14º Domingo do Tempo Comum – Ano B – Homilia

 Evangelho: Marcos 6,1-6 

Frei Alberto Maggi *

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas) 

A liberdade tem o seu preço

É a terceira vez que Jesus prega em uma sinagoga; nas duas vezes anteriores, as coisas não correram bem: na primeira (cf. Mc 1,21-28) ele foi interrompido porque apresentava uma mensagem completamente nova que minava a autoridade dos escribas, na segunda (cf. Mc 3,1-6) foi pior, até tentaram matá-lo, porque Jesus curou uma pessoa na sinagoga e isso não poderia ser feito em dia de sábado, mas para Jesus o bem das pessoas sempre vem antes do bem da observância da lei divina. Como será desta vez? É a terceira e última vez e o número 3, em linguagem figurada na Bíblia, significa aquilo que está completo. Desta vez, há todas as condições para que tudo corra muito bem, porque Jesus vai falar em Nazaré, ou seja, na sua família, entre os seus parentes. Poderíamos dizer, coloquialmente, que Jesus desta vez “joga em casa”; vejamos. 

Marcos 6,1-2:** «Naquele tempo, Jesus foi a Nazaré, sua terra, e seus discípulos o acompanharam. Quando chegou o sábado, começou a ensinar na sinagoga. Muitos que o escutavam ficavam admirados e diziam: “De onde recebeu ele tudo isto? Como conseguiu tanta sabedoria? E esses grandes milagres que são realizados por suas mãos?»

É o sexto capítulo de Marcos, Jesus veio em dia de sábado e começou a ensinar na sinagoga. E aqui está o problema, porque o ensino de Jesus não é como o dos escribas que repetem as coisas já ditas, mas é a proposta de uma nova relação com Deus, que não se baseia na observância, na obediência das suas leis, mas na aceitação do seu amor. Isso cria confusão! De fato, o evangelista comenta que as pessoas em Nazaré “ficaram maravilhadas”, há espanto e perguntam-se “de onde vêm estas coisas?”. O que significa “de onde recebeu tudo isto”? Significa que os nazarenos percebiam as palavras e ações de Jesus como não sendo provenientes de Deus, mas de um ambiente misterioso, talvez fosse magia ou bruxaria: “como conseguiu tanta sabedoria?”. Para eles nada vinha de Jesus, era algo de misterioso. “E estas maravilhas realizadas com as suas mãos”, “realizar com as suas mãos indicavaatos de feitiçaria; em suma, confundem Jesus com uma espécie de mago, com uma espécie de feiticeiro, e também desacreditam o seu falar e a sua sabedoria. 

Marcos 6,3: «Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, de Joset, de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco?” E ficaram escandalizados por causa dele.»

É interessante, Jesus está no seu país, eles o conhecem, não o nominam. Jesus, nos evangelhos, nunca é nomeado pelas autoridades, pelos fariseus, que sempre se dirigem a ele com desprezo, dizendo “este”. Bem, mesmo em sua aldeia, os seus concidadãos falando de Jesus dizem: “Mas ele não é o carpinteiro”. E, depois, de forma ofensiva: “o filho de Maria”. Jamais um indivíduo era lembrado como filho de uma determinada mãe, mas sempre filho do pai, porque se parecia com ele. Então vemos que Jesus não honra a figura paterna, na opinião dos moradores de Nazaré. “E eles ficaram escandalizados com ele.” Portanto, quando Jesus vai dizer aos seus parentes e conhecidos sobre essa nova relação com Deus, aqueles que o conheceram se escandalizam; é a semente lançada na terra dura que não pega, que não cria raízes. 

Marcos 6,4: «Jesus lhes dizia: “Um profeta só não é estimado em sua pátria, entre seus parentes e familiares”. »

E Jesus reage com uma censura que tornou-se proverbial, ele afirma: “Um profeta...”. Quem é o profeta? O profeta é o homem que, em profunda e íntima harmonia com Deus, cria sempre coisas novas porque o Deus da Bíblia é um Deus que faz novas todas as coisas (cf. Ap 21,5), um Deus que muda sempre, continuamente. Então o profeta é aquele que sempre propõe novas formas de se relacionar com Deus. “Um profeta”, diz que Jesus, “só é desprezado na sua pátria, entre os seus familiares e na sua própria casa”. Aqueles que deveriam tê-lo compreendido, conhecido e, portanto, apreciado, são aqueles que o desprezam, por quê? Nestes mundos, nestes pequenos mundos, mas em todo o mundo religioso, aplica-se o imperativo: “sempre foi feito assim!”. Por isso, cada novidade é vista com suspeita, é vista com medo porque coloca em crise as próprias certezas. Em vez disso, Jesus veio propor uma nova realidade de Deus que precisa, como ele dirá, de vinho novo em odres novos, as velhas formas de pensar não podem ser mantidas

Marcos 6,5-6: «E ali não pôde fazer milagre algum. Apenas curou alguns doentes, impondo-lhes as mãos. E admirou-se com a falta de fé deles. Jesus percorria os povoados das redondezas, ensinando.»

Jesus, diante deste ceticismo, deste desprezo, escreve o evangelista, tem as mãos atadas: “Ele não pôde fazer nenhum milagre”, mas apenas alguns. O evangelista destaca que Jesus “ficou surpreso com a com a falta de fé deles”. É um espanto da parte de Jesus, é um espanto cheio de tristeza que mostra até que ponto a instituição religiosa pode escravizar e subjugar as pessoas. As pessoas não têm o direito de pensar com as suas próprias cabeças, devem sempre pensar de acordo com a forma como as autoridades decidem e as autoridades decidiram que Jesus é um blasfemador, deve ser condenado à morte e, portanto, não deve ser ouvido. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994.

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«A coisa mais dolorosa que uma pessoa pode fazer pela outra, é rejeitá-la pelo que ela é.»

(Marianna Moreno)

No fundo, no fundo, são raríssimas as pessoas, seja no passado, como hoje, que, ao frequentar uma igreja, tomar parte em uma celebração ou rito religioso o façam com uma verdadeira vontade de mudança radical e profunda de vida! A nossa participação nas atividades de nossa Igreja, em grande parte, se dá por hábito, tradição e rotina! Poucas são as vezes em que temos uma real e profunda consciência do que estamos celebrando e das consequências daquele rito do qual estamos participando! 

A grande lição que a cena dessa terceira visita a uma sinagoga, por parte de Jesus, nos traz é que a liberdade, a novidade cobra um alto preço! Os nazarenos esperavam ver e ouvir em Jesus aquilo que eles lhe haviam incutido mediante a educação ministrada em sua família e na sinagoga do vilarejo. No entanto, viram e ouviram coisas novas, surpreendentes, que não procediam deles! Portanto, a mentalidade e a maneira de pensar de Jesus estavam completamente diferentes daquelas que eram compartilhadas em Nazaré. 

Outro fator que explica a rejeição a Jesus, por parte de seus concidadãos e familiares, é que: “No afã de serem importantes, as pessoas gostam de coisa importada, enquanto aquilo que Deus suscita no meio da própria gente não vale” (J. Konings). Isso é mais comum do que pensamos! Quantas vezes, pessoas e propostas saídas do seio de nossas comunidades são desprezadas em lugar daquelas “brilhantes” e “espetaculares” pessoas e ideias que vêm de fora?! 

Um dos maiores perigos e fatores de morte para as comunidades cristãs é a tão comum mentalidade: “aqui, sempre fizemos assim”. Jesus foi incompreendido e rejeitado por aqueles que mais pensavam conhecê-lo porque representava uma perigosa novidade. Ele era perigoso para a religião daquela gente, representada pela sinagoga, bem como, para o modelo de sociedade da época, representado pela sua família. Eu não tenho dúvidas! Assim, como Jesus ficou sozinho naquela época, também o ficaria hoje! Porque toda pessoa que busca mudança de mentalidade e de sociedade será perseguida e incompreendida! 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Tu, ó Jesus, foste rejeitado pelo teu povo em Nazaré, como o profeta Ezequiel foi entre os israelitas. O profeta não deve desanimar diante das dificuldades, porque na fraqueza se revela o poder da tua graça. O profeta é o sinal de que o Pai continua a amar-nos, chamando-nos à conversão. É o triunfo do amor do Pai, mesmo que a sua presença seja muitas vezes contrariada. A tua graça basta ao profeta: o seu poder exprime-se na fraqueza. Num mundo desorientado por um pluralismo exasperado, sentimos o peso de uma vida sem sentido, sem ponto de referência. Envia, ó Jesus, a este mundo profetas itinerantes que venham ao nosso encontro, fazendo-se dom de salvação, apesar de diversas recusas e descrenças. Envia-nos também discípulos que na fé te acolham como “o Profeta”, para serem também eles profetas e partilhar convosco a alegria e o compromisso do anúncio missionário. Amém.»

(Fonte: GOBBIN, Marino, O.Carm. Orazione iniziale. In: CILIA, Anthony, O.Carm [a cura di]. Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico B. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 437)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – XIV Domenica Tempo Ordinario – 4 luglio 2021 – Internet: clique aqui (Acesso em: 25/06/2024).

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