«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

6º Domingo do Tempo Comum – Ano C – Homilia

Evangelho: Lucas 6,17.20-26

 Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

Felizes os que não se deixam escravizar pelos bens e pelas riquezas deste mundo

«Não haverá pobres no meio de ti», esta é a vontade de Deus, a qual encontramos expressa no livro de Deuteronômio no capítulo 15 versículo 4, e que, então, achará a sua realização nos Atos dos Apóstolos, onde o evangelista escreve que a primitiva Comunidade cristã testemunhava com força a ressurreição de Cristo, porque nenhum membro passava necessidade. Por esta razão, os pobres são considerados infelizes, pois é dever da comunidade cristã tirá-los da sua condição de pobreza.

Jesus jamais proclamou os pobres bem-aventurados, os pobres são infelizes e é dever da comunidade cristã retirá-los da sua condição.

Encontramos as bem-aventuranças em duas versões:

a) no Evangelho de Mateus são oito [Mt 5,1-12a], onde Jesus se dirige àqueles que devem optar por entrar nessa condição, por isso Jesus fala de pobres de espírito, de força interior;

b) no Evangelho de Lucas que examinamos agora, no capítulo 6 do versículo 17, ao contrário, a pobreza é uma condição que os discípulos já escolheram.

Portanto, Jesus nunca proclama bem-aventurados os pobres que a sociedade fez, mas aqueles que livre e voluntariamente entraram nessa condição e não são abençoados porque são pobres, são abençoados pela resposta de Deus à sua escolha. 

Lucas 6,17.20:** «Jesus desceu com eles da montanha e parou num lugar plano. Ali estavam muitos dos seus discípulos e uma grande multidão do povo, de toda a Judeia e de Jerusalém, e do litoral de Tiro e Sidônia. Então ergueu o olhar para os seus discípulos e disse-lhes: “Bem-aventurados vós, os pobres, pois vosso é o Reino de Deus!»

Escreveu o evangelista: «Vós que fizestes esta escolha, que deixastes tudo e o seguistes, sois abençoados, isto é, plenamente felizes». Essa não é uma condição estática, mas dinâmica, em andamento, porque o reino de Deus é de vocês, isto é, Deus cuida de vocês. 

Lucas 6,21: «Bem-aventurados vós que agora passais fome, pois sereis saciados! Bem-aventurados vós que agora estais chorando, pois haveis de rir!»

Jesus veio para inaugurar o Reino de Deus, uma sociedade alternativa onde, em vez de acumular para si, se reparte generosamente pelos outros e, para quem faz isso, há a resposta de Deus que cuida dele e de quaisquer elementos negativos dessa escolha. A necessidade e a perseguição são neutralizadas pela ação do Pai. 

Lucas 6,22-23: «Bem-aventurados sereis quando vos odiarem, vos expulsarem e injuriarem, quando banirem o vosso nome como coisa má, por causa do Filho do Homem. Alegrai-vos, nesse dia, e exultai, pois grande é a vossa recompensa no céu. Assim os pais deles faziam aos profetas.»

Qual é o motivo dessa perseguição? Que a bem-aventurança da pobreza torna a pessoa totalmente livre. Jesus diz: «por causa do Filho do Homem». O Filho do Homem é o homem que tem a condição divina, portanto o homem totalmente livre, e...

... a instituição, toda instituição seja religiosa que política, detesta as PESSOAS LIVRES e desencadeia a perseguição.

Mas Jesus diz «não vos preocupeis porque Deus está do vosso lado». Entre os perseguidos e os perseguidores, Deus está sempre do lado dos perseguidos. É por isso que Jesus diz: «Alegrai-vos». E, Jesus acrescenta: «Assim os pais deles faziam aos profetas».

Para Jesus o papel do discípulo na comunidade cristã é o do profeta, quem é o profeta? Aquele que torna visível o Deus invisível em sua própria existência, aquele que, sobretudo, em harmonia com Deus, amplia o horizonte da comunicação entre Deus e os homens.  

Lucas 6,24-25: «Mas, ai de vós, ricos, pois já tendes vossa consolação! Ai de vós que agora estais fartos, pois passareis fome! Ai de vós que agora estais rindo, pois ficareis de luto e chorareis!»

Mas, depois de ter proclamado plenamente felizes aqueles que fizeram a escolha de compartilhar seus bens, porque é disso que se trata neste texto do Evangelho, Jesus faz um lamento fúnebre sobre os ricos. É traduzido como um problema, mas não são ameaças, não são palavrões, é uma compaixão. O “ai” refere-se à expressão hebraica “hoi” que era o lamento fúnebre. Jesus chora os ricos como se já estivessem mortos, aqueles que, em vez de compartilhar para os outros, acumularam para si. 

Não esqueçamos que é o evangelista Lucas, que nos conta a parábola do rico e do pobre Lázaro [Lc 16,19-31], o rico que vive só para si e é condenado não porque maltratou os pobres, mas simplesmente porque os ignorou em sua existência. 

Aqui, Jesus passa a chorar, poderíamos traduzir “infelizmente” ou “pena de”: «vós que agora estais fartos, vós que agora estais rindo», isto é, vocês que causaram a fome, vocês que causaram sofrimento e Jesus chora por eles como gente já morta! No Evangelho, o ensinamento de Cristo é que se possui apenas o que se dá.

O que retemos para nós não é possuído, mas nos possui.

Essas pessoas ricas acreditavam que possuíam bens, na verdade eles eram possuídos por esses bens, adoravam Mamon e Mamon, o lucro e a conveniência, os destruiu.

[Observação: Mamon era considerado o deus das riquezas entre o povo Sírio. Os evangelhos também consideram Mamon como sendo o demônio das riquezas e ao demônio de uma forma geral. Essa palavra vem do hebraico - que significa “dinheiro”.] 

Lucas 6,26: «Ai de vós quando todos falarem bem de vós, pois assim os pais deles faziam aos falsos profetas.»

O critério de autenticidade do discípulo, do profeta pode ser visto pela relação que ele tem com o sistema:

... se o sistema lhe elogia, lhe gratifica, lhe recompensa, vê-se logo que você é um falso profeta.

Se, por outro lado, o sistema persegue você, significa que você está indo contra a corrente, você está seguindo Jesus, mas só indo contra a corrente você encontrará a água sempre cristalina, sempre fresca. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 3. ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2019. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

“Odeio o privilégio e o monopólio. Para mim, tudo o que não pode ser dividido com as multidões é tabu.” (Mahatma Gandhi: 1869-1948 – filósofo e político indiano) 

Primeiramente, deve ficar bem claro que as bem-aventuranças, seja aquelas de Mateus, seja estas de Lucas (provavelmente as mais originais e antigas), foram pensadas e pronunciadas tendo como destinatários os(as) discípulos(as). Jesus fala para aqueles que se sentem vinculados, unidos a ele, ao seu projeto de Reino de Deus. Ele tem consciência de que, apenas uma minoria, está disposta a ser pobre por opção, por iniciativa e não por consequência de uma situação social injusta. 

Jesus não é ingênuo, ressentido ou impotente diante do empobrecimento e da miséria de seus irmãos! Ele possui uma “visão intensa da justiça de Deus, que não pode permitir o triunfo final da injustiça” (J. A. Pagola). Por isso, ele não amaldiçoa os ricos, nem requer a vingança divina para eles. O que Jesus faz é compadecer-se, até o luto (!) daqueles que se deixam escravizar pelo dinheiro, pelas riquezas, pelos seus bens, mesmo que, para isso, tenham de explorar, expropriar e tomar, sempre mais, daqueles que já são pobres, já são humildes, já são pequenos! 

Jesus vai no cerne da questão:

Para ter sempre mais, para acumular sempre mais, o ser humano se desumaniza, esquece-se de seus semelhantes, torna-se indiferente, insensível ao que se passa na vida de seus irmãos e irmãs! Por isso, essas pessoas ricas já estão MORTAS para a vida autêntica, para a verdadeira felicidade, para o Bem, para o Reino de Deus!

A partir disso, surge a proposta radical das bem-aventuranças de Lucas: fazer-se pobre, acontentar-se com o essencial, saber partilhar, saber se doar, viver na sobriedade de quem sabe que NADA É SEU, tudo é de todos, tudo é de Deus! No fundo, Jesus pede que seus autênticos discípulos sejam PESSOAS LIVRES que não se igualam ao pensamento predominante que há neste mundo! 

Não é por acaso que Jesus respondeu a Pedro, quando este lhe interrogou sobre a recompensa que teriam seus discípulos, aqueles que deixaram tudo, pelo fato de o seguirem:

“Em verdade, vos digo: ninguém que deixe casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos e campos, por causa de mim e do Evangelho, ficará sem receber cem vezes mais: neste tempo agora, casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos com perseguições –; e no mundo futuro, a vida eterna” (Mc 10,29-30).

Que fique bem claro algo fundamental: “Se no mundo, chamado cristão, há a desigualdade que sabemos e sofremos, é que não cremos no Evangelho (J. M. Castilo). Como dizia-nos o saudoso profeta, bispo-emérito da Prelazia de São Félix do Araguaia, Dom Pedro Casaldáliga:

“Na dúvida, fique do lado dos pobres”.

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Duas coisas eu te pedi, esperando que não as recuses, antes de eu morrer: afasta de mim vaidade e mentira, e não me dês indigência nem riqueza, concedendo-me apenas minha porção de alimento. Isto para que, estando farto, eu não seja tentado a renegar-te e comece a dizer: “Quem é o Senhor?” ou, tendo caído na indigência, me ponha a roubar e profane o nome do meu Deus.»

(Provérbios 30,7-9)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – VI Domenica del Tempo Ordinario – 17 febbraio 2019 – Internet: clique aqui (Acesso em: 10/02/2022).

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