1º Domingo do Advento – Ano C – HOMILIA
Evangelho: Lucas 21,25-28.34-36
Alberto Maggi *
Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano
Cuidado para não nos envolvermos com o poder
Para o primeiro domingo do Advento, a liturgia apresenta-nos o Evangelho de Lucas, trazendo o último discurso importante de Jesus. É o capítulo 21 dos versículos 25 a 36 com algumas interrupções que não compreendemos o porquê. Jesus responde à pergunta que os discípulos lhe fizeram quando anunciou o fim do Templo em Jerusalém:
“Mestre,
quando será, e qual o sinal quando isso irá acontecer?” (Lc 21,7).
Por que Jesus anunciou a destruição do Templo? Porque uma instituição religiosa que, em vez de cuidar dos pobres e marginalizados, se faz manter por estes e, portanto, em vez de comunicar vida a retira, não tem o direito de existir.
Lucas 21,25-26a:** «Haverá sinais
no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações ficarão angustiadas, com
pavor do barulho do mar e das ondas. Os homens vão desmaiar de medo, só em
pensar no que vai acontecer ao mundo...».
O Evangelho deste domingo, inicia-se com a resposta de Jesus aos seus discípulos. Jesus toma uma citação do profeta Joel (2,10), com a qual foi anunciada a chegada do dia do Senhor, portanto não é uma linguagem real, mas profética, indica uma coisa boa, positiva, a chegada do dia do Senhor. Mas por que Jesus diz: “Os homens vão desmaiar de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo”? Porque o que parecia eterno, esses impérios, o que parecia estável e duradouro, o que parecia real, o que parecia sagrado, de repente não é mais. O próprio Santo Agostinho, ao ver o Império Romano ruir, pensará que chegou ao fim do mundo porque era inimaginável pensar o mundo sem a estrutura do Império Romano. Pois bem, Jesus anuncia, e isso é um encorajamento para a comunidade cristã, que todos esses poderes, esses gigantes todos têm pés de barro e mais cedo ou mais tarde vão desabar.
Lucas 21,26b: «... porque as forças do céu serão abaladas.»
E, de fato, aqui está o anúncio positivo de Jesus. O
que são essas “forças/potências celestes”? No céu significa ter a condição
divina e o céu é o lugar de Deus. Bem, existem intrusos, existem realidades,
instituições que pretendem ter a condição divina. A Carta aos Colossenses
indicará esses poderes com o nome de “tronos, dominações, principados,
potestades” (Cl 1,16), todos tendo relação com o poder. Então,
existem esses intrusos nos céus, na verdade, eles ficarão chocados. Em outras
palavras, é o que João escreve em seu prólogo: “E a luz brilha nas trevas”
(Jo 1,5).
Com o anúncio da mensagem de Jesus, todas as falsas divindades revelarão o que são, ou seja, precisamente a falsidade, e começarão a cair.
Lucas 21,27: «Então eles verão o Filho do Homem, vindo numa nuvem com
grande poder e glória.»
Então esses poderes, aqueles que se arrogaram de condição divina, começarão a se perturbar e “então, [eles] verão”. Jesus não diz “vós vereis”, porque não é uma catástrofe que diz respeito à humanidade, mas uma catástrofe que diz respeito a todos os sistemas de poder que exploram o ser humano para sua própria conveniência. Enquanto os poderes dos céus são perturbados, vemos o anúncio do poder do Filho do Homem que não é o poder do domínio, mas o poder do amor que se torna generosidade e serviço.
Lucas 21,28: «Quando essas coisas começarem a acontecer, reerguei-vos e
levantai a cabeça, porque está próxima a vossa libertação.»
E Jesus adverte-nos que: “Quando essas coisas começarem a
acontecer”, devemos recuperar a nossa dignidade (“reerguei-vos e
levantai a cabeça”), porque a nossa libertação está próxima. Portanto, não
é um anúncio assustador, mas um anúncio de encorajamento: não há
estrutura de poder que não esteja destinada a entrar em colapso mais cedo ou
mais tarde. Então aqui, incompreensivelmente, os liturgistas recortam alguns
versículos que são importantes. Vejamos o texto evangélico que foi cortado e
que não consta no lecionário:
“E Jesus contou-lhes uma parábola: ‘Olhai a figueira e todas as
árvores. Quando começam a brotar, basta olhar para saber que o verão está
perto. Vós, do mesmo modo, quando virdes acontecer essas coisas, sabei que o
Reino de Deus está próximo. Em verdade vos digo: esta geração não passará até
que tudo aconteça. O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras jamais
passarão’” (Lc 21,29-33).
A destruição de Jerusalém e de seu templo, finalmente,
permitirá que, até mesmo, os pagãos entrem no Reino de Deus, então trata-se de
um evento positivo. E Jesus afirma que: “O céu e a terra passarão, mas as
minhas palavras jamais passarão”.
Portanto, Jesus garante à comunidade que o poder do Evangelho será mais forte do que qualquer potência de dominação.
Lucas 21,34-35: «Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem
insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse
dia não caia de repente sobre vós; pois esse dia cairá como uma armadilha sobre
todos os habitantes de toda a terra.»
No entanto, Jesus faz uma clara advertência, a referência é à
parábola dos quatro terrenos (cf. Lc 8,4-15 e paralelos) onde, por
conveniência, por interesse a mensagem de Jesus se torna estéril. A seguir,
Jesus adverte os discípulos, porque, se os discípulos se integraram em uma
sociedade injusta, aquela que deve desaparecer, eles terão a mesma sorte
dela: a destruição.
Finalmente, Jesus coloca a todos de prontidão: “esse dia não caia de repente sobre vós, pois esse dia cairá como uma armadilha”!
Lucas 21,36: «Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem”.»
Por isso, Jesus diz à comunidade: fiquem acordados, estejam atentos, não se conformem à mentalidade deste mundo que é a mentalidade baseada no egoísmo, no interesse, na proveniência das pessoas, caso contrário, como todos esses poderes estão destinados a desaparecer, então vocês correm o risco de fazer o mesmo fim. Então, essa mensagem é uma mensagem de grande encorajamento para a comunidade: a comunidade fiel ao Evangelho será verdadeiramente a luz que brilha nas trevas e fará com que as trevas que sufocam a humanidade se dissipem gradualmente.
*
Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.
** Os textos bíblicos citados foram extraídos de: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994.
Reflexão Pessoal
Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo
«O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por
causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam e
deixam o mal acontecer.»
(Albert Einstein:
1879-1955 ― físico alemão, um dos mais célebres cientistas do século XX)
O tempo do Advento, o tempo de preparação e expectativa para a chegada, sempre renovada, do Menino Deus entre nós começa com um Evangelho que anuncia uma grande notícia (o que é uma redundância, obviamente!): os poderes e poderosos deste mundo não são eternos! A implantação do Reino de Deus, a chegada de seu reinado, nesta Terra, abalará todo tipo de poder que se pretenda eterno!
Sobra, inclusive, para os
que se consideram discípulos, seguidores de Jesus Cristo! Pois, se os cristãos
se deixarem influenciar, dominar e corromper pela ideologia de poder,
pelo egoísmo deste mundo, então experimentarão a mesma sorte, o mesmo
fim dos poderosos e dominadores! Ao anunciar a destruição do Templo de
Jerusalém, Jesus deixa claro que:
Uma religião que não escolhe o lado
dos pobres e marginalizados deste mundo, que não luta por justiça e igualdade,
que não busca o bem de todos, não pode ser uma religião que leva a Deus. Não é
uma religião que durará por muito tempo!
Aqui, me vem de citar Papa Francisco, o qual nos adverte, sempre, do perigo de cairmos no “mundanismo”, ou seja, adotarmos a ideologia, a maneira de pensar e agir deste mundo. Diz o papa:
«Neste
contexto, alimenta-se a vanglória de quantos se contentam com ter algum
poder e preferem ser generais de exércitos derrotados antes que simples
soldados dum batalhão que continua a lutar. Quantas vezes sonhamos planos
apostólicos expansionistas, meticulosos e bem traçados, típicos de generais
derrotados! Assim, negamos a nossa história de Igreja, que é gloriosa por ser história
de sacrifícios, de esperança, de luta diária, de vida
gasta no serviço, de constância no trabalho fadigoso, porque todo o
trabalho é “suor do nosso rosto”. Em vez disso, entretemo-nos vaidosos a falar
sobre “o que se deveria fazer” – o pecado do “deveriaqueísmo” – como
mestres espirituais e peritos de pastoral que dão instruções ficando de fora.
Cultivamos nossa imaginação sem limites e perdemos o contato com a dolorosa
realidade do nosso povo fiel. Quem caiu neste mundanismo olha de cima e, de
longe, rejeita a profecia dos irmãos, desqualifica quem o questiona, faz
ressaltar constantemente os erros alheios e vive obcecado pela aparência.
Circunscreveu os pontos de referência do coração ao horizonte fechado da sua
imanência e dos seus interesses e, consequentemente, não aprende com os seus
pecados nem está verdadeiramente aberto ao perdão. É uma tremenda
corrupção, com aparências de bem. Devemos evitá-lo, pondo a Igreja em
movimento de saída de si mesma, de missão centrada em Jesus Cristo, de
entrega aos pobres. Deus nos livre de uma Igreja mundana sob vestes
espirituais ou pastorais! Este mundanismo asfixiante cura-se saboreando o
ar puro do Espírito Santo, que nos liberta de estarmos centrados em nós
mesmos, escondidos numa aparência religiosa vazia de Deus. Não deixemos que
nos roubem o Evangelho! (Os grifos são meus. PAPA FRANCISCO, Evangelii gaudium, n. 96-97)
E o que faz os poderes e as potências serem abaladas com a chegada do Menino Deus? O que tem de especial a presença de Jesus no mundo, a ponto de representar um transtorno, um pesadelo para aqueles que dominam e desfrutam deste mundo e das pessoas que nele existem?
Foi o modo como Deus entrou na História e se fez presente entre os seres humanos que abala os poderes e os poderosos! O menino nascido em um estábulo, o Deus-incarnado vindo ao mundo pobre entre os pobres, frágil entre os frágeis, inseguro entre os inseguros, ameaçado entre os ameaçados. Diante desse fato, o que sobra, o que resta é a nossa humanidade, feita de proximidade, fraternidade, respeito, justiça e bondade! Isso transtorna a lógica elitista do judaísmo oficial, que esperava um Messias rei, nascido em berço de ouro, destinado a ser um guerreiro conquistador de terras e gentes, a custa da vida e da violência. O Messias da vida não foi compreendido e acolhido por aqueles que aguardavam o Messias da morte, do poder, da conquista.
Tudo isso, deve nos inspirar e nos conduzir em nosso modo de viver, de praticar o nosso cristianismo! Que tipo de Messias nós esperamos? Que tipo de Cristo temos em nossa mente e em nosso coração?
«Senhor Jesus, te dou graças por este novo ano
litúrgico, ano de graça e caminho de santidade. Não somente o meu corpo, mas
também a minha alma tem necessidade de manter-se em boa saúde. Ajuda-me a
empenhar-me com fé e coragem neste Advento: faz que eu saiba erguer a fronte e
olhar para o alto, para ti que vieste, que vem e que virás no final dos tempos.
Todos os seres humanos te procuram, a inteira criação pede por ti, revela-te a
nós, agora, vem conosco, caminha conosco. Senhor nosso Deus, nós te esperamos:
não para nos despirmos de nossas responsabilidades, mas para nos devolver o
compromisso; não para ser consolados, mas para aprendermos a consolar uns aos
outros. Senhor nosso Deus, nos te esperamos: não para te extrair um segredo,
mas para compreender e para acolher o teu mistério; não para resignar-nos à
morte e à violência, mas para acreditar que podem ser vencidas.»
(MESTERS, Carlos. 1ª Domenica di Avvento. In: CILIA, Anthony
O.Carm. Lectio Divina sui vangeli festivi – per l’anno litúrgico C.
Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 22-23.)
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