Evangelho: Marcos 7,31-37
Proclamação do Evangelho de
Jesus Cristo segundo Marcos. Naquele tempo: 31 Jesus saiu de novo da região de Tiro, passou
por Sidônia e continuou até o mar da Galileia, atravessando a região da
Decápole. 32 Trouxeram então
um homem surdo, que falava com dificuldade, e pediram que Jesus lhe impusesse a
mão. 33 Jesus afastou-se com o
homem, para fora da multidão; em seguida colocou os dedos nos seus ouvidos, cuspiu
e com a saliva tocou a língua dele. 34
Olhando para o céu, suspirou e disse: «Efatá!», que quer dizer: «Abre-te!» 35 Imediatamente seus ouvidos se abriram, sua
língua se soltou e ele começou a falar sem dificuldade. 36 Jesus recomendou com insistência que não
contassem a ninguém. Mas, quanto mais ele recomendava, mais eles divulgavam. 37 Muito impressionados, diziam: «Ele tem
feito bem todas as coisas: Aos surdos faz ouvir e aos mudos falar».
Palavra da Salvação.
Alberto
Maggi *
Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado
biblista italiano
Jesus abre nossos ouvidos
para ouvir os novos tempos
A dificuldade e resistência por parte dos discípulos em
aceitar que a Boa Nova, a mensagem de Jesus é também dirigida aos pagãos, são
narrados pelo evangelista Marcos em um episódio que só ele tem. É o sétimo
capítulo, versículos 31-37, que lemos. Lemos: «Jesus
saiu de novo da região de Tiro, passou por Sidônia e continuou até o mar da
Galileia, atravessando a região da Decápole». Basta olhar para
qualquer mapa geográfico para ver que se trata de um itinerário absurdo,
improvável, porque Jesus parte de Tiro, já tinha ido para terras pagãs, sobe
para o norte como podemos ver no mapa geográfico, até Sidônia, então desce para
ir ao mar da Galileia, mas faz um amplo passeio passando pela Decápole, ou
seja, pelas cidades pagãs. Por que isso? O evangelista não quer indicar um
itinerário topográfico, mas teológico:
... a ação de Jesus, a da boa nova, abraça todo o mundo pagão e é
aqui que
encontra resistência.
Neste episódio, o evangelista, através da figura do surdo-gago,
representa a resistência dos discípulos. São surdos, não aceitam a mensagem
de Jesus e por isso não podem expô-la.
Diz o Evangelho: «Trouxeram então
um homem surdo», ele não é mudo, «falava
com dificuldade», a referência é ao profeta Isaías, no capítulo 35
onde ele fala do êxodo, da libertação: «e pediram
que Jesus lhe impusesse a mão». Pois bem, Jesus não lhe impõe a sua
mão, a situação é muito mais grave e Jesus age quase com violência, lemos: «tomando-o à parte». Esta expressão «à
parte» das sete vezes que aparece no Evangelho de Marcos, nada menos que seis
vezes se relaciona aos discípulos. Portanto, sob a figura desse
surdo-gago, o evangelista pretende representar a resistência por parte dos
discípulos de Jesus.
Diz o Evangelho: «para fora da
multidão; em seguida colocou os dedos nos seus ouvidos»,
literalmente enfiou, ou seja, desarrolhou os dedos nos ouvidos. Aqui o
evangelista usa o termo grego «ota» que indica o órgão físico. Prossegue
o Evangelho: «cuspiu e com a saliva»,
acreditava-se que a saliva era respiração condensada e era uma imagem do
Espírito. Segue o Evangelho: «tocou a língua dele.
Olhando para o céu»; o céu representa a esfera divina. Prossegue: «suspirou»; é só aqui no Novo Testamento
que Jesus suspira. É a resistência, o esforço que Jesus faz para compreender
que o Reino de Deus não conhece fronteiras, não constrói muros, mas abre
portas a todos.
Ele disse: «Efatá!».
Quando, no evangelho de Marcos, são utilizadas palavras em aramaico, a língua
falada naquela época, significa que o episódio diz respeito aos discípulos
de Jesus que eram dessa língua, e é um imperativo, «abre-te».
O imperativo é dirigido a todo indivíduo: se fosse dirigido aos ouvidos do
surdo, Jesus deveria ter dito «abri-vos», em vez disso é o homem que deve
abrir-se completamente. O Evangelho diz, então: «Imediatamente»,
finalmente, «seus ouvidos se abriram»,
e, aqui, o evangelista para expressar «ouvidos», ele não usa o termo usado
antes, mas um outro termo «acuai», que indica a audição, a
compreensão.
Esse era o problema, não era um problema físico, era um problema de
compreensão.
O texto evangélico segue dizendo: «sua
língua se soltou e ele começou a falar sem dificuldade»; aqui, a
referência é tirada do capítulo 35 do profeta Isaías, onde fala da libertação,
do êxodo do cativeiro. Isaías escreve: «Então os olhos dos cegos se abrirão
e os ouvidos dos surdos se abrirão, então o coxo pulará como um cervo e a
língua do mudo gritará de alegria» (Is 35,5). Portanto, o evangelista
vê, na ação de Jesus, essa libertação que ele traz consigo.
O Evangelho traz: «Jesus
recomendou com insistência», a esses portadores, «que não contassem a ninguém». Continua: «Mas, quanto mais ele recomendava, mais eles divulgavam.
Muito impressionados, diziam:»; no entanto, aqui, a reação é
estranha porque Jesus curou um surdo e mudo, mas a fala se estende a
todos, o plural indica que diz respeito aos discípulos: «Ele tem feito bem todas as coisas»; o termo «bem»
é retirado do livro do Gênesis [1,31], da criação, portanto vemos na
atividade de Jesus o prosseguimento da ação criadora do Pai: «Aos surdos faz ouvir e aos mudos falar».
Portanto, a atividade de Jesus é libertar esses discípulos desses
preconceitos nacionalistas e religiosos que os fechavam aos pagãos.
Mas por que Jesus proíbe? Para evitar um entusiasmo fácil,
o caminho ainda será longo e, mais adiante, Jesus terá que censurá-los
dizendo: «Tendo olhos, não vedes, e tendo ouvidos, não ouvis?» [Mc 8,18 –
citando Jr 5,21], o caminho é longo.
*
Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.
Reflexão Pessoal
Pe.
Telmo José Amaral de Figueiredo
Uma das coisas mais difíceis,
mais desafiadoras da vida é a COMUNICAÇÃO! Saber comunicar-se não é algo banal
e natural a todas as pessoas! E, por comunicação, não entendemos, somente,
saber dizer algo, expressar algo, fazer ver algo. Por comunicação entende-se,
aqui, conseguir fazer com que a PALAVRA proferida seja capaz de ser ACOLHIDA,
RECEBIDA, COMPREENDIDA. Significa fazer da PALAVRA um instrumento útil para
atingir, em sentido profundo, o(a) nosso(a) interlocutor(a).
Do modo como expressou
Isaías (55,10-11): “Tal como a chuva e a neve descem do céu e para lá não
voltam antes de inebriar a terra, tornando-a fecunda e fazendo-a germinar
produzindo semente para quem semeia e pão para quem come, assim acontece com a minha
palavra, que sai da minha boca: não voltará para mim vazia, mas fará tudo
aquilo que decidi, realizando a missão para a qual a enviei”.
Porém, para que haja uma verdadeira
comunicação, é necessário que as partes tenham um “código” em comum,
isto é, a fala, os gestos, as imagens, a escrita
devem ser compreensíveis, condivisíveis por ambas as partes envolvidas no
processo comunicacional. Por isso, os discípulos tiveram dificuldade de
compreender Jesus! Eles estavam dominados pela comunicação que se dava entre
os judeus, na qual eles se sentiam um povo único, exclusivo, especial,
privilegiado diante das demais nações. Eles não conseguiam dar o passo que
Jesus tanto desejava: abrir-se ao OUTRO, abrir-se ao DIFERENTE, abrir-se
ao NOVO.
Esse “outro”, esse
“diferente” eram os pagãos, os não-judeus, aqueles que não se
comunicavam com os mesmos “códigos” que os discípulos, os judeus: normas de
pureza e impureza, normas cultuais, normas comportamentais etc. Apenas se
colocando no lugar deles, abrindo-se a eles, como Jesus ordenou no
Evangelho deste domingo, seria possível estabelecer-se a COMUNICAÇÃO.
Será que não seria essa a
mesma barreira que nos impede de comunicar-nos, de verdade, com tantos seguimentos
da sociedade dos quais permanecemos distantes, surdos e mudos? Refiro-me da
nossa surdez e mudez diante da JUVENTUDE, diante dos MISERÁVEIS/DESCARTADOS,
diante dos INTELECTUAIS, diante do EMPRESARIADO, diante dos COMUNICADORES,
diante de vários PROFISSIONAIS LIBERAIS etc.
Reflitamos a respeito e
inspiremo-nos nas atitudes e palavras de Jesus!
Oração após a meditação do Santo Evangelho
«Senhor
Jesus, tu que fizeste ouvir os surdos e falar os mudos, dize-nos como fizeste
ao surdo-mudo: “Effatá!”: abre-te! Então, os nossos ouvidos se abrirão e a
nossa língua se soltará e o coração saberá ser teu discípulo e testemunha do
teu amor. Envia teu Espírito, para ajudar-me a ler a Escritura com o mesmo
olhar com o qual tu a leste para os discípulos no caminho para Emaús. Cria em
nós o silêncio para escutar a tua voz, a tua Palavra nos oriente, para que, como
os dois discípulos de Emaús, também nós possamos experimentar a força da tua
ressurreição e testemunhar aos outros que tu estás vivo no meio de nós como
fonte de fraternidade, de justiça e de paz. Amém.»
(Fonte: Carlos Mesters. 23ª Domenica del
Tempo Ordinario. In: Anthony Cilia, O.Carm. [Org.] Lectio Divina sui vangeli
festivi per l’anno litúrgico B. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 523.)
Fonte: Commento al Vangelo di P. Alberto Maggi – XXIII
Domenica del Tempo Ordinario – 9 settembre 2018 – Internet: clique aqui (acesso em: 26/08/2021).
Comentários
Postar um comentário