«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 28 de setembro de 2021

Conversando sobre ansiedade

Ansiedade nos lembra que não há controle sobre o futuro

 Rodrigo de Almeida Ramos

Psiquiatra e mestre em Medicina pela Santa Casa de São Paulo, diretor e Sócio Fundador do Núcleo Paulista de Especialidades Médicas – NUPEM 

Ansiedade na medida certa é preciosa, em excesso, é insalubre

RODRIGO DE ALMEIDA RAMOS

Com a revolução agrícola, há cerca de 12 mil anos, a organização social montou a civilização orientando-se por preceitos que diminuiriam a probabilidade de um amanhã ruim. Charles Darwin, a partir da Teoria da Seleção Natural, coloca como critério fundamental para a sobrevivência a capacidade de se adaptar ao ambiente. 

O neurocientista português Antonio Damasio, em seu livro A Estranha Ordem das Coisas, reflete sobre a necessidade de sentimentos humanos para a preservação da homeostase, a situação de equilíbrio químico do mundo interno. Quando a homeostase opera no que ele chama de faixa positiva, a pessoa experimenta uma sensação de alegria e bem-estar que reflete em sua saúde, ajudando a mantê-la. Nas situações em que ela atua, no entanto, numa faixa negativa, como ocorre por exemplo em situações de estresse, há a emergência de sentimentos como tristeza, desconforto e, em alguns casos, até dores no corpo. 

E é aqui que entra a ansiedade. Antes de mais nada é importante que se esclareça que há uma relação íntima entre ansiedade e medo. Se este é a representação emocional de um perigo iminente detectada pelo organismo, a ansiedade é um aviso de que precisamos nos empenhar se quisermos garantir a sobrevivência futura. 

Quer ir bem em uma prova? Estude. Seu desejo é perder peso para manter sua saúde? Organize sua dieta e rotina de exercícios físicos.

E o que garante que você se esforçará adequadamente? A ansiedade!

Aquele estado de humor de valor negativo e altamente desconfortável que funciona como um conselheiro que toda hora sopra em seu ouvido “você está bem-preparado para o evento de amanhã?”. 

Não é à toa que a ansiedade sobreviveu na linhagem humana da seleção natural. Indivíduos com uma ansiedade saudável tendem a ser mais adaptados porque apresentam uma probabilidade aumentada de ter um futuro mais organizado. 

Então a ansiedade é uma dádiva? Muita calma nessa hora! Porque como tudo que depende de uma regulação química do nosso corpo, a ansiedade pode sair do controle e se tornar uma doença. Imagine um desequilíbrio tamanho em nossa homeostase que faça você acreditar que o futuro está completamente comprometido e que a você nada resta a não ser sofrer a expectativa da desgraça. 

A doença ansiedade não se baseia em fatos. Ela é apenas uma espécie de contaminação do pensamento que compromete a vida da pessoa.

Como reação ao hipotético destino miserável, o corpo responde com medo.

Há a liberação interna de substâncias como a adrenalina, que promovem taquicardia, falta de ar, palidez, sudorese, diarreia, tremores e sensação de desmaio. 

E por que a pandemia piora a ansiedade?

Ela promove uma situação de estresse ao comprometer todas as ideias de futuro. O emprego não está mais garantido. A vida de pessoas que amamos, ao menos no curto prazo, é incerta. Nossa sobrevivência também não é tão segura. É a hostilidade do ambiente se somando a uma hostilidade do mundo interno, que pode ocorrer em pessoas vulneráveis para o problema. 

A ansiedade na medida certa é preciosa. Em excesso é insalubre. E no fundo ela sempre nos lembra uma coisa: que por mais que tentemos, nosso controle sobre o futuro nunca será pleno. “Como será o amanhã? Responda quem puder”. 

Fonte: O Estado de S. Paulo – Cultura – Quarta-feira, 22 de setembro de 2021 – Pág. H1 – Internet: clique aqui (Acesso em: 28/09/2021). 

Olho nessa realidade!

 Desigualdade digital

 Editorial

Jornal “O Estado de S. Paulo” 

É fundamental reduzir o enorme contingente de brasileiros excluídos da vida digital. O contrário significa aceitar que milhões vivam à margem da plena cidadania

 

A falta de acesso estável à internet é mais um reflexo da brutal desigualdade socioeconômica que separa ricos e pobres no Brasil de uma forma tão avassaladora que os faz parecer filhos de pátrias distintas. 

Um estudo elaborado pela consultoria PwC, em parceria com o Instituto Locomotiva, revelou que:

a) apenas 29% das pessoas acima de 16 anos no País, cerca de 49,4 milhões de brasileiros, estão “plenamente conectadas” à internet, o que significa ter acesso “a qualquer tempo” e não experimentar problemas graves de instabilidade na conexão.

b) No extremo oposto, há 33,9 milhões de pessoas, ou 20% da população, que nem sequer têm acesso à internet para poder reclamar da qualidade da conexão.

c) Entre eles, há os “subconectados” (25% da população, ou 41,8 milhões de pessoas), que têm algum meio para acessar a internet, mas se conectam de forma “intermitente”, e

d) os “parcialmente conectados” (26% da população, ou 44,8 milhões de pessoas), que se conectam à internet durante “a maior parte do tempo” em um dispositivo de boa qualidade.

A chamada desigualdade digital é extremamente prejudicial para a renda das famílias.

O estudo da PwC e do Instituto Locomotiva revelou que, se os mais pobres tivessem a mesma qualidade de acesso à internet que têm os mais ricos, sua renda poderia dar um salto de 15,3%. Vale dizer, encurtar a distância que os separa hoje significaria colocar em circulação mais de R$ 75 bilhões.

A renda

Enquanto os “desconectados” têm renda média de R$ 1.413, os “plenamente conectados” recebem R$ 3.530. Já os “subconectados” ganham, em média, R$ 1.933. E os “parcialmente conectados”, R$ 2.229 mensais. 

O quadro da desigualdade digital é particularmente agravado pela pandemia de covid-19, tendo afetado, sobretudo, os mais jovens. Durante tempo demasiado longo, as escolas permaneceram fechadas na maior parte do País, o que obrigou alunos e professores a se adaptarem ao ensino remoto. Neste processo de adaptação, além das dificuldades naturais impostas pela própria mudança dos métodos pedagógicos...

... muitos alunos ficaram para trás porque simplesmente não tinham meios para assistir às aulas online.

Sabe-se, por diversos outros estudos, que os níveis de educação também estão diretamente ligados à renda. Diante desta dupla “punição” aos mais vulneráveis – risco sanitário e risco socioeconômico –, há quem defenda, como faz a professora da London School of Economics Ellen Helsper, que o acesso à internet seja considerado um “direito fundamental”. “A pandemia mostrou que nem todos têm acesso igual às tecnologias e que a internet não é um luxo, mas algo fundamental”, disse Helsper ao Estado. 

Implementar políticas públicas que contornem este problema de múltiplos desdobramentos, portanto, é fundamental. O Congresso fez sua parte, ao aprovar no início deste ano um projeto de lei que destinou R$ 3,5 bilhões do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) aos Estados e municípios a fim de que os entes subnacionais invistam no acesso à internet para alunos e professores da rede pública de ensino. O presidente Jair Bolsonaro vetou integralmente o projeto alegando que não havia “espaço no Orçamento” para o gasto. Sabe-se muito bem que, quando se trata de assuntos de seu interesse, Bolsonaro não deixa faltar recursos orçamentários por falta de “espaço”. Em boa hora, o veto presidencial foi derrubado tanto pela Câmara (419 votos a 14) como pelo Senado (69 votos a zero).

Não é exagero dizer que o exercício da cidadania se dá em boa medida por meio do acesso à internet.

“Na prática, a digitalização (da vida) é o novo português, e (sem garantir acesso à internet) estaremos excluindo diversas pessoas se nada for feito”, disse Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva. 

Fica evidente, conforme o estudo da PwC e do Locomotiva, que a inclusão digital tem relação direta com a renda dos indivíduos. Outros estudos também já mostraram que é estreita a ligação entre conectividade e níveis de educação. É fundamental, portanto, reduzir o enorme contingente de brasileiros excluídos da vida digital. O contrário significa aceitar que milhões vivam à margem da plena cidadania. 

Fonte: O Estado de S. Paulo – Notas & Informações – Domingo, 19 de setembro de 2021 – Pág. A3 – Internet: clique aqui (Acesso em: 27/09/2021).

sábado, 25 de setembro de 2021

26º Domingo do Tempo Comum – Ano B – HOMILIA

 Evangelho: Marcos 9,38-43.45.47-48 

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos. Naquele tempo: 38 João disse a Jesus: «Mestre, vimos um homem expulsar demônios em teu nome. Mas nós o proibimos, porque ele não nos segue». 39 Jesus disse: «Não o proibais, pois ninguém faz milagres em meu nome para depois falar mal de mim. 40 Quem não é contra nós é a nosso favor. 41 Em verdade eu vos digo: quem vos der a beber um copo de água, porque sois de Cristo, não ficará sem receber a sua recompensa. 42 E, se alguém escandalizar um destes pequeninos que creem, melhor seria que fosse jogado no mar com uma pedra de moinho amarrada ao pescoço. 43 Se tua mão te leva a pecar, corta-a! É melhor entrar na Vida sem uma das mãos, do que, tendo as duas, ir para o inferno, para o fogo que nunca se apaga. 45 Se teu pé te leva a pecar, corta-o! É melhor entrar na Vida sem um dos pés, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno. 47 Se teu olho te leva a pecar, arranca-o! É melhor entrar no Reino de Deus com um olho só, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno, 48onde o verme deles não morre, e o fogo não se apaga”».

Palavra da Salvação. 

Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

É melhor ser aliado de Jesus e de seu Reino do que causa de tropeço para os pequenos deste mundo

Jesus deu aos seus discípulos a capacidade de libertar as pessoas dos demônios, isto é, das ideologias que as tornam refratárias à Palavra, ao ensino de Jesus. Bem, eles não eram capazes disso, não conseguem seguir Jesus e, o que é mais sério, pretendem impedir quem o faz. O evangelista, nesta passagem, faz referência a João. João sempre aparece emparelhado com seu irmão Tiago, apelidado por Jesus de «os filhos do trovão», em aramaico «boanerges», por sua arrogância. Aqui, João aparece sozinho porque o evangelista quer fazer um paralelo com Josué que era servo de Moisés e que foi protestar a Moisés porque dois judeus que não compareceram à reunião para receber o Espírito Santo também o receberam [cf. Números 11,16-30]. 

Versículos 38-39: «João disse a Jesus: “Mestre, vimos um homem expulsar demônios em teu nome. Mas nós o proibimos, porque ele não nos segue”. Jesus disse: “Não o proibais, pois ninguém faz milagres em meu nome para depois falar mal de mim”.»

Ao dizer que alguém expulsava demônios “em nome” de Jesus, significa adesão a ele! Portanto, essa pessoa denunciada por João faz aquilo que os próprios discípulos não eram capazes de fazer! A arrogância, a pretensão de ser um grupo exclusivo faz com que se proíba essa pessoa. E, atenção, o proíbem porque “nãos nos seguia”, não se referem a Jesus, mas ao grupo! Desde o início, houve, na comunidade cristã, a tentação de ser um grupo exclusivo. Jesus, então, repreende João, usando um termo forte, um imperativo: «Não o proibais». Em seguida, o termo grego usado pelo evangelista não é «milagre», mas «dynamis», que significa uma força, uma energia que comunica a vida. Assim sendo, podemos traduzir a afirmação de Jesus, assim: «Não há ninguém que atue com força em meu nome», portanto me dando adesão.

Todos os que trabalham pelo bem dos seres humanos, pela liberdade dos seres humanos, Jesus os vê como seus aliados, mesmo que não pertençam ao seu grupo.

Versículos 41-42a: «Em verdade eu vos digo: quem vos der a beber um copo de água, porque sois de Cristo, não ficará sem receber a sua recompensa. E, se alguém escandalizar um destes pequeninos que creem...»

E, então, novamente Jesus convida os discípulos a se identificarem com ele. Mencionando um fato simples: dar um copo de água para beber porque «sois de Cristo», isto é, eles pertencem ao Messias.

A presença de Jesus e do Pai é a recompensa de quem os acolhe.

Mas então Jesus muda de tom, muda de registro e ele, sempre quase maternal com os pecadores, tão terno, tem palavras de extrema dureza justamente com seus discípulos, palavras terríveis. Jesus utiliza o verbo «escandalizar», esse verbo significa «cair, tropeçar» Os «pequeninos» que Jesus menciona não são crianças! O termo grego usado pelo evangelista, «micron», do qual vem a palavra micróbio, indica o invisível, o excluído, o marginalizado da sociedade. Estes pequeninos que acreditam em Jesus são pessoas que sentiram a resposta às suas aspirações de vida na mensagem de Jesus. Ouviram falar de amor, fraternidade e perdão e, por isso, aderiram a Jesus. 

Versículo 42b: «... melhor seria que fosse jogado no mar com uma pedra de moinho amarrada ao pescoço».

Não podemos esquecer que Jesus surpreendeu seus discípulos discutindo entre si para descobrir quem seria o maior e o mais importante dentre eles [cf. Marcos 9,33-37]. E, por isso, as pessoas ficam escandalizadas, veem que dentro da comunidade de Jesus existem as mesmas rivalidades, as mesmas tensões da sociedade. Então Jesus diz que, se alguém faz tropeçar e cair, devido a sua ambição, mesmo a um daqueles «invisíveis, marginalizados» que creem nele, seria muito melhor para ele que uma pedra de moinho fosse colocada em seu pescoço. Jesus, aqui, é rico em detalhes, quando normalmente é muito comedido! Na época de Jesus, havia duas mós: uma menor, a doméstica que a dona de casa usava para moer o grão e uma maior, a do moinho, que servia no lagar de azeite. Jesus fala, aqui, exatamente dessa última, portanto uma mó grande e imóvel. Mas isso não basta, essa pessoa deveria ser jogada ao mar. Por que isso? Os judeus acreditavam que só ressuscitaria a pessoa que fosse enterrada na terra de Israel. Se você morresse no mar e se afogasse, não haveria esperança de ressurreição.

Mas por que não é suficiente Jesus dizer «seja lançado ao mar» e querer que essa pessoa coloque uma pedra de moinho? Porque se alguém afogasse o corpo, ele poderia vir à superfície e ser enterrado. Portanto, Jesus quer dizer que não deseja ver essa pessoa que provoca a queda, o tropeço dos humildes, dos pobres, dos marginalizados nem aqui nem no além. Estas são palavras terríveis, e elas são dirigidas para a comunidade de seus seguidores! 

Versículo 43: «Se tua mão te leva a pecar, corta-a! É melhor entrar na Vida sem uma das mãos, do que, tendo as duas, ir para o inferno, para o fogo que nunca se apaga.»

Então, Jesus dá um conselho à sua comunidade: «Se a tua mão...». Em seguida, Jesus mencionará o pé e o olho:

* a mão indica a ATIVIDADE,

* o a CONDUTA e

* o olho o CRITÉRIO, os VALORES.

Com isso, Jesus está dizendo aos seus seguidores: Se você tem valores, atitudes, comportamentos em sua vida que favorecem a ambição, o colocar-se acima dos outros, é melhor você entrar na vida com uma mão (um pé, um olho) do que com ambas as mãos e ir para a Geena [= inferno]. O que é Geena? Geena é um termo que procede de Ghe Hinnon, vale dos filhos de Hinnon, era uma ravina [= uma depressão, uma erosão provocada por águas de chuva ou de escoamento da cidade] que, ainda hoje, existe ao sul do Templo em Jerusalém. Na época de Jesus, servia como depósito de lixo, onde esse lixo queimava dia e noite. Era uma imagem de destruição total em fogo inextinguível.

Versículo 48: «... “onde o verme deles não morre, e o fogo não se apaga”.»

Por isso, Jesus pede que é necessário erradicar tudo o que se opõe à sua mensagem, mesmo que isso seja doloroso. E, depois de fazer essa lista, ele conclui sobre a Geena, dizendo: «onde o verme deles não morre, e o fogo não se apaga». Qual é o significado disso? Jesus cita o profeta Isaías, capítulo 66,24, onde está o castigo para os que se rebelaram contra Deus. Por que ele fala de um verme que não morre e do fogo que não se apaga? Jesus se refere às duas formas de destruir o cadáver, seja por putrefação ou por cremação, portanto, o verme e o fogo. Por que não apaga? É a destruição total.

Portanto, aqueles que são causa de tropeço para os outros devido à sua própria ambição enfrentam a ruína total de sua existência.

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

No Evangelho deste domingo, Jesus deixa claro que não deseja que seus seguidores formem um gueto, uma seita, um grupo seleto e privilegiado de pessoas! Pois, cedo ou tarde, esse grupo acaba por tornar-se intolerante, intransigente e, ainda pior, sentindo-se melhor que as outras pessoas da sociedade! Grupos fechados dessa maneira acabam desenvolvendo uma mentalidade fundamentalista e de combate contra todos que não são do próprio grupo. 

Infelizmente, essa forma de pensar e agir estava presente entre os discípulos do tempo de Jesus e, certamente, entre os de hoje, também. No entanto, Jesus não deseja entre seus discípulos pessoas fechadas em si mesmas, intolerantes, excludentes, que se acham detentoras do monopólio da verdade e do bem. O Evangelho de Jesus é um “projeto de vida includente”, não excludente! 

Por isso, é preciso ficar bem claro para nós que:

“Todos que praticam o bem, todos que libertam as outras pessoas dos sofrimentos, opressões e forças da morte, esteja no grupo que estiver, seja da religião que for, e tenha as crenças que tiver, merece o nosso respeito, a nossa aceitação e a nossa acolhida sem condições.” (José María Castillo – teólogo espanhol)

Aquilo que importa, de verdade, para Jesus, é a BONDADE com todos e FAZER O BEM a toda pessoa que estiver necessitada e ao nosso alcance. 

O Evangelho deste domingo, inclui, também, uma terrível advertência contra aqueles que, mesmo fazendo parte do grupo de Jesus, mesmo se considerando seus seguidores, trazem consigo a mentalidade deste mundo! E do que se trata? Essa mentalidade é aquela que faz com que alguém se sinta superior aos demais, mais importante que os outros, mais especial que seus semelhantes. Provocando, com essa atitude, o tropeço, a queda, a incredulidade naqueles que são humildes, pobres, marginalizados, esquecidos e descartados pela sociedade. 

E quantas vezes isso já não aconteceu em nossa Igreja? Quantos escândalos, quantas omissões, quanto apego ao dinheiro, à fama, ao poder, à glória não fizeram com que muitos se afastassem ou nem se aproximassem da Igreja?! Quem fizer isso, quem assim proceder, estará se condenando de maneira terrível, afirma Jesus! 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Senhor Jesus, no Evangelho manifestas a tua tolerância e paciência. Mas tu sabes quanto desprezamos, marginalizamos os fracos, os expomos ao perigo de perder a fé. Se nós somos os fortes, concede-nos, Senhor, suportar a enfermidade dos fracos sem pensar em nós mesmos, mas facilitando o caminho para o bem de quem tem passo vacilante. Tu, Deus e Senhor, feito homem fraco como nós, oraste por nós e te aniquilaste e com amor inconcebível tomaste sobre ti os insultos dos pecadores. Concede-nos os teus próprios sentimentos, Cristo Jesus, para que, com um só ânimo e uma só voz rendamos glória a Deus Pai e nos acolhamos uns aos outros como tu nos acolheste. Então, ficaremos felizes em ficar sem uma mão, um pé ou um olho, apenas para evitar um tropeço aos pequenos que creem em teu nome, mas estaremos dispostos a doar tudo a favor deles, como tu fizeste sobre a cruz por cada um de nós. Amém.» 

(Fonte: Carlos Mesters. 26ª Domenica del Tempo Ordinario. In: Anthony Cilia, O.Carm. [Org.] Lectio Divina sui vangeli festivi per l’anno litúrgico B. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 554.)

Fonte: Commento al Vangelo di P. Alberto Maggi – XXVI Domenica del Tempo Ordinario – 30 settembre 2018 – Internet: clique aqui (acesso em: 23/09/2021).

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Está difícil “esperançar”

 Educação em tempos bolsonarísticos

 Renata Cafardo

Repórter especial do jornal “O Estado de S. Paulo” e fundadora da Associação de Jornalistas de Educação (JEDUCA) 

O Brasil deixou as escolas fechadas por mais tempo, não aumentou seus investimentos em educação durante a pandemia e ainda tem o pior piso salarial do professor

PAULO FREIRE: 1921 - 2021 - Centenário de nascimento

Mesmo em dia de centenário de Paulo Freire, fica difícil “esperançar”, como dizia o educador. Relatórios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgados na semana passada mostram que:

a) o País deixou as escolas fechadas por mais tempo,

b) não aumentou seus investimentos em educação durante a pandemia como outras nações e

c) ainda tem o pior piso salarial do professor. 

Somam-se a essas novas constatações outros alertas dados o ano todo:

* sobre prejuízos de aprendizagem das crianças brasileiras que nos farão andar décadas para trás.

* Sobre os milhões de estudantes que não tiveram nenhuma atividade escolar, online ou presencial, durante a pandemia.

* Sobre as meninas e os meninos que desistiram da escola, mesmo remota, para trabalhar. 

MILTON RIBEIRO: pastor presbiteriano e atual Ministro da Educação

Mas o insensível ministro da educação e pastor Milton Ribeiro não está preocupado que o Banco Mundial diga que o desenvolvimento econômico do Brasil será muito prejudicado por causa da situação atual. Ao contrário, enfureceu-se semana passada por ter “jogado no lixo” o dinheiro que colocou no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para pagar isenções de estudantes carentes que acabaram faltando à prova por causa da covid, em janeiro. Negou-se a dar gratuidade novamente a eles, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) ordenou que o fizesse. Ribeiro então achou por bem humilhar mais um pouco os já humilhados jovens que nem sequer podem pagar R$ 85 para fazer o Enem. 

Enquanto isso, durante a pandemia, países como Portugal e França contrataram milhares de professores para ajudar no enfrentamento da covid nas escolas, tanto para substituir os afastados como para dividir turmas. Aqui, o Ministério da Educação de Jair Bolsonaro parece que não tem nada a ver com o professorado. Só aparece para criticar quando acredita que, por não jogarem pedras em Paulo Freire, estão todos querendo manipular a cabecinha de seus alunos para a esquerda. 

O relatório da OCDE mostrou que o Brasil paga um piso salarial equivalente a 13 mil dólares norte-americanos anuais, enquanto na Alemanha são US$ 70 mil. Chile e Colômbia também tem melhores salários: US$ 20 mil anuais. A pandemia ainda exigiu desafiadoras aptidões dos trabalhadores mais mal pagos entre os 40 países estudados. Tiveram de aprender a ensinar pelo celular. E com os pais ao lado, alguns reclamando da aula, metendo o bedelho, dizendo que a prova está difícil. 

O Brasil deixou suas escolas fechadas por mais tempo, 178 dias! Enquanto que a média de dias fechados nos 40 países que a OCDE pesquisou foi de 48 dias

A maior crise educacional recente não foi suficiente pra que o governo brasileiro acreditasse que era preciso investir mais na área:

a) Houve cortes nas universidades federais, que já tinham seus orçamentos reduzidos e trabalharam em pesquisas sobre covid.

b) Com muito atraso, o MEC apresentou apenas parcos programas de ajuda às escolas públicas no período.

Segundo a OCDE, dois terços das nações aumentaram seus investimentos em educação durante a pandemia. 

Por aqui, preferimos deixar as escolas fechadas por 178 dias – outro recorde mundial – e torcer para que tudo voltasse ao seu rumo quando a tempestade passasse. Em setembro de 2021, ainda há cidades que não abriram um só dia sua educação desde março de 2019. 

Está óbvio que países que já tinham a educação de pior qualidade, não só vão aumentar essa desigualdade como também a distância que estavam das nações desenvolvidas. No Pisa, o exame internacional feito pela OCDE, os estudantes brasileiros já não chegavam nem perto do desempenho da média dos colegas de outros países. 

“Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda.”

Paulo Freire, 100 anos.

 

No centenário de Paulo Freire, Universidade de Columbia anuncia eventos

 Renata Cafardo 

Universidade em Nova York vai destacar obra de brasileiro, pioneiro em temas atuais como equidade, gênero e educação antirracista

UNIVERSIDADE COLUMBIA, em Nova York, Estados Unidos, promove uma série de eventos e concede apoio financeiro para pesquisas e debates sobre o pensamento de Paulo Freire

Aos 100 anos, Paulo Freire é atual. Com essa convicção, uma das maiores universidades do mundo, a Columbia, em Nova York, anuncia hoje [19 de setembro], no centenário do educador brasileiro, uma série de eventos e incentivos para pesquisa sobre o seu trabalho. “Equidade, educação antirracista, gênero, a preocupação com diferentes camadas de opressão e exploração são temas com muita força na academia atualmente. E foram explorados há muitas décadas por Freire”, diz o professor de Columbia Paulo Blikstein, que é brasileiro. 

Ele é um dos idealizadores da Paulo Freire Iniciative, organizada pelo Teachers College, pelo Centro Lemann e pelo Institute of Latin American Studies (ILAS), todos de Columbia. No texto que apresenta a iniciativa, ao qual o Estadão teve acesso com exclusividade, a universidade americana lembra que Freire tem “um legado impressionante” que ajudou a promover “equidade e justiça social, missões alinhadas com as da Columbia”. 

Paulo Freire nasceu em 19 de setembro de 1921, no Recife, e passou a vida defendendo uma educação que transformasse o mundo. Criou um método de alfabetização de adultos, que deu certo em Angicos, Rio Grande do Norte, mas logo foi perseguido pela ditadura militar e teve de deixar o País. No exílio, suas ideias se espalharam e começou a consagração internacional. Voltou ao Brasil em 1979 e foi secretário de Educação na Prefeitura de Luiza Erundina. Freire foi um dos pioneiros de uma pedagogia crítica, preocupada em formar cidadãos. 

Um dos livros mais lidos, citados e comentados de Paulo Freire

Seu livro Pedagogia do Oprimido, de Freire, é o terceiro mais citado de todos os tempos em pesquisas da área de ciências sociais. Mais até que A Interpretação dos Sonhos, de Sigmund Freud. Freire morreu em 1997, aos 75 anos. 

Por ignorância ou desconhecimento, o mais célebre educador brasileiro foi associado em tempos de bolsonarismo ao comunismo ou a uma educação partidária. Tornou-se um dos principais alvos de ataques de grupos de apoio, ministros da Educação e do próprio presidente da República, Jair Bolsonaro.

A Universidade Columbia vai financiar estudantes que queiram pesquisar sua obra. Segundo Blikstein, a ideia é criar uma comunidade, que não precisa ser só de brasileiros. Haverá também um trabalho de advocacy em outras instituições do mundo para manter vivo o trabalho do brasileiro. 

Os primeiros eventos serão em 3, 4 e 10 e 11 de novembro com nomes da cultura e educação brasileiros e estrangeiros que vão discutir o legado de Freire em vários aspectos. Ele será online e aberto ao público em geral. E a partir de 2022 todo dia 19 de setembro terá uma palestra especial em homenagem ao educador na Columbia. 

PAULO BLIKSTEIN - professor na Universidade Columbia, de Nova York, brasileiro de nascimento, é um dos idealizadores da iniciativa

“Num momento no qual o País se encontra tão polarizado, precisamos contribuir para que setores da sociedade brasileira compreendam que Paulo Freire é um intelectual sofisticado, com propostas concretas para a educação de crianças, jovens e adultos”, diz o aluno brasileiro de doutorado da Columbia, Danilo Fernandes Lima da Silva, de 34 anos, que também organiza a iniciativa. 

Blikstein diz que a ideia dos eventos e pesquisas não é apenas repetir as ideias de Freire.

“Ele sempre falava que ele não queria ser um fóssil, queria que o reinventassem, então é repensar, significar o que ele falou, mas antenado no mundo atual.”

A ideia dos organizadores é ampliar a iniciativa ao longo dos anos com mais seminários, publicações e bolsas de estudo. 

A neta de Paulo Freire, Sofia Freire, diz que está esperançosa por mudanças no País com a chegada do centenário do avô. Ela conta que, desde que voltou ao Brasil há três anos, depois de morar em Barcelona, convive com ataques a Freire. Sofia acaba de criar o coletivo independente Esperanzar (referência à palavra célebre do educador, que dizia que era preciso ter esperança e agir e, não, só esperar) para fomentar e assessorar ações transformadoras com movimentos sociais e atores culturais urbanos periféricos. 

Uma das iniciativas é um mural imenso em um prédio na Avenida Pacaembu, na zona oeste, com uma foto de Freire e a frase:

Esperançar: Amar é um ato de coragem.

A expectativa é de que a obra, feita pelo artista Raul Zito, fique pronta hoje. “Escolhemos uma frase amorosa, não queremos partir para o conflito. Queremos gerar emoção e, se der para partir para a ação, melhor ainda”, diz Sofia.

 

Paulo Freire não era comunista, era crítico, diz biógrafo

 O tiro saiu pela culatra

 Renata Cafardo 

Entrevista com Sérgio Haddad

Biógrafo de Paulo Freire 

De acordo com o pesquisador Sérgio Haddad, o educador era uma pessoa de esquerda, mas não se alinhava a nenhum governo autoritário

SÉRGIO HADDAD

O pesquisador Sérgio Haddad, biógrafo de Paulo Freire, acredita que os ataques que surgiram no governo de Jair Bolsonaro ajudaram a impulsionar a busca por conhecimento sobre o educador. 

Há um entendimento equivocado de quem foi Paulo Freire?

Sérgio Haddad: Tem muita desinformação na crítica, por exemplo, ele nunca foi comunista. Era, sim, uma pessoa de esquerda, estava do lado dos mais pobres, mas não se alinhava a nenhum governo autoritário, foi crítico com os comunistas. Mas há aqueles que não querem saber, criticam porque foi secretário do PT. 

Onde é possível ver Freire nas escolas atuais?

Sérgio Haddad: Nas escolas mais participativas, que trazem o conhecimento dos alunos para a sala de aula. Freire fala que se um professor passa um ano dando a sua aula e no fim ele é o mesmo, algo está errado. Esse estímulo a refletir no processo educativo é freireano. 

Livro publicado pela TODAVIA, em agosto de 2019 - obra fundamental para compreender a trajetória desse educador brasileiro, mais lido e pesquisado no exterior que no Brasil!

Os ataques o enfraqueceram?

Sérgio Haddad: Acho que a quantidade de eventos, de textos, que vem sendo feitos foi também muito impulsionada por essa conjuntura. Desde a campanha, com ministros da Educação atuais, foi surgindo um movimento em defesa do legado de Freire e de debate sobre seu pensamento e obra. Se ele estivesse vivo, seria uma voz muito forte para confrontar o que está ocorrendo. Ninguém é obrigado a gostar dele, mas respeitar seu reconhecimento internacional seria uma forma de respeito à ciência. 

O que será que ele diria sobre Bolsonaro?

Sérgio Haddad: Ele estaria muito bravo, estaria verbalizando uma raiva, mas também o “esperançar”. A importância de saber que o futuro não é inexorável. 

Fonte: O Estado de S. Paulo – .Edu – Domingo, 19 de setembro de 2021 – Pág. A14 – Internet: clique aqui; aqui e aqui (Acesso em: 23/09/2021).

sábado, 18 de setembro de 2021

25º Domingo do Tempo Comum – Ano B – HOMILIA

 Evangelho: Marcos 9,30-37 

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Marcos. Naquele tempo: 30 Jesus e seus discípulos atravessavam a Galileia. Ele não queria que ninguém soubesse disso, 31 pois estava ensinando a seus discípulos. E dizia-lhes: «O Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos homens, e eles o matarão. Mas, três dias após sua morte, ele ressuscitará». 32 Os discípulos, porém, não compreendiam estas palavras e tinham medo de perguntar. 33 Eles chegaram a Cafarnaum. Estando em casa, Jesus perguntou-lhes: «O que discutíeis pelo caminho?» 34 Eles, porém, ficaram calados, pois pelo caminho tinham discutido quem era o maior. 35 Jesus sentou-se, chamou os doze e lhes disse: «Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!» 36 Em seguida, pegou uma criança, colocou-a no meio deles, e abraçando-a disse: 37 «Quem acolher em meu nome uma destas crianças, é a mim que estará acolhendo. E quem me acolher, está acolhendo, não a mim, mas àquele que me enviou».

Palavra da Salvação. 

Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano

Quem mais serve, mais próximo de Cristo está 

Jesus anuncia três vezes a sua paixão aos discípulos e cada vez é uma ocasião de conflito, de incompreensão, como vemos neste segundo anúncio, no capítulo 9 do Evangelho de Marcos, versículos 30-37. Diz o Evangelho: «Jesus e seus discípulos atravessavam a Galileia. Ele não queria que ninguém soubesse disso», eles têm uma ideia errada do messias, acham que o messias vai a Jerusalém para tomar o poder. Então Jesus não quer que as pessoas conheçam esse conceito errado. 

Prossegue dizendo o Evangelho: «estava ensinando a seus discípulos. E dizia-lhes: “O Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos homens, e eles o matarão”». De fato, é a segunda vez que Jesus “ensina” sobre sua paixão. O “Filho do Homem” é o homem que tem a condição divina, ou seja, o homem com o Espírito que atinge a plenitude de sua humanidade. Em contraste com o Filho do Homem, que é o homem em plenitude, há homens que não têm o Espírito, que não atingiram a maturidade de vida, e eles vão matar Jesus, eles não podem suportar o plano de Deus para a humanidade. 

O Evangelho nos diz, ainda: «“Mas, três dias após sua morte, ele ressuscitará”. Os discípulos, porém, não compreendiam estas palavras e tinham medo de perguntar». O número 3 indica que Jesus ressuscitará completamente, totalmente. Jesus falou muito claramente, não falava por parábolas. Não é que seus discípulos não entendessem suas palavras, eles as entendiam bem, mas eles não querem que Jesus explique o que eles realmente tinham compreendido, ou seja, que Jesus enfrentará o desastre em Jerusalém. E aqui se dá, novamente, a reprovação que Jesus já havia feito aos discípulos que têm ouvidos, mas não entendem. 

Prossegue o Evangelho: «Eles chegaram a Cafarnaum. Estando em casa, Jesus perguntou-lhes: “O que discutíeis pelo caminho?”» Jesus os questionou, eles têm medo de questioná-lo, mas Jesus não! Ele pergunta o que eles vinham falando pelo caminho. Recordando, quando o evangelista Marcos coloca a indicação do “caminho”, ele sempre se refere à parábola dos quatro terrenos, onde a semente lançada pelo caminho é a semente imediatamente comida pelos pássaros, que eram a imagem de Satanás e Satanás é o poder.

Aqueles que nutrem sentimentos de ambição acima dos outros e de sucesso são refratários à palavra do Senhor.

O Evangelho nos diz: «Eles, porém, ficaram calados, pois pelo caminho tinham discutido quem era o maior. Jesus sentou-se, chamou os Doze e lhes disse: “Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!”» Os discípulos continuam com essa ideia de hierarquia, posição, superioridade e não entendem a mensagem de Jesus. Jesus se coloca na posição de mestre, sentado. O evangelista afirma que Jesus “chamou os Doze”, é estranho, ele está em uma casa palestina, uma casinha, porque é que Jesus teve que chamá-los? Porque estão longe, sim, estão fisicamente próximos, mas estão distantes, seus discípulos o acompanham, mas na realidade não o seguem. E, quando Jesus começa dizendo “Se alguém”, o evangelista constrói a expressão como o convite que Jesus fez sobre a cruz: “se alguém quer vir atrás de mim”, então é uma questão de seguimento.

Não, na comunidade de Jesus não há pessoas superiores, mas pode haver o primeiro, ou seja, aquele mais próximo dele.

Nesse caso, quanto mais a pessoa se fizer a última, a serva de todos, mais estará próxima a Jesus! Aqui o evangelista usa o termo grego “diaconos”: enquanto servo (doulos) é aquele que é obrigado a servir, diaconos” é aquele que, livre e voluntariamente, por amor, se põe a serviço dos outros. 

O evangelista continua: «pegou uma criança, colocou-a no meio deles, e abraçando-a disse: “Quem acolher em meu nome uma destas crianças, é a mim que estará acolhendo. E quem me acolher, está acolhendo, não a mim, mas àquele que me enviou”». Enquanto que, os Doze tiveram que ser chamados, aqui, Jesus pega uma criança, toma alguém que está perto dele. O termo usado pelo evangelista indica um rapazinho, o qual, devido à sua idade e importância, é o último na sociedade judaica, estando a serviço de todos. O Evangelho diz que Jesus “o colocou no meio”, indicando que o rapazinho ocupa o lugar dele. Portanto, Jesus coloca no meio, em destaque, aquele que serve. Ao abraçar o rapazinho, o servidor de todos, Jesus se identifica plenamente com ele. E diz que devemos nos identificar, também, com aqueles rapazinhos, os quais, com a sua atitude de serviço, são a imagem do verdadeiro discípulo de Jesus! Porque é disso que se trata, quem acolhe esses pequenos “em nome” dele, é a ele que está acolhendo, e quem o acolhe, acolhe o Pai, que o enviou. Jesus assegura que o serviço voluntariamente exercido é aquele que identifica o indivíduo com ele e que é o acolhimento dos menores da sociedade que permite a presença contínua do Pai na comunidade. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

Impressiona constatarmos o contraste que havia entre Jesus e seus discípulos, aqueles que andavam mais próximos ao mestre. É, ainda mais, impressionante percebermos como o evangelista não esconde a covardia, o medo e incoerências que os discípulos manifestam a todo momento! E eles eram reconhecidos como as testemunhas oficiais da ressurreição de Cristo (cf. 1Cor 15,5), representavam as doze tribos do “novo Israel” que era a Igreja (cf. Mt 19,28; Lc 22,30; At 26,7; Ap 21,12). A sua forma de vida e trabalho era conhecida (cf. 1Cor 9,4-5). 

Portanto, a esses homens a quem a Igreja nascente tanto devia, não se tratou de modo privilegiado! O Evangelho é bem honesto em deixar transparecer todos os seus limites e imperfeições! Com isso, o Evangelho está nos dizendo, que:

“... o melhor para a Igreja não é a boa imagem de seus dirigentes, mas a verdade e a transparência do que cada qual vive no seguimento de Jesus” (José María Castillo).

Na Igreja primitiva, e isso é bom saber, a liberdade de falar com clareza, sem nada ocultar (em grego: parresía) teve uma importância singular na vivência da fé. Pena que, nos tempos que correm, em várias ocasiões, a Igreja se preocupe mais em “ocultar”, em preservar a “boa imagem” de si mesma e de sua hierarquia, ao invés de viver de modo transparente, obtendo, assim, mais credibilidade! 

Podemos tentar fazer uma paródia do que o Evangelho deste domingo nos narra. Se, nos tempos de Jesus, os discípulos perdiam tempo, energia e foco discutindo e disputando entre si, a fim de ver quer seria o mais importante, o mais poderoso, o mais influente; nos dias atuais, há muitos membros da hierarquia católica que desperdiçam tempo precioso, energias, inteligência e foco com questões secundárias, enquanto o nosso povo, está faminto de pão e da Palavra de Deus! 

Hoje, o nosso povo, também, se parece com “ovelhas sem pastor”, como Jesus constatou em sua época. No Brasil, voltou com força total e incrível velocidade: a fome, a miséria, o desemprego, a inflação, a fuga da escola, a fuga de talentos do nosso país, a ignorância, a superstição, a falsa fé cristã etc. etc. etc. 

E nós, vamos ficar assistindo a tudo isso sem tomarmos iniciativas, sem nos envolvermos, sem nos sensibilizarmos? Jesus está nos exortando, tal como fez aos seus discípulos: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mc 6,37 e paralelos).


 Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Senhor Jesus, no evangelho de salvação, colocaste para nosso modelo um rapazinho: é o homem não realizado, pequeno, indefeso, insuficiente para si e para as necessidades dos outros. Tu te fazes presente em um pequeno para indicar-nos que estás presente aonde existe incompletude e limite. Servir, hoje, significa acolher, cuidar, prestar serviços, dar espaço à comunhão de vida. Tu nos ensinas que o acolhimento deve ser vivido como sinal de amor, um amor feito de gestos concretos que suscitam a consciência de ser amados. Achamos difícil pegar o avental para servir, preferimos dá-lo aos outros e nosso amor continua parcial. Concede-nos deixar-nos penetrar pela tua Palavra e de nos descobrirmos pequenos diante de ti, necessitados de teu auxílio e de teu amor. Providencia para que levemos sempre conosco um jarro d'água, uma bacia, uma toalha e um avental. Amém.» 

(Fonte: Carlos Mesters. 25ª Domenica del Tempo Ordinario. In: Anthony Cilia, O.Carm. [Org.] Lectio Divina sui vangeli festivi per l’anno litúrgico B. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 544.)

Fonte: Commento al Vangelo di P. Alberto Maggi – XXV Domenica del Tempo Ordinario – 23 settembre 2018 – Internet: clique aqui (acesso em: 16/09/2021).