5º Domingo da Páscoa – Ano C – Homilia

 Evangelho: João 13,31-35 

Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

Há, apenas, um mandamento a seguir: amar!

No capítulo 13 do Evangelho de João, o evangelista apresenta a Última Ceia de Jesus com seus discípulos, na qual, até o último momento, Jesus faz a tentativa de oferecer seu amor também ao discípulo que o trairá, a Judas. Oferece-lhe o pão, que representa a sua vida, mas Judas não come este pão, ou seja, não assimila Jesus, toma-o e sai. O evangelista diz que “afundou na noite” [Jo 13,30b]. 

João 13,31:** «Depois que Judas saiu, Jesus disse: “Agora foi glorificado o Filho do Homem, e Deus foi glorificado nele.»

Quando Judas saiu (do Cenáculo), pegou o bocado de pão que lhe foi dado, não o assimilou, mas foi trair a pessoa de Jesus, Jesus disse: “Agora...” Ao longo do Evangelho esta hora de Jesus foi anunciada e o evangelista diz que, agora, está acontecendo. Por que Jesus diz isso depois que Judas o traiu para condená-lo à morte?

Porque no amor incondicional que também é oferecido ao inimigo, a glória de Deus se manifesta ali, ou seja, a glória é a manifestação visível do que Deus é. E o que é Deus?

Deus é amor que se oferece também ao inimigo, ao traidor.

Jesus fala de si mesmo como o “Filho do Homem”, por que usa essa expressão que lhe é muito cara? “Filho do Homem” significa homem com a condição divina, então...

Jesus é filho de Deus, Deus na condição humana, e é filho do Homem, ou seja, homem com a condição divina.

E Deus foi glorificado nele.” O evangelista apresenta uma dinâmica contínua na vida de Jesus, que deve ser também a do crente, do amor recebido e do amor comunicado. 

João 13,32: «Se Deus foi glorificado nele, também Deus o glorificará em si mesmo, e o glorificará logo.»

Este é um versículo que é omitido em muitos manuscritos, onde o evangelista não faz nada além de repetir o mesmo conceito. Como ele irá glorificá-lo imediatamente? Dando-lhe a capacidade de enfrentar a morte, a qual não será um fim, mas um começo, porque na morte de Jesus o Espírito se derramará sobre sua comunidade. 

João 13,33: «Filhinhos, por pouco tempo ainda estou convosco. Vós me procurareis, e agora vos digo, como eu disse também aos judeus: ‘Para onde eu vou, vós não podeis ir’.»

Então Jesus, pela primeira vez, a única vez, tem uma expressão de tanta e profunda ternura para com seus discípulos. Ele os chama de “Filhinhos”, literalmente “criancinhas ou minhas crianças”. Aqui, quando menciona o que disse aos judeus, Jesus está equiparando os discípulos a seus adversários, às autoridades. Por que eles não podem ir com Jesus? Porque os discípulos estão prontos para morrer por Jesus, mas não para morrer como Jesus, para dar a vida com ele e como ele. É por isso que Jesus diz que, por enquanto, eles não podem ir para onde ele vai. E, em seguida, está a conclusão deste capítulo extraordinário, capítulo 13, a novidade de Jesus. 

João 13,34: «Eu vos dou um novo mandamento: que vos ameis uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros.»

Eu vos dou um mandamento novo”. Jesus não diz: “Eu vos dou um novo mandamento” [como, aliás, consta da tradução da CNBB], ou seja, há os de Moisés e agora eu vos dou o meu. “Dou-vos um mandamento novo”, a palavra grega para “novo” significa o melhor, que substitui tudo o mais. O evangelista havia dito isso no Prólogo de seu Evangelho: “A lei foi dada por meio de Moisés, a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo” [Jo 1,17].

A nova relação que Jesus estabeleceu com o Pai e os discípulos não poderia se enquadrar nos termos da antiga aliança e precisa de uma nova aliança que se expressa em um único e novo mandamento.

Portanto, “novo” na medida em que a qualidade deste mandamento eclipsa todos os outros.

É importante observar que Jesus não fala com verbos no futuro, ele não diz “como eu vos amarei”. Jesus não está anunciando a morte, o sacrifício total que fará na cruz, mas diz “como eu vos amei”. E como é que Jesus amou? Estamos no contexto da Última Ceia segundo João, quando Jesus começou a lavar os pés dos discípulos.

O amor não é real se não for transformado em SERVIÇO que purifica a vida dos outros.

Este é o amor que Jesus requer de nós. 

João 13,35: «Nisso conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns para com os outros.”»

O serviço é o único traço distintivo do crente na comunidade de Jesus e, de fato, Jesus confirma: “Nisso”, isto é, no amor que se torna serviço, “conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns para com os outros”.

Jesus, com esta afirmação muito clara, exclui qualquer outro distintivo.

Portanto, NÃO aos brasões, roupas, sinais ou condecorações que queiram mostrar a relação que se tem com o Senhor, mas apenas um amor que se põe a serviço dos outros.

E quando esses substitutos são usados, é uma luz de alarme que se acende, uma luz de alerta que acende, que talvez esse amor que se transforma em serviço não seja tão comum a ponto de ser o único distintivo da comunidade cristã.

Portanto, Jesus deixa um único mandamento, ele que o evangelista apresentou como a palavra de Deus, a palavra se fez carne, e esta palavra de Deus é formulada e expressa com um único mandamento que eclipsa todos os outros. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 3. ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2019. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

“Amar não é olhar um para o outro, é olhar juntos na mesma direção.” (Antoine de Saint-Exupéry (1900-1944): escritor, ilustrador e piloto francês)

No relato do Evangelho deste domingo, Jesus faz a mais surpreendente afirmação de toda a sua vida! Isso mesmo! Afinal, quem poderia esperar dele que falasse de “glorificação”, “ser glorificado” ao constatar que um de seus amigos mais íntimos havia decidido traí-lo e entregá-lo à morte? No cume do sofrimento e do fracasso, em meio a uma das mais dolorosas situações de sua vida, Jesus levanta sua voz e proclama: “Agora foi glorificado o Filho do Homem, e Deus foi glorificado nele” (João 13,31). 

O esplendor do poder divino, a glorificação, para Jesus, não está na vitória, em ser bem sucedido, mas em seu aparente fracasso e derrota! Isso que se parece a algo desumano, na verdade, é a realização da mais plena humanidade: amar e ser amado! É neste momento de sua vida, que Jesus revela o seu TESTAMENTO, aquilo que ele quer deixar para todos os que o seguirem: amem-se uns aos outros como eu vos amei! Portanto, como bem sintetiza J. M. Castillo:

«Aquele que ama o ser humano, seja quem for, este é o que ama a Deus

E o cristianismo se resume a isso!!!

Mas, atenção, não se trata de um amor qualquer! O amor que Jesus pede de cada um de nós é: “como eu vos amei (João 13,34). E como é que ele nos amou? Ele nos amou, resumindo, de três modos:

a) Como amigos: “Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz seu senhor. Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de meu Pai” (João 15,15). Na Igreja e fora dela, todos devemos nos amar como amigos. E entre amigos há igualdade, proximidade e apoio mútuo. Ninguém que é verdadeiro amigo se sente e se coloca acima do(a) outro(a) amigo(a).

b) Como servidor: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por muitos” (Marcos 10,45 // Mt 20,28; Lc 22,27b). Na Igreja não deve haver disputa por posições, cargos, fama, poder. Pelo contrário, o protagonismo está em SERVIR, em vir ao encontro das necessidades dos outros.

c) Acolhendo a todos: essa comunidade de amigos, reunida entorno a Jesus, não se fecha em si mesma! Ao contrário, a amizade com Jesus e entre os seus seguidores promove a abertura e acolhida de todos, especialmente, dos pecadores, dos excluídos e desprezados. E Jesus simboliza isso, mediante a figura de uma criança: “Quem recebe, em meu nome, uma só criança como esta, recebe a mim mesmo” (Marcos 9,37 // Mt 18,5; Lc 9,48). 

É inevitável surgir as seguintes questões em nossa mente:

* O modo como nós vivemos, hoje, na Igreja e fora da comunidade eclesial, indica que somos cristãos?

* As pessoas, observando nossas atitudes, palavras e ações nos identificam, imediatamente, como seguidores de Jesus Cristo?

* Será que grande parte de nosso insucesso em atrair mais pessoas para Cristo, não se deve ao fato de não sermos um “outro Cristo” para o mundo onde vivemos? 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Eu te amo por ti mesmo, eu te amo por teus dons,

Eu te amo por tua causa

e eu te amo tanto que,

se algum dia Agostinho fosse Deus

e Deus fosse Agostinho,

eu gostaria de voltar a ser o que sou, Agostinho,

para fazer de ti o que tu és,

porque só tu és digno de ser quem tu és.

Senhor, tu vês,

minha língua enlouquece,

Não sei me expressar,

mas o coração não enlouquece.

Tu vês o que eu sinto

e o que eu não posso te dizer.

Te amo, meu Deus,

e meu coração é estreito para tanto amor,

e minhas forças se rendem a tanto amor,

e meu ser é pequeno demais para tanto amor.

Eu saio da minha pequenez

e todo em ti, eu mergulho,

eu me transformo e me perco.

Fonte do meu ser,

fonte de todo o meu bem:

meu amor e meu Deus.»

(Santo Agostinho, Confissões)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – V Domenica di Pasqua – 19 maggio 2019 – Internet: clique aqui (Acesso em: 10/05/2022).

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