A REFORMA QUE O BRASIL PRECISA
Para sociólogo, política está privatizada
e mercantilizada por empresas
Eduardo
Maretti
Na opinião de Cândido Grzybowski, país está num beco
sem saída
"porque sistema é corrupto". "Temer não
tem condições mínimas de governar,
mas só não caiu porque eles não têm solução no
bolso"
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CÂNDIDO GRZYBOWSKI - sociólogo do IBASE |
Depois
da absolvição da chapa Michel Temer-Dilma Rousseff, pelo Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), o país parece estar em um beco sem saída. Agora, à espera da
denúncia que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve apresentar
contra Temer na próxima semana. Para o sociólogo
Cândido Grzybowski, assessor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e
Econômicas (Ibase), a encruzilhada em que o país se encontra, mais do que uma
crise conjuntural, é sintoma de uma
estrutura contaminada. “Estamos num beco sem saída porque o sistema é
corrupto. O modo de fazer política no
Brasil é privatizado e mercantilizado pelas empresas.”
Para
ele, o paralelo que se pode fazer entre a crise dos anos 1980 e o atual impasse
mostra que o problema brasileiro é estrutural. Para a crise de hoje ser superada, será preciso instaurar um novo processo constituinte.
“O
primeiro movimento das ‘Diretas Já’ acabou na Constituinte de 1988. Naquele
momento acabou no ‘Centrão’. Lembrando o 'Centrão' daquela Constituinte, a
maioria do Temer é muito parecida. Isso mostra que a política não mudou. Houve avanços em direitos civis, políticos
e sociais, mas nada na economia, em questões de propriedade ou tributárias.
E com os governos do PT se adotou a conciliação como estratégia”, diz
Grzybowski. O “Centrão” dos anos 1980 era formado pela ala conservadora do PMDB
mais PFL, PDS, PTB e partidos menores. “Para
usar a mesma imagem, o 'Centrão' de hoje está perdendo eficácia”, diz.
Na
opinião do sociólogo, a encruzilhada a que chegou o país não é apenas para os
setores progressistas. “Temer não tem
condições mínimas de governar, mas só não caiu porque eles não têm solução no
bolso. Quem eles podem colocar de imediato? Se tivessem, ele já teria caído.
Mas o fato é que ele já não está mais servindo.”
Grzybowski
acredita que a saída são as eleições
diretas, mas dentro de um processo o
mais democrático possível. Sem essa condição, nem uma saída via eleições
pode ser favorável ao país. “Por exemplo, se o Lula se eleger e não se renovar
o Congresso, é como não resolver nada. A eleição direta têm a vantagem de
recuperar a legitimidade mínima. Mas ela só pode acontecer sem
condicionalidades. Tem que ser levada às ultimas consequências. Se houver 'Diretas Já', precisa ser também
para deputados e senadores junto. No mínimo, para criar legitimidade e se
constituir uma aliança que talvez produza algumas alternativas.”
Se
Temer será afastado, se alguma nova bomba está a caminho, se a denúncia de
Janot vai redundar no fim do governo Temer ou não, ainda não se pode prever. “Mas precisávamos hoje de alguém um tanto
neutro, como um Itamar Franco pós-Collor. Hoje não tem esse nome”, avalia o
sociólogo. Seja quem for, essa personalidade “neutra” precisaria ser alguém
“com compromisso de garantir que as eleições do ano que vem fossem
democráticas, as mais diretas possíveis, sem interferência empresarial e como
um pacto para se pensar numa
Constituição nova, porque a atual Constituição foi desfigurada”.
Para
Grzybowski, não está claro o que pretendem os grupos por trás dos atuais
governantes e seus aliados. “Há personagens pequenos como Temer, Romero Jucá,
figuras que não tem por que valorizá-las. E
não é a movimentação de Fernando Henrique, Nelson Jobim e outros que interessa.
Mas a dos grandes grupos, Bradesco, Itaú, a própria JBS. Em que jogada
estão apostando? O ciclo da democratização revela a mesma coisa. Os personagens
são diferentes, mas Sarney, que era vice, vinha do regime militar e virou
presidente; o Temer, um vice, deu o golpe. São dois vices. O 'Centrão' hoje se
chama base.”
Capitalismo
selvagem
Na
opinião do analista, o país tem hoje
implantadas “as bases de um projeto do tipo capitalismo selvagem como no tempo
militar”. A principal missão do governo Temer já foi feita: “a reforma
constitucional da maldade”, que congelou os gastos com educação e saúde, além
de inúmeras outras limitações. A Emenda
95 tirou o sentido do que tinha de melhor na Constituição de 1988, os direitos
sociais, avalia.
“Se
eles completarem as duas outras mudanças (trabalhista e previdenciária)
precisará de muito tempo para mudar isso. Já
impuseram uma agenda de longo prazo ao país. Para desfazer isso, só com um
movimento de 'Diretas Já', capaz de gerar um impasse diferente: uma constituinte soberana que coloque o
país nos trilhos.”
Na
opinião de Grzybowski, a situação já esteve melhor para os atuais donos do
poder. “Já há sinais como a greve (geral, de 28 de maio). As manifestações já
são um sinal. E a mídia também não é mais um bloco só. Há evidências demais (contra Temer). Nada como um dia depois do
outro. As contradições sempre contêm as soluções nelas mesmas. Podem levar a um
impasse ou a uma crise ainda maior, mas não
vejo como não ser a crise o berço da solução”, diz. “Nunca se deve dizer
que a barbárie está fora do horizonte. Um
pai da pátria pode aparecer como salvador. Estão fazendo muito para que seja
assim. Mas isso não significa que vão sair ganhando.”
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