«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sábado, 30 de junho de 2018

Solenidade de São PEDRO e São PAULO, Apóstolos – Homilia

Evangelho: Mateus 16,13-19

Naquele tempo:
13 Jesus foi à região de Cesareia de Filipe e ali perguntou aos seus discípulos: «Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?»
14 Eles responderam: «Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias; Outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas».
15 Então Jesus lhes perguntou: «E vós, quem dizeis que eu sou?»
16 Simão Pedro respondeu: «Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo».
17 Respondendo, Jesus lhe disse: «Feliz es tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu.
18 Por isso eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e o poder do inferno nunca poderá vencê-la.
19 Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus;
tudo o que tu desligares na terra será desligado nos céus».

O ABRAÇO DE PEDRO E PAULO

Esta solenidade reúne em uma só celebração a Pedro, que segundo os evangelhos sinóticos [Mt, Mc e Lc] foi o primeiro apóstolo chamado por Jesus, a «rocha» da Igreja, e a Paulo, que sem ser discípulo de Jesus nem fazer parte dos Doze lhe coube a honra de ser considerado o missionário por excelência e de receber o título de «o Apóstolo». Os escritos do Novo Testamento não descrevem a morte deles, porém uma antiga tradição recorda que ambos padeceram o martírio em distintos lugares da cidade de Roma no mesmo dia; duas vidas oferecidas em sacrifício por Jesus e pelo Evangelho. Ambos apóstolos estão, assim, unidos na celebração litúrgica, ainda que suas histórias terrenas não estejam isentas de mútuos enfrentamentos (cf. Gl 2,11-14). Sua comunhão, vivida na parrésia [franqueza, coragem] evangélica, nem sempre foi fácil.

 Simão Pedro era um pescador de Betsaida de Galileia, um homem que alimentava sua fé principalmente no culto sinagogal dos sábados; desde que foi chamado por Jesus, sua fé começou a nutrir-se do ensinamento daquele mestre que falava como ninguém havia jamais falado. Sempre ao lado de Jesus, aparece em ocasiões como porta-voz dos outros discípulos, entre os que ocupava uma posição proeminente. Não se pode falar da história de Jesus sem mencionar Pedro, que foi o primeiro que ousou confessar a fé em Jesus como Messias. Os discípulos, como muitos entre a multidão, se perguntavam se Jesus seria um profeta, inclusive «o» Profeta dos últimos tempos (cf. Jo 6,14; 7,40), ou se acaso seria o Cristo, o Messias. A confissão pública de Pedro se deveu a uma força interior, uma revelação que somente podia vir de Deus. Crer que Jesus é o Messias, o Filho de Deus, não é possível a partir unicamente da interpretação das Escrituras. Foi Deus mesmo quem revelou a Pedro a identidade de Jesus, e este, por sua vez, reconheceu em Simão a pedra sobre cuja fé pode assentar a Igreja.

Porém, Pedro, qualificado como «bem-aventurado» por Jesus, não estará isento de ser infiel ao seu Senhor. Imediatamente depois dessa confissão de fé, manifestará seu pensamento demasiado mundano acerca do caminho de Jesus que conduz à paixão, até o ponto de que este se verá obrigado a chamá-lo de «Satanás» (Mt 16,23) e, ao final da vida terrena de Jesus, declarará três vezes jamais tê-lo conhecido (cf. Mt 26,69-75): o medo e a vontade de salvar a si mesmo o empurram a afirmar que «não conhece» esse Jesus, um conhecimento que Pedro havia recebido nada menos que de Deus. E Jesus lhe havia garantido que rogaria por ele para que sua fé não fraquejasse (cf. Lc 22,32). Depois da ressurreição, no entanto, Jesus o confirmará em seu posto, ainda que exigindo-lhe confessar por três vezes que o amava: «Simão, filho de João, tu me amas?» (Jo 21,15.16.17). À raiz precisamente desta pergunta, Pedro se converterá no apóstolo de Jesus Cristo, o pastor de suas ovelhas, primeiramente em Jerusalém, depois nas comunidades judias da Palestina, continuando em Antioquia e, finalmente, em Roma, onde, a exemplo de seu Senhor e Mestre, entregará sua vida. E, em Roma, Pedro encontrará Paulo, não sabemos se no dia a dia do testemunho cristão, ainda que certamente no grande sinal do martírio. 
SÃO PAULO - retratado em mosaico da cidade de Ravenna, na Itália
Paulo é o apóstolo diferente, colocado junto a Pedro em sua alteridade, como para garantir que a Igreja, desde seus primeiros passos, seja plural e se nutra da diversidade. Judeu da diáspora, originário de Tarso, foi a Jerusalém para fazer-se escriba e rabino na escola de Gamaliel, um dos mais famosos mestres da tradição rabínica. Paulo era fariseu, experto e zeloso da Lei de Moisés, e não conheceu Jesus nem seus primeiros discípulos, chegando, inclusive, a se destacar na perseguição do nascente movimento cristão. No caminho de Damasco, ele se encontrou também com Jesus Ressuscitado, converteu-se e recebeu a revelação, como ele mesmo confessa: «Deus, porém, se dignou revelar-me o seu Filho (Gl 1,15-16).

Paulo define-se a si mesmo como um «aborto» (1Cor 15,8) comparado com os demais apóstolos, que haviam visto o Senhor ressuscitado, porém exige ser considerado como enviado de Jesus Cristo igual a eles, porque pôs sua vida a serviço do Evangelho, fez-se imitador de Cristo também em seus sofrimentos, entregou-se a viagens apostólicas por todo o Mediterrâneo. Sua paixão, sua inteligência, seu empenho em anunciar o Senhor Jesus aparecem em todas as suas cartas assim como nos Atos dos Apóstolos. Ele é o «apóstolo dos gentios» (Rm 11,13), da mesma forma que Pedro é «o apóstolo dos circuncisos» (Gl 2,8).

Pedro e Paulo, ambos apóstolos de Cristo ainda que tão diferentes. Pedro, um pobre pescador; Paulo, um rigoroso intelectual. Pedro, um judeu da Palestina de uma obscura aldeia; Paulo, um judeu da diáspora e cidadão romano. Pedro, lento em entender e, por isso mesmo, em atuar; Paulo, consumido pela urgência escatológica... Foram apóstolos com estilos diferentes, viveram a Igreja, às vezes, de modo dialético, se não oposto, porém ambos procuraram seguir o Senhor e sua vontade e, juntos, precisamente graças à sua diversidade, souberam dar um rosto à missão cristã e um fundamento à Igreja de Roma que preside na caridade. Por isso, a iconografia apresenta-os unidos em um abraço ou sustentando entre os dois a única Igreja que juntos contribuíram para construir: uma sinfonia que é memória e profecia da única comunhão eclesial, na que Pedro abraça Paulo e Paulo deve abraçar Pedro.

Traduzido do espanhol por Telmo José Amaral de Figueiredo.

Fonte: Enzo Bianchi. Jesús, «Dios con nosotros» que cumple la Escritura: comentario a los evangelios dominicales del Ciclo A. Salamanca: Ediciones Sígueme, 2010, páginas 213-216.

sexta-feira, 29 de junho de 2018

Necessitamos de uma hierarquia que serve

«Nenhum de nós deve se sentir “superior” a ninguém», nem «olhar os outros de cima para baixo», diz Francisco aos novos cardeais

Andrea Tornielli
Vatican Insider
28-06-2018

São claras e nada fáceis as palavras que o Papa Francisco pronunciou na breve homilia, durante o Consistório público para a criação de 14 novos cardeais
PAPA FRANCISCO
Faz sua homilia durante a celebração do Consistório de nomeação de 14 novos cardeais
Basílica de São Pedro, 29 de junho de 2018

“A maior promoção que pode nos ser outorgada é: servir a Cristo no povo fiel de Deus, no faminto, no esquecido, no encarcerado, no enfermo, no toxicodependente”, e não se deixar corroer por “intrigas asfixiantes que secam e tornam estéril o coração e a missão”. São claras e nada fáceis as palavras que o Papa Francisco pronunciou na breve homilia, durante o Consistório público para a criação de 14 novos cardeais. O Pontífice concluiu com uma citação sobre a pobreza, do testamento espiritual de São João XXIII.

Os novos purpurados [cardeais], um por um, desfilam diante do Papa para receber de suas mãos o barrete vermelho (de cor púrpura, que indica o juramento de servir ao Bispo de Roma e à Igreja usque ad sanguinis effusionem, até o derramamento do próprio sangue), o anel cardinalício e o pergaminho com o “título” que designa a cada um uma igreja paroquial da diocese de Roma, com o qual entram a título pleno no clero romano, ainda que exerçam seu ministério em lugares longínquos.
PAPA FRANCISCO
Coloca o barrete vermelho sobre a cabeça de um recém-nomeado cardeal

Os novos purpurados são:
1. Luis Raphael I Sako, patriarca de Babilônia dos Caldeus, no Iraque;
2. Luis Ladaria Ferrer, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé;
3. Angelo De Donatis, vigário de Roma;
4. Giovanni Angelo Becciu, substituto da Secretaria de Estado;
5. Konrad Krajewski, esmoleiro pontifício;
6. Joseph Coutts, arcebispo de Karachi, no Paquistão;
7. Antonio dos Santos Marto, bispo de Leiria-Fátima;
8. Pedro Ricardo Barreto Jimeno, arcebispo de Huancayo, Peru;
9. Désiré Tsarahazana, arcebispo de Toamasina, Madagascar;
10. Giuseppe Petrocchi, arcebispo de Áquila, Itália;
11. Thomas Aquino Manyo Maeda, arcebispo de Osaka, Japão.
Além deles, há outros três que possuem mais de oitenta anos:
12. Sergio Obeso Rivera, arcebispo emérito mexicano;
13. Toribio Ticona Porco, prelado emérito de Corocoro, na Bolívia; e o padre espanhol
14. Aquilino Bocos Merino, dos missionários claretianos, o único que não é bispo.

Em sua saudação ao Papa, o primeiro dos nove cardeais, o iraquiano Luis Sako, recordou que “alguns muçulmanos que foram me felicitar expressaram sua admiração pela abertura da Igreja e por estar sempre perto das pessoas em suas preocupações, medos e esperanças”. Sako se referiu aos sofrimentos dos cristãos: “Seu chamado paternal é para nós de animação em nossos sofrimentos e nos dá a esperança de que a tormenta atual passará e será possível viver juntos harmoniosamente. Creio firmemente na fecundidade do amor impelido até o final. Este sangue dos mártires não é por acaso, Santidade, asseguramos-lhe nosso apoio e nossa colaboração ainda mais intensa para promover a cultura do diálogo, do respeito e da paz, por todas partes e em particular onde mais se necessita”.
LUIS RAPHAEL I SAKO (no centro)
Patriarca de Babilônia dos Caldeus, no Iraque - novo cardeal, ladeado por dois outros bispos

A imposição dos barretes foi acompanhada pelos aplausos dos fiéis (mais consistentes quando passaram os purpurados italianos, pois contavam com mais acompanhantes). Foram significativos os abraços do Papa com os novos cardeais, com seus colaboradores mais próximos (De Donatis, Ladaria, Becciu e Krajevski), mas foi longo e comovedor também o abraço com outros, como com o arcebispo de Karachi, Joseph Coutts, e com o arcebispo de Joseph Coutts, Giuseppe Petrocchi. Um barrete diferente dos normais foi entregue ao patriarca iraquiano: em lugar do tradicional “tricórnio”, recebeu um de forma cilíndrica semelhante a um gorro.

Francisco meditou sobre a passagem do Evangelho de Marcos, lido apenas na passagem em que se descreve a subida de Jesus a Jerusalém, enquanto caminha frente a seus discípulos. Cristo precede, primerea, disse Bergoglio, aos seus, na hora “das grandes determinações e decisões”.

“Todos sabemos – acrescentou o Papa – que os momentos importantes e cruciais na vida deixam falar ao coração e mostram as intenções e as tensões que nos habitam. Tais encruzilhadas da existência nos interpelam e conseguem trazer à luz buscas e desejos nem sempre transparentes do coração humano”. Diante do terceiro e mais duro dos anúncios da paixão, o evangelista Marcos não teme revelar “certos segredos do coração dos discípulos:
* busca dos primeiros postos,
* ciúmes,
* invejas,
* intrigas,
* arranjos e acomodações;
uma lógica que não só carcome e corrói a partir de dentro as relações entre eles, como também os encerra em discussões inúteis e pouco relevantes”. Mas, Jesus lhes diz com força: “Não deve ser assim entre vocês: quem quiser ser grande entre vocês, que seja o servidor”. [Como estamos distantes deste apelo de Cristo!!!]

Desta maneira, explicou o Pontífice, “o Senhor busca reorientar a visão e o coração de seus discípulos, não permitindo que as discussões estéreis e autorreferenciais ganhem espaço no seio da comunidade. Para que serve ganhar o mundo inteiro, caso se esteja corroído por dentro? Para que serve ganhar o mundo inteiro, caso se viva preso em intrigas asfixiantes que secam e tornam estéril o coração e a missão? Nesta situação – como alguém fazia notar – já se poderiam vislumbrar as intrigas palacianas, também nas cúrias eclesiásticas”. [A “política” interna da Igreja é muito atuante, e como!]

As palavras evangélicas são utilizadas para analisar a situação atual da Igreja. E essas palavras de Jesus, “não deve ser assim entre vocês”, são um “convite e uma aposta a recuperar o melhor que há nos discípulos e assim não se deixar derrotar e encerrar pelas lógicas mundanas que desviam a visão do importante”, convidando, ao contrário, a se dedicar à missão.

Justamente a missão “supõe deixar de ver e velar pelos próprios interesses para olhar e velar pelos interesses do Pai. A conversão de nossos pecados, de nossos egoísmos não é e nem será um fim em si mesma, mas aponta principalmente a crescer em fidelidade e disponibilidade para abraçar a missão”.

E Francisco convidou a estar “bem dispostos e disponíveis para acompanhar e receber a todos e a cada um, e não nos transformemos em ótimos repelentes por questões de estreiteza de olhar ou, o que seria pior, por estar discutindo e pensando entre nós quem será o mais importante. Quando nos esquecemos da missão, quando perdemos de vista o rosto concreto de nossos irmãos, nossa vida se fecha na busca dos próprios interesses e seguranças. Assim, começa a crescer o ressentimento, a tristeza e a inquietação”.

Na Igreja asfixiada pelas lutas internas, por intrigas de palácio, por grupinhos velhos e novos, “pouco a pouco, resta menos espaço para os outros, para a comunidade eclesial, para os pobres, para escutar a voz do Senhor. Desse modo, perde-se a alegria, e o coração acaba secando”. Ao contrário, Jesus ensina que “aquele que deseja ser primeiro, seja escravo de todos”. É “o convite que o Senhor nos faz para não nos esquecer que a autoridade na Igreja cresce nessa capacidade de dignificar, de ungir o outro, para curar suas feridas e sua esperança tantas vezes danificada”.

Por isso, recordou o Papa apontando o exemplo de Jesus, “a única autoridade credível é a que nasce de se colocar aos pés dos outros para servir a Cristo. É a que surge de não se esquecer que Jesus, antes de inclinar sua cabeça na cruz, não teve medo de se inclinar diante de seus discípulos e lhes lavar os pés”.

“Essa é a maior condecoração que podemos obter, a maior promoção que pode nos ser outorgada: servir a Cristo no povo fiel de Deus, no faminto, no esquecido, no encarcerado, no enfermo, no toxicodependente, no abandonado, em pessoas concretas com suas histórias e esperanças, com suas ilusões e desilusões, suas dores e feridas”.

Só desta maneira, concluiu Bergoglio, “a autoridade do pastor terá sabor de Evangelho, e não será como “um metal que ressoa ou um címbalo que aturde”. Nenhum de nós deve se sentir “superior” a ninguém. Nenhum de nós deve olhar os outros de cima para baixo. Unicamente nos é lícito olhar para uma pessoa de cima para baixo, quando a ajudamos a se levantar”.
PAPA SÃO JOÃO XXIII
Tomado como exemplo para os cardeais durante o Consistório pelo Papa Francisco

Para concluir, Francisco fez com que ressoassem na basílica vaticana as palavras do testamento espiritual de São João XXIII:

“Nascido pobre, mas de honrada e humilde gente, estou particularmente feliz em morrer pobre, tendo distribuído segundo as diferentes exigências e circunstâncias de minha simples e modesta vida, a serviço dos pobres e da Santa Igreja que me alimentou, o que me chegou às mãos (em medida, aliás, muito limitada) durante os anos de meu sacerdócio e de meu episcopado. Aparências de comodidade, muitas vezes, velaram ocultos espinhos de pobreza que me impediram de dar sempre com a generosidade que gostaria. Agradeço a Deus esta graça da pobreza da qual fiz votos em minha juventude, pobreza de espírito, como Padre do Sagrado Coração, e pobreza real; e que me sustentou para nunca pedir nada, nem postos, nem dinheiro, nem favores, nem para mim, nem para meus parentes ou amigos” (29 de junho de 1954).

Um exemplo, o do Papa Bom que agora é santo, que Francisco expõe a todos, e, particularmente, aos novos e velhos cardeais.

Traduzido do italiano pelo CEPAT. Acesse a versão original deste artigo, clicando aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Sexta-feira, 29 de junho de 2018 – Internet: clique aqui.

terça-feira, 26 de junho de 2018

Partido tóxico ! ! !


MDB é tóxico e pode contaminar aliados nas
eleições, diz cientista político

Entrevista com Alberto Carlos Almeida

Néli Pereira

A má avaliação do governo Michel Temer torna o MDB - partido tradicional pelas alianças costuradas em eleições presidenciais -, um peso negativo no pleito deste ano
 
ALBERTO CARLOS ALMEIDA
A avaliação é do cientista político Alberto Carlos Almeida, que acaba de lançar o livro O Voto do Brasileiro, no qual analisa indicadores socioeconômicos e eleitorais para afirmar que o resultado das eleições no Brasil é "previsível". Ele defende que o segundo turno deve se manter entre o duopólio PT x PSDB - partidos cujas máquinas eleitorais, segundo ele, "não têm competição".

Autor de outros livros sobre o assunto, como A Cabeça do Brasileiro e A Cabeça do Eleitor, Almeida argumenta que apesar de o eleitorado brasileiro ter sido impactado pelas crises recentes e pelos escândalos de corrupção, não houve uma mudança significativa no perfil do eleitor. Segundo ele, apesar da demanda da população ser diferente, a oferta de candidatos e partidos permanece praticamente inalterada.

Eis a entrevista.

BBC News Brasil: No seu livro recém-lançado, você analisa indicadores eleitorais e sociais para afirmar que as eleições presidenciais no Brasil são previsíveis e reforçam o monopólio de PT e PSDB. O senhor acredita que este pode ser o caso do pleito deste ano, mesmo com Lula preso e o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, tão em baixa?

Alberto Carlos Almeida: Um forte indicador são as pesquisas que já foram divulgadas e mostram o Lula liderando a corrida presidencial, mesmo preso. As pessoas podem até falar "ah, mas ele não vai ser candidato" - pode ser, mas isso é um sinal da força do PT. E essa liderança se dá graças ao Nordeste do país, o que reforça o padrão que eu demonstro no livro com base nas eleições de 2010 e 2014. O que falta é o PT ter um candidato para o lugar do Lula, e nessa hora o Nordeste vai olhar com todo carinho, pensar em programas como o Bolsa Família, como a vida deles melhorou nos anos do PT etc.

Do outro lado, o PSDB, que é o "anti-PT". Pode ser que haja uma exceção neste ano, mas isso só vamos poder afirmar depois que a campanha começar, porque a estrutura do PSDB é muito maior do que a de vários partidos, inclusive da sigla do Jair Bolsonaro (pré-candidato pelo PSL).

O fato de as pesquisas mostrarem uma certa dificuldade do PSDB neste ano, não quer dizer que ela vá permanecer. A gente não pode esquecer que na eleição passada, o então candidato Aécio Neves passou a Marina Silva somente na quinta-feira antes da votação que ocorreu no domingo. O mesmo pode vir a acontecer com o Geraldo Alckmin, já que o PSDB tem uma máquina muito forte em São Paulo.

BBC News Brasil: Quer dizer que, depois de todos os escândalos de corrupção e da Lava-Jato, nada mudou na cabeça do eleitor brasileiro?

Almeida: Não é que nada tenha mudado. Quando se fala do eleitor você está falando da procura, da demanda - o eleitor demanda mudança, e isso não é de hoje. Mas quando falamos de partido, falamos da oferta, e essa oferta no Brasil é "oligopolizada". Os recursos de campanha, recursos financeiros, tempo de televisão - tudo está muito concentrado no PT e PSDB, eles são muito fortes. A diferença entre eles e os competidores deles é muito grande.

BBC News Brasil: Com a recessão e os cortes de gastos públicos, muitas pessoas que haviam ascendido experimentaram retrocesso social. Como essa experiência se refletirá no voto?

Almeida: Eu tenho visto isso de forma muito direta. Há um apoio muito forte ao voto de oposição - e a oposição sendo o PT. Ou seja, na cabeça do eleitor funciona mais ou menos assim: "tiraram o PT e colocaram um governo que não está funcionando, então põe o PT de volta".

Essa intenção de voto no Lula mostra um pouco isso, e nas pesquisas você observa que há um favoritismo para o PT. Então, embora a crise tenha afetado figuras do partido, o saldo favorece a sigla nas eleições desse ano, as pesquisas mostram isso inclusive para o segundo turno. Aí, mesmo que você não tenha o Lula, que seja outro candidato, o partido tem uma máquina muito forte, por exemplo: o governo da Bahia, de Minas Gerais, que é o maior colégio eleitoral do país. Se somar Minas, Bahia, Maranhão, Piauí, dá um quarto do eleitorado brasileiro, sem contar todos os Estados do Nordeste.

Tem um lado bom do Lula não fazendo campanha para ele mesmo - afinal, ele está respondendo a acusações, o nome dele foi envolvido em escândalos etc. Outro candidato do PT que não seja o Lula, não terá esse lado tão ruim. O Lula tem ativos, sim, mas tem passivos também.
LULA
Forte mesmo preso em Curitiba

BBC News Brasil: Assim como aconteceu em outros países, qual a chance de termos aqui um candidato ultra conservador com sucesso no pleito, como Jair Bolsonaro? Como ele se insere em meio ao monopólio PT/PSDB?

Almeida: A diferença é que na Europa, e até nos Estados Unidos, você tem o tema da imigração, que não existe aqui no Brasil. Lá você tem uma onda de imigrantes que são acusados de ocupar vagas de trabalho dos cidadãos dos países para onde vão, e isso vira um tema muito forte das campanhas conservadoras, como a de Marine Le Pen na França. Então, o que poderia fortalecer esse discurso aqui no Brasil? O tema da segurança pública?

Duvido um pouco, porque os governadores vão fazer campanha em cima desse tema, eles controlam as polícias militar e civil - isso vai fazer o discurso do Bolsonaro parecer um pouco demagogo, porque ele vai falar, prometer o que não poderá cumprir. Tem muita onda para passar debaixo dessa ponte que vão acabar mostrando os pontos fracos do Bolsonaro.

BBC News Brasil: O senhor falou sobre segurança pública, quais devem ser os grandes temas das campanhas deste ano?

Almeida: Tudo o que estiver relacionado ao bem estar social e econômico das pessoas - aumento de poder de compra, ter acesso a programas sociais. A palavra que costura tudo é acesso: acesso a bens de consumo via renda, acesso a serviços, acesso a programas sociais. A campanha deve ser muito focada nisso.

BBC News Brasil: O MDB é sempre um peso importante nas eleições presidenciais, e nas alianças. Qual deve ser o peso do MDB neste ano?

Almeida: O MDB tem um peso de um governo muito mal avaliado. Para onde o partido for e apoiar, ele vai ferir de morte aquele que estiver junto. Quem encostar no MDB, quem encostar no governo, está morto.

BBC News Brasil: Mas em uma eleição em que todos os candidatos têm um tempo de televisão curto, como os partidos vão disputar a eleição sem o tempo de TV e a capilaridade do apoio do MDB. Vai dar para ganhar a eleição, ignorando os pesos pesados do MDB?

Almeida: Sobre o tempo de TV, para se ter uma ideia, o PT terá 30 vezes mais tempo que o Bolsonaro. A Marina Silva tem menos ainda. A assimetria é muito grande. O Alckmin a mesma coisa: o Ciro Gomes tem muito menos tempo. Então isso reforça o peso, mesmo com as alterações de campanha.

Sobre o MDB, as máquinas estaduais no Brasil se dividem em função do voto regional, então o MDB do Nordeste já afirmou que vai apoiar o PT, caso de Alagoas, e no Sul a sigla já declarou apoio ao PSDB, como RS e SC.

Na convenção que definirá se o partido vai ou não ter candidato, já que o Henrique Meirelles está se colocando, ali teremos uma definição mais precisa de como eles vão se comportar, inclusive em termos de apoio.

Outra coisa: quem o MDB apoiar, perde a eleição. Por exemplo, a escolha do vice do Alckmin, se essa figura for do MDB, ele perde. O MDB é tóxico, inteiramente tóxico, porque o governo é muito mal avaliado.

A imagem do partido é muito ruim, não só do presidente. Seria uma loucura ter o MDB por perto, quem o tiver, perde. As divisões regionais é que regem o apoio das máquinas estaduais do partido, então nas regiões onde o PT é mais votado, a máquina vai para onde o vento sopra, e o mesmo com o PSDB. E por fim, o impacto do tempo de televisão ainda não está claro porque vai depender das escolhas que eles farão na convenção.

BBC News Brasil: É possível falar de um realinhamento eleitoral no Brasil? De que forma ele se configura? E algo muda para as eleições do Legislativo?

Almeida: É difícil de dizer. O que já observamos é que essa mudança sobre as doações privadas de campanha vai dificultar a entrada de novos políticos - os que vão entrar serão aqueles que estarão dispostos a gastar uma fortuna pessoal, ou algo desse tipo.

Na minha avaliação, de certa forma, isso vai ter um aspecto negativo para a política e já há estudos que detectam que mostram que a cada eleição que passa, os candidatos eleitos tendem a ser os mais ricos, e isso está aumentando a distância social entre os eleitos e não eleitos.

Antigamente, os eleitos eram pouco mais ricos que os não eleitos, agora eles são muito mais ricos do que aqueles que perdem as eleições. Isso gera um grupo de parlamentares que são ricos pessoalmente. Essa é a única janela de renovação hoje em dia. O restante vai ter o financiamento público e quem segura a máquina do partido vai ter esse financiamento.
GERALDO ALCKIMIN
Candidato do PSDB beneficia-se da grande e forte máquina e estrutura de seu partido

BBC News Brasil: E sobre o perfil do eleitor? No seu livro o senhor defende que o perfil socioeconômico é determinante para o voto e que houve uma mudança significativa a partir da eleição de Lula em 2006. O peso desse fator deve ser o mesmo neste ano?

Almeida: De alguma maneira, já há uma configuração nessa direção. As pesquisas divulgadas até agora mostram um favoritismo do PT na região Nordeste e do PSDB em São Paulo. Isso mostra que o peso desse fator não foi alterado.

BBC News Brasil: Podemos esperar alguma mudança no comportamento do eleitor com base na ideologia de alguns candidatos, inclusive sobre temas mais sociais, como identidade de gênero, legalização do aborto, entre outros?

Almeida: Eu ficaria surpreso se os candidatos seguissem para esse tipo de discussão. Os jornalistas vão questioná-los sobre isso, mas eles entendem que a economia é mais importante - a população brasileira é muito carente, o que mobiliza mesmo os votos é o consumo, poder comprar mais. As pessoas estão contraindo gastos até no supermercado, acredito que esses temas serão mais discutidos.

BBC News Brasil: Com Lula preso, muitos de seus eleitores continuam sem candidato. Quem tende a "herdar" esses eleitores? Por quê?

Almeida: Na minha avaliação, esses eleitores devem ficar com o PT porque o partido tem uma máquina muito forte. A gente pode até imaginar como vai ser essa dinâmica de lançamento de um candidato: eles vão anunciar quem vai ser, o ex-presidente deve enviar uma carta, que será lida, esse nome vai ser entrevistado e ter mídia forte durante algum tempo, a exposição midiática vai ser muito grande - e esse candidato pode crescer.

BBC News Brasil: Os grandes escândalos não arranharam a imagem de PT? E agora do PSDB? O eleitor não está ligando pra isso? Por quê?

Almeida: Arranharam sim, se não tivessem arranhado, a eleição estaria ganha no primeiro turno. Ainda que se suponha um equilíbrio porque a imagem do PT está arranhada, a ascensão do Bolsonaro também por causa dessa imagem mais prejudicada - não fosse isso, o PT ganharia no primeiro no turno e o PSDB estaria mais à frente nas pesquisas, com muito mais solidez. Então os escândalos de corrupção estão sendo sentidos sim, e eles é que são responsáveis pelo cenário que estamos vendo antes das eleições e da campanha em si.

BBC News Brasil: No livro o senhor analisa indicadores para afirmar que um segundo turno sem PT e PSDB neste ano é possível, mas não provável. Por quê?

Almeida: Por causa das máquinas. Hoje a dificuldade maior é dizer se o PSDB vai. Mas eles têm uma máquina muito forte, um domínio político em cada Estado - agências de publicidade, diretores de entidades estatais, de hospitais - essa máquina fica ali esperando a eleição, e será ativada na campanha. O PSDB tem essa máquina muito forte principalmente em São Paulo. E o PT continua tendo uma máquina forte, como eu disse anteriormente. Nesse aspecto, podemos não ter nenhuma novidade.

A oferta é rígida, e limitada. E faz parte de uma construção, que leva tempo. PT e PSDB são grandes jogadores.

BBC News Brasil: E olhando para um futuro próximo, há alguém ou alguma sigla que desponte no cenário político capaz de competir com esses dois grandes partidos?

Almeida: Não vejo isso acontecer, e se trata de um processo longo, tem que ser plantado e construído. Se pegarmos o caso do Movimento 5 Estrelas na Itália, eles vêm construindo, isso leva tempo. Não é de uma hora para a outra.

Fonte: BBC News Brasil – Segunda-feira, 25 de junho de 2018 – Internet: clique aqui.

Sínodo dos jovens, as novas linhas

Rumo a uma virada sobre aspectos concretos
da vida juvenil: desde a sexualidade
até a maneira de viver a fé

Giovanni Panettiere
Jornalista & Jurista italiano
www.quotidiano.net
19-06-2018

Estamos falando sobre o Instrumentum laboris do próximo Sínodo dos Bispos sobre os jovens, agendado para o período de 3 a 28 de outubro, publicado nesta quarta-feira

Será lembrado como o primeiro documento do Vaticano que traz a sigla LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros), cunhada nos anos 1980, e encoraja a Igreja a enfrentar o tema da sexualidade "mais abertamente e sem preconceitos". Estamos falando sobre o Instrumentum laboris do próximo Sínodo dos jovens, agendado para o período de 3 a 28 de outubro, publicado nesta quarta-feira. Mais de setenta páginas elaboradas pela Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos, que orientarão o confronto entre os delegados das diversas conferências episcopais em todo o mundo. Não se trata de um texto definitivo, mas de um esboço de trabalho que deixa perceber uma mudança na abordagem pastoral de questões delicadas e significativas para os jovens de hoje.

O Instrumentum laboris [para baixá-lo, lê-lo e imprimi-lo – em italiano –, clique aqui], com seu viés fortemente sociológico e ao mesmo tempo realista, é articulado em três partes:
1ª) a primeira ligada ao verbo “reconhecer” apresenta uma fotografia do variegado mundo juvenil;
2ª) a segunda (cujo fio comum é a palavra “interpretar”) oferece algumas chaves de leitura para orientar-se no contexto atual das novas gerações;
3ª) a terceira tem o objetivo de chegar a “escolher”, isto é, colocar os padres sinodais nas condições de tomar posição em relação aos desafios cruciais para os jovens.

O esboço é o resultado de um processo complexo lançado em janeiro de 2017, com a publicação do Documento Preparatório do Sínodo ao qual estava anexado um questionário dedicado às conferências episcopais nacionais. O novo texto também leva em consideração as reflexões surgidas no curso do seminário internacional sobre a condição juvenil, realizado em setembro passado, as respostas de um segundo questionário (esse endereçado aos jovens e difundido online) e, finalmente, o que emergiu da reunião pré-sinodal em março, que contou com a participação de 300 jovens de representações dos cinco continentes.

Estes são os temas de destaque apresentados no Instrumentum laboris:

O desafio da globalização (números 8-9)

O documento, dirigido principalmente a 1,8 bilhão de pessoas entre os 16 e 29 anos (cerca de um quarto da população mundial), ressalta, apesar das óbvias diferenças regionais, "a influência do processo de globalização sobre os jovens de todo o planeta". Isso determina "uma demanda por espaços crescentes de liberdade, autonomia e expressão a partir do compartilhamento de experiências do mundo ocidental, talvez emprestadas da mídia social. "Uma situação que muitas conferências episcopais não ocidentais consideram um aviso de alarme, a ponto de se perguntar como conseguir acompanhar os jovens nessa "mudança cultural que desarticula as culturas tradicionais, ricas do ponto de vista da solidariedade, dos laços comunitários e da espiritualidade”. São os mesmos episcopados que "sentem não ter as ferramentas adequadas" para acolher o desafio e que, em alguns casos, insistem em falar expressamente de uma "decadência dos costumes" em ato.


A crise do pai (número 12)

A Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos, contando com as respostas do questionário online, ressalta como "a figura materna seja a referência privilegiada dos jovens". Mais problemático é o discurso sobre o papel do pai. Nesse ponto, torna-se necessária uma reflexão precisa, porque "a ausência" na família do pai ("evanescência em alguns contextos, especialmente aqueles ocidentais") produz "ambiguidade e vazios" que investem também o exercício da paternidade espiritual.

Procuram-se adultos (número 14)

"Não faltam apenas adultos na fé. Faltam adultos, pura e simplesmente": é o que pode ser lido em uma das passagens mais sinceras do Instrumentum. Muitas vezes, hoje, são os adultos "que tomam os jovens como referência para o próprio estilo de vida". Disso decorre que, de acordo com alguns episcopados, entre jovens e adultos "não existe um verdadeiro conflito de gerações", mas sim uma "estranheza recíproca": os adultos não têm mais interesse em transmitir valores para as novas gerações que acabam por senti-los "mais como competidores do que como potenciais aliados".

As armadilhas da Web (números 34 a 35)

A relação entre as novas gerações e o mundo digital está entre os primeiros desafios indicados pelo documento do Vaticano. Os próprios jovens denunciam "a presença invasiva" das novas mídias e ressaltam como a Rede também representa "um território de solidão, manipulação, exploração e violência, até o caso extremo da 'dark web'". No entanto, não deve ser esquecido que "o acesso a ferramentas de formação on-line abriu oportunidades educacionais para os jovens que vivem em áreas remotas e tornou o acesso ao conhecimento a um clique de distância". Dito isso, na Internet e arredores, na Igreja as sombras superam as luzes. "Também por ignorância e falta de formação – admite-se - os pastores e os adultos em geral têm dificuldade em compreender essa nova linguagem". Eles tendem a ter medo "sentindo-se diante de um 'inimigo invisível e onipresente' que às vezes demonizam".

Sexo sem preconceitos (número 53)

Sobre o recebimento entre as novas gerações da doutrina católica sobre o tema do sexo, a Santa Sé colide com a realidade. Cada vez mais estudos sociológicos mostram como "muitos jovens católicos não seguem as orientações da moral sexual da Igreja". Nenhuma conferência episcopal oferece soluções ou receitas, mas muitos consideram que "a questão da sexualidade deve ser discutida mais abertamente e sem preconceitos". A posição da Igreja sobre "contracepção, aborto, homossexualidade, coabitação, casamento" tornou-se uma fonte de debate entre os jovens. Dentro da Igreja como na sociedade. A partir da reunião pré-sinodal, chega o convite, totalmente retomado no esboço de trabalho publicado agora "para enfrentar de maneira concreta temas controversos como a homossexualidade e as temáticas de gênero, sobre que os jovens já discutem livremente e sem tabus".

O drama dos hikikomori (número 58)

Um uso superficial da mídia digital, pode ser lido no Instrumentum, "expõe ao risco de isolamento, inclusive extremo: o fenômeno é conhecido pelo termo japonês Hikikomori, que afeta um número crescente de jovens em muitos países, especialmente na Ásia". A Internet ainda assume para muitos jovens os contornos de "um refúgio em uma felicidade ilusória e inconsistente que gera formas de dependência". Não faltam nem mesmo aqueles que "tendem a separar seu comportamento on-line daquele off-line". Há o suficiente para sugerir "uma formação sobre como viver a própria vida digital" ideal para as novas gerações. Cientes de que "as relações on-line podem se tornar desumanas".

A escuta dos casais homossexuais (número 197)

Pela primeira vez em um documento do Vaticano aparece a sigla LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros). Por uma curiosa brincadeira do calendário, a reviravolta linguística ocorre no mesmo dia em que a OMS (Organização Mundial de Saúde) retira a transexualidade das doenças mentais. No Instrumentum da Secretaria Geral do Sínodo acena-se para "alguns jovens LGBT", que, através de várias contribuições enviadas para o mesmo ponto de coleta da assembleia, manifestaram o desejo de “beneficiar-se de uma maior proximidade e experienciar um maior cuidado por parte da Igreja". Aparece também o tema das relações entre pessoas do mesmo sexo: "Algumas Conferências episcopais questionam-se sobre o que sugerir aos jovens que, em vez de formar casais heterossexuais decidem constituir casais homossexuais e, especialmente, querem estar próximos da Igreja". Historicamente data de 1975, a primeira providência da Santa Sé centrada no cuidado pastoral dos homossexuais. O título era “Persona humana”, redigida pelo ex Santo Ofício. Quanto aos casais do mesmo sexo merece ser lembrado o Relatório intermediário do Sínodo extraordinário sobre a família (2014), que em uma passagem, julgada pela assembleia dos bispos demasiadamente avançada e, como tal, acabou sendo retirada, reconhecia-se o valor positivo de uma relação afetiva para a pessoa homossexual.

Traduzido do italiano por Luisa Rabolini.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Quinta-feira, 21 de junho de 2018 – Internet: clique aqui.

domingo, 24 de junho de 2018

Solenidade da Natividade de São João Batista – Homilia

Evangelho: Lucas 1,57-66

57 Completou-se o tempo da gravidez de Isabel, e ela deu à luz um filho.
58 Os vizinhos e parentes ouviram dizer como o Senhor tinha sido misericordioso para com Isabel, e alegraram-se com ela.
59 No oitavo dia, foram circuncidar o menino, e queriam dar-lhe o nome de seu pai, Zacarias.
60 A mãe porém disse: «Não! Ele vai chamar-se João.»
61 Os outros disseram: «Não existe nenhum parente teu com esse nome!»
62 Então fizeram sinais ao pai, perguntando como ele queria que o menino se chamasse.
63 Zacarias pediu uma tabuinha, e escreveu: «João é o seu nome.»
64 No mesmo instante, a boca de Zacarias se abriu, sua língua se soltou, e ele começou a louvar a Deus.
65 Todos os vizinhos ficaram com medo, e a notícia espalhou-se por toda a região montanhosa da Judéia.
66 E todos os que ouviam a notícia, ficavam pensando: «O que virá a ser este menino?» De fato, a mão do Senhor estava com ele.
80 E o menino crescia e se fortalecida em espírito. Ele vivia nos lugares desertos, até o dia em que se apresentou publicamente a Israel. 

JOSÉ MARÍA CASTILLO
Teólogo espanhol

O PRECURSOR DO MESSIAS

O dia de São João Batista recorda a todos o momento no qual se inicia uma das mudanças mais decisivas na história da humanidade. João Batista é o único santo do qual a Igreja celebra o nascimento. Independentemente das razões que tiveram aqueles que instituíram essa festa, para comemorar hoje, não sua morte, mas seu nascimento, o que deve chamar a atenção daquele que crê é que, com a chegada de João Batista a este mundo, encerra-se uma etapa na história das tradições religiosas, e se abre outra: «A Lei e os Profetas chegaram até João Batista; desde então se anuncia o Reino de Deus» (Lc 16,16; Mt 11,13).

Com João encerra-se a etapa marcada pela lei religiosa e se abre a etapa do Reino, que é vida para os pobres, enfermos e pecadores. Dizendo mais claramente: a presença de João Batista neste mundo anuncia a todos que o «fato religioso» se desloca. O centro desse fato deixa de estar no Templo e passa à rua, ao campo, ao deserto. O central não será mais «o sagrado», mas «o profano». É isso mesmo!

Enquanto ao nome, João significa em hebraico «Javé é clemente». Pois bem, a clemência se traduz geralmente pela palavra grega «éleos», que significa misericórdia. O que nos vem dizer que o próprio nascimento de João Batista representa uma mudança assombrosa: Deus não se encontra no «sagrado», mas na «misericórdia». João é o precursor porque é o anuncio vivo da grande transformação do fato religioso: da religião dos «homens sagrados» à religião dos «homens misericordiosos».

João representou uma inovação importante em seu tempo. Era filho de um sacerdote (Zacarias) e sua mãe (Isabel) era da família de Aarão (Lc 1,5). Ou seja, João era de família sacerdotal em sentido pleno. O lógico era que ele fizesse o que lhe correspondia, integrar-se no Templo e viver como sacerdote. Porém, ele não fez assim. João foi um homem do deserto, lugar de perigo e marginalização social, onde viviam pessoas que não tinham boa relação com o Templo, como era o caso dos monges de Qumran.

Porém, João foi somente o primeiro caso de um deslocamento decisivo. A passagem da etapa da Lei e do Templo para a etapa do Reino de Deus. Há diferenças entre João e Jesus. Reduzindo essas diferenças ao essencial, é seguro que o centro das preocupações de João foi a conversão dos pecadores. Enquanto que o centro das preocupações de Jesus foi a saúde dos enfermos e a alimentação (como comensalidade) de todos, especialmente dos pobres e excluídos sociais. No fundo de tudo, estava o fato que João cria em um Deus justiceiro e castigador (Mt 3,12; Lc 3,17), enquanto que Jesus creu sempre em um Pai absolutamente bom com todos (Lc 15,11-32).

Traduzido do espanhol por Telmo José Amaral de Figueiredo.

Fonte: José María Castillo. La religión de Jesús: comentario ao Evangelio diario – Ciclo A (2016-2017). Bilbao: Desclée De Brouwer, 2016, página 277; La religión de Jesús: comentario ao Evangelio diario – Ciclo B (2017-2018). Bilbao: Desclée De Brouwer, 2017, páginas 239-240.