«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 11 de março de 2022

2º Domingo da Quaresma – Ano C – Homilia

 Evangelho: Lucas 9,28-36

 Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

Qual é o “seu” Messias?

Chegamos ao segundo domingo da Quaresma. Com Jesus, estamos caminhando rumo a Jerusalém, a cidade onde ele sofrerá muito, morrerá e ressuscitará. Estamos, pois, caminhando em direção à Páscoa. No domingo passado, celebramos Jesus que, uma vez assumida a missão de salvador da humanidade, foi posto à prova, não somente, por quarenta dias, mas em toda a sua vida nesta Terra. Contudo, obediente à vontade do Pai, expressa nas Escrituras Sagradas, venceu toda sedução diabólica!

Um pouco antes da cena que nos é proposta para este segundo domingo da Quaresma, Jesus havia feito o primeiro anúncio de sua paixão, morte e ressurreição (Lc 9,22). Em seguida, esclareceu quais eram as condições para ser seu discípulo, onde se destacou a necessidade de “dar a vida” pelo projeto do Reino de Deus (Lc 9,23-27). É claro que isso causa ressentimentos, causa decepção naqueles que buscam seguir Jesus. 

Lucas 9,28:** «Uns oito dias depois dessas palavras, Jesus levou consigo Pedro, João e Tiago, e subiu à montanha para orar.»

Eis, aqui, a nossa passagem deste domingo, é o capítulo 9 do evangelista Lucas do versículo 28 ao 36. Nos evangelhos, sempre são importantes as indicações de local e tempo. De fato, o evangelista escreve: “Uns oito dias depois dessas palavras”, ou seja, depois que Jesus anunciou a sua morte. Por que o número oito? É típico dos evangelistas nunca mencionar a morte de Jesus sem também dar uma indicação de sua ressurreição. O oitavo dia é o dia da ressurreição de Jesus. Então, Jesus agora mostra quais são os efeitos para a pessoa que passa pela morte.

Não são de destruição, de aniquilação, mas de empoderamento.

Jesus levou Pedro consigo. Este discípulo é apresentado com o único apelido negativo indicando sua teimosia. Ele levou, também, João e Tiago.

Serão os discípulos mais difíceis que Jesus levará sempre consigo nos momentos importantes da sua vida.

O evangelista escreve: “... e subiu à montanha”, com o artigo definido, não é uma montanha qualquer, mas não está indicado. O evangelista não quer indicar um lugar topográfico, mas teológico. A montanha é o lugar da esfera divina, da condição divina. 

Lucas 9,29: «Enquanto orava, seu rosto mudou de aparência e sua veste se tornou branca e resplandecente.»

É típico de Lucas, nos momentos importantes de Jesus, apresentá-lo em oração. Esse versículo mostra os efeitos da morte anunciada anteriormente. A morte não mergulha a pessoa na escuridão, mas a envolve na luz.

A morte, como dissemos, não destrói a pessoa, mas libera todas as suas energias de amor e vida. 

Lucas 9,30: «E eis que dois homens conversavam com ele: Moisés e Elias.»

Quando o evangelista usa a expressão: “E eis que”, ele indica algo inesperado, uma surpresa. Por que Moisés e Elias? Foram os personagens que, no Antigo Testamento, falaram com Deus, mas sobretudo Moisés foi o grande legislador e Elias foi o profeta que com zelo, e também com violência, fez cumprir a lei de Moisés. 

Lucas 9,31: «Apareceram em glória e conversavam sobre o êxodo que ele estava para consumar em Jerusalém.»

Esta é uma característica típica do evangelista Lucas, usar este termo “êxodo” para indicar a libertação que Jesus veio trazer. Em Jerusalém, a cidade santa, Jesus será assassinado pelos mais altos representantes de Deus, pela instituição religiosa. 

Lucas 9,32a: «Pedro e seus companheiros, estavam com muito sono.»

E, aqui, o evangelista menciona algo incompreensível para nós: “Pedro (de novo com o apelido negativo) e seus companheiros...”. Agora, eles não são mais companheiros de Jesus, mas seguem Pedro. Diante de tal revelação, o evangelista nos apresenta esses discípulos oprimidos pelo sono. Por quê? O sono significa incompreensão em relação ao que está acontecendo. 

Lucas 9,32b-33: «Ao acordarem, viram a glória de Jesus e os dois homens com ele. E enquanto esses se afastavam de Jesus, Pedro lhe disse: “Mestre, é bom estarmos aqui. Façamos três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”. Ele nem sabia o que dizia.»

O apelido pejorativo “Pedro” reaparece. É a terceira vez, o número três segundo a linguagem dos evangelistas, sempre indica o que é definitivo, então Pedro insiste em sua teimosia. Quando Pedro dirige a palavra a Jesus, ele não o chama de “mestre” como vejo aqui na tradução, mas o termo usado por Lucas é “chefe” (grego: epistáta), alguém a quem se submeter. Esta é a ideia que Pedro tem de Jesus.

Por que essas tendas? Das três festas muito importantes que pontuavam a vida religiosa de Israel, a festa da Páscoa, a festa de Pentecostes e a festa das Tendas, a última era a mais importante. Tão importante, que não precisou ser nomeada, bastava dizer “a festa” e ficou claro que era a festa das Tendas. Era a festa que comemorava a libertação da escravidão egípcia, e durante uma semana - ainda hoje em Israel - vive-se sob os galhos, sob as tendas.

Bem, a tradição dizia que o Messias chegaria durante a Festa das Tendas. Em memória da antiga libertação, a nova libertação seria inaugurada. Assim, o esperado messias, o da tradição, se manifestaria nesta festa. É por isso que Pedro pede para construir três tendas. Ele quer que Jesus se manifeste como o messias.

Quando há três personagens, geralmente o mais importante é colocado no centro. Para Pedro, o mais importante não é Jesus, no centro, para Pedro, está Moisés, o legislador. Depois, Jesus assim como Elias, ao lado, como aqueles que fazem esta lei ser praticada. Mas para Pedro o mais importante é Moisés. 

Lucas 9,34: «Enquanto ainda falava, desceu uma nuvem que os cobriu com sua sombra. Ao entrarem na nuvem, os discípulos ficaram cheios de medo.»

Pedro ainda não havia concluído o seu discurso, então, “desceu uma nuvem que os cobriu”. A nuvem, no Antigo Testamento, é uma imagem da presença ativa de Deus. Então, Pedro e os demais discípulos fazem essa experiência de Deus. É estranha, no entanto, a reação de Pedro! Na primeira vez que ele se viu na frente de Jesus, durante a pesca milagrosa, pediu a Jesus que se afastasse dele, porque era pecador (Lc 5,8-9). E, desta vez, fazendo uma experiência de Deus, tem medo dele! Por isso, o evangelista nos faz entender...

... o quanto uma tradição religiosa, uma ideologia religiosa, pode ser um obstáculo para a compreensão do verdadeiro Deus. 

Lucas 9,35: «E da nuvem saiu uma voz que dizia: “Este é o meu Filho, o Eleito. Escutai-o!”»

Por FILHO se entende não apenas aquele que nasceu do pai, mas aquele que se assemelha a ele no comportamento. Então, Deus diz que ele está todo em Jesus. “O Eleito. Escutai-o!” É um imperativo, isto é: “Ouçam-no!” Depois, desaparece Moisés, desaparece Elias e há só Jesus para se escutar, é uma indicação muito preciosa que o evangelista dá à sua comunidade. Devemos ouvir a mensagem de Jesus, e o que está escrito nos textos de Moisés ou nos livros proféticos deve ser confrontado com o ensinamento de Jesus: se estiver em harmonia leva-se em conta, senão não será a norma de comportamento para a comunidade cristã. 

Lucas 9,36: «Ao ressoar a voz, Jesus ficou só. Os discípulos ficaram calados e, naqueles dias, a ninguém contaram nada do que haviam visto.»

Esse silêncio é típico dos inimigos de Jesus. Por que eles não contam nada? Porque não estão de acordo. Continuam ruins. Querem um Jesus segundo a lei de Moisés e segundo o zelo violento de Elias, não aceitam Jesus sem Moisés e sem Elias. Então, eles discordam de Jesus e ficam em silêncio.

Portanto, o caminho da comunidade de Jesus, de compreensão de sua realidade, ainda é longo. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 4. ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2020. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

“E se o Cristo e o Messias vierem, e eles forem dois caras diferentes?” (Thomas Eugene “Tom” Robbins: 89 anos – escritor norte-americano)

Quantas coisas nos fazem perder o foco, extraviar do caminho, distrair-nos com o que não é importante! Por isso, a Quaresma é um convite para adentrarmos no DESERTO com Jesus. Ele, assim, o fez no Evangelho do 1º Domingo da Quaresma, penetrando no deserto da sua vivência a fim de enfrentar as seduções atraentes que se apresentaram durante toda a sua vida entre nós. No deserto nos encontramos diante do essencial, diante da sobriedade, diante da carência, por isso, não há com o que se distrair, não há o que desperdiçar! 

Estou me referindo a isso, a fim de chamar a atenção para a atitude de Pedro (e seus companheiros), no Evangelho deste 2º Domingo da Quaresma. O fato de possuir uma ideia bem cristalizada de messias em sua mente, faz com que ele tenha dificuldade em compreender (daí o sono da ignorância!) e aceitar o messias que é Jesus. Chegando ao ponto de colocá-lo abaixo (na realidade, ao lado) de Moisés e Elias! 

Por isso, é bom nos perguntarmos, sempre, como formamos a ideia que temos de Jesus Cristo? De onde retiramos aquilo que forma a nossa crença nele?

Há um sábio provérbio chinês apropriado para essa circunstância:

“Nunca é tão fácil se perder como quando se julga conhecer o caminho”.

Nessa cena da transfiguração, ficam claros alguns aspectos fundamentais de Jesus Cristo: a) Jesus está disposto a ir até as últimas consequências com seu projeto de reino de Deus, incluindo a morte! b) Está prometida a sua glorificação, mediante a ressurreição. c) Deus está presente em todos esses acontecimentos da vida de Jesus (= nuvem que envolve a todos). d) Jesus é a expressão e a palavra mais evidentes de Deus para a humanidade! Em Jesus, Deus se dá por inteiro! Ele se identifica, completamente, em seu Filho! Nenhum outro profeta, nenhum outro personagem pode substituí-lo! 

Isso quer dizer algo muito simples e sério:

Não há outro modo de conhecer e obedecer a Deus a não ser conhecendo e seguindo Jesus Cristo, seu Filho! E, para conhecer o Filho, basta observar o seu ESTILO DE VIDA, seu projeto revela-se na maneira dele ser e atuar neste mundo!

Agora, assim como Pedro e outros discípulos, podemos viver em uma permanente contradição, como nos adverte J. M. Castillo:

«Por um lado, vai a nossa “fé”, enquanto o “seguimento” de Jesus não focaliza nossas vidas no mesmo projeto de humanização que traçou a vida de Jesus para nós.»

Qual é a solução? Há uma só! Nós, que nos consideramos cristãos e cristãs, necessitamos “interiorizar” a nossa religião a fim de reavivar a nossa fé. Isso quer dizer que (J. A. Pagola):

«Não basta ouvir o evangelho de maneira distraída, rotineira e desgastada, sem desejo algum de escutar. Não basta, tampouco, uma escuta inteligente preocupada somente em entender. Necessitamos escutar Jesus vivo no mais íntimo de nosso ser... precisamos escutar a Boa Nova de Deus, não a partir de fora, mas a partir de dentro

 
Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Senhor Jesus Cristo, ícone da majestosa glória do Pai, luz da luz, face do amor, faze-nos subir à tua presença sobre o monte da oração e do diálogo com o Pai. Conquistados pelo teu fulgor, desejaríamos que tu nos tivesses sempre contigo sobre o monte onde amor e glória se fundem, mas o coração se perde com o pensamento do batismo de sangue no qual devemos nos empenhar para participar de tua vida. Assusta-nos o sacrifício, o dom total de nós mesmos. O monte da oração é muito árduo para escalar sem ti. Único é o caminho que alcança a meta: passar através da altura do Calvário. Nossas forças não podem resistir, gostaríamos de fugir, desviar nossos passos e nosso olhar para outro lugar. Mas tu, por um momento fugaz, dá-nos também, como aos três apóstolos, Pedro, Tiago e João, o dom de ver além da vida quotidiana, para que até a cruz se transfigure e já não nos assuste. Amém.»

(Marino Gobbin. In: CILIA, Anthony O.Carm. Lectio Divina sui vangeli festivi per l’anno litúrgico C. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 139-140)

 Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – II Domenica di Quaresima – 17 marzo 2019 – Internet: clique aqui (Acesso em: 08/03/2022).

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