15º Domingo do Tempo Comum – Ano B – Homilia
Evangelho: Marcos 6,7-13
Frei
Alberto Maggi *
Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas)
O que você é não deve desmentir a mensagem que você anuncia!
O fracasso na sinagoga de Nazaré, onde Jesus não foi acreditado e só conseguiu realizar alguns gestos (cf. Mc 6,1-6a), não só não desanimou Jesus, mas levou-o a intensificar a sua atividade de diferentes maneiras. É o capítulo seis, do versículo 7 ao 13, mas há um meio versículo que foi omitido da versão litúrgica que é importante. O evangelista escreve que: “Jesus percorria os povoados da redondeza ensinando” (Mc 6,6b). O que isso significa? Jesus nunca mais põe os pés em uma sinagoga! A essa altura, ele já percebeu que os locais de culto, os locais religiosos são refratários à ação do Espírito. Então é inútil perder tempo nesses ambientes, por isso, ele vai às aldeias, isto é, aos lugares de marginalização, aos lugares de pobreza.
Marcos
6,7:**
«Naquele tempo, Jesus chamou os doze, e começou a
enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros.»
E desta vez ele chamou os Doze para si, os doze representam o número de discípulos que por si refletem o novo Israel. E começou a enviá-los, do verbo grego “enviar” vem a palavra apóstolo, que não indica um título, mas sim uma atividade, é aquela de serem enviados, dois a dois. Jesus não os envia sozinhos, mas em dois, devem ser uma comunidade que expresse uma mensagem, e lhes dá poder, ou seja, autoridade, sobre os espíritos impuros. O espírito impuro já apareceu neste evangelho quando Jesus tentou anunciar sua mensagem pela primeira vez numa sinagoga (cf. Mc 1,21-26). O Espírito é uma força, quando vem de Deus é chamado de Santo, não só pela sua qualidade sublime, mas pela sua atividade de separar as pessoas do mal; quando vem de realidades contrárias a Deus é chamado de impuro. Portanto, Jesus dá-lhes poder sobre os espíritos impuros. Essa expressão tem um duplo sentido, tanto o óbvio de libertar as pessoas desses espíritos, ou seja, dessas ideologias nacionalistas, religiosas, que os impedem de acolher a Boa Notícia de Jesus, como o sentido de trabalhar sobre si mesmos, porque para libertar é preciso ser totalmente livre!
Marcos
6,8-9: «Recomendou-lhes que não levassem nada para o caminho, a não
ser um cajado; nem pão, nem sacola, nem dinheiro na cintura. Mandou que andassem
de sandálias e que não levassem duas túnicas.»
E o evangelista diz que Jesus “ordenou” [no Lecionário da CNBB, o termo é mais brando: “recomendou”). É a única vez que Jesus ordena algo aos discípulos, então significa que ele encontra resistência! Ele ordena não levar nada além de cajado e sandálias para a viagem, ou seja, o que é necessário para caminhar Jesus pede que os discípulos levem. Mas aí Jesus diz para não levar nem pão nem sacola, era a sacola típica de mendigo, nem dinheiro no cinto, o que isso quer dizer? Devem ser pessoas totalmente livres, devem ser senhores, devem confiar plenamente na riqueza da mensagem que trazem, senhores livres, mas não ricos! É por isso que Jesus diz para não usar duas túnicas, duas túnicas eram roupas dos ricos. O que você é não deve desmentir a mensagem que você anuncia! Jesus não indica o que devem dizer, mas como devem ser: portadores da Boa Nova.
Marcos
6,10: «E Jesus disse ainda: “Quando entrardes numa casa, ficai ali
até vossa partida.»
E esta liberdade também deve ser interior. Jesus continua afirmando “Quando entrardes numa casa, ficai ali”. Quando os judeus viajavam, pediam para serem hospedados apenas nas casas de outros judeus, possivelmente observantes, para terem certeza que as regras rituais do puro e do impuro seriam observadas. Jesus pede-nos que sejamos livres de tudo isto, que entremos nas casas como elas são e lá permaneçamos, porque para libertar, seus seguidores devem estar totalmente livres desses tabus, dessas superstições!
Marcos
6,11: «Se em algum lugar não vos receberem, nem quiserem vos
escutar, quando sairdes, sacudi a poeira dos pés, como testemunho contra eles!”»
Mas, Jesus adverte: “Se em algum lugar não vos receberem, nem quiserem vos escutar, quando sairdes, sacudi a poeira dos pés, como testemunho contra eles!” Era típico dos judeus, quando iam para terras pagãs, voltar para a terra de Israel e, na fronteira, sacudir o pó das sandálias para não trazer nada de impuro para a sua terra. Então, o que Jesus está dizendo? A ideia do que é pagão está mudando. Quem é o pagão? Para a religião, o pagão é aquele que acredita em outras divindades, para Jesus, o pagão é aquele que é incapaz de acolher, é aquele que é incapaz de ser fraterno!
Marcos
6,12-13: «Então os doze partiram e pregaram que todos se convertessem.
Expulsavam muitos demônios e curavam numerosos doentes, ungindo-os com óleo.»
Bom, a conclusão é que os discípulos, que partiram em missão, proclamaram que o povo se convertesse, mesmo que isso não esteja explícito no texto. Portanto, pregaram uma mudança de vida, para isso, expulsavam demônios, ou seja, libertavam as pessoas de todas aquelas ideologias que as tornavam refratárias, hostis ao acolhimento da Boa Nova de Jesus. E o último detalhe é importante porque se preocupam não só com a parte espiritual, mas com a pessoa inteira, com a integridade de todo o ser humano. Jesus tem isso em mente, e eles ungiram muitos doentes com óleo e os curaram. Este é o primeiro retrato da atividade dos discípulos. Veremos, no Evangelho do próximo domingo (Mc 6,30-34), se Jesus ficou feliz ou não com essa atividade deles.
* Traduzido e editado do italiano por Pe.
Telmo José Amaral de Figueiredo.
** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994.
Reflexão PessoalPe. Telmo José Amaral de Figueiredo
«É fundamental diminuir a distância entre o que se diz
e o que se faz, de tal forma que, num dado momento, a tua fala seja a tua
prática.»
(Paulo Freire: 1921-1997 ― educador, escritor e
filósofo brasileiro)
Quem não gostaria de receber um receituário pronto e garantido para ser bem sucedido na evangelização? Muitos leem os Evangelhos a procura dessa “receita” perfeita para o sucesso de nossa ação evangelizadora e da própria Igreja, a encarregada de realizá-la, nesta terra.
O Evangelho deste domingo, apesar de não poder ser considerado uma “receita” garantida para uma boa e perfeita evangelização, nos fornece as condições suficientes e fundamentais para que a evangelização, do modo como desejou Jesus, aconteça neste mundo em que ele viveu. Podemos subdividir essa “receita” em três partes:
1ª) Objetivo: a conversão das pessoas (cf. Mc 6,12). Essa conversão somente pode se dar mediante o contato vivo, lúcido e apaixonado com o Cristo! Não pode haver evangelização sem evangelizadores e estes não existem sem a conversão!
2ª) Tarefas: curar e libertar as pessoas (cf. Mc 6,13), ou seja, aliviar os sofrimentos e lutar contra os agentes da violência. A obra de evangelização não é algo que se reduz ao âmbito religioso, mas o ultrapassa. O ser humano somente pode fazer uma experiência viva, vibrante e autêntica com Deus, se estiver liberto de todos os tipos de amarras, vícios e servidões! Afinal, somente pessoas livres podem e conseguem amar!
3ª) Metodologia/condições: para realizar essas
tarefas, Jesus dá autoridade aos seus discípulos sobre os “espíritos impuros”
ou “demônios”. Ao se falar disso, naquela época, se entendia as pessoas enfermas
do corpo e da mente. Portanto, os verdadeiros discípulos de Jesus possuem poder
para separar o ser humano de tudo aquilo que o escraviza, que o desumaniza, que
aprisiona a sua mente e o seu coração, impedindo-o de se doar aos outros, de
ser bondoso, misericordioso e feliz. Porém, isso só será possível observando certas
condições que Jesus ordena:
a) os discípulos devem adotar
uma forma de vida que não esteja determinada ou condicionada pelo dinheiro e
bem-estar (cf. Mc 6,8-9).
b) Os discípulos não podem ter preconceito,
mas estar abertos a toda e qualquer experiência (“Quando entrardes numa
casa, ficai ali até vossa partida”: Mc 6,10).
c) Não desanimar nem perder tempo com quem não acolhe e não escuta os enviados de Jesus (cf. Mc 6,11).
Enfim, o que Jesus quis dizer e ensinar a seus discípulos e a nós, hoje, é que a prática do Reino é o anúncio do Reino, isto é, se evangeliza, vivendo a vida de tal modo que os outros nos perguntarão o motivo (“estai sempre prontos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que a pedir” – 1Pd 3,15) que nos leva a viver de modo tão diferente deste mundo e sermos pessoas tão felizes, unidas e acolhedoras! Somente uma Igreja constituída por evangelizadores desapegados dos bens e do poder, não carreiristas, simples e humildes, autênticos e coerentes conseguirá convencer a humanidade de que Cristo é a nossa única e definitiva esperança!
«Senhor nosso Deus, desvia os discípulos
do teu Filho dos caminhos fáceis da popularidade, da glória barata, e leva-os
aos caminhos dos pobres e dos flagelados da terra, para que possam reconhecer
no rosto deles o Mestre e Redentor. Dá olhos para ver os caminhos possíveis
para a justiça e a solidariedade; ouvidos para ouvir as questões de sentido e
salvação de muitos que estão tateando; enriquecer os seus corações com generosa
lealdade, delicadeza e compreensão, para que se tornem companheiros de viagem e
testemunhas verdadeiras e sinceras da glória que brilha no crucificado
ressuscitado e vitorioso. Ele vive e reina em glória contigo, ó Pai, para todo
o sempre.»
(Fonte: MESTERS, Carlos, O.Carm. Orazione finale.
In: CILIA, Anthony, O.Carm [a cura di]. Lectio Divina sui vangeli festivi:
per l’anno liturgico B. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 443)
Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – XV Domenica Tempo Ordinario – 15 luglio 2018 – Internet: clique aqui (Acesso em: 02/07/2024).
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