34º Domingo do Tempo Comum – Ano B – Solenidade de Jesus Cristo, Rei do Universo – HOMILIA

 Evangelho: João 18,33b-37 

Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

Jesus, o rei da verdade!

O julgamento de Jesus, de acordo com João no capítulo 18 de seu evangelho, é um processo bastante estranho porque há o juiz que tem medo do acusado e é o acusado quem dirige as perguntas ao juiz. Por que isso? Enquanto Jesus, que está preso, é totalmente livre, Pilatos, que é livre, está na realidade preso aos condicionamentos de sua conveniência, do poder. Mas vamos ver o que o evangelista escreve para nós no capítulo 18, do versículo 33 em diante. 

João 18,33b-34:** «Pilatos chamou Jesus e perguntou-lhe: “Tu és o rei dos judeus?” Jesus respondeu: “Estás dizendo isto por ti mesmo, ou outros te disseram isto de mim?”.

Pilatos fica surpreso, as autoridades judaicas lhe deram Jesus como um criminoso, como um perigo para os romanos, mas ele não parece ver isso em Jesus, ele não tem nada da aparência do revolucionário perigoso que, pela força e pela violência, deveria expulsar os romanos. Então, ele lhe faz essa pergunta. Jesus reage exatamente como fez com o guarda, quando este lhe deu um tapa (cf. Jo 18,22-23). Jesus é o homem livre e quer libertar as pessoas, quer que elas pensem por si mesmas. Jesus respondeu, porém, é ele quem faz a pergunta a Pilatos. Assim, Jesus convida Pilatos a raciocinar com sua própria cabeça, não com o que os representantes da instituição religiosa lhe disseram que o capturaram com uma mentira. 

João 18,35-36: Pilatos falou: “Por acaso, sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim. Que fizeste?”. Jesus respondeu: “O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui!.

Pilatos reage com raiva, furioso. E expressa todo o desprezo que sentia por esta região que foi chamado a governar. E aqui está a dramática acusação: “O teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim”. O evangelista, no início de seu evangelho no prólogo, havia escrito: “Veio entre os seus e os seus não o receberam”. Todos o rejeitaram, não só os poderosos, mas também os submissos, portanto os sumos sacerdotes, e o povo. Pilatos quer saber o que Jesus fez. Porque os dirigentes lhe disseram que Jesus é um criminoso. No entanto, Jesus não responde a esta pergunta, e diz que ele e Pilatos estão em duas esferas completamente diferentes. Jesus diz que seu reino não é deste mundo. O fato de ele não ser deste mundo não significa que ele não esteja neste mundo. Jesus não está contrapondo este mundo ao além, mas dois mundos diferentes:

a) o mundo de Pilatos, que é o mundo do poder e da dominação, e

b) aquele de Jesus, que é o do amor e do serviço.

Jesus não tem servos, neste mundo, porque veio servir.  Assim, o evangelista apresenta Jesus com dois mundos diferentes: o do amor que produz vida e o do poder que, em vez disso, produz a morte. 

João 18,37ab: Pilatos disse a Jesus: “Então tu és rei?” Jesus respondeu: “Tu o dizes: eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade”.

Jesus não está interessado neste discurso de realeza e interrompe Pilatos. Jesus respondeu: “Tu o dizes: eu sou rei”. O evangelista escreve exatamente: Tu dizes que eu sou rei, ou seja, é a tua opinião. A Jesus, porém, não interessa este discurso de realeza, por isso, ele quer conduzir a conversa ao que é importante para ele, justamente, para oferecer vida também a Pilatos, para libertá-lo. Que “verdade” é esta da qual fala Jesus a Pilatos?

A verdade, no evangelho de João, não é algo que se possui, mas algo que se é. Jesus disse: “Eu sou a verdade”. Ele não disse que eu tenho a verdade, caminha-se na verdade. No diálogo com Nicodemos, Jesus contrapôs quem pratica a verdade com quem pratica o mal (cf. Jo 3,19-21). Portanto, fazer a verdade significa fazer o bem, fazer a verdade significa estar em harmonia com o desígnio de Deus da criação, que coloca o bem da humanidade como o valor supremo. Esta é a verdade do evangelho de João. 

João 18,37c: «Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz».

E então Jesus dá esta indicação preciosa e válida para sempre: “Todo aquele que é da verdade”; portanto não diz “quem tem a verdade”, porque quem tem a verdade, a partir da verdade que acredita possuir, considera-se no direito de julgar e eventualmente condenar aqueles que não pensam como ele. Quem pôs a sua vida em sintonia com esta onda de amor que mantém vivo o universo, o amor do criador pelas suas criaturas, ouve a voz de Jesus. Ele não diz, como seria de se esperar: “quem ouve a minha voz é da verdade”, não. Para ouvir, isto é, entender a voz de Jesus, a mensagem de Jesus, é preciso fazer uma escolha prévia, qual?

A de colocar o bem do ser humano como valor absoluto na própria existência. Somente aqueles que fazem isso entendem a voz de Jesus.

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994.

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«Não rogo que os tires do mundo, mas que os guardes do mal. Eles não são do mundo, como eu não sou do mundo.»

(João 17,15)

A solenidade de Cristo, Rei no Universo é fruto da instituição por parte do Papa Pio XI, em 1925. Ela conclui o Ano Litúrgico da Igreja Católica. É um domingo de retrospectiva geral do ano. Neste Ano Litúrgico B, acompanhamos o Evangelho Segundo Marcos, durante os domingos do tempo comum. Esse evangelho, o primeiro a ser escrito, foca em Jesus como o anunciador do Reino de Deus. Um reino que é para todos nós e deve ser implantado aqui e agora! Reino de amor, paz e justiça! 

Vê-se que o título de “rei” não pega bem para Jesus! Ele sempre o recusou. Confiramos isso no próprio evangelho de João (6,15):

“Quando Jesus percebeu que queriam levá-lo para proclamá-lo rei, retirou-se novamente sozinho para o monte.”

Diante da pressão de Pilatos, ele acaba revelando que o seu reino não é deste mundo ao qual Pilatos pertence. O mundo do poder, o mundo da glória, o mundo da fama, o mundo do prazer, o mundo da futilidade e superficialidade! O reino de Jesus resume-se no servir, no ser irmão e irmã uns dos outros, em praticar e lutar pela justiça, em realizar o bem, enfim, estar do lado da verdade. 

O bem, a felicidade, a dignidade do ser humano são colocados acima de tudo, no reinado diferente de Deus! Pilatos não pode compreender isso, por isso perguntará, em seguida: “O que é a verdade?” (Jo 18,38). Mas não é só ele que não compreende! Infelizmente, as autoridades religiosas e civis judaicas, bem como, boa parte do povo não compreendem esse “rei” Jesus! A própria Igreja Católica não compreendeu, também, pois, durante muitos séculos viveu associada aos monarcas, aos poderosos, aos grandes do mundo. O papa era tido, até o princípio da Idade Moderna, como um imperador supremo, acima de todos os reis da Terra. E, até hoje, existem muitos bispos, cardeais, padres, monges e eclesiásticos em geral que têm nostalgia desses “bons e velhos tempos”, em que a Igreja parecia contar mais e decisivamente neste mundo. Esquecendo-se que o reino de Cristo, o reino de Deus não é deste mundo! 

O que de melhor podemos realizar na Terra é formar bons e conscientes cidadãos para que possam viver e praticar o seu cristianismo realizando o bem-comum de toda a sociedade e não, apenas, de uma minoria privilegiada, como hoje acontece!

O melhor modo de ser cristão, o melhor modo de pertencer ao reino de Jesus, é sermos bons cidadãos, pessoas que se interessam e lutam para promover o bem de todos!


Oração após a meditação do Santo Evangelho
 

«Pai, te louvo, te bendigo, te agradeço porque conduziste-me junto ao teu Filho Jesus no pretório de Pilatos, nesta terra estrangeira e hostil, mas também de revelação e de luz. Somente tu, com o teu amor infinito, sabes transformar toda distância e toda escuridão em lugar de encontro e de vida. Obrigado porque fizeste surgir o tempo santo da consolação, no qual envias o teu Cordeiro, sentado no trono, como rei imolado e vivente; o seu sangue é orvalho restaurador, é unção de salvação. Obrigado porque Ele me fala sempre e me canta a tua verdade, que é somente amor e misericórdia; desejaria ser um instrumento nas mãos do rei, de Jesus, para transmitir a todos as notas consoladoras de tua Palavra. Pai, eu te escutei, hoje, neste evangelho, mas te suplico, faze que os ouvidos não se cansem jamais de ti, de teu Filho, de teu Espírito. Faze-me renascer, assim, da verdade, para ser testemunha da verdade.»

(Fonte: CUCCA, M. A. Domenica: Gesù Cristo Re dell’Universo. In: CILIA, Anthony O.Carm. (a cura di). Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico B. Leumann (TO): Elledici, 2009, p. 628)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – XXXIV Domenica Tempo Ordinario – 25 novembre 2018 – Internet: clique aqui (acesso em: 04/11/2024).

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