Necessitamos de um espírito novo
Mês da Bíblia 2024
Telmo José Amaral de Figueiredo
Presbítero da Diocese de Jales (SP), mestre em Ciências Bíblicas, doutor em Literatura Hebraica e pós-doutor em Teologia Bíblica. Assessor da Comissão Bíblica Diocesana, Jales
“Porei em vós o meu espírito, e vivereis” (cf. Ez 37,14)
O que fazer quando os problemas e desafios são enormes? É possível seguir confiando em Deus diante de uma grande tragédia que afeta toda uma nação? Que esperança pode ter um povo que foi deportado de sua própria terra e vive no estrangeiro em meio às incertezas?
Pois bem, essas foram as grandes questões que
um profeta do Antigo Testamento colocou a si mesmo. Estamos em setembro
novamente, chegamos ao Mês da Bíblia, momento tão aguardado por toda a Igreja
Católica, no Brasil. A cada ano, escolhe-se um livro, seja do Antigo como do
Novo Testamento, para ser refletido, conhecido e meditado durante o mês de
setembro. Em 2024 o livro escolhido foi aquele do profeta Ezequiel.
Ezequiel não é um profeta como os outros,
pois ele atuou e exerceu seu ministério profético somente em terra estrangeira,
longe de seu país, longe de Judá, na Babilônia, para onde foi exilado em 598
a.C. Isso obrigou o profeta Ezequiel a pensar Deus e a religião de uma maneira
bem diferente daquela convencional. Vejamos algumas mudanças que esse profeta
realizou na mentalidade religiosa da época:
a) O Deus de Judá, Javé, não é mais um
Deus prisioneiro de um templo construído por mãos humanas. Ele acompanha o seu
povo exilado na Babilônia. É um Deus que está junto ao seu povo. Apesar que,
aqui, há uma questão em aberto: o que dizer da presença de Deus, na terra de
Judá, onde ficaram mais de 40.000 judeus que não foram deportados? Leia:
Ezequiel 1,1.4-28; 10,1-22; 11,22-25.
b) A aliança antiga que Deus havia
realizado com o seu povo foi quebrada devido à infidelidade do povo,
especialmente de seus governantes, que pecou contra Deus, bem como, pecou
contra os seus próprios irmãos. Assim sendo, Deus se propõe a realizar uma nova
aliança, que não depende mais do rígido cumprimento e observância de leis e
normas, mas de aceitar que o Espírito de Deus esteja no íntimo de cada pessoa e
oriente seus pensamentos e ações. Leia: Ezequiel 16,60-63; 36,26-27.
c) Ezequiel converte-se no grande profeta da responsabilidade
individual, pois a partir de então, a salvação e condenação do ser humano
dependem dele mesmo, e não de seus antepassados nem de sua família, nem sequer
do passado pessoal, mas do presente de cada um. Leia: Ezequiel 18,1-32.
d) Apesar de ser um profeta que viveu na corte
e de estar junto à nobreza no exílio babilônico, Ezequiel foi muito crítico
e duro em relação aos governantes do povo. Para este profeta, Deus não quer
mais que seu povo seja conduzido por esses governantes que permitiram a
desgraça acontecer. Será o próprio Deus quem governará, doravante, a sua gente!
Leia: Ezequiel 34,1-22.
e) O profeta observará que viver em meio a uma
sociedade com costumes, ideias e princípios muito diferentes daqueles do Deus
de Israel comporta um grande risco. Daí a necessidade de não se deixar
contaminar por aquilo que possa nos afastar do verdadeiro Deus. Leia: Ezequiel 22,26;
44,23.
Acima de tudo, o profeta Ezequiel percebeu
que o povo de Deus precisaria ressurgir, renascer em espírito para uma nova
realidade. Não era mais possível continuar adorando a Deus sem que isso tivesse
reflexos decisivos na vida, no comportamento, no pensamento e nas atitudes das
pessoas que dizem acreditar nele! Para isso, o profeta utiliza a imagem de um novo
espírito e um novo coração, isto é, um novo entendimento
(cf. Ez 11,19; 18,31; 36,26-27; 37,14).
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