«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sábado, 23 de dezembro de 2017

INDIGNAÇÕES DE UM BIBLISTA...

Caras amigas, caros amigos,
Johan Konings

Ao enviar a minha saudação natalina, sei que, durante os últimos tempos, fiquei em dívida para com muitos de vocês, mas isso é, em grande parte, porque dez anos atrás tomei a decisão de priorizar incondicionalmente a nova tradução da Bíblia da CNBB [Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – Igreja Católica] dedicando-lhe todo o meu tempo que sobrava das aulas, atividades pastorais e sociais. Claro, com a ajuda do coordenador e dos outros colaboradores. Eu assumi o papel de ser o arquivo vivo do projeto, tendo tudo na cabeça e no computador, para ligar tudo com tudo, o texto material, a interpretação, o projeto de edição... Acabou (quase). Agora posso pensar em mensagens para meus amigos...

E minha preocupação política, social, cultural? Não neguei. Somente, fui para a retaguarda, para poder terminar o trabalho de que falei acima. Meu pensamento não abandonou o povo brasileiro, muito amado e muito abandonado. Decerto, há ainda uma aparência de bem-estar material, até de progresso... Mas que progresso? Venda de automóveis, aumento da violência e competição para um lugar debaixo das pontes...

Minhas preocupações

Estou preocupado, sobretudo, com o que se chama de EDUCAÇÃO. Os brasileiros, em geral, são agradáveis, amáveis, corteses, têm boas maneiras. São simpáticos e comunicativos. Alegres até, pois riem para não chorar. Mas muitos chegam ao fim do ensino fundamental sem domínio da língua pátria, da matemática e das ciências. Sem compreensão da história, da sociedade e da própria pessoa. Nas escolas públicas é comum encontrar no oitavo ou nono ano pessoas “normais” que não sabem ler, por falta de método educativo coerente e/ou de atenção psicopedagógica. Perde-se muito tempo na aula. Não se aprende a aprender – coisa que exige disciplina. Professores e direções se veem impotentes diante de fatores estranhos à educação. Atmosfera generalizada de imediatismo, de consumismo, até na sala de aula. Substituição da recepção auditiva (ouvir e refletir) pela meramente visual (ver e crer que as coisas são assim mesmo...). E os profissionais da educação cruzando os braços ou levando as mãos à cabeça...

As crianças e adolescentes não aprendem a observar e a compreender o mundo em que vivem. Com isso viram vítimas de todo tipo de manipulação: comercial, política, religiosa. Falava-se em Paulo Freire, mas agora está sendo demonizado, seu nome tirado de praças e ruas... Fala-se ainda, às vezes, em Piaget. Mas o que queriam esses educadores? Que os jovens, e também os adultos, observassem o mundo em que vivem e a partir daí construíssem um saber que lhes servisse. Entretanto, muitos nem sabem o nome da rua vizinha ou até da sua própria. Não aprendem a agarrar o boi pelos chifres para os afazeres de cada dia. Muita alienação.

Estou preocupado também com o CRISTIANISMO, a tradição religiosa na qual me insiro. Digo “cristianismo”, porque muitas coisas são comuns à igreja católica e às protestantes. Estou preocupado com o fundamentalismo, o recorrer a frases bíblicas absolutizadas ou a dogmas e tradições inquestionáveis para não ter de refletir sobre a realidade vivida. E no meio disso, as inclarezas do ensino religioso na escola pública. Catecismo é questão de comunidade, mas na escola pode-se aprender a observar, estudar a fé das pessoas como elemento do mundo em que se vive. Como formação humana integral, respeitosa, aberta. Como saber viver. Se “a graça supõe e eleva a natureza”, como dizem os teólogos, comecemos enobrecendo a natureza...

Quem viveu com todo o entusiasmo os anos do Concílio Vaticano II não pode ficar quieto diante da onda de neoconservadorismo que sopra na Igreja. Claro, não da parte do Papa Francisco – embora seja teologicamente mais prudente do que dizem seus adversários! Eu mesmo me considero como “tradicional”, acredite ou não. Dediquei tempo imenso à organização de grandes obras que representam a tradição cristã (a Bíblia) e católica (o Compêndio de Dogmas e Declarações de fé e moral).

No seio da CNBB estou articulando um ambiente para os biblistas católicos de nível acadêmico superior, porque eles e seus bispos têm questões e projetos específicos a serem contemplados. Amo nossa tradição, mas não o neoconservadorismo. A Idade Média passou. O Concílio de Trento foi atualizado no Concílio Vaticano II, que, por sua vez, precisa ser atualizado em cada parte do mundo, na África, na América Latina, e também na velha Europa.

E há um neoconservadorismo que não o parece: escondido atrás do som de guitarras elétricas, com melodias incantáveis que os fãs procuram impingir nas comunidades paroquiais, transformando a missa em show, tudo para curtir um Jesus "espiritual", que não mexe com os conflitos do mundo. 

Perdeu-se a consciência de que a missa é a memória viva de Jesus, o qual, por amor e fidelidade até o fim, enfrentou a morte. Tremenda superficialidade que invadiu o mundo, no qual vale a nova máxima: “Eu posto, logo sou”.

Estamos vivenciando o FIM DE UMA CIVILIZAÇÃO. O Papa Francisco o diz abertamente: no caminho em que estamos não há mais como continuar. Por um lado, o esgotamento do habitat humano. Por outro, a morte do ser humano pessoal. O ser humano acoplado à eletrônica, se não se cuidar, poderá acabar anencéfalo, reduzido a registrar e reagir, sem saber o que está fazendo. O “sistema” é que vai mandar.

Não podemos ficar assistindo passivamente a uma política econômica e social suicida e ao esvaziamento da humanidade dos indivíduos. Inundados por informação, perdemos a capacidade de pensar e agir.

É isso aí, gente. Mas, ao recordar que alguém que nasceu numa estrebaria virou o profeta que mais mexeu com o mundo, creio que haja esperança.

Desde já, feliz Natal e Ano Novo.

Johan Konings*, novembro 2017.


* Johan Konings é padre jesuíta nascido na Bélgica, professor titular da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia - FAJE, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Participou como perito na XII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, em Roma, em 2008, com o tema «A Palavra de Deus na Vida e na Missão da Igreja». Filósofo e filólogo, concluiu o doutorado em Teologia na Universidade Católica de Lovaina, na Bélgica, sócio-fundador da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica (ABIB). Entre suas muitas obras, coordenou a tradução da «Bíblia Ecumênica» – TEB e a tradução da "Bíblia Sagrada" da CNBB.

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