8º Domingo do Tempo Comum – Ano C – Homilia
Evangelho: Lucas 6,39-45
Alberto Maggi *
Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano
Há um só mestre, todos somos irmãos e irmãs
Jesus continua o seu ensinamento aos seus discípulos e, tendo-os convidado a serem filhos do Altíssimo, isto é, a serem bondosos para com os ingratos e os ímpios, não excluindo ninguém do âmbito de ação deste amor e ter, até mesmo, sentimentos maternos para com os outros. Agora, Jesus adverte seus discípulos para aqueles riscos sempre presentes em todas as comunidades, e eram os riscos da espiritualidade farisaica, o da pretensão dos discípulos de serem guias e mestres dos outros. Não, na comunidade de Jesus há apenas um guia e um mestre: Cristo.
Lucas 6,39:** «Naquele tempo, Jesus contou uma parábola aos discípulos: “Pode
um cego guiar outro cego? Não cairão os dois num buraco?»
Aqui, a mera pretensão de ser o guia do outro torna a pessoa cega. O crente não é chamado para ser guia, o único guia é Cristo, porque a pessoa que crê é um(a) companheiro(a) de viagem que apoia o outro, o encoraja, mas não o guia. E Jesus diz: “Se um cego conduz outro cego, ambos caem em um buraco”; incorrendo na maldição bíblica do livro de Deuteronômio (27,18): “maldito aquele que fizer o cego perder o caminho”.
Lucas 6,40: «Um discípulo não é maior do que o mestre; todo discípulo
bem formado será como o mestre.»
E, então, Jesus adverte novamente seus discípulos sobre a pretensão de serem mestres e guias dos outros, depois, ele retomará o discurso da cegueira. Jesus convida o discípulo a crescer, a tornar-se independente, a realizar-se pessoalmente e a não precisar mais de mestre, porque é o Espírito que o guia. Deus, o Pai de Jesus, não governa os seres humanos emitindo leis que eles devem observar, mas comunicando interiormente seu Espírito que os tornam livres e independentes.
Lucas 6,41-42: «Por que vês tu o cisco no olho do teu irmão, e não percebes
a trave que há no teu próprio olho? Como podes dizer a teu irmão: irmão,
deixa-me tirar o cisco do teu olho, quando tu não vês a trave no teu próprio
olho? Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás enxergar
bem para tirar o cisco do olho do teu irmão.»
Mas
Jesus retorna ao tema da cegueira e explica o que é esse mal. A pretensão de
ser um guia, um mestre do outro, pode levar a corrigir o que Jesus diz ser
minúcias e o fato de você fingir corrigir o outro é porque tem uma trave
cravada na sua visão. Então, Jesus continua de forma irônica. Como não ver uma
trave que está no olho? É a trave que está no olho que mostra o cisco nos olhos
dos irmãos, mas não ver a trave no olho significa uma presunção, um sentimento
de superioridade; é o que Jesus chama de hipocrisia.
E Jesus convida a retirar a trave que está no olho do irmão, mas só aparentemente, porque depois desencoraja! É o que, na espiritualidade, se chama correção fraterna, mas quando se consegue tirar a trave que grudou no olho, desaparece o desejo de ir buscar os ciscos nos olhos dos irmãos.
Lucas 6,43-44: «Não existe árvore boa que dê frutos ruins, nem árvore ruim
que dê frutos bons. Toda árvore é reconhecida pelos seus frutos. Não se colhem
figos de espinheiros, nem uvas de plantas espinhosas.»
Então,
Jesus fornece um critério para a autenticidade do discípulo, qual é? É a
questão dos frutos. Quando esses frutos são de vida, enriquecem a vida,
comunicam a vida, vêm de Deus.
Jesus dá um exemplo compreensível a todos. Assim, o critério de autenticidade não é a doutrina, a ortodoxia, mas o fruto que se produz. Se um estilo de vida, se uma mensagem produz vida, enriquece a vida dos outros, certamente vem de Deus, porque Deus é o autor da vida.
Lucas 6,45: «O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu coração.
Mas o homem mau tira coisas más do seu mau tesouro, pois sua boca fala do que o
coração está cheio.»
Jesus
conclui, dizendo: “O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu
coração”. O coração, naquela cultura, é a mente, é a consciência, ele traz
o bem. O que isso significa?
Aqueles
que se alimentam do bem, inevitavelmente produzem o bem para os outros.
É por isso que é importante nos nutrirmos apenas com o que Lucas fala que é o belo, o bem, porque o que se torna fonte de alimento em nós é o que produz alimento para os outros. A liturgia deste domingo não traz, mas há o versículo 46 que é importante: “Por que me chamais: ‘Senhor! Senhor!’, mas não fazeis o que vos digo?” Aqueles que chamam “Senhor, Senhor”, são os que defendem e são extremamente apegados à doutrina perfeita, à ortodoxia perfeita, mas eles não fazem o que Jesus diz. Para Jesus, eles são pessoas inúteis. Então, é isso que o homem mau tira de seu mau tesouro: o mal. Portanto, é um convite de Jesus para se colocar sempre ao lado do belo, alimentar-se da beleza para ser pessoas bonitas que transmitem o bem aos outros.
* Traduzido e editado do italiano por Pe.
Telmo José Amaral de Figueiredo.
** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994.
Reflexão
Pessoal
Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo
“Três coisas não
podem ser escondidas por muito tempo: o sol, a lua e a verdade.”
(Buda)
O Evangelho deste domingo nos pede a “revolução do coração”! Isso mesmo! O ser humano autêntico se constrói a partir de dentro, do íntimo, do coração! Porém, tudo o que somos, tudo o que pensamos e sentimos acaba por se transformar em ações, atitudes, gestos concretos. Por isso, Jesus menciona a árvore e seus frutos. Afinal, conhece-se a árvore por aquilo que ela produz. Do mesmo modo, conhece-se o ser humano por meio de suas práticas, suas posturas.
Vivemos em tempos do retorno da hipocrisia! Hipocrisia
que se traduz, segundo Jesus, em ser exigente com os outros:
* ser extremamente ortodoxo em questões
de doutrina,
* moralista em questão de costumes,
* tradicionalista em questões
litúrgicas e rituais,
enquanto desculpamos ou fingimos não ver ou
nos omitimos diante de nossas próprias imperfeições e incoerências diante do:
* Evangelho, fonte de toda doutrina,
* da caridade, principal virtude e
essência da vida cristã,
* da fraternidade e simplicidade dos gestos sacramentais oriundos de Jesus de Nazaré, o qual jamais se fez distinguir de seus concidadãos mediante vestes e hábitos diferentes e especiais.
Tudo isso, não deixa de ser uma sorte de “neurose espiritual”, ou seja, o modo equivocado, exagerado de como o indivíduo se relaciona com os seus desejos e com as suas contradições. Muitos transformam a sua vivência cristã em uma neurose, uma preocupação excessiva com o pecado, a culpa, a rigidez doutrinal e o formalismo litúrgico. Jesus já havia percebido isso nos especialistas em lei e grandes intelectuais de seu tempo, chamando-lhes: “Guias cegos, que coais o mosquito e engolis o camelo!” (Mateus 23,24).
Quantos “guias cegos”, pessoas que se
consideram justas, santas, irrepreensíveis, mestras não temos no catolicismo e
cristianismo de nossos tempos! Justamente para evitar esse risco, Jesus afirma categoricamente:
“Quanto
a vós, não vos façais chamar de ‘rabi’ [= mestre], pois um só é vosso Mestre e
todos vós sóis irmãos” (Mateus 23,8).
No entanto, há muitas pessoas que creem, confiam, seguem e obedecem cegamente a esses “guias cegos” e não ao único e verdadeiro Mestre, Jesus Cristo e seu Evangelho! Aliás, recomendo, vivamente, a leitura e meditação atentas do Evangelho Segundo Mateus, capítulo 23 versículos de 1 a 32. Vale a pena!
Jesus nos convida e não tornar a vida das
pessoas mais pesada, mais difícil e desafiadora do que ela já é! Eis alguns
propósitos que o evangelho deste domingo nos deixa, segundo as corretas
palavras de J. A. Pagola:
“Esforçar-nos por viver de tal maneira que, ao menos perto de nós, a vida seja mais humana e suportável. Não envenenar o ambiente com nosso pessimismo, nossa amargura e agressividade. Criar ao nosso redor, relações diferentes, feitas de confiança, bondade e cordialidade.”
Oração após a meditação do Santo Evangelho
«Fazei-vos de estúpidos para ficardes estúpidos, fazei-vos de cegos para ficardes cegos, ficai embriagados sem tomar vinho, tontos, sem bebida fermentada. O Senhor é quem vos prepara um vento embriagador, é ele quem vos tapa os olhos, quem vos cobre a cabeça. Essa revelação toda será para vós como o texto de um documento lacrado. Se alguém apresentar esse documento a quem sabe ler, dizendo: “Leia por favor!”, ele dirá: “Não posso ler, está lacrado!” Se o derem a quem não sabe ler, há de responder: “Não sei ler!” Disse o Senhor: “Esse povo me procura só de palavra, honra-me apenas com a boca, enquanto o coração está longe de mim. Seu temor para comigo é feito de obrigações tradicionais e rotineiras. Por isso continuarei a surpreender esse povo, com um grande e espantoso milagre. Aí a esperteza dos seus sábios se perde, e a clareza dos inteligentes se apaga”. Ai daqueles que tentam esconder-se do Senhor, fazendo segredo daquilo que planejam! Eles tramam no escuro dizendo; “Ninguém verá, ninguém saberá!” Que absurdo! O barro vai se comparar ao oleiro? Pode uma obra qualquer dizer ao seu autor: “Tu não me fizeste!”, ou a cerâmica dizer ao oleiro: “Tu não entendes de nada!”?»
(Isaías 29,9-16)
Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – VIII Domenica del Tempo Ordinario – 03 marzo 2019 – Internet: clique aqui (Acesso em: 18/02/2025).

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