27º Domingo do Tempo Comum – Ano A – Homilia
Evangelho: Mateus 21,33-43
Frei
Alberto Maggi
Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas)
Sacrificamos as nossas conveniências pelo bem
das pessoas?
O inimigo de Deus não é o pecado; o pecador que acolhe o amor do Senhor pode converter-se. O inimigo de Deus, nos evangelhos, é chamado de “conveniência”. A conveniência torna a pessoa refratária e hostil à ação divina. Isto é o que lemos no evangelho de Mateus, capítulo 21, versículos 33 a 43.
Depois de ter dito às mais altas autoridades religiosas, aos sumos sacerdotes e aos anciãos, que as categorias que consideravam excluídas da ação divina, como os cobradores de impostos e as prostitutas, ocupariam o seu lugar no Reino de Deus, Jesus dirige-se às mais altas autoridades, aos mais altos sacerdotes e anciãos dizendo “Escutai”. Não é um convite, mas é um imperativo, é uma ordem: “Escutai esta outra parábola”. É a terceira parábola que Jesus faz, neste Evangelho, tendo a vinha como protagonista. A vinha era a imagem do povo de Israel segundo a figura que se encontra no livro do profeta Isaías no capítulo 5. E, de fato, é precisamente uma vinha a protagonista desta parábola.
Mateus
21,33-34: «Naquele
tempo, Jesus disse aos sumos sacerdotes e aos anciãos do povo: “Escutai esta
outra parábola: Certo proprietário plantou uma vinha, pôs uma cerca em volta,
fez nela um lagar para esmagar as uvas, e construiu uma torre de guarda. Depois,
arrendou-a a vinhateiros, e viajou para o estrangeiro. Quando chegou o tempo da
colheita, o proprietário mandou seus empregados aos vinhateiros para receber
seus frutos.»
O evangelista, aqui, com uma série de termos mostra a grande preocupação deste senhor pela vinha: “pôs uma cerca em volta, fez nela um lagar para esmagar as uvas, e construiu uma torre de guarda”. Tudo isso indica, portanto, a grande preocupação do proprietário com esta vinha. O termo usado para “tempo” significa o tempo propício, o tempo oportuno, “mandou seus empregados aos vinhateiros para receber seus frutos”. O evangelista insiste no fato de que os frutos pertencem ao dono.
Mateus
21,35: «Os
vinhateiros, porém, agarraram os empregados, espancaram a um, mataram a outro, e
ao terceiro apedrejaram.»
Este é o destino dos profetas. Continuamente Deus enviou profetas ao seu povo e, seguidamente, esses profetas foram rejeitados, foram perseguidos e, muitas vezes, foram mortos. Por quê? Os profetas sempre convidavam à mudança, mas aqueles que estão instalados no poder não desejam mudar, mas sim manter o seu privilégio, a sua posição de prestígio.
Mateus
21,36-37: «O
proprietário mandou de novo outros empregados, em maior número do que os
primeiros. Mas eles os trataram da mesma forma. Finalmente, o proprietário
enviou-lhes o seu filho, pensando: ‘Ao meu filho eles vão respeitar’.»
“Finalmente, o proprietário enviou-lhes o seu filho”, a expressão indica o filho único. O filho único é aquele que representa o pai e que herda tudo, “pensando: ‘Ao meu filho eles vão respeitar’”. Que ilusão! As autoridades religiosas têm respeito, pedem respeito apenas para si mesmas, mas não respeitam os outros porque tudo o que fazem, como Jesus denunciará agora, é baseado na sua conveniência e não no bem dos outros.
Mateus 21,38: «Os vinhateiros, porém, ao verem o filho, disseram entre si: ‘Este
é o herdeiro. Vinde, vamos matá-lo e tomar posse da sua herança!’»
“Mas
os agricultores, vendo o filho” – o termo “filho” aparece pela terceira
vez – “disseram uns aos outros: este é o herdeiro, vamos matá-lo e
ficaremos com a sua herança”. Jesus desmascara (o fato) de que o
verdadeiro deus do templo se chama interesse, chama-se conveniência.
Jesus não morreu porque esta era a vontade de Deus, mas morreu pelo
interesse da casta sacerdotal no poder.
Portanto, o cálculo feito por estes agricultores que, como veremos depois, são as autoridades religiosas, baseia-se apenas na sua conveniência. Enquanto Jesus sacrificou a sua própria conveniência pelo bem dos homens, as autoridades religiosas sacrificam o bem dos homens pela sua própria conveniência e nem sequer hesitam em assassinar o Filho de Deus.
Mateus
21,39-41a: «Então
agarraram o filho, jogaram-no para fora da vinha e o mataram. Pois bem, quando
o dono da vinha voltar, o que fará com esses vinhateiros?” Os sumos sacerdotes
e os anciãos do povo responderam: “Com certeza mandará matar de modo violento
esses perversos...»
Ser expulso, como o filho foi da vinha, significa, de acordo com o livro de Levítico, capítulo 24, versículo 14, a condenação que estava reservada aos blasfemadores. As mais altas autoridades religiosas do povo consideram Jesus, o Filho de Deus, um inimigo de Deus, um blasfemador e como tal deve ser eliminado. “Então, quando o senhor da vinha vier, o que fará aos lavradores?”. E os principais sacerdotes e anciãos a quem Jesus dirigiu a parábola emitem a sua sentença: “Ele fará com que esses ímpios morram miseravelmente”. Para melhor traduzir o texto grego, ele deveria ser traduzido como “ele fará com que essas pessoas miseráveis pereçam miseravelmente” ou “ele destruirá gravemente essas pessoas más”. Então eles mesmos se dão a sentença!
Mateus
21,41b-42: «... e arrendará a vinha a outros vinhateiros, que lhe entregarão os
frutos no tempo certo”. Então Jesus lhes disse: “Vós nunca lestes nas
Escrituras: ‘A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto
foi feito pelo Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos?’»
Isto é, a vinha será arrendada para os povos pagãos. E Jesus, com profunda ironia, se dirige às pessoas piedosas, aos sumos sacerdotes e aos anciãos que conhecem a Escritura, como se eles fossem ignorantes: “Vocês nunca leram nas escrituras...?” e cita o Salmo 118. A pedra que foi rejeitada era, na verdade, a pedra mais importante.
Mateus 21,43: «Por isso, eu vos digo: o Reino de Deus vos será tirado e será
entregue a um povo que produzirá frutos”.»
E aqui
está a sentença de Jesus: “Por isso vos digo: o Reino de Deus vos
será tirado”. Jesus já havia dito que as categorias de pessoas consideradas
pela religião como as mais distantes de Deus, no caso, as prostitutas e os
cobradores de impostos, avançaram não no sentido de preceder, mas de ocupar o
lugar dos líderes do povo. Agora, Jesus diz isso claramente: “O reino
de Deus vos será tirado e será dado a um povo” – ou seja, um povo pagão
– “que produza frutos”.
É lamentável que os versículos 45 e 46 tenham sido retirados da versão litúrgica, pois eles nos fazem compreender o significado e a quem esta parábola foi dirigida: “Depois de ouvirem suas parábolas, os sumos sacerdotes e os fariseus entenderam que ele falava deles e tentaram capturá-lo, mas ficaram com medo da multidão que o considerava um profeta”. As palavras de Jesus não despertam o desejo de arrependimento nas autoridades, mas apenas a vontade de eliminação daquele que as desmascarou. Elas jamais se arrependem!
* Traduzido e editado do italiano por Pe.
Telmo José Amaral de Figueiredo.
** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994.
Reflexão Pessoal
Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo
«Ai
da alma pela qual o Senhor não caminha, nem afugenta dela com a sua voz as
bestas espirituais da maldade!»
(São Macário, o Grande — século IV)
Não há dúvidas que a parábola que estamos meditando, neste domingo, é uma das mais duras e diretas de todas as relatadas por Jesus! E ele tem motivos para isso: a liderança religiosa de seu povo não entrega ao seu Pai os frutos que se espera da vinha da qual são os responsáveis. Isso porque, ao invés de pastorear o povo de Deus, isto é, a vinha, eles pastoreiam a si mesmos, como já havia denunciado o profeta Ezequiel (cf. Ez 34,2b).
Uma das maiores e mais frequentes tentações daqueles que devem cuidar da vinha de Deus, de seu rebanho é imaginar que sejam não vinicultores, não pastores, mas os proprietários, os donos da vinha e do rebanho! No versículo 24 do Evangelho deste domingo, Jesus deixa claro que a vinha e os seus frutos pertencem a Deus, ao seu Pai! Sempre houve e haverá os oportunistas que, ao invés de servirem ao Reino de Deus e ao seu povo, se servem dele em proveito próprio!
Papa Francisco, desde o princípio de seu pontificado, vem desenvolvendo uma árdua batalha contra o clericalismo, doença que acomete, infelizmente, não somente o clero (diáconos, presbíteros, monges, religiosos, bispos), mas também, os leigos. O papa, assim, define o clericalismo: “Há um clericalismo que se manifesta em pessoas que vivem com atitudes ‘segregadas’, com esnobismo. São aqueles que vivenciam uma espécie de atitude aristocrática em relação aos demais. O clericalismo é uma aristocracia" (Discurso aos Religiosos, 30/11/2018). Em uma carta de 2016, Papa Francisco explicava que o clericalismo “não só anula a personalidade dos cristãos, mas também tende a menosprezar e subestimar a graça batismal que o Espírito Santo colocou no coração do nosso povo. O clericalismo leva a uma padronização do laicato; tratando-o como um ‘subordinado’ limita as diversas iniciativas e esforços e, ouso dizer, a audácia necessária para poder levar a Boa Nova do Evangelho a todos os âmbitos da atividade social e, sobretudo, política”.
Em agosto de 2018, durante um encontro com jovens no Circo Máximo, em Roma, Papa Francisco deixou claro que é preciso que “o cristão, seja um fiel leigo, um sacerdote, uma irmã, um bispo”, aprenda “a escutar o sofrimento, a escutar os problemas, a estar em silêncio e deixar falar e ouvir”. Afinal, como disse Francisco nesta mesma oportunidade: “Onde não há testemunho, não há o Espírito Santo”. Somos todos um só povo de Deus! Nesse povo há diferenças de funções, mas não de status, não de dignidade!
Cuidado! Assim como a
vinha de Deus foi retirada dos líderes judaicos soberbos e egoístas, o mesmo
pode ocorrer conosco, os cristãos de hoje! Afinal, devemos nos perguntar,
sempre:
* Nos tempos atuais, estamos
produzindo os frutos que Deus espera de nós: justiça para os excluídos,
solidariedade, compaixão para com os que sofrem, perdão e compreensão para com
os pecadores etc.?
* Estamos dando um testemunho
autêntico de amor, respeito e fraternidade entre nós, que nos dizemos
cristãos, seguidores de Cristo?
Reflitamos com sinceridade.
«Senhor Jesus, quantas vezes o amor é
retribuído com a mais triste ingratidão. Não há nada mais destrutivo do que se
sentir traído, se ver iludido, saber que foi enganado. Mais difícil ainda é
constatar que de nada serviram muitos gestos de bondade, de generosidade, de
abertura, de tolerância, bem como muitas palavras ditas com sinceridade e,
finalmente, o compromisso de ser solidário e sincero. Senhor, tu que conheceste
a ingratidão dos homens, tu que foste paciente com aqueles que te atacaram, tu
que sempre foste misericordioso, manso, ajuda-nos a combater a nossa dureza
inflexível para com os outros. Também nós te dirigimos a invocação do salmista:
«Não abandones a vinha que a tua mão direita plantou». A nossa oração, depois
deste encontro com a tua Palavra, torna-se uma súplica cada vez mais penetrante
para chegar ao teu coração: “Levanta-nos, Senhor, mostra-nos o teu rosto e
seremos salvos”. Senhor, precisamos extremamente da tua misericórdia e enquanto
houver desejo e busca da tua face em nossos corações, o caminho para a salvação
estará sempre aberto. Amém.»
(Fonte: PAGLIARA, Cosimo, O.Carm. 27ª Domenica del
Tempo Ordinario: orazione finale. In: CILIA, Anthony,
O.Carm. [a cura di]. Lectio divina sui vangeli festivi per l’anno
liturgico A. Leumann [TO]: Elledici, 2010, p. 557.)
Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci” – Videomelie e trascrizioni – 27ª Domenica del Tempo Ordinario – Anno A – 4 ottobre 2020 – Internet: clique aqui (Acesso em: 03/10/2023).
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