«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 5 de agosto de 2022

19º Domingo do Tempo Comum – Ano C – Homilia

 Evangelho: Lucas 12,32-48 

Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano

 

O verdadeiro santuário de Deus é uma comunidade e indivíduos que sabem servir e se doar

No capítulo 12 do Evangelho de Lucas o evangelista apresenta a nova realidade do reino. Se os discípulos cuidarem de seus irmãos, permitirão que Deus, como Pai, cuide de seu bem e de seu bem-estar. Aqui, agora, o evangelista nos apresenta os versículos finais deste capítulo. 

Lucas 12,32:** «Não tenhas medo, pequeno rebanho, pois agradou ao vosso Pai dar-vos o Reino.»

Jesus tira toda ansiedade, toda preocupação: “Não tenhas medo”. É,

Mesmo, minúsculo o rebanho. O termo “pequeno” é micron (grego), significa algo bastante inconsistente. O evangelista contrasta a pequenez, o pequenino - quase microscópico - rebanho, a comunidade que segue Jesus, com a grandeza do Reino de Deus, do plano de Deus para a humanidade. 

Lucas 12,33: «Vendei vossos bens e dai esmola. Fazei para vós bolsas que não se estraguem, um tesouro no céu que nunca se acabe, aonde não chega o ladrão, nem a traça corrói.»

Então Jesus com três imperativos passa a definir as características que tornam possível a realidade deste Reino. O primeiro é “Vendei vossos bens”. Não é um convite, é um imperativo. Então venda o que você tem, “e dai esmola”, ou seja, com o que você obteve, faça o bem a quem precisa. Em seguida, está a mudança, a nova realidade do Reino:Fazei para vós bolsas que não se estraguem, um tesouro no céu que nunca se acabe”.

Sabemos que o termo “céu”, na linguagem da época, significa “em Deus”. O que Jesus quer dizer?

Jesus diz que, à medida que o crente experimenta que dar não significa perder, ele deposita sua confiança no Pai, isso o liberta das preocupações materiais e ele se enche de uma confiança crescente na ação do Senhor.

Portanto, “fazei um tesouro seguro no céu”, isto é, em Deus, “aonde não chega o ladrão, nem a traça corrói”. Portanto, esse tesouro está além de qualquer preocupação. 

Lucas 12,34: «Onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.»

E, então, aqui está a declaração clara de Jesus: “Onde estiver o vosso tesouro (isto é, onde você deposita sua confiança, o que lhe dá segurança), aí estará também o vosso coração”.

O coração, na cultura judaica, não é a sede do afeto como na nossa cultura ocidental, o coração significa a mente, a consciência, então onde estiverem seus pensamentos – diz Jesus – também estará sua vida. Então, para onde você direcionou seus pensamentos, lá estará toda a sua vida, se você pensar no bem dos outros, essa será sua riqueza segura. 

Lucas 12,35: «Ficai cingidos, em prontidão, com as lâmpadas acesas.»

Então Jesus novamente, com um imperativo, – e aqui está uma imagem muito importante que, se bem compreendida, muda a relação com Deus e, consequentemente, a relação com os irmãos –, diz: “Estejais prontos, com vossas roupas apertadas nos quadris”. Por que essa recomendação? A vestimenta comum dos homens, na Palestina, era uma túnica até o tornozelo. Quando era preciso sair e, principalmente, quando era preciso trabalhar, essa túnica era um empecilho, por isso ela era amarrada na cintura.

Então Jesus pede que a característica, o que distingue a sua comunidade de discípulos, o seu traço distintivo, seja esta ATITUDE DE SERVIÇO. Não um serviço qualquer, mas um serviço que se torna o traço distintivo da pessoa e da comunidade.

E então Jesus acrescenta: “com as lâmpadas acesas”. Por que essa referência às lâmpadas acesas? A referência é ao livro do Êxodo onde, em uma tenda, havia a presença do Senhor, e havia a exigência de que uma lâmpada deveria estar sempre acesa [Ex 27,20-21]. Com esta preciosa indicação, ...

... Jesus diz que o indivíduo e a comunidade que se manifestam no SERVIÇO são o verdadeiro santuário onde Deus revela a sua presença. 

Lucas 12,36: «Sede como quem está esperando seu senhor voltar de uma festa de casamento, para lhe abrir a porta, logo que chegar e bater.»

Assim como Javé era o noivo de seu povo, Jesus é o noivo da nova comunidade. Jesus não se comporta como o dono que entra, abre bem a porta. Ele bate. É um grande sinal de respeito e gentileza para com os outros. 

Lucas 12,37-38: «Bem-aventurados os servos que o Senhor encontrar acordados quando chegar. Em verdade, vos digo: ele mesmo se cingirá, os fará assentar-se à mesa e passará a servi-los. E caso ele chegue pela meia-noite ou já perto da madrugada, bem-aventurados serão, se assim os encontrar!»

E, aqui, Jesus proclama algo inconcebível para a cultura da época. Jesus proclama “bem-aventurados”, isto é, extraordinariamente e plenamente felizes, “os servos que o senhor encontrar acordados quando chegar”. Então essa atitude de serviço não é algo que vale a pena de vez em quando, é uma atitude que continuamente distingue e identifica a comunidade de Jesus.

 O que Jesus pediu que seus discípulos tivessem como distintivo, o serviço, é o seu distintivo. Jesus, em sua comunidade, é quem serve. E aqui está algo inédito. Jesus se apresenta como o Senhor, o dono da casa e, em vez de se sentar à mesa e ser servido pelos servos, servirá. Jesus diz: “Ele os fará assentar-se à mesa (literalmente deitar-se à mesa) e passará a servi-los”. Esta é a novidade de Jesus. Jesus, no evangelho de Lucas, na última ceia, ele faz esta afirmação: “Eu, porém, estou no meio de vós como aquele que serve” [Lc 22,27].

Esta imagem do evangelista é uma alusão à Eucaristia. A Eucaristia não é um culto, mas é a comunidade que, continuamente em atitude de serviço, é convidada a descansar por Jesus, para restaurá-la, para recarregá-la com uma nova carga de seu amor.

O próprio Jesus passa a servir, esta é a imagem que o evangelista nos apresenta. Portanto, não uma comunidade a serviço de Deus, mas Deus que se põe a serviço da comunidade.

Então o culto da comunidade cristã não é dirigido a Deus, ao Pai, mas do Pai, por meio de Jesus, passa aos homens para que se manifestem continuamente por meio dessa atitude de serviço.

Lucas 12,39-48: «Sabei isto: se o dono da casa soubesse a que hora viria o ladrão, não deixaria que sua casa fosse arrombada. Também vós, ficar preparados, pois na hora em que menos pensais virá o Filho do Homem. Então Pedro disse: “Senhor, é para nós ou para todos, que contas essa parábola?” O Senhor respondeu: “Quem é o administrador fiel e prudente, que o senhor encarregará dos servos da casa para lhes dar a alimentação na hora certa? Bem-aventurado aquele servo que o senhor, ao chegar, encontrar agindo assim! Verdadeiramente, vos digo: ele o encarregará de todos os seus bens. Porém, se outro servo pensar consigo mesmo: ‘Meu senhor está demorando’ e começar a bater nos criados e nas criadas, a comer, a beber e a embriagar-se, então o senhor daquele servo chegará num dia em que não o espera e numa hora que desconhece, e o aniquilará e lhe destinará à sorte dos infiéis. Quanto ao servo que, conhecendo a vontade do senhor, nada preparou, nem agiu conforme a sua vontade, receberá muitas chicotadas. O servo, porém, que, não conhecendo essa vontade, fez coisas que merecem castigo, receberá poucas chicotadas. Todo aquele a quem muito foi dado, muito lhe será pedido; se a alguém muito se confiou, muito mais se exigirá!”»

E Jesus continua com esta atitude de disponibilidade que torna reconhecível a sua comunidade. Essa presença de Jesus em sua comunidade, esse súbito aparecimento dele não tem prazo, é de repente. O que significa de repente?

Sempre que há situações de necessidade, de necessidade dos outros, a comunidade deve estar pronta.

Mas também há o lado negativo. Jesus diz que se na comunidade, em vez de servir uns aos outros, se na comunidade não se tratam com amor e respeito, mas com arrogância, com prepotência, com desejo de poder, escravizam os outros por conveniência própria, Jesus usa uma expressão terrível. Ele diz “quando o senhor chegar” – a expressão é muito forte – “ele o dividirá em dois” [na tradução da CNBB consta “aniquilará”].

Ser dividido em dois era a pena para os traidores.

Por isso, Jesus adverte que aqueles da comunidade que, ao invés de servir, se colocar a serviço dos outros, pretendem comandar, dominar, agir com arrogância, para Jesus são traidores que nada têm a ver com sua realidade.

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 5. ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2021.

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

“Quem não vive para servir, não serve para viver.”

(Mahatma Gandhi: 1869-1948 – líder pacifista indiano que lutou pela independência da Índia e pela paz entre hindus e muçulmanos)

A questão mais importante de todas, quando se trata de religião, é uma só:

* Cremos, de verdade, naquilo que professamos com nossos lábios?

* Acreditamos, de fato, em Deus e em seu Reino?

* Ou possuímos um tipo de “fé” que poderíamos denominar de “cultural”, fruto do ambiente, produto da sociedade na qual vivemos?

Eu ponho essa questão, aqui, desde o início porque Jesus insiste, demasiadamente, em uma ideia: “Não tenhais medo!” O medo é fruto da falta de fé! Medo é produto da desconfiança! Medo é uma atitude de covardia! Daí, Jesus não tolerar o medo. 

E qual é a garantia que Jesus nos dá para não termos medo? No Evangelho deste domingo, ele diz: “agradou ao vosso Pai dar-vos o Reino”. É preciso ficar claro uma coisa: o Reino não é uma promessa! O Reino não é algo para o futuro, para o além desta vida! O Reino é Deus mesmo! O Reino é Deus presente, atuante, realizando a sua Vontade, aqui, nesta terra! Portanto, quando Jesus diz que o Pai deu para nós o Reino, é o mesmo que dizer: “Deus é vosso”, “Deus se entregou por vós”. Como afirma J. M. Castillo: “O dom de Deus a seus fiéis é Deus mesmo”.

Então, se temos a Deus, devemos nos perguntar:

* por que temos medo?

* Por que temos tanta dificuldade em desapegar-nos de nossos bens, nosso dinheiro, nossas riquezas?

* Por que depositamos nossa segurança nos tesouros acumulados, aqui, nesta terra?

* Por que temos a vontade de dominar, comandar e nos sobrepor aos outros?

* Por que queremos mais ser servidos do que servir?

O que Jesus nos pede é aquilo que, ele mesmo, faz: SERVIR AOS OUTROS. Deus se desfaz em AMOR e SERVIÇO à humanidade, enquanto que, nós, seres humanos, temos muitíssima dificuldade em fazermos o mesmo! Por quê? Porque não temos fé! Não acreditamos, para valer, que Deus esteja aqui, que ele esteja no comando da vida, do mundo, da história! Não nos sentimos seguros neste mundo, porque somos, por demais, apegados ao que é “nosso”, à propriedade, aos bens, ao material. E isso é muito fugaz! Isso tudo, como Jesus frisa no Evangelho deste domingo, pode ser levado por ladrões ou corroído pelas traças e vermes! 

No fundo, temos dificuldade em crer naquilo que o Evangelho tanto insiste: sermos de Deus, de verdade! Pertencermos a ele e a nada mais! Se fôssemos, verdadeiramente, de Deus teríamos:

* confiança,

* tranquilidade,

* paz,

* segurança,

* amor e alegria!

* Enfim, seríamos bons cidadãos, boas cidadãs, pessoas comprometidas com o bem de todos e não, apenas, de alguns!

* Seríamos tão humanos como foi Jesus: Deus humanizado em seu Filho! 

Afinal, nos sentimos herdeiros, portadores, de fato, do Reino de Deus nesta terra? Nossas comunidades vivem e respiram, de verdade, esse clima do Reino? Se, assim, não for, não somos comunidade de Jesus!

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Que a mesma fé que moveu Abraão a viver na terra como peregrino arda em nossos corações, ó Pai, e não deixe que nossa lâmpada se apague, para que, vigilantes na espera da tua hora, sejamos introduzidos por ti na pátria eterna. Amém.»

(Oração da Coleta – 19º Domingo do Tempo Comum – Ano C – Missal italiano)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – XIX Domenica del Tempo Ordinario – Anno C – 11 agosto 2019 – Internet: clique aqui (Acesso em: 03/08/2022).

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