Weber decifra com brilhantismo quando trabalha com diferentes momentos em que essa prática histórica foi adotada, sendo a última sob a forma da vitória do gradualismo contra os defensores da “terapia de choque”. O público brasileiro terá contato com o livro mais profundo, instigante e magistral escrito sobre a China nos últimos anos. 

Livro imperdível! Publicado pela Boitempo Editorial, no início de junho deste ano

Isabella é uma intelectual que tem posto em circulação, de forma pioneira, uma grande solução à questão da “inflação global”. A economista alemã manda um grande recado ao mundo e ao Brasil ao pedir coordenação mercantil e não mercantil no combate à inflação, o que significa uma mistura de controle de preços estratégicos e elevação da taxa de investimentos. Apesar de jovem, Isabella Weber é um ponto fora da curva nesta época marcada pela falta de criatividade e pela mediocridade intelectual intrínsecas à era do capitalismo financeirizado. O público brasileiro tem agora diante de si uma obra fundamental. 

Primeira obra da economista Isabella Weber, Como a China escapou da terapia de choque é uma análise original e fecunda das reformas econômicas que moldaram o caminho da China ao longo das últimas décadas. Fruto de extensa pesquisa e uma quantidade substantiva de entrevistas, o livro apresenta as ações que permitiram ao país asiático seguir o caminho da reindustrialização gradual e chegar ao século XXI como uma das principais potências mundiais

Weber busca compreender e explicar ao leitor o sucesso das reformas de mercado na China, enfatizando seu caráter plural, situando as diversas tendências e concepções na longa história do pensamento econômico chinês e ocidental. A autora também envereda pela discussão de longa data a respeito do controle estatal de preços, tanto na milenar história chinesa quanto nas tentativas recentes em outros países, no contexto da Segunda Guerra Mundial. 

Com foco na encruzilhada econômica dos anos 1980, a obra apresenta o trajeto econômico chinês a partir da não adesão à “terapia de choque” neoliberal, caminho traçado pelos países da antiga União Soviética. Weber oferece, ainda, uma perspectiva inédita sobre o modelo econômico da China e suas contínuas contestações internas e externas. Resultado disso, Como a China escapou da terapia de choque ganhou dois importantes prêmios em 2021, quando foi lançado nos Estados Unidos, e integrou a lista de melhores livros do ano do Financial Times

Como a China escapou da terapia de choque: o debate da reforma de mercado, de Isabella M. Weber, tem tradução de Diogo Faia Fagundes, texto de orelha de Elias Jabbour e capa de Maikon Nery. 

Depoimentos de leitores: 


Este livro traz a interpretação mais convincente que já li acerca da reforma chinesa e sua capacidade de promover crescimento e transformação, preservando a coesão social e a união da sociedade. É o produto de uma mente independente, investigativa, aberta – o único tipo de mente do qual se pode esperar compreensão do fenômeno que é a China hoje. Trabalho de uma economista de primeira linha.” – James K. Galbraith (Universidade do Texas) 


O estudo de Isabella Weber é único. Utiliza não apenas uma ampla gama de documentos, mas também extensas entrevistas, e oferece uma análise rica, equilibrada e erudita sobre a complexa realidade de um período fundamental para a história do mundo moderno: quando o ‘big bang’ colocou a China rumo a uma reforma pragmática que perdura até hoje.” – Peter Nolan (Universidade de Cambridge) 

Como a China escapou da terapia de choque merece um amplo público. Oferece uma análise séria das lutas intelectuais e políticas que transformaram aquele país e ainda repercutem globalmente. Fornece informações fundamentais sobre ‘como a China funciona’ e demonstra, com perspicácia, que o neoliberalismo não é a única saída. Um dos livros mais estimulantes e esclarecedores que já li.” – Inderjeet Parmar (Universidade de Londres) 

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Quinta-feira, 29 de junho de 2023 – Internet: clique aqui – Acesso em: 30/06/2023.

segunda-feira, 26 de junho de 2023

Um tema bíblico fundamental

 A sexualidade no Antigo Testamento

 Roberto Mela

Padre dehoniano italiano, teólogo e professor da Faculdade Teológica da Sicília – Publicado em «Settimana News» (Itália), 17-06-2023 

IRMTRAUD FISCHER - autora do livro comentado neste artigo

Um tema sempre atual e remanescente

A sexualidade é, sem sombra de dúvida, uma dimensão pervasiva da existência humana. Diz respeito a todos os âmbitos da vida do homem e da mulher, de todas as idades e condições sociais. Marca o pensamento, os afetos, o corpo, as mais diversas ações realizadas ao longo da vida humana. 

Irmtraud Fischer, professora de Antigo Testamento da Faculdade de Teologia Católica da Universidade de Graz (Áustria) – já atuante em Viena, Bamberg e Bonn – examina com precisão e com crivo apaixonado e contundente as várias manifestações que a sexualidade encontra no interior do Antigo Testamento, tanto nos textos jurídicos quanto nos narrativos. 

Como mulher empenhada no ensino, mas também no campo eclesial, ela lamenta várias vezes como o tema da sexualidade foi tratado (ou ignorado) no ensino dado aos discípulos de Jesus, favorecendo muitas vezes a submissão da mulher e uma visão machista das relações sexuais e afetivas. 

Muitas vezes, deixamo-nos guiar pelas afirmações bíblicas marcadas pelo estado pós-lapsário (depois do pecado das origens), reafirmadas em alguns textos do Novo Testamento, que não favoreceram uma visão serena e positiva da sexualidade da relação paritária homem-mulher e do prazer que o exercício da sexualidade em suas várias expressões pode oferecer para uma vida feliz e equilibrada. 

Em dez capítulos, a estudiosa aborda os vários aspectos da expressão da sexualidade humana tal como está presente no Antigo Testamento, chegando a avaliações que, em um caso ou outro, às vezes podem até não ser totalmente compartilhadas, mas que pretendem abrir uma janela de diálogo também no que diz respeito às relações entre pessoas do mesmo sexo. Um texto realmente interessante, muito documentado, raciocinado com a mente e com o coração, sem se deixar restringir por pré-compreensões consolidados ao longo dos séculos. 

Original alemão. Tradução do título e subtítulo: "Amor, vício, luxúria e sofrimento: a sexualidade no Antigo Testamento". Publicado pela Kohlhammer, em abril de 2021

Condições socioculturais, normas jurídicas e conceitos antropológicos

O primeiro capítulo (pp. 9-20) trata das áreas lexicais e problemáticas que descrevem a sexualidade humana, as representações iconográficas dos atos sexuais no Antigo Oriente Próximo – inexistentes no Antigo Testamento – e da possibilidade e da necessidade de resgatar a mensagem bíblica no mundo de hoje, atualizando os textos canônicos. O segundo capítulo se concentra nas condições socioculturais e nas normas jurídicas relativas à sexualidade (pp. 21-44). Estudam-se a celebração do casamento e as suas formas, as relações sexuais legítimas, as proibições de casamento, o incesto, as relações e os atos sexuais tabus e o fenômeno da violência sexual e sexualizada no contexto jurídico. Não há textos jurídicos sobre a coerção sexual, mas as narrativas a mencionam (Betsabeia, Susana etc.). 

Recorda-se a denúncia sexual (a acusação de uma jovem recém-casada de ter tido relações sexuais antes do casamento), o estupro, com os vários casos relativos a virgens prometidas ou não em casamento, violências cometidas na cidade ou no campo etc., o estupro de guerra (cf. Dt 20,5-8; 20,14; Jz 5,28-30 com as reflexões feitas pelas princesas sobre a legítima violência praticada contra as mulheres na guerra; cf. também Jz 4,12; 7,27; 9,2). 

O terceiro capítulo foca os conceitos antropológicos, estudando a sexualidade como conditio humana nos relatos da criação (pp. 45-58). Em Gn 1-2, a sexualidade é vivida de modo igualitário como ordem divina da criação. Em Gn 3, ao contrário, delineia-se a sexualidade hierárquica como ordem da natureza humana da criação decaída. Muitas legislações posteriores no âmbito eclesial se referiram a essa última condição, esquecendo a beleza e a ordem igualitária da relação homem-mulher desejada por Deus não só no que diz respeito à procriação, mas também à vida afetiva de comunhão paritária no casal humano

Pintura: "Cântico dos Cânticos" por Egon Tschirch, pintor alemão, em 1923

Instrução dos pais e relações sexuais bem-sucedidas

Alguns textos relatam a instrução dos pais como educação sexual e doutrina do matrimônio (capítulo quatro, pp. 59-66). Encontramos o eterno clichê das mulheres libidinosas que seduzem homens inocentes (cf. Pr 7 e a mulher estrangeira), mas também educação ao prazer erótico (cf. Pr 5,15-20) e educação para a esposa ideal (cf. Pr 19,14; 27,17; Eclo 42,12; Pr 31,10-31 com a apresentação da mulher não apenas como uma esposa terna, mas também como uma mulher completamente independente e com propriedades e autoridade legal). 

Vários textos refletem, como sempre, uma sociedade patrilinear e androcêntrica, recomendando a expectativa da rigorosa fidelidade de uma mulher, a vigilância sobre a integridade e a virgindade das filhas, sobre sua educação à fidelidade e à maternidade. Alguns textos mostram mulheres que não são passivas no campo da sexualidade (cf. Raquel em Gn 30,1 e Lia em Gn 30,16). 

A beleza identifica a esposa ideal (cf. Gn 12,11.14; 24,16; 29,17), mas pode representar um perigo se não for a da própria esposa. O Cântico dos Cânticos mostra que a beleza não se baseia apenas em critérios externos, mas também surge por meio da relação com a pessoa amada. O quinto capítulo analisa as relações sexuais bem-sucedidas (pp. 67-78), mesmo que o Antigo Testamento muitas vezes fale apenas de coisas trágicas ou ruins sobre os casamentos (infertilidade, abandonos, divórcios, incestos etc.). 

Às vezes, narra-se apenas um amor unilateral. O Antigo Testamento também narra a vida feliz do escravo que prefere viver com o senhor mesmo depois de ter sido liberto. Às vezes, apenas uma das partes é feliz no casamento. Por exemplo. Jacó ama, mas Raquel não corresponde; Micol ama Davi unilateralmente, e não é evidente que Séfora ame Moisés (cf. Ex 18,2, “mandou de volta” pode aludir ao divórcio ou a uma longa separação). 

Quanto às relações amorosas homossexuais satisfatórias, a estudiosa lembra os casos de Rute com Noemi e Jônatas com Davi. Diz-se de Rute que ela se “colou” a Noemi (verbo usado para a união sexual em Gn 2,24), e sobre Davi se afirma que o amor por Jônatas era para ele mais precioso do que o das mulheres. A estudiosa assume como evidente nos dois casos uma relação homossexual. Sobre Davi e Jônatas, discutiu-se muito, mas sobre Rute e Noemi a questão me parece nova e questionável (e baseada em um verbo...). 

"Noemi e Rute" - Originalmente uma pintura multimídia, agora disponível como tela giclée, autoria Yael Harris Resnick

Expectativas frustradas, esforços, irregularidades e casos particulares

O capítulo sexto fala sobre a expectativa frustrada, o desejo que desaparece e a vida conjugal cansativa (pp. 79-100). Uma grande expectativa pode suceder a uma grande desilusão. A autora analisa Gn 24 (Rebeca e Isaac) e Jz 14 (a mulher de Tamna em relação a Sansão). Ela estuda também as palavras pregnantes e a frustração matrimonial como lembrada no livro dos Provérbios. Fala-se de situações e de relações frustrantes, marcados pelas brigas e pela incompreensão, com uma avaliação muitas vezes negativa da mulher. 

A visão positiva de Pr 31,10-31 pode ser contrabalançada por algumas afirmações misóginas do Eclesiastes, mas que podem ser ambíguas, como as citações tiradas de outros e com as quais ele se confronta em citações não identificadas (cf. Ecl 7,26-29). Detalhes narrativos de uma vida conjugal problemática estão presentes em textos que, no entanto, têm como principal interesse a realização e a transmissão das promessas divinas (cf. os patriarcas) e as problemáticas dinástico-políticas (histórias sobre os inícios do reino que insistem nisso, mais do que na vida sexual satisfatória dos primeiros governantes). 

Cenas de um casamento difícil sob a promessa são aquelas oferecidas por Abrão e Sara em Gn 11,29ss e Gn 20 (Abrão nega que Sara seja sua esposa). Gn 16,1ss recorda o grave problema da esterilidade de Sara e a condução de Agar a Abrão para que tenha um filho dela. Se Abraão tinha resolvido seu problema, agora Sara resolve o dela... 

Um exemplo de amor não correspondido é o de Jacó por Raquel (cf. Gn 29,9-30) e o de Micol por Davi (cf. 1Sm 18,20). A autora afirma que Davi, no fundo, amava apenas Jônatas. Nos textos sobre Davi, a sexualidade legitima o poder e não a função reprodutiva, como, em vez disso, enfatiza-se nos relatos sobre os patriarcas. Davi tem inúmeras esposas e concubinas, mas, no fim da relação com Micol, os dois não têm mais nada a dizer um ao outro. Micol não terá filhos: não por ser estéril, mas porque Davi não se une a ela (cf. 2Sm 6,23). 

Uma atenção apagada entre casais é representada por Abigail e seu marido “estúpido” Nabal (cf. 1Sm 25). Fria, embora menos conflituosa, é também a relação conjugal entre a mulher de Suném (cf. 2 Rs 4,8-37) e seu marido, sobre o qual muito pouco se fala, em comparação com tudo o que é narrado sobre a relação da mulher com o profeta Eliseu. O homem parece apático e participa apenas marginalmente da vida. A relação – segundo a autora – é provavelmente mais uma adaptação do que um verdadeiro matrimônio. 

O capítulo sétimo analisa dificuldades, irregularidades e casos particulares (pp. 102-126). Nessas páginas, fala-se da esterilidade e da impotência (Sara e Abraão; Manué e sua esposa em Jz 13; Ana em 1Sam 1,2). A única menção à esterilidade masculina é feita para Abimelec em Gn 20,17s. Também são estéreis Maalon e Quelion, maridos de Rute e Orpa. Davi torna-se estéril na velhice (cf. 1Rs 1,1-4). 

Considerando-se a construção potencialmente polígina do matrimônio [= estado de um homem casado simultaneamente com várias mulheres], no Antigo Testamento pode-se falar de infidelidade sexual apenas quando uma mulher casada dorme com um homem que não seja seu marido. A infidelidade é sempre qualificada como adultério. A única narração detalhada de um adultério é a de Davi com Betsabeia (cf. 2Sm 11,1-27). Tamar é acusada disso, embora não tenha desfrutado da lei do levirato por parte de Judá (cf. Gn 38,6-11). 

A autora estuda a formação do harém, devido a uniões régias interessadas em tecer relações políticas (cf. Davi e Salomão). As mulheres do harém podem desempenhar papéis políticos importantes (cf. Betsabeia). Salomão viola os ditames da Torá referentes ao rei, exibindo poder e pompa excessivos. Ester 1 e 2 mostram o rígido cerimonial que rege a vida do harém e o processo de recrutamento das meninas: o único critério é a beleza

Irmtraud estuda os textos sobre amor pago ou prostituição. Recorda-se a proibição aos sacerdotes de se casarem com uma prostituta. Os textos jurídicos tratam de situações especiais que regulam a prostituição e seus proventos, enquanto os textos narrativos falam de frequentações de prostitutas por parte de homens (famosos). Nos textos proféticos, o tema é frequentemente incluído tanto nas metáforas quanto na ameaça de punição (cf. Am 7,17). 1Rs 3,16-28 narra o julgamento salomônico entre duas prostitutas que lutam por um filho. 

Muitas vezes, a paternidade não pode ser determinada com precisão. Jefté é filho de uma prostituta e foi abandonado por seus familiares (Jz 11,1). Js 2 fala de Raab e de sua integração social, tornando-se depois mãe de Boaz e entrando na genealogia de Jesus (cf. Mt 1,5). Existia uma prostituição cultual, com prostitutas sagradas também (cf. 1Rs 15,12ss, em que se narra que o rei Asa as elimina; 2Rs 23,7 menciona uma casa no templo dedicada aos qedešim – diz-se assim cinco vezes nas pp. 120-121 –, prostitutas sagradas de ambos os sexos). Sobre os homens lascivos, falam Jr 5; Os 4,11-14; Am 2,7. 

Sansão encontra uma mulher “justa” em Tamna – Jz 14,3: é assim que a autora traduz, e não com “que eu gosto” – para provocar um conflito militar, e essa intervenção vem também de YHWH (v. 4). Sansão vai também ao encontro de uma prostituta em Gaza (Jz 16,1) e depois de Dalila (cf. Jz 16,4). Sansão representa para Irmtraud o homem que vive sua sexualidade de forma a não se deixar vincular:Um clássico playboy, sexualmente, mas também politicamente, mas cuja predileção pelas mulheres venais acaba por se tornar fatal” (p. 124). 

Por fim, a autora recorda o abuso do álcool e sua relação com a sexualidade. O álcool pode favorecer um ambiente agradável para viver o sexo, mas pode tornar a pessoa agressiva, licenciosa, induzir à promiscuidade (Os 4,11-14), produzir a perda do autocontrole e a incapacidade de realizar o ato sexual. Seu abuso arruína as famílias e leva a comportamentos antissociais (1Sm 25,36: Nabal). 

"Davi e Betsabeia" - pintura à óleo de 1562 - Museu do Louvre (Paris) - Autoria de Jan Matsys, pintor flamengo que viveu de 1509 a 1575

Sexualidade e festa

O capítulo oitavo fala da relação entre sexualidade e festa, afirmando que sexualidade é festa (pp. 127-136). O prazer inebriante de uma união sexual é bem ilustrado pelo Cântico dos Cânticos. Elogia-se o amor novo e inebriante de dois jovens, dos quais nenhum vínculo matrimonial é mencionado

A união sexual não é apenas genitalidade, mas também abrange todo o mundo das pessoas, implicando uma festa para todos os sentidos. No livro, fala-se do tato, da audição, do olfato (com toda uma série de referências a perfumes e bálsamos), da visão. Não se deseja apenas “provar repetidamente o prazer sexual, mas sim o desejo de permanecer constantemente no clima de felicidade com a pessoa amada e de experimentar sua unicidade (2,3; 6,9)” (p. 131). 

A autora se debruça para descrever a figura dos amantes do Cântico dos Cânticos, descritos entre o desejo ardente e a satisfação. Trata-se de textos de alto teor erótico, exaltando o amor sexual e a intimidade pessoal. É fonte de espanto – nascido sobretudo apenas a partir do século passado – que um livro da Bíblia seja inteiramente dedicado à sexualidade realizada sem um contexto conjugal. Hoje, aprecia-se sem falsos pudores esse elogio da sexualidade humana, depois de séculos de interpretações marcadas pela alegorização (amor entre Deus e a alma, a Igreja etc.). Os cânticos são postos na boca tanto do homem quanto da mulher, que se descrevem com admiração mútua e sem sentir nenhuma vergonha pela nudez assumida

"O Cântico dos Cânticos" - pintura de Elena Kotliarker

Violência sexual e sexualizada

O capítulo nono é dedicado à análise da violência sexual e sexualizada nos textos narrativos (pp. 137-162). Irmtraud distingue sobretudo o assédio sexual da denúncia sexual. Com o primeiro, “entendem-se ações importunas cujo objetivo principal não é extorquir atos sexuais com a violência, mas podem servir tanto para iniciá-los – embora de modo inadequado – quanto para degradar o gênero de uma pessoa. A denúncia sexual, por outro lado, refere-se à difamação de uma pessoa, acusando-a de atos sexuais que não cometeu” (pp. 137-138). 

Uma vítima masculina de violência sexual é José pela mulher de Potifar (Gn 37). A autora afirma que José não é jogado na prisão, mas colocado em uma casa de custódia de “prisioneiros políticos”, ou seja, personalidades importantes que caíram em desgraça. José sofre um assédio contínuo no local de trabalho, que no fim degenera em denúncia sexual por se recusar a obedecer. Se fosse uma escrava, teria sido estuprada, e ninguém teria vindo em seu auxílio

Um adultério rejeitado seguido de uma denúncia sexual é o narrado em Dn 13, a história deuteronômica de Susana. A versão mais antiga da Susana é mais curta. É “uma narrativa hierárquica que retrata a comunidade representada por Susana (chamada de ‘a judia’ em Dn 13,22) nas mãos de chefes imorais da comunidade” (p. 141). Os dois voyeurs são juízes, mas não necessariamente anciãos. Na versão de Susana, falta a oração de Susana, e Susana não é representada como “uma pessoa cumpridora da lei, segura de si e incorruptível, que está disposta a enfrentar sua morte inocentemente de olhos abertos, mas sim uma mulher intimidada e abatida que invoca seu Deus apenas no pânico antes da execução da sentença. No entanto – continua a autora – a narração de ambas as narrativas leva ad absurdum a prática judicial da falta de separação das funções individuais no tribunal e expressa uma crítica social de que as mulheres são gravemente desfavorecidas no tribunal, especialmente quando os anciãos que devem pronunciar o juízo são réus” (p. 144). 

Nm 5,11-31 relata uma denúncia sexual de outro tipo. É o ordálio [= prova judiciária feita com a concorrência de elementos da natureza e cujo resultado era interpretado como um julgamento divino; juízo de Deus] do ciúme. “Trata-se aqui de um duplo caso legal em que um marido acusa sua mulher de adultério, que é culpada ou inocente [...] O procedimento conclui expressamente com a observação de que, seja qual for o resultado, o marido é irrepreensível [...] Esse ordálio do ciúme certamente é uma das leis mais misóginas de todo o Antigo Testamento” (p. 145), afirma indignada a autora. Basta o ciúme do homem para criar uma má imagem pública da mulher no templo. O casamento provavelmente já fracassou, e o homem quer se livrar da mulher sem um divórcio e acordo correspondentes. 

A coerção sexual implica sempre o constrangimento físico, psicológico ou jurídico e difere do estupro pela ausência de força física bruta. Como exemplo de coerção sexual, a autora estuda 2Sm 11 (o episódio de Davi e Betsabeia). O estupro encontra dispositivos legais em Dt 22,23-29. Não há estupro se ocorrer na cidade, mas o dado narrativo diz o contrário. Gn 34,1ss fala da violência sexual contra Dina. A autora lembra como Siquém a sequestra, dorme com ela e não tanto a “estupra”, mas a “priva dos direitos civis” (*’nh) - como traduz a autora. 

Eloquente é o relato da violência praticada por Amnon contra sua meia-irmã Tamar, filha de Davi (2Sm 13,1-22). A conclusão é a perda dos direitos civis (Tamar rasgará a túnica enquanto caminha pela cidade). Tamar volta para a casa de seu meio-irmão Absalão, que vai vingá-la. Amnon também implementa uma estratégia de culpabilização da vítima. O fato gerará a desavença entre os irmãos, e a história se tornará uma recordação perigosa que não permite que o infrator e seus cúmplices saiam impunes e revela uma estratégia de encobrimento

Vários textos jurídicos vetam o incesto e as relações sexuais com parentes próximos por via matrimonial (cf. Lv 18; 20; Dt 27,20-23). Em Gn 35,22, encontra-se a brevíssima nota sobre o incesto de Rúben, que se une a Bala, a concubina de seu pai. Pode haver uma menção no fato de Abraão apresentar Sara como sua irmã, na realidade como sua meia-irmã, o que, segundo Abraão, removia o impedimento incestuoso ao matrimônio (cf. Gn 20,12). A problemática do incesto é tematizada em Gn 38 em relação a Judá e Tamar, a quem foi negado um marido de acordo com a lei do levirato. 

Gn 19,30-38 narra detalhadamente o incesto de Ló com suas duas filhas. A autora nota a ausência da mãe e recorda a suspeita de que a iniciativa deva ser inequivocamente atribuível às duas mulheres. O texto não critica de modo algum o comportamento das filhas, que lutam para ter sua prole de forma nada convencional. Outro caso é o do terror sexualizado, descrito em Gn 19 (Sodoma) e em Jz 19 (a concubina do levita). A autora afirma que não se trata de episódios de homossexualidade masculina, mas sim de atos com os quais se pretende esclarecer quem manda na cidade. 

Sexo e gênero como cenas de combate são apresentados em vários textos. A violência sexual contra as mulheres torna-se um meio de humilhar seus maridos, pérfida técnica de guerra, ainda muito utilizada. Jz 20,48 lembra que, para vingar a concubina do levita, matou-se praticamente tudo o que se movia. É preciso sequestrar as mulheres em Silo para fornecer mulheres aos benjamitas. Am 7,10-17 recorda que o profeta anuncia que a mulher de Amasias será violentada e sobreviverá exercendo a prostituição. Jz 5,28-30 relata um exemplo repugnante de violência contra as mulheres em guerra, quando a mais sábia das princesas consola a mãe de Sísara, lembrando que sem dúvida os homens que tardam estão se divertindo depois da vitória, estuprando as mulheres, reduzidas apenas à sua parte genital (“útero sobre útero”). 

Alguns cantos de vitória são cantados por mulheres poupadas da violência porque seus guerreiros venceram (cf. Jz 5; 1Sm 18,6s; Jdt 15,12-16,17; Ex 15,20s). A cidade vencida é às vezes representada como uma mulher violentada (cf. Is 47,1-3), e a vingança na mesma moeda é invocada com força nos ditos proféticos sobre os povos (cf. Is 13,16; Lm 4,21). 

Ló com as suas duas filhas

Eros e sexo no imaginário de Deus

O último capítulo lembra que eros e sexo fazem parte do imaginário de Deus presente no Antigo Testamento (pp. 163-174). No Antigo Testamento, há a metáfora do casamento que abrange uma vasta área do imaginário teológico erótico-sexual para a relação entre o Deus imaginado como masculino e o povo representado como feminino. A Escritura apresenta também a imagem divina do marido ciumento, que pune a infidelidade de sua esposa às vezes por meios marciais, mas depois acusa aqueles que realizaram essa escalada da violência e vinga os crimes com golpes de retaliação igualmente drásticos. 

Um Deus sexualmente violento e os discursos proféticos de ameaça e julgamento criam um problema. Em alguns textos, a divindade reage como um marido ciumento com o divórcio (cf. Jr 3,8) ou com o abandono da esposa (cf. Is 50,1). No entanto, desde o início, a divindade tem a intenção de recuperá-la

Outro grupo de textos, bem mais problemático e amplo, mostra o marido traído reagindo violentamente à infidelidade da esposa. YHWH pune a mulher com uma vara ou manda outros a castigarem (cf. Ez 16,23). No contexto das metáforas do casamento em Os 2, o povo e o país, personificados como mulher, são repudiados sob a acusação de culpa, utilizando a fórmula oficial do divórcio (cf. v. 4). Athalia Brenner falou de “pornografia profética”

Hoje em dia, esses textos se tornam insuportáveis, afirma Irmtraud, pois apresentam um Deus que age por meio da violência sexualizada, um Deus cuja história começa com sua esposa infiel que abusou de seus filhos. Segundo a autora, esses textos “não podem mais ser mascarados como prova de uma justa punição por parte de um Deus soberano, mas devem ser designados com os conceitos atuais, pois não se trata apenas de textos históricos, mas também de textos canônicos que reivindicam validade ainda hoje” (pp. 165-166). 

A autora analisa Ez 16 e 23, com os atos violentos cometidos por YHWH contra seu povo infiel e o cálice cheio de ira mencionado em Is 51,17-23. Vários ditos dos povos, presentes nos textos proféticos, mostram YHWH ameaçando os povos que se excederam na violência contra Israel a retribuírem na mesma moeda (cf. Br 4,5-5,9; em Is 13,16 anuncia-se na Babilônia que as esposas serão estupradas). Alguns textos mencionam o descobrimento dos genitais (cf. Is 47,2s; Jr 13,22.26 e Na 3,5). 

Segundo a autora, uma imagem repugnante é representada por Is 23,15-18, um oráculo contra Tiro no qual se anuncia que a orgulhosa e rebelde cidade será obrigada a ganhar a vida como prostituta durante 70 anos. “Em todos esses textos – afirma a autora – é comum a problemática explosiva de que eles não apenas refletem as condições dos casamentos patriarcais no antigo Israel, mas também pode-se presumir que, em situações de separação, as mulheres – como frequentemente ocorre ainda hoje – foram expostas à brutal violência masculina, mas também que, ao longo dos séculos, a violência masculina no casamento pôde ser legitimada pelo testemunho bíblico de um Deus violento contra as mulheres” (p. 168). 

A autora aconselha a não eliminar esses textos do uso pastoral, mas a lê-los “como memoria passionis, como textos de terror que não escondem o grito das vítimas, mas obrigam as comunidades religiosas a refletirem até que ponto eles legitimam a violência em geral e a porem em movimento um permanente exame de consciência para descobrir como eles também participam do crime de violência contra as mulheres que se verifica em todo o mundo e até que ponto são, portanto, cúmplices” (pp. 168-169). 

A estudiosa conclui sua obra com um parágrafo sereno sobre o Deus de Israel apresentado como esposo ardente de desejo e o matrimônio como repertório de imagens para a teologia da aliança. Esses textos são o outro lado da moeda anteriormente representada e são temporalmente posteriores e um contraponto a eles. A retomada das imagens da esposa pode ser encontrada no primeiro Deutero-Isaías do tempo do exílio; a da esposa e do esposo sobretudo no Trito-Isaías pós-exílico. Is 49,14-21 e 54,1-8 marcam visivelmente a passagem da imagem da esposa (provisoriamente) abandonada e sacrificada à da noiva e da mulher acolhida no casamento. 

"Oseias e Gomer" - ilustração no estilo iluminura - "Bible Historiale" (1372)

A mulher estéril Sião ficará rica em filhos. A alegria de Sião em 61,10s – e não 62,10s, na p. 170 – também deve ser lida sob o pano de fundo da vergonha e do insulto. Is 62,1-5 apresenta Jerusalém coroada com um diadema real, destinatária do afeto e do favor de seu Deus, não mais abandonada e devastada, mas tornada “senhora” (assim Irmtraud traduz be‘ûlâ). YHWH se compraz de Jerusalém e se casa (b’l) com a terra. Deus exulta por Sião como um esposo pela esposa. 

Jr 31,2-6 anuncia a reconstrução e a restauração da vida boa mediante uma declaração de amor. Sf 3,14-17 anuncia a revogação da condenação contra a filha de Sião, convidada a se alegrar. Os 2,21ss declara novamente seu amor em uma promessa matrimonial, o que, no entanto, ele faz igualmente após a separação de esposa amada. O Salmo 45 é um canto descritivo de uma cerimônia nupcial, que menciona o rei ungido por Deus, mas também teologicamente, de modo direto, o rei divino em sua entronização, em uma profusão de joias, vestes preciosas, perfumes exaltantes, inúmeros convidados e dons preciosos. 

A autora enfatiza que a interpretação alegórica do Cântico dos Cânticos referente ao amor entre Deus e seu povo encontra excelentes ganchos no texto, pois vários termos presentes podem facilmente remeter a outros textos que falam da relação amorosa entre Deus e seu povo. O Cântico, portanto, pode ser lido em um duplo sentido, e, desde que é canônico, também foi lido assim. “A chave dessas imagens encontra-se nos textos que descrevem YHWH e o povo em uma relação de amor caracterizada por atenções e desejo de unidade” (p. 173). 

A estudiosa recorda que outro aspecto da relação de amor entre Deus e seu povo, “que desconstrói a concepção do casamento patriarcal, entra em jogo metaforicamente por meio da personificação feminina da Sabedoria. Ela é vista em relação a Deus como cocriadora preexistente (Pr 8,22-31), corregente (Sb 9,4), amada por Deus (8,3) e como presença real da divindade entre os seres humanos (Eclo 24,1-22; cf. Jo 1,14). Mediante a personificação feminina da presença divina, mais tarde, em Sb 8,2-16, é até possível inverter as relações de poder das metáforas patriarcais do casamento: Salomão pode desejar como esposa a mulher-Sabedoria e admirar sua beleza (v. 2), escolhê-la como companheira (v. 9) e conselheira de governo (v. 10), que lhe dará prestígio entre o povo, no julgamento e no cenário internacional (vv. 10-15). Na intimidade de sua casa, o rei pode relaxar entre os braços da mulher-Sabedoria após cansativas incumbências de governo e sentir com ela júbilo e alegria (v.16), que lhe conferem um novo vigor para suas tarefas – todos dons que o prazer do amor é capaz de dar. Portanto, não surpreende – conclui Irmtraud – quando, em Eclo 24,12-19, a mulher-Sabedoria é descrita com as metáforas do Cântico dos Cânticos e é apresentada com todo o tipo de plantas e árvores esplêndidas, que, com seus frutos e suas especiarias, convidam ao prazer com todos os sentidos. Como em uma relação sexual bem-sucedida, o prazer proporciona uma satisfação profunda, mas a experiência, que encanta todos os sentidos e é esculpida profundamente na memória, exige ainda mais e aumenta o desejo (vv. 20ss; cf. Ct 8,7)” (pp. 173-174). 

Na conclusão (pp. 175-176), a autora reafirma que a sexualidade determina toda a vida, pode ser vivida de forma diferente conforme a idade e a possibilidade ou não da fertilidade, e isso também em idade avançada. O exercício da sexualidade entre os idosos não deve ser reprimido. De fato, os rabinos relembram:Três coisas têm algo do mundo vindouro: o sábado, o sol e a relação sexual” (Ber 57,b, cit. p. 176). 

As notas de rodapé são esparsas, e não está indicada uma bibliografia. O livro se fecha com o precioso índice das passagens bíblicas (pp. 176-183). Uma obra verdadeiramente fascinante, rica em dados e em avaliações exegético-jurídico-sapienciais, escrita com entusiasmo e vontade de exaltar um elemento fundamental da vida humana, com uma atenção particular para a promoção da figura feminina contra o enorme poder patriarcal, do qual – segundo a autora – algumas Igrejas do nosso tempo também não estão imunes. 

Edição italiana da obra alemã. Tradução livre do título: "A sexualidade no Antigo Testamento: amor, vício, prazer sexual e sofrimento". Publicado pela Queriniana, em maio deste ano. Observação: não há, por enquanto, edições desta obra em outros idiomas

L I V R O :

Autora: Irmtraud Fischer

Título da obra: La sessualità nell’Antico Testamento. Amore, vizio, piacere sessuale e sofferenza

Coleção: Biblioteca Biblica 38

Editora: Queriniana (Bréscia – Itália)

Ano de publicação: 2023 (original em alemão de 2021)

Páginas: 192 páginas 

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Segunda-feira, 26 de junho de 2023 – Internet: clique aqui – Acesso em: 26/06/2023.

domingo, 25 de junho de 2023

Um Papa beijado

 O beijo de Lula no Papa Francisco

 Ruth de Aquino

Jornalista 

PAPA FRANCISCO recebe um carinhoso abraço e beijo de LULA durante visita que o Presidente do Brasil realizou ao Papa, no Vaticano, no dia 21 de junho, quarta-feira

“Habemus presidente”. O Brasil é de novo respeitado

O Brasil está grudado no julgamento de um fascista, que se esmerou em destruir tudo, democracia, voto, paz, floresta, indígenas, saúde, e até o caráter nacional. Mas o personagem da semana é outro. Felizmente. Luiz Inácio Lula da Silva, 77 anos, reeleito presidente apesar das violentas tentativas de fraude e golpe de Estado. Lula e o seu belo e afetuoso encontro com Francisco, o sumo pontífice.

Pontífice, segundo reza o consenso geral, vem do Latim pons (ponte) e facere (fazer). Foi um encontro entre dois construtores de pontes.

Vi e revi o momento do beijo de Lula no rosto do papa, o abraço de olhos fechados e o sorriso de companheiros, cúmplices na luta contra a pobreza e na defesa do meio ambiente. Comungam temas que influenciam a vida e o futuro do Brasil e no mundo. Eles podem discordar em temas específicos, como o apoio de Lula ao autocrático Maduro, na Venezuela. E o pendor de Lula por Vladimir Putin, na guerra da Ucrânia, e suas críticas à Europa. Mas, na essência, no respeito à dignidade humana e na luta contra a desigualdade, estão do mesmo lado. Modestamente, eu também estou.

A viagem de Lula à Itália, onde se encontrou com a primeira-ministra de extrema direita e líderes do centro-esquerda, dá orgulho e alívio. Habemus presidente da República. É o pragmatismo em ação, sem abandonar os amigos, como o prefeito de Roma, Roberto Gualtieri, que visitou Lula na prisão em Curitiba. A clara defesa da Amazônia, sem deixar de elogiar a matriz energética do Brasil, dá aquele calor bom na alma.

Encontro de LULA com GIORGIA MELONI, Primeira-Ministra da Itália, na sede do governo italiano, Palácio Chigi, no dia 21 de junho, quarta-feira

Lula nunca reuniria 40 embaixadores para falar mal do país, de nossas leis e nosso sistema eleitoral. É uma questão de inteligência emocional e política. Algo que o ex-presidente, prestes a se tornar inelegível, nunca teve.

Bolsonaro jamais se encontrou ou sequer falou ao telefone com o Papa durante seu mandato. Não poderia. Durante a pandemia, o Papa defendeu “a cultura do cuidado”, o cuidado com o outro, a fraternidade, a floresta. Bolsonaro alfinetou Francisco: “O Papa falou que a Amazônia é dele, do mundo, de todo mundo. O Papa é argentino, mas Deus é brasileiro”, disse, rindo com o esgar [= careta de escárnio] asqueroso. Bolsonaro era presenteado com fuzis, pistolas, joias escondidas.

Ufa, acabou a ostentação do escárnio.

Acabou a ostentação da burrice, das armas, do desmatamento, da violência, do desprezo aos oprimidos, mulheres, homossexuais, negros.

Acabou a deturpação da bandeira. A idolatria a símbolos nazistas. Acabou a lavagem cerebral de iludidos pedindo intervenção das Forças Armadas. Ainda sinto arrepios ao pensar que, mancomunado com as forças mais sinistras, Bolsonaro poderia estar governando o Brasil.

Melhor mesmo é falar do encontro no Vaticano, destinado a conversar sobre um mundo mais justo. Francisco me reconciliou com a fé, eu que sou batizada e crismada, mas não costumo ir à missa. “Ainda estou vivo”, disse o Papa a Lula, lembrando sua cirurgia abdominal recente. “A paz é uma flor frágil”, era a inscrição no presente dado ao brasileiro. Lula retribuiu com uma xilogravura da Sagrada Família, do artista pernambucano J. Borges, cordelista e poeta.

Presentes trocados entre PAPA FRANCISCO e o Presidente LULA e sua esposa, JANJA

O presidente brasileiro também recebeu um livro com uma oração do Papa pelo fim da pandemia, na praça vazia da Basílica em 2020. A primeira-dama, Janja, levou como lembrança uma imagem da padroeira da Amazônia, Nossa Senhora de Nazaré. Presentes são símbolos. Dizem muito.

Lula não é santo, já cometeu erros nesse início de mandato. Mas os acertos falam mais alto. O Brasil é novamente respeitado. Obrigada, Lula e Francisco

Fonte: O Globo – Colunistas – Quinta-feira, 22 de junho de 2023 – Acesso em: 15/06/2023.