«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

quinta-feira, 30 de março de 2023

Pastoral Hollywoodiana

 Não converte, mas ilude e manipula!

 Pe. Alfredo José Gonçalves

Congregação dos Missionários de São Carlos (Scalabrinianos), é vice-presidente do Serviço Pastoral dos Migrantes (SPM) 

Pe. Alfredo José Gonçalves, cs

Pastoral em tempos líquidos, diria Zygmunt Bauman

O mais importante é despertar sensações. No pano de fundo de uma música em geral tempestuosa, desfilam velozes os diálogos, gestos e imagens. Luzes, cores e ação devem levar ao espetáculo. Este último é a razão de ser da filmagem, seja ela de natureza real ou fictícia. Objetos, rostos e multidões percorrem a tela numa corrida vertiginosa. Importa menos a conexão das fotografias e da linguagem do que os arrepios que elas são capazes de provocar. O grande sucesso é deixar o espectador emocionalmente ébrio e hipnotizado. A ponto de ele praticamente sequer repousar e recostar-se. Numa atitude permanente de expectativa e quase de medo, ele tende a ocupar apenas a ponta da poltrona. O olhar grudado naquela alucinante sucessão ou justaposição de ações que surgem e desaparecem no seu campo de visão, a cabeça pendida para frente, ele mal consegue respirar com regularidade. As surpresas o mantêm o tempo todo alerta. Pouca deverá ser a preocupação com o processo de encadeamento. Menor ainda a definição e os contornos de tempo e espaço. Fugaz e veloz, tudo desliza com um sonho. Sonho meio fantasia e meio pesadelo, onde a conexão entre causa e efeito não sabe exatamente onde colocar os pés. 

Cena de ação em filme produzido por Hollywood

Em lugar de fatos, com seu respectivo sequenciamento, prevalecem as emoções e sentimentos. As cenas, em cadeia não raro, desconectada, entram pelos olhos e eletrizam os neurônios do cérebro, sem passar pela razão. Não há meio nem tempo de engolir, mastigar, digerir e selecionar o que se vê e ouve. Tampouco haverá reflexão possível e menos ainda espaço para uma formulação de juízo crítico. Imperam as verdades e certezas, não as hipóteses, buscas e pesquisas. Tanto que, ao sair da sala de projeção para a rua, o espectador sente-se literalmente cruzar de um mundo para outro. É como se tivesse feito uma longa viagem a um lugar secreto, misterioso. De repente, a nave espacial o abandona em meio à dura realidade do cotidiano. 

Os dois parágrafos anteriores servem para ilustrar o que tende a ocorrer quando, em lugar de uma pastoral de processo, privilegiamos uma “pastoral hollywoodiana”. Multidões, espetáculos, heroísmos e grandes proezas tomam o protagonismo dos trabalhadores e trabalhadoras. Daí a relevância dada à solenidades e às pompas exteriores, em detrimento da concentração e reflexão pessoal e coletiva. Nestes casos, não será incomum que a parafernália dos gestos e objetos litúrgicos ganhem um formalismo ritual exageradamente rico e vistoso.

É preciso compensar o vazio interior com a exuberância, o exibicionismo e a ostentação exterior.

Sobretudo, é preciso “encher os olhos” das câmeras, dos holofotes e dos microfones, uma vez que as cerimônias tendem a ultrapassar as paredes do templo e chegar ao espectador através das telas e telinhas. A linguagem da pose, da indumentária, das frases feitas e de certos ritualismos obtusos retornam da noite dos tempos.

A teatralização se sobrepõe ao processo de oração, reflexão, meditação e contemplação.

Nesse cenário fantasioso de luzes e cores, não difícil transformar qualquer celebração em show. E neste, fazem valer sua performance tanto o celebrante quanto os ministros, coroinhas, cantores, e assim por diante.

O espetáculo, a vibração, a emoção são os resultados que importam!

Mais pernicioso, todavia, vem a ser quando a pastoral hollywoodiana, além de predominante nos momentos celebrativos, invade igualmente o campo da conscientização, organização e mobilização populares, à luz da Palavra de Deus. A tendência hoje é deixar de lado, como ultrapassadas:

* a opção preferencial pelos pobres,

* o caráter combativo das Pastorais Sociais,

* as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)!

* E, juntamente com tais práticas a reflexão teórico-crítica da Teologia da Libertação (TdL) que as acompanhava.

Por que trilhar este caminho longo, lento e laborioso, quando podemos usar os atalhos da espetacularização? E o povo aplaude, uma vez que não é fácil olhar para a realidade nua e crua. Menos fácil ainda é pensar, refletir e lutar. Melhor festejar, receber pronta a receita, vestir um jaleco branco e fazer parte integrante do show, mesmo que seja alguns degraus abaixo dos figurantes centrais. 

Convém deixar claro que não tem sido pouca a influência de alguns canais católicos de televisão para esse retrocesso de uma PASTORAL DO PROCESSO para uma PASTORAL DO ESPETÁCULO. A via do envolvimento pastoral e do compromisso sociopolítico da fé cedeu o lugar à via curta e emocionante da festa.

Através desse atalho, tenta-se chegar à ressurreição sem passar pela dor e o sofrimento, pela paixão e a morte, pela superação da cruz e do túmulo.

Ademais, a interiorização e espiritualização individuais da religião é bem mais cômoda do que ter de lidar com relações novas para com o “outro, o diferente e o estrangeiro”. São essas relações, contudo, as únicas que apontam o caminho do Reino dos Céus. 

Fonte: Enviado pelo autor – Quinta-feira, 30 de março de 2023.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.