«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 14 de abril de 2023

2º Domingo de Páscoa – Ano A – Homilia

 Evangelho: João 20,19-31 

Frei Alberto Maggi

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas)

A comunidade cristã deve ser a luz do amor do Pai ao mundo, pelo afeto e ternura

No primeiro dia da semana — é o dia da ressurreição de Jesus —, os discípulos criaram o hábito, a iniciativa de reunir-se para a celebração eucarística. O capítulo 20 do Evangelho de João, nestes versículos 19 ao 31, que a liturgia hoje nos propõe, diz respeito justamente ao significado profundo da celebração eucarística. A Eucaristia é o momento importante, indispensável e precioso para o crescimento individual e para o crescimento da comunidade; o evangelista nesta passagem nos dá seu significado profundo, vejamos. 

João 20,19ab: «Ao entardecer daquele dia, o primeiro da semana, os discípulos estavam reunidos, com as portas trancadas por medo dos judeus. Jesus entrou e pôs-se no meio deles.»

A comunidade se reúne no primeiro dia da semana e — escreve João — que “Jesus veio”. Cada vez que a comunidade se reúne, Jesus se manifesta. Nesta passagem, o evangelista evita usar o verbo “aparecer”; não são aparições, são encontros, são manifestações habituais de Jesus quando a sua comunidade se reúne.

E pôs-se no meio”: é importante a indicação que o evangelista dá sobre a posição de Jesus! Quando Jesus se manifesta, coloca-se no centro. Qual o significado disso? Jesus não se coloca à frente dos outros, nem sequer se coloca no topo — o que implicaria que as pessoas, algumas, pudessem estar mais próximas dele — não, Jesus se coloca no centro. Isso significa que na Eucaristia não há hierarquias de importância, mas todos são iguais em torno de Jesus. Mas Jesus, no centro não absorve os seus, não os atrai para si, mas dali comunica o seu amor, fortalece o seu amor aos seus para mandá-los com ele e como ele para os outros. 

João 20,19c: «Disse: “A paz esteja convosco”.»

Pois bem, uma vez que Jesus se coloca no centro, pronuncia as palavras que se repetem três vezes nesta passagem. O número três significa aquilo que é completo, aquilo que é definitivo. “Paz a vós!”. Essa expressão de Jesus não é um convite, não é um desejo: Jesus não diz “a paz esteja convosco” [como consta da tradução da CNBB], mas é um dom. Na Eucaristia, a presença de Jesus comporta um dom. “Paz” — sabemos —, no mundo judaico, tem um significado riquíssimo e indica tudo o que contribui para o bem-estar dos seres humanos. Bem, Jesus se preocupa com o bem-estar de seus discípulos e ele lhes proporciona isso. 

João 20,20a: «Dito isso, mostrou-lhes as mãos e o lado.»

Mas as de Jesus não são palavras, são fatos. Com efeito, o evangelista escreve que “Dito isso” — portanto, depois de lhes ter dado a paz — “mostrou-lhes as mãos e o lado”, que trazem os sinais da paixão. O mandado de prisão — nós sabemos — era para todo o grupo de Jesus; foi Jesus — que havia dito que o verdadeiro pastor é aquele que dá a vida pelas suas ovelhas —, que no momento da sua captura, em posição de força, disse aos guardas: “Se é a mim que procurais, deixai estes irem” (Jo 18,8b). Não se deixou defender pelos seus discípulos que estavam dispostos a dar a vida pelo seu mestre, não, foi ele quem deu a vida pelos seus discípulos. Ora, ao mostrar as mãos e o lado com os sinais da paixão, isso significa que o amor que levou Jesus a dar a sua vida, a própria vida, pelos seus discípulos, permanece para sempre. 

João 20,20b: «Os discípulos, então, se alegraram por ver o Senhor.»

Assim, para a comunidade, eis o dom da paz:

... a certeza da presença de um amor do Senhor que é para sempre, um amor que protege, um amor que envolve, um amor que segue e acompanha os seus discípulos.

Com efeito, escreve o evangelista, “os discípulos se alegraram por ver o Senhor”. A experiência de se sentir tão amado — há uma expressão que usamos coloquialmente quando dizemos “nas mãos do Senhor, estar nas mãos do Senhor” — não é apenas a etapa final de um momento de dificuldade, mas é a experiência constante do crente da comunidade cristã: estar nas mãos amorosas do Senhor. 

João 20,21: «Jesus disse, de novo: “A paz esteja convosco. Como o Pai me enviou, eu também vos envio”.»

Então Jesus volta novamente a repetir este dom de paz, mas desta vez acrescenta “Como o Pai me enviou”. O Pai como enviou o Filho? Para manifestar o seu amor, a sua ternura incondicional: um amor que não depende dos méritos das pessoas, mas das suas necessidades.

O Pai não enviou o Filho para transmitir uma doutrina sobre ele, mas para manifestar seu amor, sua ternura.

Então Jesus diz: “Como o Pai me enviou, eu também vos envio”. Eis que a tarefa dos crentes é prolongar no mundo, com o seu amor, o próprio amor do Pai e do Filho que sobre eles foi derramado e, assim como Jesus não veio trazer uma doutrina sobre Deus, assim também a comunidade cristã não deve transmitir uma doutrina, mas ser expressão do seu amor. E como se exprime o seu amor? Pela carícia. A carícia é um gesto de ternura que todos podem compreender. Compreende-se, aqui, como qualquer demonstração de afeto ou benevolência feita a outrem por ação ou palavra

João 20,22: «Dito isso, soprou sobre eles e falou: “Recebei o Espírito Santo.»

E desta vez, escreve o evangelista: “Dito isso”, ou seja, para a missão, para poder manifestar este amor de ternura, “soprou sobre eles”. Encontramos essa expressão no livro de Gênesis no capítulo 2, versículo 7, quando é o momento da criação do homem. Prossegue: “e falou: ‘Recebei” — não é “o Espírito Santo”, recebam “Espírito Santo”. Por que não é “o Espírito Santo”? Não é a totalidade do Espírito Santo. Jesus havia dito que dava o espírito sem medida. Da parte de Deus, a comunicação de vida não tem medida, a medida é dada pela pessoa. Aquelas partes ainda ocupadas por ressentimentos, rancores e egoísmos são todas partes onde o Espírito não pode chegar. No entanto, onde este Espírito é plenamente acolhido, desencadeia-se um dinamismo de amor recebido e amor comunicado. Quanto maior for a capacidade do discípulo(a) de comunicar o amor, tanto maior será a capacidade de receber este Espírito de Deus. 

João 20,23: «A quem perdoardes os pecados, lhes serão perdoados; a quem os retiverdes, lhes serão retidos”.»

Depois vem a indicação de Jesus sobre o perdão dos pecados, que não é um ofício importante que Jesus dá a alguns, não é um poder que Jesus dá a alguns, mas é responsabilidade de todos. A comunidade de Jesus, com Ele no centro, onde este amor irradia, emana luz. Quem vive no pecado — o termo pecado indica direção errada de vida e, portanto, diz respeito ao passado — quem, vivendo no pecado, se sente atraído pela luz desse amor e passa a fazer parte dele, seu passado é completamente apagado. Aqueles, ao contrário — Jesus já havia dito — que praticam o mal odeiam a luz, permanecem nas trevas, mesmo que vejam a luz deste amor, eles se afastam dela, a presença de sua culpa e de seu pecado paira sobre eles. Portanto, como dissemos, não é um poder para alguns, mas uma enorme responsabilidade da comunidade ser a luz do amor do Pai

João 20,24-31: «Tomé, chamado Dídimo, que era um dos Doze, não estava com eles quando Jesus veio. Os outros discípulos contaram-lhe: “Nós vimos o Senhor!” Tomé, porém, disse: “Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não puser o dedo nas marcas dos pregos, se eu não puser a mão no seu lado, não crerei”. Oito dias depois, os discípulos encontravam-se reunidos na casa, e Tomé estava com eles. Estando as portas trancadas, Jesus entrou, pôs-se no meio deles e disse: “A paz esteja convosco”. Depois disse a Tomé: “Põe o teu dedo aqui e olha as minhas mãos. Estende a tua mão, coloca-a no meu lado e não sejas incrédulo, mas crê”. Tomé respondeu: “Meu Senhor e meu Deus!” Jesus lhe disse: “Por que me viste, creste? Felizes os que não viram e creram!” Jesus fez diante dos discípulos muitos outros sinais, que não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome.»

Observação: quem desejar um comentário dessa segunda parte do Evangelho deste domingo pode acessar uma outra reflexão de Frei Alberto Maggi, aqui (clique sobre): https://padretelmojosefigueiredo.blogspot.com/2022/04/2-domingo-de-pascoa-ano-c-homilia.html

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Todos os textos bíblicos citados foram extraídos de: BÍBLIA SAGRADA. Tradução oficial da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). 6. ed. Brasília (DF): Edições CNBB, 2022.

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«Eu vos disse essas coisas para que, em mim, tenhais a paz. No mundo, tereis aflições, mas tende coragem! Eu venci o mundo.»

(Evangelho Segundo João 16,33)

Há algo de muito assustador, de umas décadas para cá, em nosso mundo, refiro-me àquilo que alguns estudiosos vêm chamando de “sociedade narcisista” ou “sociedade do eu” ou, ainda, “cultura do egoísmo”. Algumas das características marcantes dessa cultura social seriam:

* a perda de vínculo e sentimento de pertencimento entre as pessoas, seja na família tradicional, nos grupos políticos e movimentos sociais;

* preocupação excessiva com o seu próprio bem-estar;

* dificuldade em ter empatia, ou seja, colocar-se na perspectiva do outro;

* culto à personalidade;

* autopromoção, especialmente, nas redes sociais;

* busca da fama a qualquer preço;

* consumo desenfreado de tudo;

* preocupação exacerbada com o autocuidado e a saúde mental;

* as vontades, ânsias e aspirações do indivíduo devem prevalecer na sociedade, a qual deve preocupar-se em satisfazer esse indivíduo. 

Poderíamos seguir adiante com essa lista, porém, isso é suficiente para relacionarmos com o cristianismo tal como o Evangelho de hoje nos inspira. Pois, nos ajudará a compreender a dificuldade de se viver a proposta de Jesus em uma cultura tal como a descrita acima! Segundo o Evangelho de João, Jesus entregou o “Espírito” ao morrer (Jo 19,30) e quando ressuscitou (Jo 20,22), portanto, como bem observa o teólogo José María Castillo, “Jesus dá ‘seu espírito’ ao fracassar no sofrimento e ao triunfar do sofrimento”. Portanto, quando sabemos sofrer e fracassar e sair com dignidade e humanidade dessas situações estamos comunicando o “espírito de Jesus”! 

Interessante que, logo após, conceder o Espírito Santo aos discípulos, Jesus autoriza a comunidade de seus seguidores (e não apenas seus apóstolos!) a ser agente do perdão, da misericórdia, da libertação das pessoas: “A quem perdoardes os pecados, lhes serão perdoados”. Jesus, com isso, reconhece a imperfeição humana, não condena, não foca na culpa, mas no perdão! Ele não impõe condições ao perdão! Portanto, com isso, Jesus é consciente da possibilidade de fracasso presente na história de toda pessoa humana! 

Por que o destaque que se dá, aqui, ao fracasso? Justamente porque vivemos em uma cultura social que abomina, condena, exclui e busca extirpar todo tipo de fracasso e fracassados! Em uma sociedade, na qual os indivíduos voltam-se, cada vez mais, apenas para si e para a satisfação de seus desejos e aspirações, viver o cristianismo parece ser algo impossível! Afinal, o cristianismo não é a exaltação do indivíduo, mas da comunidade! A experiência com Jesus ressuscitado se dá, segundo os Evangelhos, sobretudo, no ambiente da comunidade reunida, confira: Mt 28,16-20; Lc 24,36-49 e Jo 20,19-31. Há relatos de experiências em pequenos grupos: mulheres (Mt 28,9-10; Lc 24,13-35 e Jo 20,11-18 — somente Maria Madalena) e a um pequeno grupo de discípulos (Simão Pedro, Tomé/Dídimo, Natanael, Tiago e João, mais dois discípulos anônimos — Jo 21,1-19). Porém, mesmo nas manifestações a pequenos grupos, a finalidade é que retornem à comunidade para anunciar que Jesus está vivo e tem uma missão para todos. O foco é sempre sobre a comunidade e a missão! 

Tomé, ausente da comunidade quando da primeira experiência com o ressuscitado (Jo 20,24), teve mais dificuldade em crer. No entanto, bastou-lhe “ver” as feridas, o sofrimento de Jesus para que manifestasse sua fé: “Meu Senhor e meu Deus!”. Portanto, não somos uma comunidade do sucesso total, da glória permanente, dos bem-sucedidos e realizados, mas uma comunidade dos sofredores e fracassados que se inspira no aparentemente fracassado Jesus de Nazaré, vencedor do mundo (cf. Jo 16,33)! 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Agradeço-te Jesus, meu Senhor e meu Deus, porque me amaste e me chamaste, me tornaste digno de ser teu discípulo, porque me deste o Espírito, o mandato de anunciar e testemunhar a tua ressurreição, a misericórdia do Pai, a salvação e o perdão para todos os homens e mulheres do mundo. Tu és verdadeiramente o caminho, a verdade e a vida, aurora sem crepúsculo, sol de justiça e de paz. Deixa-me permanecer no teu amor, unido como um ramo à videira, dá-me a tua paz, para que eu possa vencer as minhas fraquezas, enfrentar as minhas dúvidas, responder ao teu chamado e viver plenamente a missão que me confiaste, louvando-te para sempre. Tu que vives e reinas para todo o sempre. Amém.»

(Fonte: SCORRANO, Tiberio, O.Carm. 2ª Domenica di Pasqua: contemplatio. In: CILIA, Anthony O.Carm. Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico B. Leumann [TO]: Elledici, 2009, p. 215.)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci” – Videomelie e trascrizioni –II Domenica di Pasqua – Anno A – 19 aprile 2020 – Internet: clique aqui (Acesso em: 12/04/2023).

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