«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sábado, 27 de novembro de 2021

1º Domingo do Advento – Ano C – HOMILIA

 Evangelho: Lucas 21,25-28.34-36 

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas. Naquele tempo disse Jesus a seus discípulos: 25 «Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações ficarão angustiadas, com pavor do barulho do mar e das ondas. 26 Os homens vão desmaiar de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo, porque as forças do céu serão abaladas. 27 Então eles verão o Filho do Homem, vindo numa nuvem com grande poder e glória. 28 Quando estas coisas começarem a acontecer, levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima. 34 Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós; 35 pois esse dia cairá como uma armadilha sobre todos os habitantes de toda a terra. 36 Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem.»

Palavra da Salvação. 

Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

Cuidado para não nos envolvermos com o poder, o egoísmo e a ambição deste mundo

Para o primeiro domingo do Advento, a liturgia apresenta-nos o Evangelho de Lucas, trazendo o último discurso importante de Jesus. É o capítulo 21 dos versículos 25 a 36 com algumas interrupções que não compreendemos o porquê. Jesus responde à pergunta que os discípulos lhe fizeram quando anunciou o fim do Templo em Jerusalém:

«Mestre, quando será, e qual o sinal quando isso irá acontecer?» (Lc 21,7)

Por que Jesus anunciou a destruição do Templo? Porque uma instituição religiosa que, em vez de cuidar dos pobres e marginalizados, se faz manter por estes e, portanto, em vez de comunicar vida a retira, não tem o direito de existir. 

Lucas 21,25-26a:** «Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações ficarão angustiadas, apavoradas com o bramido do mar e das ondas. As pessoas desmaiarão de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo...».

O Evangelho deste domingo, inicia-se com a resposta de Jesus aos seus discípulos. Jesus toma uma citação do profeta Joel [2,10], com a qual foi anunciada a chegada do dia do Senhor, portanto não é uma linguagem real, mas profética, indica uma coisa boa, positiva, a chegada do dia do Senhor. Mas por que Jesus diz: «Os homens vão desmaiar de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo»? Porque o que parecia eterno, esses impérios, o que parecia estável e duradouro, o que parecia real, o que parecia sagrado, de repente não é mais. O próprio Santo Agostinho, ao ver o Império Romano ruir, pensará que chegou ao fim do mundo porque era inimaginável pensar o mundo sem a estrutura do Império Romano. Pois bem, Jesus anuncia, e isso é um encorajamento para a comunidade cristã, que todos esses poderes, esses gigantes todos têm pés de barro e mais cedo ou mais tarde vão desabar. 

Lucas 21,26b: «... porque as potências celestes serão abaladas.»

E, de fato, aqui está o anúncio positivo de Jesus. O que são essas «potências celestes»? No céu significa ter a condição divina e o céu é o lugar de Deus. Bem, existem intrusos, existem realidades, instituições que pretendem ter a condição divina. São Paulo, na carta aos Colossenses, indicará esses poderes com o nome de «tronos, dominações, principados, potestades» [Cl 1,16], todos tendo relação com o poder. Então, existem esses intrusos nos céus, na verdade, eles ficarão chocados. Em outras palavras, é o que João escreve em seu prólogo: «E a luz brilha nas trevas» [Jo 1,5].

Com o anúncio da mensagem de Jesus, todas as falsas divindades revelarão o que são, ou seja, precisamente a falsidade, e começarão a cair.

Lucas 21,27: «Então, verão o Filho do Homem, vindo numa nuvem, com grande poder e glória.»

Então esses poderes, aqueles que se arrogaram de condição divina, começarão a se perturbar e «então, [eles] verão». Jesus não diz «vós vereis», porque não é uma catástrofe que diz respeito à humanidade, mas uma catástrofe que diz respeito a todos os sistemas de poder que exploram o homem para sua própria conveniência. Enquanto os poderes dos céus são perturbados, vemos o anúncio do poder do Filho do Homem que não é o poder do domínio, mas o poder do amor que se torna generosidade e serviço. 

Lucas 21,28: «Quando essas coisas começarem a acontecer, reerguei-vos e levantai a cabeça, porque está próxima a vossa libertação.»

E Jesus adverte-nos que: «Quando essas coisas começarem a acontecer», devemos recuperar a nossa dignidadereerguei-vos e levantai a cabeça»), porque a nossa libertação está próxima. Portanto, não é um anúncio assustador, mas um anúncio de encorajamento: não há estrutura de poder que não esteja destinada a entrar em colapso mais cedo ou mais tarde. Então aqui, incompreensivelmente, os liturgistas recortam alguns versículos que são importantes. Vejamos o texto evangélico que foi cortado:

«E Jesus contou-lhes uma parábola: “Olhai a figueira e todas as árvores. Quando começam a brotar, basta olhar para saber que o verão está perto. Vós, do mesmo modo, quando virdes acontecer essas coisas, sabei que o Reino de Deus está próximo. Em verdade vos digo: esta geração não passará até que tudo aconteça. O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras jamais passarão”.» (Lc 21,29-33)

A destruição de Jerusalém e de seu templo, finalmente, permitirá que, até mesmo, os pagãos entrem no Reino de Deus, então trata-se de um evento positivo. E Jesus afirma que: «O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras jamais passarão».

Portanto, Jesus garante à comunidade que o poder do Evangelho será mais forte do que qualquer potência de dominação.

Lucas 21,34-35: «Cuidado para que vossos corações não fiquem pesados por causa dos excessos, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós, pois cairá como uma armadilha sobre todos os que habitam a face de toda a terra.»

No entanto, Jesus faz uma clara advertência: «Cuidado para que vossos corações não fiquem pesados por causa dos excessos, da embriaguez e das preocupações da vida». A referência é à parábola dos quatro terrenos [Lc 8,4-15 e paralelos] onde, por conveniência, por interesse a mensagem de Jesus se torna estéril. A seguir, Jesus adverte os discípulos, porque,

... se os discípulos se integraram em uma sociedade injusta, aquela que deve desaparecer, eles terão a mesma sorte, a destruição.

Finalmente, Jesus coloca a todos de prontidão: «esse dia não caia de repente sobre vós, pois cairá como uma armadilha»! 

Lucas 21,36: «Ficai, porém, de sobreaviso e orai a todo momento, a fim de conseguirdes escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes de pé diante do Filho do Homem.»

Por isso, Jesus diz à comunidade: fiquem acordados, estejam atentos, não se conformem com a mentalidade deste mundo que é a mentalidade baseada no egoísmo, no interesse, na proveniência das pessoas, caso contrário, como todos esses poderes estão destinados a desaparecer, então vocês correm o risco de fazer o mesmo fim. Então, essa mensagem é uma mensagem de grande encorajamento para a comunidade:

... a comunidade fiel ao Evangelho será verdadeiramente a luz que brilha nas trevas e fará com que as trevas que sufocam a humanidade se dissipem gradualmente.

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Observação: o texto bíblico desses retângulos foi extraído de: Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB. 3 ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2019. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

O tempo do Advento, o tempo de preparação e expectativa para a chegada, sempre renovada, do Menino Deus entre nós começa com um Evangelho que anuncia uma grande notícia (o que é uma redundância, obviamente!): os poderes e poderosos deste mundo não são eternos! A implantação do Reino de Deus, a chegada de seu reinado, nesta Terra, abalará todo tipo de poder que se pretende eterno! 

Sobra, inclusive, para os que se consideram discípulos, seguidores de Jesus Cristo! Pois, se os cristãos se deixarem influenciar, dominar e corromper pela ideologia de poder, pelo egoísmo deste mundo, então experimentarão a mesma sorte, o mesmo fim dos poderosos e dominadores! Ao anunciar a destruição do Templo de Jerusalém, Jesus deixa claro que:

... uma religião que não escolhe o lado dos pobres e marginalizados deste mundo, que não luta por justiça e igualdade, que não busca o bem de todos, não pode ser uma religião que leva a Deus. Não é uma religião que durará por muito tempo!

Aqui, me vem de citar Papa Francisco, o qual nos adverte, sempre, do perigo de cairmos no “mundanismo”, ou seja, adotarmos a ideologia, a maneira de pensar e agir deste mundo. Diz o papa:

«Neste contexto, alimenta-se a vanglória de quantos se contentam com ter algum poder e preferem ser generais de exércitos derrotados antes que simples soldados dum batalhão que continua a lutar. Quantas vezes sonhamos planos apostólicos expansionistas, meticulosos e bem traçados, típicos de generais derrotados! Assim, negamos a nossa história de Igreja, que é gloriosa por ser história de sacrifícios, de esperança, de luta diária, de vida gasta no serviço, de constância no trabalho fadigoso, porque todo o trabalho é “suor do nosso rosto”. Em vez disso, entretemo-nos vaidosos a falar sobre “o que se deveria fazer” – o pecado do “deveriaqueísmo” – como mestres espirituais e peritos de pastoral que dão instruções ficando de fora. Cultivamos nossa imaginação sem limites e perdemos o contato com a dolorosa realidade do nosso povo fiel. Quem caiu neste mundanismo olha de cima e de longe, rejeita a profecia dos irmãos, desqualifica quem o questiona, faz ressaltar constantemente os erros alheios e vive obcecado pela aparência. Circunscreveu os pontos de referência do coração ao horizonte fechado da sua imanência e dos seus interesses e, consequentemente, não aprende com os seus pecados nem está verdadeiramente aberto ao perdão. É uma tremenda corrupção, com aparências de bem. Devemos evitá-lo, pondo a Igreja em movimento de saída de si mesma, de missão centrada em Jesus Cristo, de entrega aos pobres. Deus nos livre de uma Igreja mundana sob vestes espirituais ou pastorais! Este mundanismo asfixiante cura-se saboreando o ar puro do Espírito Santo, que nos liberta de estarmos centrados em nós mesmos, escondidos numa aparência religiosa vazia de Deus. Não deixemos que nos roubem o Evangelho! (Os grifos são meus. PAPA FRANCISCO, Evangelii gaudium, n. 96-97)

E o que faz os poderes e as potências serem abaladas com a chegada do Menino Deus? O que tem de especial a presença de Jesus no mundo, a ponto de representar um transtorno, um pesadelo para aqueles que dominam e desfrutam deste mundo e das pessoas que nele existem? 

Foi o modo como Deus entrou na História e se fez presente entre os seres humanos que abala os poderes e os poderosos! O menino nascido em um estábulo, o Deus-incarnado vindo ao mundo pobre entre os pobres, frágil entre os frágeis, inseguro entre os inseguros, ameaçado entre os ameaçados. Diante desse fato, o que sobra, o que resta é a nossa HUMANIDADE, feita de proximidade, fraternidade, respeito, justiça e bondade! Isso transtorna a lógica elitista do judaísmo oficial, que esperava um Messias rei, nascido em berço de ouro, destinado a ser um guerreiro conquistador de terras e gentes, a custa da vida e da violência. O Messias da VIDA não foi compreendido e acolhido por aqueles que aguardavam o Messias da MORTE, do PODER, da CONQUISTA. 

Tudo isso, deve nos inspirar e nos conduzir em nosso modo de viver, de praticar o nosso cristianismo! Que tipo de Messias nós esperamos? Que tipo de Cristo temos em nossa mente e em nosso coração? 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Senhor Jesus, te dou graças por este novo ano litúrgico, ano de graça e caminho de santidade. Não somente o meu corpo, mas também a minha alma tem necessidade de manter-se em boa saúde. Ajuda-me a empenhar-me com fé e coragem neste Advento: faz que eu saiba erguer a fronte e olhar para o alto, para ti que vieste, que vem e que virás no final dos tempos. Todos os seres humanos te procuram, a inteira criação pede por ti, revela-te a nós, agora, vem conosco, caminha conosco. Senhor nosso Deus, nós te esperamos: não para nos despirmos de nossas responsabilidades, mas para nos devolver o compromisso; não para ser consolados, mas para aprendermos a consolar uns aos outros. Senhor nosso Deus, nos te esperamos: não para te extrair um segredo, mas para compreender e para acolher o teu mistério; não para resignar-nos à morte e à violência, mas para acreditar que podem ser vencidas.»

(MESTERS, Carlos. 1ª Domenica di Avvento. In: CILIA, Anthony O.Carm. Lectio Divina sui vangeli festivi – per l’anno litúrgico C. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 22-23.)

 Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – I Domenica di Avvento – 2 dicembre 2018 – Internet: clique aqui (acesso em: 25/11/2021).

sábado, 20 de novembro de 2021

34º Domingo do Tempo Comum – Ano B – Solenidade de Jesus Cristo, Rei do Universo – HOMILIA

 Evangelho: João 18,33b-37 

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João. Naquele tempo: 33b Pilatos chamou Jesus e perguntou-lhe: «Tu és o rei dos judeus?» 34 Jesus respondeu: «Estás dizendo isto por ti mesmo, ou outros te disseram isto de mim?» 35 Pilatos falou: «Por acaso, sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim. Que fizeste?». 36 Jesus respondeu: «O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui». 37 Pilatos disse a Jesus: «Então tu és rei?» Jesus respondeu: «Tu o dizes: eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz».

Palavra da Salvação.

 Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

Jesus, o rei da verdade!

O julgamento de Jesus, de acordo com João no capítulo 18 de seu evangelho, é um processo bastante estranho porque há o juiz que tem medo do acusado e é o acusado quem dirige as perguntas ao juiz. Por que isso? Enquanto Jesus, que está preso, é totalmente livre, Pilatos, que é livre, está na realidade preso aos condicionamentos de sua conveniência, do poder. Mas vamos ver o que o evangelista escreve para nós no capítulo 18, do versículo 33 em diante. 

João 18,33b-34: Pilatos chamou Jesus e perguntou-lhe: «Tu és o rei dos judeus?» Jesus respondeu: «Estás dizendo isto por ti mesmo, ou outros te disseram isto de mim?».

Pilatos fica surpreso, as autoridades judaicas lhe deram Jesus como um criminoso, como um perigo para os romanos, mas ele não parece ver isso em Jesus, ele não tem nada da aparência do revolucionário perigoso que, pela força e pela violência, deveria expulsar os romanos. Então, ele lhe faz essa pergunta. Jesus reage exatamente como fez com o guarda, quando este lhe deu um tapa. Jesus é o homem livre e quer libertar as pessoas, quer que elas pensem por si mesmas. Jesus respondeu, porém, é ele quem faz a pergunta a Pilatos. Assim, Jesus convida Pilatos a raciocinar com sua própria cabeça, não com o que os representantes da instituição religiosa lhe disseram que o capturaram com uma mentira. 

João 18,35-36: Pilatos falou: «Por acaso, sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim. Que fizeste?». Jesus respondeu: «O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui».

Pilatos reage com raiva, furioso. E expressa todo o desprezo que sentia por esta região que foi chamado a governar. E aqui está a dramática acusação: «O teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim». O evangelista, no início de seu evangelho no prólogo, havia escrito: «Veio entre os seus e os seus não o receberam». Todos o rejeitaram, não só os poderosos, mas também os submissos, portanto os sumos sacerdotes, e o povo. Pilatos quer saber o que Jesus fez. Porque os dirigentes lhe disseram que Jesus é um criminoso. No entanto, Jesus não responde a esta pergunta, e diz que ele e Pilatos estão em duas esferas completamente diferentes. Jesus diz que seu reino não é deste mundo. O fato de ele não ser deste mundo não significa que ele não esteja NESTE mundo. Jesus não está contrapondo este mundo ao além, mas dois mundos diferentes:

a) o mundo de Pilatos, que é o mundo do poder e da dominação, e

b) aquele de Jesus, que é o do amor e do serviço.

Jesus não tem servos, neste mundo, porque veio servir.  Assim, o evangelista apresenta Jesus com dois mundos diferentes: o do amor que produz vida e o do poder que, em vez disso, produz a morte. 

João 18,37ab: Pilatos disse a Jesus: «Então tu és rei?» Jesus respondeu: «Tu o dizes: eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade».

Jesus não está interessado neste discurso de realeza e interrompe Pilatos. Jesus respondeu: «Tu o dizes: eu sou rei». O evangelista escreve exatamente: «Tu dizes que eu sou rei», ou seja, é a tua opinião. A Jesus, porém, não interessa este discurso de realeza, por isso, ele quer conduzir a conversa ao que é importante para ele, justamente, para oferecer vida também a Pilatos, para libertá-lo. Que «verdade» é esta da qual fala Jesus a Pilatos?

A verdade, no evangelho de João, não é algo que se possui, mas algo que se é.

Jesus disse: «Eu sou a verdade». Ele não disse que eu tenho a verdade, caminha-se na verdade. No diálogo com Nicodemos, Jesus contrapôs quem pratica a verdade com quem pratica o mal. Portanto, fazer a verdade significa fazer o bem, fazer a verdade significa estar em harmonia com o desígnio de Deus da criação, que coloca o bem da humanidade como o valor supremo. Esta é a verdade do evangelho de João. 

João 18,37c: «Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz».

E então Jesus dá esta indicação preciosa e válida para sempre: «Todo aquele que é da verdade»; portanto não diz «quem tem a verdade», porque quem tem a verdade, a partir da verdade que acredita possuir, considera-se no direito de julgar e eventualmente condenar aqueles que não pensam como ele. Quem pôs a sua vida em sintonia com esta onda de amor que mantém vivo o universo, o amor do criador pelas suas criaturas, ouve a voz de Jesus. Ele não diz, como seria de se esperar: «quem ouve a minha voz é da verdade», não. Para ouvir, isto é, entender a voz de Jesus, a mensagem de Jesus, é preciso fazer uma escolha prévia, qual?

O de colocar o bem do ser humano como valor absoluto na própria existência. Somente aqueles que fazem isso entendem a voz de Jesus.

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

A solenidade de Cristo, Rei no Universo é fruto da instituição por parte do Papa Pio XI, em 1925. Ela conclui o Ano Litúrgico da Igreja Católica. É um domingo de retrospectiva geral do ano. Em 2021 acompanhamos o Evangelho Segundo Marcos, durante os domingos do tempo comum. Esse evangelho, o primeiro a ser escrito, foca em Jesus como o anunciador do Reino de Deus. Um reino que é para todos nós e deve ser implantado aqui e agora! Reino de amor, paz e justiça! 

Vê-se que o título de “rei” não pega bem para Jesus! Ele sempre o recusou. Confiramos isso no próprio evangelho de João (6,15):

“Quando Jesus percebeu que queriam levá-lo para proclamá-lo rei, retirou-se novamente sozinho para o monte.”

Diante da pressão de Pilatos, ele acaba revelando que o seu reino não é DESTE mundo ao qual Pilatos pertence. O mundo do poder, o mundo da glória, o mundo da fama, o mundo do prazer, o mundo da futilidade e superficialidade! O seu reino resume-se no SERVIR, no ser IRMÃO e IRMÃ uns dos outros, em praticar e lutar pela JUSTIÇA, em REALIZAR O BEM, enfim, estar do lado da VERDADE. 

O bem, a felicidade, a dignidade do ser humano são colocados ACIMA DE TUDO, no reinado diferente de Deus! Pilatos não pode compreender isso, por isso perguntará, em seguida: “O que é a verdade?” (Jo 18,38). Mas não é só ele que não compreende! Infelizmente, as autoridades religiosas e civis judaicas, bem como, boa parte do povo não compreendem esse “rei” Jesus! A própria Igreja Católica não compreendeu, também, pois, durante muitos séculos viveu associada aos monarcas, aos poderosos, aos grandes do mundo. O papa era tido, até o princípio da Idade Moderna, como um imperador supremo, acima de todos os reis da Terra. E, até hoje, existem muitos bispos, cardeais, padres, monges e eclesiásticos em geral que têm nostalgia desses “bons e velhos tempos”, em que a Igreja parecia contar mais e decisivamente neste mundo. Esquecendo-se que o reino de Cristo, o reino de Deus NÃO É DESTE MUNDO! 

O que de melhor podemos realizar na Terra é formar bons e conscientes CIDADÃOS para que possam viver e praticar o seu cristianismo realizando o BEM-COMUM de toda a sociedade e não, apenas, de uma minoria privilegiada, como hoje acontece!

O melhor modo de ser cristão, o melhor modo de pertencer ao reino de Jesus, é sermos bons cidadãos, pessoas que se interessam e lutam para promover o bem de todos!

Como nos recorda o teólogo espanhol José María Castillo:

“Se queremos ser crentes em Jesus, com todas suas consequências, o lógico é que sejamos mais sensíveis à solidariedade com os pobres, os marginalizados, os que sofrem, os que são atropelados pela ambição do capital e do capitalismo.” 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Pai, te louvo, te bendigo, te agradeço porque conduziste-me junto ao teu Filho Jesus no pretório de Pilatos, nesta terra estrangeira e hostil, mas também de revelação e de luz. Somente tu, com o teu amor infinito, sabes transformar toda distância e toda escuridão em lugar de encontro e de vida.

Obrigado porque fizeste surgir o tempo santo da consolação, no qual envias o teu Cordeiro, sentado no trono, como rei imolado e vivente; o seu sangue é orvalho restaurador, é unção de salvação. Obrigado porque Ele me fala sempre e me canta a tua verdade, que é somente amor e misericórdia; desejaria ser um instrumento nas mãos do rei, de Jesus, para transmitir a todos as notas consoladoras de tua Palavra. Pai, eu te escutei, hoje, neste evangelho, mas te suplico, faze que os ouvidos não se cansem jamais de ti, de teu Filho, de teu Espírito. Faze-me renascer, assim, da verdade, para ser testemunha da VERDADE.» 

(CUCCA, M. A. Domenica: Gesù Cristo Re dell’Universo. In: CILIA, Anthony O.Carm. (a cura di). Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico B. Leumann (TO): Elledici, 2009, p. 628)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – XXXIV Domenica Tempo Ordinario – 25 novembre 2018 – Internet: clique https://www.studibiblici.it/videoomelie21.html (acesso em: 18/11/2021).

quinta-feira, 18 de novembro de 2021

Educação deve ser prioridade!

 É quase fim do ano: onde estão os nossos jovens?

 Simon Schwartzman

Sociólogo, membro da Academia Brasileira de Ciências e ex-presidente do IBGE 

A lei do novo ensino médio desorganizou um sistema que estava ruim, mas não se sabe ainda se isso resultará num outro melhor

Este deveria ser o ano em que as escolas concluiriam os preparativos para dar início, em 2022, ao novo ensino médio. É, também, o segundo ano da pandemia, em que elas ficaram fechadas ou oferecendo ensino à distância de qualidade e eficácia desconhecidas. Muitos jovens abandonaram os cursos e muitos mais ficaram, mas aprenderam pouco ou nada. Os candidatos ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que em 2016 eram mais de 8 milhões, caíram para a metade em 2021. Este número já vinha caindo, com a percepção crescente de que o roteiro tradicional do ensino médio único aos cursos universitários tradicionais, que já era inacessível para a maioria da população, se tornou mais difícil ainda. 

A lei do novo ensino médio foi uma tentativa de tornar o ensino médio mais significativo, abrindo a possibilidade de diferentes itinerários formativos e criando uma ampla oferta de ensino técnico-profissional para os que buscassem uma qualificação mais prática e mais acessível. Agora, além de ter de introduzir o novo currículo, as escolas terão de lidar com milhões de estudantes que ficaram fora da escola ou aprenderam ainda menos do que antes. O que farão? Como estão se preparando para recuperar os anos perdidos? Como será, na prática, este novo ensino médio tão anunciado? 

O Ministério da Educação deveria estar liderando esta transição, mas, de onde menos se espera, daí é que não vem nada, mesmo. As secretarias estaduais têm tomado a iniciativa, preparando os currículos para os diferentes itinerários e organizando a oferta de ensino técnico-profissional.

Algumas já publicaram suas conclusões, que, embora diferentes entre si, parecem ter algumas coisas em comum. Todas supõem que o regime de 3 mil horas, ou 5 horas diárias, estará implantado, e várias anunciam que darão prioridade às escolas de tempo integral, de 8 horas. Todas anunciam novos conteúdos e atividades como projeto de vida, empreendedorismo, sustentabilidade, vida futura, cultura digital. Nada contra, desde que não seja à custa da iniciação apropriada nas disciplinas acadêmicas centrais para os diferentes itinerários. Para esses itinerários, nenhuma consegue se desvencilhar da estranha classificação das áreas de conhecimento inventada pelo MEC e avançar em opções focadas nos temas de tecnologia e engenharia, profissões sociais, ciências da vida e humanidades, como no resto do mundo. E, para o ensino técnico, alguns Estados planejam dar prioridade a algumas áreas – eletrotécnica, agronegócio, administração, etc. – e abrir espaço tanto para cursos técnicos mais longos quanto curtos, na antiga modalidade de Formação Inicial Continuada (FIC); mas poucos dizem como vão fazer isso. 

Na pressa, é compreensível que os currículos sejam tratados com prioridade, mas chama a atenção a ausência de informações sobre como as redes pretendem lidar com a enorme diversificação de seus estudantes, como esperam preparar seus professores para lidar com o novo formato e como vão tentar compensar o impacto da epidemia na formação dos estudantes que vão receber.

Fala-se muito em educação profissional integrada e estudo em tempo integral, mas não se considera que 20% dos alunos de ensino médio regular nas redes públicas estudam à noite, que um terço tenha 18 anos ou mais (dados do Censo Escolar) e que 30% trabalham (dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua). Sem falar nos cerca de 1,2 milhão que estão hoje matriculados nos cursos médios de Educação de Jovens e Adultos (EJA), reconhecidamente precários. Estes estudantes mais velhos, que estudam à noite, trabalham e estão nos cursos de EJA deveriam ser os principais beneficiários de cursos técnicos mais práticos, em tempo parcial e com uso apropriado de tecnologias de ensino híbridas, em carreiras com boas perspectivas de emprego mais imediato, e não me parece que estejam sendo devidamente considerados. 

Organizar itinerários de formação é menos uma questão de currículo do que da existência de professores que tenham uma concepção clara da formação que se deseja proporcionar e possam liderar este trabalho. Nossos professores, no melhor dos casos, podem ensinar bem as respectivas matérias, mas seria preciso um trabalho intenso e coordenado de identificação e capacitação de coordenadores de área com esta visão mais ampla. Para o ensino técnico, é preciso professores com um perfil muito diferente dos que se formam pelas licenciaturas tradicionais, que possam combinar experiência de trabalho com capacidade de ensino, assim como de convênios de cooperação entre as redes escolares e instituições especializadas, com destaque para as dos sistemas nacionais de aprendizagem. 

É bom que cada Estado esteja buscando seu caminho, mas, sem a âncora de um sistema adequado de avaliação e certificação de competências, que substitua o atual Enem, cada um continuará atirando para um lado, sem saber bem os alvos que devem mirar. A lei do novo ensino médio desorganizou um sistema que estava ruim, mas ainda não se sabe se isso resultará num outro melhor. 

Fonte: O Estado de S. Paulo – Espaço Aberto – Sexta-feira, 12 de novembro de 2021 – Pág. A4 – Internet: clique aqui (Acesso em: 18/11/2021).

domingo, 14 de novembro de 2021

Padres que se suicidam, por quê?

 O clero do pré-Trento e o clero do século XXI

 José Rafael Solano Durán

Padre da Arquidiocese de Londrina, no Paraná. Possui graduação em Teologia pela Pontifícia Universidade Javeriana, Bogotá, Colômbia (1995). Mestre e Doutor em Teologia Moral pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma (2004). Pós-Dourado em Teologia Moral e Familiar no Instituto para a Família Giovanni Paolo II, em Roma, Itália. 

Falta espiritualidade, estudo, real interesse pelos problemas do mundo e, especialmente, amizade sincera entre os padres

Ernest Renan, um dos maiores historiadores franceses, tinha muita razão quando afirmava: “O homem encontra santidade naquilo que crê e beleza naquilo que ama”. 

Muito tem-se refletido ultimamente sobre o suicídio no clero do Brasil. Vale a pena afirmar que não só no clero brasileiro há suicidas. O suicídio é uma das realidades mais angustiantes da sociedade contemporânea. Seja como for, quero me limitar única e exclusivamente ao meio ao qual pertenço. 

Sou e faço parte do clero. Uma das situações que me levam a pensar na triste realidade que vivemos é que muitos de nós perdemos o encanto, a alegria e ofuscamos a beleza do nosso ministério. Aqui, já há um problema de base. Como recuperar aquele primeiro amor, o qual o apóstolo Paulo já nos convidava constantemente a resgatar e manter. Presbíteros, diáconos e bispos desencantados! Homens que já não se sentem mais atraídos por nada e muito menos por ninguém. Neste caso, por Cristo. Para muitos, fazer parte do Clero é muito mais do que um problema, um dilema. Homens capazes de pensar e refletir, mas incapazes de decidir!

Quem não sabe decidir perde o horizonte do fundamental e chega a um ponto no qual situações inesperadas o absorvem, se tornando simplesmente alguém que vive segundo as decisões dos outros.

Muitos presbíteros, diáconos e bispos carecem do senso moral da objeção de consciência. Fazem opções contra a sua própria dignidade e capacidade.

Para muitos, ficar “bem na foto” significa só se adaptarem às ideologias do momento:

a) Há quem use batina porque um padre ou bispo “pop” numa frase do seu Instagram afirma que a batina não é fantasia.

b) Há quem use calça jeans e camiseta justa porque é chamado de padre moderno e bonito;

c) há quem faça dieta porque precisa reafirmar sua figura e

d) há quem tem pânico de envelhecer e inventa todos os tratamentos possíveis para fazer parte do mundo dos cosméticos e das propagandas de beleza.

e) Isso sem contar quando, como eu, deixamo-nos levar pela moda litúrgica! Exageradamente, o Brasil se transformou numa plataforma comercial das empresas litúrgicas e do comércio de belos paramentos e objetos... 

Um clero insatisfeito quase que desde o dia da ordenação. “A minha ordenação deve ser diferente de todas aquelas que já assisti”; e então aquele homem prostrado no chão vira motivo de curtidas e aplausos. Meses depois, o neopresbítero deve fazer vestibular e ingressar na faculdade mais próxima, porque os dez anos de estudo no processo formativo não foram suficientes para que a sua inteligência se desenvolvesse o suficiente. Um Clero que muitas vezes não quer aceitar a necessidade de se aproximar das realidades do mundo para influenciar e questionar, mas que se torna escravo e dependente do mundo para viajar e gastar. 

Muitos criticam a nossa sexualidade. Há quem afirme que somos uma imensa maioria de homens anormais. Já o disseram para mim inúmeras vezes.

Penso que a maior doença sexual e afetiva que temos no clero é que nós, membros do mesmo clero, não acreditamos no dom sobrenatural da amizade.

A castidade cristã nos ajudaria a sermos amigos entre nós! “Sacerdos lupi sacerdotum” = Somos lobos nos devorando uns aos outros. Ter amigos sacerdotes é a maior dádiva para os nossos leigos; mas entre nós não é assim. Vivemos sob suspeita, não podemos viajar juntos, sair juntos, caminhar juntos e pedirmos para rezar juntos! Que anacronismo. Precisamos romper as barreiras dos medos e dos preconceitos e acreditar na castidade. Sem ela não superaremos nosso egoísmo e carreirismo desenfreado. 

Os sacerdotes do século XXI temos muitos mais problemas dos que já tinham os sacerdotes antes do concílio de Trento. Antes de Trento, faltava formação acadêmica, algo de disciplina e maior entrosamento com o mundo. Mas antes de Trento os membros do clero eram homens unidos ao seu bispo e aos seus irmãos. Pode ser questionada a situação do alto e do baixo clero vivido antes de Trento; mas o mesmo Carlos Borromeu e, posteriormente, Jean J. Olier, Jean Eudes, Vincent de Paul, nos séculos sucessivos fortaleceram a formação e deram grandes luzes para ajudar o clero. 

Não serão as confraternizações de natal e de aniversário aquelas que nos tornarão mais irmãos; não serão os retiros anuais ou as reuniões mensais aquelas que nos ajudarão a sermos e permanecermos mais unidos à Igreja Particular ou ao carisma dos fundadores.

Só um encontro constante com AQUELE que nos chamou e nos fez membros do seu Corpo nos tornará verdadeiros irmãos.

Aproximemo-nos uns dos outros em Cristo; só assim não teremos mais suicídios, quer em vida ou em fato… nove foram os suicídios do clero no nosso Brasil, mas penso que haja mais de nove vivos que já se suicidaram. 

Fonte: Redes sociais.

sábado, 13 de novembro de 2021

33º Domingo do Tempo Comum – Ano B – HOMILIA

 Evangelho: Marcos 13,24-32 

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos. Naquele tempo: Jesus disse a seus discípulos: 24 «Naqueles dias, depois da grande tribulação, o sol vai se escurecer, e a lua não brilhará mais, 25 as estrelas começarão a cair do céu e as forças do céu serão abaladas. 26 Então vereis o Filho do Homem vindo nas nuvens com grande poder e glória. 27 Ele enviará os anjos aos quatro cantos da terra e reunirá os eleitos de Deus, de uma extremidade à outra da terra. 28 Aprendei, pois, da figueira esta parábola: quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto. 29 Assim também, quando virdes acontecer essas coisas, ficai sabendo que o Filho do Homem está próximo, às portas. 30 Em verdade vos digo, esta geração não passará até que tudo isto aconteça. 31 O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão. 32 Quanto àquele dia e hora, ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, mas somente o Pai.»

Palavra da Salvação.

 Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

O Reino de Deus abala e faz cair as potências e os potentes deste mundo

O capítulo 13 do Evangelho de Marcos é extremamente complexo. O evangelista está ciente disso a ponto de, no versículo 14, dizer «quem lê», ou seja, o leitor «entenda». Portanto, vamos tentar entender o que o evangelista nos transmite. 

Marcos 13,24a: «Jesus disse a seus discípulos: “Naqueles dias, depois da grande tribulação...”».

A tribulação foi a destruição do Templo e de Jerusalém, anunciada por Jesus. E, aqui, Jesus, referindo-se aos textos dos profetas, em particular do profeta Isaías, usa a linguagem profética da queda de regimes opressores. 

Marcos 13,24b: «... o sol vai se escurecer, e a lua não brilhará mais...»

O sol e a lua, naquela cultura, eram divindades adoradas por povos pagãos. Consequentemente, as divindades pagãs perdem seu esplendor. Por quê? Jesus já havia dito: «É necessário que o evangelho, a boa nova, seja anunciada a todos» [cf. Mt 24,14]. Então, o processo de libertação, que se iniciou com a queda de Jerusalém, começa a fazer efeito. A proclamação da boa nova com a luz, o esplendor do verdadeiro Deus, ofusca todas as falsas divindades. 

Marcos 13,25a: «... as estrelas começarão a cair do céu...»

Estes são os efeitos. O que se entende por «estrelas»? Naquela época, todos aqueles que detinham um poder, fosse o rei, o imperador, ou o faraó, consideravam-se de condição divina, por isso estavam metaforicamente nos céus, considerados estrelas.

Então Jesus, através do evangelista, nos diz que todos aqueles regimes, aqueles poderosos, que baseiam seu poder em falsas divindades, visto que há a proclamação do Evangelho de Jesus, essas falsas divindades perdem seu esplendor e essas «estrelas» começam a cair uma após outra.

Aqui a referência de Jesus é ao oráculo contra a Babilônia do profeta Isaías, onde o profeta profetiza contra o rei da Babilônia:

«Como caíste do céu, estrela da manhã, filho da aurora! Estás derrubado por terra, tu que derrubavas as nações! Tu, que dizias no teu coração: “Subirei até o céu e exaltarei meu trono acima das estrelas...” Pelo contrário, foste precipitado no Xeol, no fundo do Abismo!» [Is 14,12-13a.15].

Portanto, o efeito positivo de anunciar a BOA NOVA de Jesus é que todas as estruturas de poder, todos os regimes baseados no poder, cairão para a libertação do ser humano.

Marcos 13,25b: «... e as forças do céu serão abaladas.»

Nos céus, segundo o evangelista, está o Pai, o Filho do Homem e os anjos. As potências terrenas são poderes que usurpam a condição divina e começam a ser abaladas. 

Marcos 13,26: «Então, verão o Filho do Homem vindo nas nuvens com grande poder e glória.»

Em seguida, Jesus garante: «Então, eles verão». Jesus não diz «vós vereis», mas «eles verão». Quem é que vai ver? Justamente, os poderosos que caem de seu trono. As nuvens indicam a condição divina. Quando as potências são abaladas, as estrelas começam a cair, o poder e a glória se manifestam no Filho do Homem. 

Marcos 13,27: «Ele enviará os anjos aos quatro cantos da terra e reunirá os eleitos de Deus, de uma extremidade à outra da terra.»

E Jesus acrescenta que «enviará os anjos», isto é, aqueles que o ajudaram a realizar a sua obra, «e reunirá os seus eleitos».

A queda dos perseguidores será o triunfo dos perseguidos.

«Dos quatro ventos, da extremidade da terra à extremidade do céu.» Tudo isso para um novo começo. 

Marcos 13,28a: «Aprendei, pois, da figueira esta parábola...».

A figueira já apareceu, neste Evangelho, como imagem do Templo, da instituição religiosa que era todo esplendor, mas nenhum fruto, apenas folhas e nada de fruto! É uma parábola particular, poderíamos traduzi-la como «aquela parábola». Mas qual é a parábola? É a que Jesus pronunciou contra a instituição religiosa, os sumos sacerdotes, é a parábola dos arrendatários assassinos de quem Deus vai tirar a videira [cf. Mc 12,1-12]. 

Marcos 13,28b-29: «... quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto. Assim também, quando virdes acontecer essas coisas, ficai sabendo que o Filho do Homem está próximo, às portas.»

O que está próximo? O que está às portas? O Reino de Deus. Do momento em que, Jerusalém e o Templo caem, esse grande obstáculo para ir pregar a boa nova também aos pagãos; do momento em que, com o anúncio da boa nova, todos os poderes que se baseiam na dominação, na exploração da humanidade começam a cair, então se dá a inauguração do Reino de Deus. 

Marcos 13,30-31: «Em verdade vos digo, esta geração não passará até que tudo isto aconteça. O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão.»

Sabemos que a destruição de Jerusalém será no ano 70. A ruína de Jerusalém permitirá que os pagãos entrem no Reino de Deus. «O céu e a terra passarão», ou seja, tudo passará, «mas minhas palavras não passarão». Portanto, Jesus nos diz, com absoluta certeza, que...

... se a comunidade anunciar e viver a boa nova de Jesus, todo sistema injusto, todo sistema opressor cairá porque todos os poderosos, todos os regimes têm pés de barro e, mais cedo ou mais tarde, estão destinados a cair.

Marcos 13,32: «Quanto àquele dia e hora, ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, mas somente o Pai.»

E então essa passagem do Evangelho termina com uma imagem de grande confiança. O «dia» ao qual se refere Jesus, é o dia da sua morte. A «hora» que ele menciona, é a hora da perseguição e morte de seus discípulos. Jesus afirma que nem ele nem os anjos sabem algo sobre isso.

O que Jesus quer nos dizer? Não é importante conhecer o momento, mas saber que está nas mãos do Pai. Portanto, esta página termina com um convite a confiar plenamente na ação do Pai. Então, é uma página totalmente positiva, certamente não uma página que tende a assustar as pessoas, mas libertá-las e, acima de tudo, é uma página que encoraja a pequena comunidade de crentes que se encontra impotente diante dos grandes regimes que governam o mundo. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

Há um antigo provérbio que diz: “Não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe”. Essa frase resume, bem, a lição que Jesus quer nos transmitir com o seu Evangelho, neste domingo. O provérbio não quer estimular a apatia, a acomodação diante da realidade. Alguém poderia raciocinar, assim: “Bem, como nada é duradouro, vamos aguardar até que mude!” É, justamente, o contrário! Se lutarmos, se buscarmos com tenacidade e esperança, tudo pode ser melhorado, tudo pode ser mudado! O mal não perdurará, a opressão chegará ao fim! E, mesmo se estivemos bem, mesmo se tudo estiver dando certo, se não nos esforçarmos, se não prosseguirmos com nossos trabalhos e ideais, isso tudo poderá acabar, também! 

Como estamos nos aproximando do final de ano, a liturgia quer nos transmitir esperança, quer nos recordar que é época das promessas se cumprirem! Nossas esperanças estão na boa nova de Cristo! Não poderia haver melhor BOA NOTÍCIA que a instauração do reinado de Deus na humanidade. E aqui, como nos adverte corretamente José María Castillo (teólogo espanhol):

«Não se trata de um momento concreto da história; não será um acontecimento determinado. Será um processo lento e longo, no qual o Deus humanizado em Jesus se fará presente entre os humanos, até humanizar este mundo libertando-o da desumanização que dá origem a tanto sofrimento e a tanta opressão.»

Para que haja esperança e vida nova para os habitantes da Terra, para que a humanização do ser humano aconteça, é necessário que as potências caiam, os potentes sejam abalados. Isso não é uma novidade na boca de Jesus! Desde o Antigo Testamento, os profetas já tinham se dado conta dessa verdade: aonde há opressores, aonde há poderosos, aonde há dominadores, não pode haver justiça, fraternidade e paz! Os grandes opressores devem cair, confira: Isaías 13,9-10; 34,4; Jeremias 4,23-24; Ezequiel 32,7-8; Joel 3,4; 4,1-8 e outros mais. 

Contudo, não significa que para acontecer isso, tenha que ocorrer calamidades que afetem a Terra, nem fenômenos astronômicos como aqueles descritos no Evangelho deste domingo! Essas imagens fazem parte da linguagem profético-apocalíptica presente na Bíblia. A implantação do reinado de Deus neste mundo será fruto de um processo contínuo e crescente de HUMANIZAÇÃO e LIBERTAÇÃO. No entanto, esse processo não acontecerá por si mesmo! Essa progressiva humanização dos indivíduos, dos grupos, das instituições e das nações é fruto do nosso empenho, do nosso trabalho, do nosso esforço. 

A esperança, a boa notícia está no fato de que Deus nos dá a seguinte garantia:

«Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos.» (Mt 28,20b) 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Ó Deus de meus pais e Senhor de misericórdia, que tudo fizeste com a tua Palavra, e com tua Sabedoria criaste o ser humano para dominar as criaturas que fizeste, para governar o mundo com santidade e justiça e exercer o julgamento com retidão de coração! Dá-me a Sabedoria, que se assenta contigo no teu trono, e não me excluas do número de teus filhos. Pois sou ter servo, filho de tua serva, homem frágil e de vida breve, e incapaz de compreender a justiça e as leis. Por mais que alguém dentre os mortais seja perfeito, se lhe faltar a tua Sabedoria será considerado como nada... Contigo está a Sabedoria que conhece as tuas obras e que estava presente quando fazias o mundo; ela sabe o que é agradável aos teus olhos e o que é correto conforme os teus preceitos. Manda-a dos teus sagrados céus e faze que ela venha do teu trono glorioso, para que me acompanhe e trabalhe comigo e eu saiba o que é agradável diante de ti. Pois ela tudo conhece e compreende, e me guiará com prudência em meus trabalhos, protegendo-me com a sua glória. Amém!»

(Sabedoria 9,1-6.9-11)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – XXXIII Domenica Tempo Ordinario – 18 novembre 2018 – Internet: clique aqui (acesso em: 12/11/2021).