«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Solenidade de N. S. Jesus Cristo, Rei do Universo – Ano C – Homilia

 Evangelho: Lucas 23,35-43 

Frei Alberto Maggi

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas)

 

Jesus, um rei que olha para as necessidades das pessoas

O episódio das tentações no deserto terminou com estas palavras: “o diabo afastou-se dele até o tempo oportuno” (Lc 4,13) E aqui está o momento oportuno, isto é, o momento de máxima debilidade de Jesus: Jesus é crucificado, já está em agonia, na cruz, e no momento de máxima fragilidade, surgem novamente as tentações de força, as tentações de poder. 

Lucas 23,35a: «O povo permanecia lá, observando.»

Vamos ler o que Lucas escreve para nós, no capítulo 23 versículos 35 a 43. Jesus, que tinha como única missão trazer a vida, salvar as pessoas, já pronunciou as palavras dirigidas ao Pai, uma oração de perdão: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!” (Lc 23,34a). O evangelista escreve que “as pessoas estavam assistindo”.

Esse povo que o seguiu, essa multidão que se encantou com sua mensagem, agora, está sujeita às decisões dos líderes, não toma iniciativa, apenas observa. 

Lucas 23,35b: «E até os chefes zombavam, dizendo: “A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se, de fato, é o Cristo de Deus, o Eleito!”»

O evangelista diz que, inclusive, os líderes zombavam de Jesus; aqui sem um mínimo de humanidade, sem um pouco de compaixão. Afinal, Jesus, mesmo que aos olhos deles seja culpado, é um homem agonizando na cruz, esta terrível tortura, mas eles são implacáveis, eles zombam dele dizendo: “A outros ele salvou”, e aqui há um eco do que Jesus disse no episódio da Sinagoga de Nazaré quando citou um provérbio: “Médico, cura-te a ti mesmo” (Lc 4,23). Aqui, as tentações retornam.

Esta expressão: “se, de fato, é o Cristo de Deus”, retornará três vezes e sabemos que o número três na simbologia numérica hebraica significa aquilo que está completo, portanto, o diabo volta com força, com suas tentações no momento de maior fraqueza de Jesus. O eleito de Deus é abandonado. Uma das provas de que Jesus não era o Messias, o Cristo de Israel, é que o Messias não poderia morrer. 

Lucas 23,36-37: «Os soldados também zombavam dele; aproximavam-se, ofereciam-lhe vinagre e diziam: “Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo!”»

Até os soldados, os soldados romanos, ridicularizam ele, literalmente “escarneciam dele”, zombavam dele, faziam piada, eles se aproximavam dele para lhe entregar um pouco de vinagre. Enquanto o vinho é a imagem do amor, o seu oposto, o vinagre, é a imagem do ódio. Há um salmo, o salmo 69, versículo 22 que diz: “na minha sede me deram vinagre”, e disseram “se és o rei dos judeus”, esta tentação volta novamente, “salva-te a ti mesmo”. 

Lucas 23,38-39: «Acima dele havia um letreiro: “Este é o Rei dos Judeus”. Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo: “Não és tu o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!»

Mas Jesus veio salvar quem está perdido, Jesus não veio se salvar, mas salvar os outros, e o evangelista comenta: “Acima dele havia um letreiro: ‘Este é o Rei dos Judeus’”, literalmente “o Rei do Judeus é este”. É uma escrita muito irônica, e é a única escrita conhecida de Jesus em sua vida e é um escárnio. Portanto, é uma expressão que indica o máximo desprezo para esse povo que os romanos submetiam; mas eis onde o evangelista nos quer conduzir: “Um dos malfeitores crucificados o insultava...”.  É a terceira vez que há tentação:salva-te a ti mesmo”: é a tentação do diabo, de usar o poder para si mesmo. Mas Jesus não usa a força do seu amor para si mesmo, mas para os outros. 

Lucas 23,40-41: «O outro, porém, o repreendeu: “Nem sequer temes a Deus, tu que sofres a mesma condenação? Para nós, é justo sofrermos, pois estamos recebendo o que merecemos, mas este, não fez nada de mal”.»

Então este indivíduo crucificado com Jesus é um criminoso, ele é um delinquente. Aqui, ele reconhece, este bandido, este criminoso crucificado com Jesus, reconhece a realidade de Jesus, aquela realidade que os Atos dos Apóstolos, pelas palavras de Pedro, nos apresentam: “Por toda a parte, ele [Jesus de Nazaré] andou fazendo o bem, e curando a todos os que estavam dominados pelo diabo; pois Deus estava com ele” (At 10,38). 

Lucas 23,42: «E acrescentou: “Jesus, lembra-te de mim, quando entrares no teu reino”.»

Então este criminoso reconhece que Jesus é inocente, e se volta para Jesus e lhe pede: “Jesus, lembra-te”, este verbo lembrar faz parte da linguagem da oração hebraica. Recordar, lembrar significa pedir a Deus que lance um olhar de bondade, que intervenha em favor de quem ora, portanto é um pedido: “lembra-te de mim, quando entrares no teu Reino” – ou melhor, segundo uma variante deste versículo – “quando vieres no teu Reino”, isto é, quando vieres como Rei, lembra-te de mim.

Lucas 23,43: «Ele lhe respondeu: “Em verdade te digo: hoje estarás comigo no paraíso”.»

Pois bem, a resposta de Jesus desloca a todos. Desloca ouvintes, leitores da época e nos desloca também, porque, repito, não é como a história, posteriormente, vai tentar diluir esse episódio falando do “bom ladrão”. Este é um delinquente, um criminoso, que, como ele diz, merecia com razão este terrível castigo. Pois bem, a resposta de Jesus “em verdade” – portanto é uma afirmação solene – “te digo: hoje estarás comigo no paraíso”. Enquanto o bandido havia pedido “lembra-te de mim, quando entrares no teu reino”, então não imediatamente, a resposta de Jesus é imediata, hoje. Então não amanhã, não no tempo, mas hoje, imediatamente, “tu estarás comigo no paraíso. É a única vez que o termo “paraíso” aparece no Evangelho de Lucas. Quando Jesus tem que falar de vida que continua além da morte, ele fala de vida eterna, de vida indestrutível, mas ele nunca usa esse termo “paraíso”. “Paraíso” é um termo persa, que significa simplesmente “jardim”; era o lugar intermediário onde as almas esperavam a ressurreição.

Por que Jesus fala precisamente de paraíso? O evangelista quer contrastar a ação de Jesus com a descrita no livro de Gênesis.

No livro de Gênesis, Deus expulsa do paraíso o homem pecador; com Jesus o primeiro a entrar no paraíso com ele é precisamente o homem pecador.

O que o evangelista quer dizer é o que ele seguiu ao longo de seu evangelho: o amor de Deus não é dirigido às pessoas por seus méritos, mas por suas necessidades.

Que mérito esse bandido tem para entrar no paraíso? Ele não tem mérito, mas tem necessidade, o amor de Deus olha para as necessidades das pessoas. Para Jesus, pela força do seu amor, não existem casos impossíveis que o amor de Deus, o amor de Jesus, não possa vencer. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 5. ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2021.


 Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

“Nenhum pecador jamais foi salvo por entregar seu coração a Deus. Não somos salvos por nossa entrega, somos salvos pelo que Deus entregou.”

(Arthur Walkington Pink [1886-1952] – estudioso da Bíblia, evangelista e escritor britânico)

O Evangelho deste domingo nos oferece uma explicação da figura de Jesus mediante um forte contraste entre os seguintes personagens:

* de um lado, os líderes do povo judeu, os soldados romanos e um dos malfeitores (em grego: lestaí = rebelde político) crucificados ao lado de Jesus, que debocham, zombam, ironizam a triste e terrível situação do Filho de Deus agonizante na cruz! Aqui, não há alguma piedade, sensibilidade e empatia para com o sofredor!

* De outro lado, a misericórdia, o amor, o perdão agindo na pessoa de Jesus que, mesmo agonizante, sabe dirigir uma palavra de esperança a um dos criminosos condenados ao seu lado. Aqui, temos a empatia em pessoa! Jesus de Nazaré soube, a vida toda, colocar-se na carne, nas vestes, no lugar das outras pessoas, especialmente dos pecadores e marginalizados pela sociedade israelita da época. 

Por ironia da história, o motivo da condenação de Jesus é de natureza política! Ele foi condenado como tendo cometido o delito de seditio, ou seja, subversão da ordem estabelecida por Roma. Logo, Jesus de Nazaré que jamais promoveu alguma revolta política, nem proferiu juízos contra Roma, contra a ocupação romana, contra a crueldade dos legionários romanos, contra os abusos fiscais ou a repressão militar exercida pelo império romano! Mesmo assim, foi condenado como “rei dos judeus”. 

É preciso ficar bem claro que Jesus nunca buscou esse título de rei! Jamais favoreceu que o povo o tratasse como tal, antes, escapava de situações desse tipo (cf.: Jo 6,15). Mas é verdade que a pregação e prática de Jesus contrariavam os dois pilares sobre os quais se assentavam o direito romano e a ideologia do império:

1º) Defesa absoluta do “direito de propriedade”.

2º) A defesa do “poder dos poderosos” (cf.: José M. Castillo. La religión de Jesús: comentarios al evangelio diario – Ciclo C (2018-2019). Bilbao: Desclée De Brouwer, 2018, p. 435).

O reino que Jesus pregava encontrava-se na contramão da ideologia dessa sociedade desigual e injusta! Assim, como está na contramão da sociedade atual! Como expõe, muito bem, J. M. Castillo (idem):

«O que Jesus queria era afirmar que “outro mundo é possível”. Um mundo não edificado sobre o poder e o capital, mas sobre a ética da honradez, do respeito, da igualdade de direitos e garantias de todos os seres humanos, a bondade acima de tudo e a ajuda a todo o que sofre. Nisso consiste o reinado de Cristo

Portanto, celebrar Cristo, rei no universo, significa aderir, encampar, optar por instaurar o seu reinado neste mundo, aqui e agora!

Esse desafio do Reino de Deus, obviamente, coloca em xeque o comodismo, a insensibilidade, o egoísmo, a apatia e o conformismo de uma parcela de nossa sociedade que vive no conforto, no bem-estar, na segurança e na abundância! Bem como, desinstala cada um de nós! Afinal, como Igreja, como comunidade, como indivíduos o que estamos realizando, concretamente, para que esse “outro mundo” desejado por Jesus Cristo aconteça?


 Oração após a meditação do Santo Evangelho

 «Senhor, parece-me estranho dar-te o nome de rei. Um rei não se aproxima facilmente... E hoje te encontro sentado ao meu lado, na covinha do meu pecado, aqui onde eu nunca teria pensado em encontrar-te. Os reis estão nos palácios, longe da vida dos pobres. Tu, por outro lado, vives tua senhoria vestindo as roupas gastas de nossa pobreza. Que festa, para mim, ver-te aqui onde fui me esconder para não sentir sobre mim os olhares indiscretos do julgamento humano. À beira dos meus fracassos, quem encontrei senão tu? O único que poderia censurar minhas incoerências vem me procurar para sustentar minha angústia e minha humilhação! Quanta ilusão quando pensamos que temos que vir até ti apenas quando alcançamos a perfeição... Tu não gostas de quem eu sou, eu pensaria, mas talvez não seja exatamente assim: não me agrada aquilo que eu sou! Para ti estou bem de qualquer maneira, porque teu amor é algo especial que respeita tudo em mim e faz de cada momento um espaço de encontro e doação. Senhor, ensina-me a não descer da cruz na absurda pretensão de me salvar! Concede-me saber esperar, ao teu lado, o hoje do teu Reino na minha vida. Amém.»

(Fonte: BOSCHI, Maria Teresa della Croce, O.Carm. 34ª Domenica: Gesù Cristo Re dell’Universo. In: CILIA, Anthony O.Carm. Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico C. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 647) 

Assista ao vídeo com a íntegra da homilia acima, clicando sobre esta imagem: 

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci” – Videomelie e trascrizioni – XXXIII Domenica del Tempo Ordinario – Anno C – 17 novembre 2019 – Internet: clique aqui (Acesso em: 08/11/2022).

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