«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

7º Domingo do Tempo Comum – Ano C – Homilia

 Evangelho: Lucas 6,27-38

 Alberto Maggi *

Frade da Ordem dos Servos de Maria (Servitas) e renomado biblista italiano 

Deus é bondade e misericórdia sempre!

Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso”. Todo o Evangelho de Lucas nada mais é do que uma variação desse tema [a misericórdia], uma reproposição dessa expressão em múltiplas formas. É o que vemos na passagem que comentamos, o capítulo sexto de Lucas, dos versículos 27 a 38, onde Jesus convida seus discípulos a colocarem suas vidas em harmonia com a onda de amor de Deus para torná-la indissolúvel. Mas vamos ouvir Jesus. 

Lucas 6,27-28:** «A vós, porém, que me ouvis, eu digo: amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam. Abençoai os que vos amaldiçoam e orai pelos que vos caluniam.»

O evangelista escreve que Jesus se dirige “A vós que me ouvis”. Portanto, aos discípulos que Jesus proclamou bem-aventurados, e tudo é um convite a um amor dinâmico, a um fazer, não passivo. Ao ordenar “amai os vossos inimigos”, ele revela o que significa harmonizar a vida com o amor de Deus. E Jesus complementa, dizendo: “fazei o bem aos que vos odeiam”. Em grego, literalmente, aqui o evangelista escreve “torna belo, faz bonito”. O termo que é traduzido como “bem” em grego tem o significado de “belo” e este termo é muito importante, inclusive, porque, com ele, esta passagem termina.

O amor é usado para tornar belos aqueles que são feios, porque quem odeia é gente feia.

Então, com o nosso amor devemos torná-los belos, significa colaborar na ação criadora de Deus que, lemos no livro de Gênesis, quando ele cria tudo, ele “viu que era muito bom”, ou seja, muito belo [Gn 1,31]. E, por isso, Jesus nos convida a abençoar aqueles que nos amaldiçoam, a rezar por aqueles que nos tratam mal, para harmonizar a nossa própria extensão de amor com a de Deus. 

Lucas 6,29-30: «Ao que te bate numa face, oferece-lhe também a outra. E ao que tira o teu manto, não o impeças de levar também a túnica. Dá a todo que te pedir e, se alguém tirar do que é teu, não peças de volta.»

Também convida a uma atitude positiva em relação à violência, no sentido de que a violência não deve ser sofrida passivamente, mas a violência deve ser neutralizada. É por isso que Jesus diz: “Ao que te bate numa face, oferece-lhe também a outra”. A dignidade é perdida por aqueles que esbofeteiam, não por aqueles que são esbofeteados. Depois, com a plenitude da própria atividade, mostrar ao outro a inconsistência de sua ação violenta. 

Lucas 6,31: «Assim como quereis que os outros vos façam, fazei-o vós a eles.»

Então, Jesus se refere ao que era uma regra bem conhecida, chamada de “regra de ouro”. Também a encontramos na história de Tobias, no livro de Tobias no capítulo 4 versículo 15, que era o de não fazer aos outros o que você não quer que seja feito a si mesmo. Bem, para Jesus nunca há o negativo, mas sempre o positivo, por isso, ele muda essa expressão para: “Assim como quereis que os outros vos façam, fazei-o vós a eles”. Portanto, Jesus afirma: “faça aos outros o que você faz a si mesmo”. Então, é uma atitude positiva, é uma atitude criativa. 

Lucas 6,32-35a: «Se amais os que vos amam, que gratidão esperais? Também os pecadores amam os que os amam. E se fazeis o bem aos que vos fazem o bem, que gratidão esperais? Também os pecadores agem assim. E se emprestais somente àqueles de quem esperais receber, que gratidão esperais? Até os pecadores emprestam a pecadores para receberem o equivalente. Amai os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai sem querer nada em troca. Então, a vossa recompensa será grande, e sereis filhos do Altíssimo...»

Então, Jesus refere, depois de ter feito o contraste entre o crente e os pecadores, onde constata que não há necessidade de crer em Deus, ser filho/filha de Deus para amar aqueles que nos amam, Jesus afirma que filho de Deus não se nasce, mas um se torna através da aceitação e imitação de seu amor. Na verdade, Jesus diz: “Amai os vossos inimigos”. Portanto, nesta página não há tanto indicações sobre as atitudes que os homens devem ter e o que os homens devem fazer, mas esta página é o retrato de quem é Deus, porque Deus é assim.

Filhos de Deus não nascemos, mas nos tornamos pela imitação de seu amor. 

Lucas 6,35b: «... porque ele é generoso também para com os ingratos e os maus.»

E, aqui, Jesus derruba um dos pilares da religião. Pois, em toda religião e em cada religião, Deus recompensa os bons, mas pune os maus. Bem, Jesus supera tudo isso, Jesus apresenta um Deus não bom, mas exclusivamente bom, cujo amor se dirige a todos. Aqui, Lucas também supera a teologia de Mateus, que havia dito que “Deus era bom para com os maus e para os bons”, aqui não, os bons desaparecem, ele é benevolente para com os ingratos e os maus.

Deus é amor e a sua é uma oferta contínua e crescente de amor a cada pessoa. 

Lucas 6,36: «Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso.»

Aqui, está a palavra que dissemos, é aquela sobre a qual todo o Evangelho de Lucas está centrado: “Sede misericordiosos”. É a única vez que este termo “misericordioso” aparece no Novo Testamento, há, apenas, uma outra vez como uma citação na carta de Tiago. Esta palavra “misericordioso” vem de um termo hebraico que indica o ventre, o útero. E, aqui, Jesus contrasta, ele diz “sede misericordiosos”, ele poderia dizer “como é misericordiosa uma mãe”, porque é disso que se fala, o que está no ventre da mãe. Porém, ele afirma: “como vosso Pai é misericordioso”. Ele contrasta a atitude da mãe com a do pai, mas não a contrasta, na realidade a une: Jesus apresenta um pai que é materno e o amor materno é o do amor incondicional. 

Para isso convida Jesus, a sermos misericordiosos como o nosso Pai é misericordioso. Enquanto no Antigo Testamento o Senhor concluía suas prescrições com o convite “sede santos como eu sou santo”, – mas a santidade pode separar dos outros, santidade entendida como observância de regras, – aqui, Jesus nos convida a ser misericordiosos como nosso Pai é misericordioso e este amor, este amor maternal, este amor visceral não só não afasta, mas aproxima, não separa, mas une. 

Lucas 6,37: «Não julgueis, e não sereis julgados; não condeneis, e não sereis condenados; perdoai, e sereis perdoados.»

E Jesus prossegue em um crescente. E, aqui, está outra surpresa: “perdoai, e sereis perdoados. O perdão não é obtido indo ao templo, por meio de uma ação litúrgica, mas por uma atitude dinâmica que significa encher de amor quem errou. Perdoar não significa esquecer, mas significa fazer o outro entender:

a sua capacidade de me ferir nunca será tão grande quanto a minha de lhe amar e lhe fazer bem. 

Lucas 6,38: «Dai e vos será dado: uma medida boa, calcada, sacudida e transbordante será colocada no vosso colo, pois com a medida com que medirdes, será medido para vós.»

Em seguida, vem a conclusão, Jesus se refere ao uso dos mercados quando as mercadorias eram colocadas na roupa, que era recolhida e feita tipo de um saco, uma bolsa. O Senhor não se deixa vencer pela generosidade. Nessa dinâmica de amor recebido e amor comunicado, quanto maior o amor comunicado aos outros, maior será a possibilidade de Deus nos transmitir seu amor. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 3. ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2019. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

“A medida do amor é amar sem medida.” (Santo Agostinho: 354-430 – filósofo, teólogo e bispo da Igreja no norte da África)

Lendo e refletindo esse texto de Lucas, é impossível não nos admirarmos de quanto Jesus é desconcertante! Quanto ele nos surpreende, sempre! Afinal, nós, seres humanos, temos a mania de medir, calcular, delimitar todas as coisas. Porém, Jesus Cristo nos faz perceber e enxergar que não há limites para Deus! Ele ama, ele perdoa, ele é misericordioso sem limites, sem cálculos! 

Ouso dizer que, nessas palavras de Jesus encontra-se, na verdade, o grande segredo da felicidade e capacidade de vivermos neste mundo sem nos deixarmos vencer pelo estresse que significa conviver com outras pessoas. Sim, a convivência é desafiadora! Estar com o outro, viver junto a outros, partilhar a vida com outros pode, aparentemente, significar algo óbvio, normal, da natureza humana. Porém, o outro sempre nos desafia, nos invade, nos inquieta, nos desinstala! Não é por acaso que São Paulo nos diz:

“...suportai-vos uns aos outros e, se um tiver motivo de queixa contra o outro, perdoai-vos mutuamente. Como o Senhor vos perdoou, fazei assim também vós. Sobretudo, revesti-vos do amor, que é o vínculo da perfeição” (Cl 3,13-14; cf. Ef 4,1-3).

Sem sermos bondosos não conseguiríamos viver juntos sobre a face da Terra! Como nos recorda J. M. Castillo: “O centro e o eixo de nossa vida de crentes em Jesus, tem que ser sempre a bondade, a generosidade, a caridade, o amor fraterno. Tudo que não seja isso, é deixar o cristianismo”. Isso não é uma utopia, mas também não é algo fácil, algo óbvio! Não significa despir-me dos meus direitos, renunciar a minha dignidade! 

As palavras de Jesus, neste domingo, nos apresentam dois fortes e urgentes desafios:

1º) Termos a coragem de rompermos com o ciclo da violência, da agressão mútua, da vingança, da mania de superioridade que impera neste mundo! Aprendermos a tratar quem diverge de mim, quem discorda de mim, quem pensa diferente de mim, quem vive diferente de mim, quem encara a vida de modo diverso do meu, não como um inimigo, mas como, um irmão ou irmã a quem devo respeitar e amar sempre, incondicionalmente! Para o cristão, não deve haver “inimigos”!

2º) Amarmos gratuitamente. Sim, a gratuidade é algo em extinção nesse mundo! Corremos o grave perigo de transformarmos tudo em nossa vida em uma mera troca de serviços, favores, valores e assim por diante! A grande infelicidade do ser humano, nos tempos atuais, está em não amar e não ser amado! Muitos não possuem a capacidade de amar! Tudo transformou-se em interesses, satisfações momentâneas, desfrutar o aqui e o agora. 

Viver sem se importar com os outros, desinteressado(a), insensível ao que se passa com os demais seres humanos pode ser uma tentação, pois nos “livraria” de tantas contrariedades. No entanto, uma pessoa que assim agisse e agir não será feliz! Aqui, cabem, perfeitamente, as sábias e proféticas palavras de Dom Hélder Câmara (1909-1999), arcebispo-emérito de Olinda e Recife (PE):

“Para libertar-te de ti mesmo, lança uma ponte para além do abismo que teu egoísmo criou. Procura ver além de ti mesmo. Procura escutar a um outro e, sobretudo, tenta fazer um esforço para amar em vez de amar a ti mesmo”.

 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Ó alta e eterna Trindade, voltai o olhar da vossa misericórdia para as vossas criaturas. Eu sei que a misericórdia é vossa; e onde quer que eu olhe, não encontro nada além de vossa misericórdia; por isso corro e clamo diante da vossa misericórdia para que façais misericórdia ao mundo. Vossa misericórdia nos criou; a própria misericórdia nos resgatou da morte eterna. Vossa misericórdia nos preserva e prolonga a vida dando-nos tempo para voltar e reconciliar convosco. Ó Pai misericordioso e compassivo, por misericórdia nos concedeis grandes consolações, para que sejamos movidos a amar, pois o coração da criatura é atraído pelo amor. Vossa misericórdia também nos dá e nos permite dores e aflições para que aprendamos a nos conhecer e adquirir a pequena virtude da verdadeira humildade. Por misericórdia reservastes as cicatrizes no corpo de vosso Filho, para que com elas peça misericórdia para nós diante de vossa majestade. Nós vos damos graças. Amém.»

(Santa Catarina de Sena, Oratio IX)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – VII Domenica del Tempo Ordinario – 24 febbraio 2019 – Internet: clique aqui (Acesso em: 17/02/2022).

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