«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

6º Domingo do Tempo Comum – Ano A – Homilia

 Evangelho: Mateus 5,17-37 

Frei Alberto Maggi

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas) 

O Messias veio revelar o significado da Lei de Deus

O Evangelho deste domingo é muito longo e é impensável, no pouco tempo de que dispomos, poder ler e comentar tudo, por isso focamos a atenção apenas nos primeiros versículos, até porque são os mais polêmicos e, talvez, o mais importante. É o capítulo 5 de Mateus, a partir do versículo 17, e a passagem litúrgica continua até o 37. 

Mateus 5,17a: «Não penseis que vim abolir a Lei e os Profetas.»

Qual é o contexto dessa declaração de Jesus? É a proclamação das bem-aventuranças. A nova relação que Jesus veio propor com Deus já não podia estar contida na antiga aliança, a de Moisés. Moisés era o servo do Senhor e havia imposto uma aliança entre os servos e seu Senhor, baseada na obediência à sua lei, pela qual o crente, com Moisés, era aquele que obedecia a Deus, observando suas leis. Porém, Jesus não é o servo de Deus, Jesus é o filho de Deus, então ele veio propor um novo relacionamento, baseado na aceitação e prática do amor do Pai, pelo qual o crente, para Jesus, é aquele que se assemelha ao Pai, praticando um amor semelhante ao dele.

Jesus exprimiu esta nova relação, formulou-a no monte: como Moisés, no monte Sinai, anunciou o decálogo, Jesus, no monte, propôs as bem-aventuranças, que são a nova aliança de Deus com o seu povo. Bem-aventuranças, porém, que sem dúvida causam perplexidade, decepção nos ouvintes, por quê? Na primeira bem-aventurança, sabemos, ...

... Jesus nos convida a entrar na condição de pobreza, para eliminar as raízes da pobreza.

Bem, esperava-se exatamente o contrário: o reino de Deus seria um reino de esplendor, um reino de sucessos, seria, acima de tudo, um reino de acumulação de riquezas. Basta ler a última parte do profeta Isaías (66,18-24), onde se imaginam caravanas de dromedários e camelos, que trazem a Jerusalém riquezas de todo o mundo. Portanto, há uma perplexidade diante da pregação de Jesus.

Então Jesus diz: não, “não penseis que vim”, e o verbo usado pelo evangelista não é “abolir”, que é usado para uma lei, mas é “demolir, destruir”. É o mesmo verbo que, mais tarde, no julgamento de Jesus, no capítulo 26, no versículo 61, será usado como acusação contra Jesus, acusado de ter vindo “destruir” o templo. Jesus não fala em abolir uma lei, mas em destruir, o quê? “A Lei ou os Profetas”. Não se trata de observar ou não a lei: com Jesus já não é a lei que relaciona o homem com Deus, mas a aceitação do seu amor. Lei e profetas são o que chamamos de Antigo Testamento, ou seja, o complexo da Bíblia, formado pelos livros da lei e aqueles dos profetas. 

Mateus 5,17b: « Não vim abolir, mas completar.»

Então Jesus diz: “não vim abolir”, este é o significado, “aquele desígnio de Deus, que estava contido na lei e nos profetas, não vim para revogá-lo, mas para dar-lhe pleno cumprimento”. Dêmos um exemplo: no livro do Deuteronômio, portanto na lei, o Senhor diz que entre o seu povo ninguém passe necessidade, e nos livros dos profetas há uma denúncia constante da riqueza, da ganância, que torna as pessoas carentes. Bem, Jesus não veio para demoli-la, mas para completá-la. É por isso que a primeira bem-aventurança é o convite à partilha.

A primeira bem-aventurança está idealmente ligada ao último dos mandamentos, qual era o último dos mandamentos: não cobiçar os bens alheios. A primeira bem-aventurança é: deseje que os outros tenham o mesmo que você. Então Jesus vem para concretizar tudo isso; por isso proclama estas bem-aventuranças, este convite à partilha.

O sinal, a garantia de que, na comunidade cristã, existe a presença de Deus é que ninguém passa necessidade.

Nos Atos dos Apóstolos, lemos que a primeira comunidade cristã testemunhou com grande força a ressurreição de Jesus, porque ninguém passava necessidade. E é por isso que, no “Pai Nosso”, Jesus insere a cláusula para cancelar as dívidas; são dívidas econômicas, então eis o que significa que Jesus não veio para abolir esse projeto, esse ideal do Reino, mas para levá-lo a cabo. 

Mateus 5,18: «Em verdade, eu vos digo: antes que passem o céu e a terra, nem a mínima letra ou traço serão tirados da Lei, até que se cumpram todas as coisas.»

E então Jesus assegura: “Em verdade”, o termo hebraico que se traduz com verdade é “amém”, “eu vos digo: antes que passem o céu e a terra”, uma imagem que diz tudo, “nem um só iota”, o iota é o yód (fonético), o menor sinal do alfabeto hebraico, “ou um só traço serão tirados da Lei, sem que tudo tenha acontecido”, é a garantia de Jesus. Este plano de Deus para a humanidade, de uma sociedade alternativa, encontrará muitas dificuldades, mas, mais cedo ou mais tarde, dará frutos. 

Mateus 5,19: « Portanto, quem abolir um só destes mandamentos, por menor que seja, e assim ensinar aos homens, será considerado o menor no Reino dos Céus. Porém, quem os praticar e os ensinar será considerado grande no Reino dos Céus.»

E, por isso, Jesus pede que “quem, pois, transgredir apenas um destes mínimos preceitos”, os mínimos preceitos são as suas bem-aventuranças, insignificantes face à grandeza dos mandamentos, “e ensinar os outros a fazerem o mesmo, será considerado o menor no reino dos céus. Mas quem os guardar e ensinar será considerado grande no reino dos céus”. O menor e o maior não significam uma hierarquia, os mais importantes e os menores, mas é uma forma judaica de dizer exclusão ou pertencimento.

Depois Jesus convida os seus discípulos, aqueles que ouvem, a praticarem as bem-aventuranças e, quando Jesus diz “ensinar aos outros”, não quer dizer que vai ensinar uma doutrina, as últimas palavras de Jesus neste Evangelho são: “Ensinai-os [todos os povos pagãos] a observar/praticar tudo o que vos mandei” (Mt 28,20).

O que Jesus nos convida a ensinar não é uma doutrina, mas uma prática, e qual é a prática? A do amor e da partilha.

Se isso existe, o reino dos céus é realizado, ou melhor, o reino de Deus, uma sociedade alternativa.

Dissemos que essas palavras de Jesus levam a decepções, porque Jesus, na verdade está nos dizendo:

“Não, não vim para abolir este projeto do reino, vim para realizá-lo, mas não como vocês pensam. Vocês pensam que isso é alcançado por meio da acumulação de riqueza, eu lhes digo, em vez disso, que é mediante a partilha de bens; vocês pensam que isso é realizado por meio do poder, da dominação, em vez disso, eu digo a vocês que será realizado por meio do serviço; vocês pensam que isso é apenas para Israel, mas meu programa é para toda a humanidade”.


Mateus 5,20-37: «Com efeito eu vos digo: se vossa justiça não superar a dos escribas e fariseus, não entrareis no Reino dos Céus. [...] Seja o vosso sim, sim, e o vosso não, não. O que passa disso vem do Maligno.»

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 6. ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2022. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«Ressignificar é complexo, pois implica em mexer nos mais profundos dos “arquivos” (ensinamentos) e redefinir o “o que” e “o como” somos.»

(Rond-Deyvely)

É muito importante aquilo que lemos no Evangelho deste domingo: Jesus não veio destruir a Lei de Moisés, as normas de vida que foram transmitidas ao povo de Israel no passado, mas ressignificá-las, isto é, revelar o verdadeiro significado e aplicação que elas possuem na vida dos seres humanos. 

A grande indignação de Jesus com os líderes religiosos de seu tempo era motivada pelo fato de terem afastado Deus de seu povo e o povo de seu Deus! Fizeram isso, ao insistirem em um Deus que está “nas alturas”, distante do cotidiano humano e que atua como se fosse um terrível juiz ou bedel a exigir o cumprimento rigoroso, pormenorizado de uma montanha de regras e proibições! Ao invés de um Deus-amor, apresentaram ao povo um deus-carrasco! Um deus que parecia ter prazer em punir, em provocar dor, morte e infelicidade entre os seus filhos! Por isso, a religião, no tempo de Jesus não promovia a felicidade, mas o temor, a apreensão, o medo! 

Devido a isso, Jesus vem colocar a “casa” em ordem! Ele vem reapresentar o verdadeiro Deus ao seu povo, ele vem revelar o autêntico significado da Lei de seu Pai, que tinha se perdido em um emaranhado de normas sem vida e sem sentido! O Evangelho deste domingo apresenta-nos um exemplo dessa ressignificação promovida por Jesus, vejamos: 

1. O homicídio (Mt 5,21-22) não é, somente, tirar a vida de uma pessoa, mas anulá-la, aos poucos, dentro de nosso coração! Ao irar-nos, ao desprezarmos, ao insultarmos alguém, já iniciamos um processo de morte, de aniquilamento dessa pessoa em nosso íntimo! Isso, também, é tirar a vida de alguém! 

2. O culto, a oferta que realizamos a Deus (Mt 5,23-24) não tem sentido e valor se não estivermos, ao mesmo tempo, em comunhão com os demais irmãos! Não encontramos Deus diante do altar, mas em cada ser humano! Para estar bem com Deus, há de se estar bem com o próximo! 

3. Evitar os processos judiciais, as querelas e disputas (Mt 5,25-26)! Vale mais o diálogo, o acordo, a resolução amigável dos problemas que as brigas e demandas. 

4. O adultério (Mt 5,27-30) não se concretiza, somente, na relação sexual, mas ele se inicia com a cobiça, com o “olhar” (= desejo) que se começa a ter por outra pessoa. E isso acontece, porque não dominamos os nossos instintos e vontades, representados pelo “olho direito”, “mão direita” etc. A desatenção para com o cônjuge é o princípio do adultério! 

5. O divórcio (Mt 5,31-32) é prejudicial à mulher e, hoje, também ao homem! Por isso, deve ser evitado, ao máximo! Jesus insiste que o casal busque todos os meios possíveis para evitar uma separação, pois a dissolução de um matrimônio é um convite ao adultério! 

6. Não se deve jurar (Mt 5,33-37) por nenhum motivo! Aqui, Jesus foca a perda do valor da palavra humana, da credibilidade do ser humano e o uso do nome de Deus em vão. A falsidade, a mentira, a hipocrisia não se misturam com Deus! Deus não pode ser envolvido em nossos mesquinhos projetos e desejos. 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«A Palavra que escutamos e meditamos pareceu-nos forte, Senhor, e desafiou a nossa atitude: «Vai primeiro reconciliar-te!». Antes de tudo, antes de estar diante do altar, antes de apresentar nossas coisas e entregá-las a Ti com amor, antes que o irmão tome a iniciativa, ajuda nosso coração a realizar aquele movimento que recompõe o conflito, a dilaceração, para recompor a harmonia perdida. Amém.»

(Fonte: Cosimo Pagliara, O.Carm. 6ª Domenica del Tempo Ordinario: orazione finale. In: CILIA, Anthony O.Carm. Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico A. Leumann [TO]: Elledici, 2010, p. 381.)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci” – Videomelie e trascrizioni – VI Domenica del Tempo Ordinario – Anno A – 16 febbraio 2020 – Internet: clique aqui (Acesso em: 08/02/2023).

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