«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

É hora de reformar as polícias

[OS ARTIGOS REPRODUZIDOS ABAIXO AJUDAM

A REFLETIR E DEBATER UM ASSUNTO QUE NÃO PODE MAIS

SER DEIXADO SOMENTE SOB A RESPONSABILIDADE DAS NOSSAS

AUTORIDADES!!!

É HORA DE AGIR E MUDAR ALGO QUE É CRÍTICO NA SOCIEDADE ATUAL]



RENATO SÉRGIO DE LIMA E SAMIRA BUENO


O Estado atua a partir de um oneroso sistema de segurança pública sempre paralisado por disputas de competência, fragmentação e corporativismo - que, no entanto, demanda investimentos crescentes


Muito tem sido dito nos últimos dias sobre a crise na segurança pública em São Paulo e, mais recentemente, em Santa Catarina. Porém, só de modo residual começam a ressurgir questionamentos acerca do modelo que organiza as polícias brasileiras e que, em vez de dotá-las de eficiência no enfrentamento do crime organizado e da violência, as enfraquece e as torna reféns de estruturas burocráticas, ineficientes e arcaicas.
Os acontecimentos dos últimos três meses são repetições de situações agudas vividas em quase todos os Estados brasileiros nos últimos 15 anos e demonstram quão distante estamos dos padrões de civilidade de países desenvolvidos. 
Segurança tem se resumido à administração de uma constante agenda de crises, intercaladas por momentos de calmaria. Mas até onde conseguiremos postergar esforços para a reversão estrutural dessa situação?
O Estado, em seus vários poderes e instâncias, tem atuado a partir de um oneroso sistema de segurança pública que fica recorrentemente paralisado por disputas de competência, fragmentação de políticas e jogos corporativos, mas que, paradoxalmente, demanda investimentos crescentes para se manter.
E, infelizmente, no meio, ficam a população, sem força política suficiente para influenciar novas agendas, e os mais de 600 mil policiais brasileiros, que na ausência de regras claras de valorização profissional, só são lembrados como heróis quando são mortos.
Na brecha e no cotidiano das periferias das regiões metropolitanas, o medo e a insegurança acabam fortalecendo o crime e pautando a relação entre polícia e comunidade, entre Estado e sociedade.
Não é possível pedir civilidade e dignidade ao crime, mas é, sim, possível exigir racionalidade e eficiência democrática dos gestores públicos responsáveis por fazer frente à violência, ao medo e à criminalidade.
No lugar da cultura de ódio, que tanto marca manifestações públicas sobre o tema, temos que defender a garantia de direitos como o que diferencia o Estado da barbárie. Uma polícia forte não é sinônimo de violência, de obtenção de provas por meio de coações e/ou grampos indiscriminados.
O Brasil que queremos precisa de uma polícia forte e valorizada e que seja conhecida da comunidade. Polícias distantes dificultam não só a prevenção da violência, mas também a investigação de crimes. Sabendo a quem recorrer, fica muito mais fácil confiar na polícia e ajudá-la a cumprir sua missão.
A polícia não pode trabalhar sozinha, e criar vínculos públicos com a comunidade tem sido uma das estratégias mais bem-sucedidas no mundo. Ações de reorientação das práticas policiais em direção à participação da comunidade na formulação e execução de ações (conselhos, bases de polícia comunitária, entre outros) mostraram-se muito mais eficazes na reconquista da legitimidade e de espaços.
A história recente das políticas de segurança nos ensina que, entre as ações que mais tiveram êxito em reverter as taxas de violência, o envolvimento com a comunidade tem sido mais eficiente se associado a práticas integradas de gestão, pelas quais há uma irredutível aliança entre técnica e política.
E, nessa aliança, as melhores práticas concentraram suas energias no tripé aproximação com a população, uso intensivo de informações e aperfeiçoamento da inteligência.
Por uso intensivo de informações compreendemos a adoção de técnicas de produção de indicadores e análise de dados para planejamento, monitoramento e avaliação de operações policiais. Elas foram fundamentais para otimizar recursos humanos e materiais no dia a dia das polícias.
Já no aperfeiçoamento da inteligência, queremos destacar os esforços de coordenação dos fluxos de dados para a investigação criminal com vistas a reduzir ruídos e produzir provas mais robustas, que permitam punir quem comete um delito.
No entanto, por melhores que sejam essas práticas de gestão, sem uma mudança substantiva na estrutura normativa das polícias o quadro de insegurança hoje existente tenderá a ganhar contornos dramáticos.
Uma das lições de países que conseguiram reformar suas polícias, como Irlanda e África do Sul, é que quando a atividade policial deixa de ser autônoma e passa a responder à lógica das políticas públicas muito se ganha.
Para além de soluções puramente técnicas, percebe-se que os problemas da área podem ser mitigados quando a política está efetivamente comprometida na construção de uma nova postura do Estado em relação à sociedade. E, na esperança de que tal situação vire realidade, propomos a criação de uma comissão especial do Congresso para, em seis meses, elaborar um anteprojeto de reforma das polícias brasileiras.
Estamos diante de um momento ímpar, pelo qual as crises acontecem num ambiente de consenso de que algo precisa ser feito. Dito isso, precisamos de um passo adiante na busca de um Brasil mais seguro; um passo que alie as melhores técnicas e vontade política de mudar.
RENATO SÉRGIO DE LIMA E SAMIRA BUENO SÃO DIRIGENTES DO FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA
Fonte: O Estado de S. Paulo - Supl. ALIÁS - Domingo, 18 de novembro de 2012 - Pg. J5 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,e-hora-de-reformar-as-policias,961585,0.htm
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A gramática bélica da segurança
Daniel Hirata e Vera Telles
Expressões como ‘guerra urbana’ e ‘guerra ao crime’ avalizam a ação extralegal, quando não abertamente criminosa, da polícia
Cruzes simbolizaram policiais militares mortos em ação neste ano em São Paulo
Foto: J. Duran Machfee/Futura Press
No centro das manchetes dos principais meios de comunicação do País, a crescente onda de violência em São Paulo nos últimos meses é mais que inquietante. Mas também inquieta o modo como, em geral, o assunto é tratado, alimentando as imagens correntes de uma "guerra urbana", um confronto entre polícia e bandidos que mais parece cenário de faroeste urbano - no mais das vezes, uma composição de evidências (a contabilidade diária de mortes) e montagem de cenas de violência que embaralham fatos e circunstâncias que ainda precisam ser mais bem esclarecidos, e entendidos. Mortes de policiais, mortes de moradores em bairros periféricos da cidade, queima de ônibus, os chamados comboios da morte, confrontos, toque de recolher, tudo isso e mais alguma coisa aparece indistintamente como evidências de uma violência generalizada. Acontece que não são a mesma coisa. E as diferenças não são triviais, muito pelo contrário. É esse o ponto que assinala o problema político posto na situação atual.
Em nome da assim chamada "guerra ao crime", os supostos confrontos e a dita "resistência seguida de morte" mal escondem práticas de execução sumária operadas pela polícia fardada, ao mesmo tempo que na lógica do revide pelos policiais mortos multiplicam-se mortes que acontecem sob o modus operandi próprio de grupos de extermínio, que não surgiram agora, vêm de longa data, mas voltam com especial vigor e agressividade.
A violência policial não é novidade, sabemos disso. Não é o caso, aqui, de discutir as razões e circunstâncias que fazem dela um componente persistente em nossa história. Quanto aos acontecimentos atuais, não são poucos os analistas que procuram deslindar os fatores que teriam desencadeado esse ciclo de violência - desajustes no equilíbrio precário que rege acordos entre forças policiais e o crime organizado, tendo como ponto de partida as circunstâncias nebulosas que presidiram a morte de integrantes do PCC em maio deste ano. Muito provavelmente, assim como nos eventos de maio de 2006, foi assim que as coisas aconteceram. No entanto, quer nos parecer que, neste momento, o importante é entender a lógica política que preside e alimenta esse ciclo de violência.
As palavras não são inocentes. O uso recorrente da expressão "guerra urbana" assim como a postulação de uma "guerra ao crime" atestam a gramática bélica, cada vez mais militarizada, que vem pautando as políticas de segurança de São Paulo, construindo um campo nebuloso que alimenta e avaliza a ação extralegal, quando não abertamente criminosa, de forças policiais, como recurso de gestão da ordem.
As chacinas e extermínio que vêm acontecendo, na maioria das vezes após as mortes de policiais, atingindo as populações nos locais em que ocorrem, é o lado sinistro dos fatos recentes, ainda mais porque é a questão que fica nas bordas das discussões, tal como acidentes de percurso em um cenário de "guerra urbana". Mas isso não são detalhes desimportantes. É intolerável. É intolerável no sentido de que as forças policiais não podem fazer uso de meios extralegais como instrumento de gestão da ordem. É isso que introduz e aprofunda a insegurança que afeta os cidadãos desta cidade, mais ainda aqueles moradores dos bairros periféricos em que esses fatos acontecem. Nesse terreno, todos viram alvos passíveis de morte violenta, todos igual e indiferenciadamente extermináveis.
Nos últimos anos, a estratégia oficial parece ter sido a chamada incapacitação por meio do encarceramento, de que é evidência o acirramento das políticas punitivas e o aumento exponencial da população carcerária em São Paulo. Mais recentemente, parece que estamos presenciando uma guinada ainda mais perversa, que se sobrepõe à anterior, sem substituí-la, pondo em ação a incapacitação pela morte, fazendo uso de instrumentos extralegais de controle e, talvez, de puro extermínio dos "supranumerários". Quando o governador afirma que "quem não reagiu está vivo", de alguma maneira está avalizando essas práticas, no mínimo porque passa por cima das leis que supostamente governam o País, se atribuindo um poder de julgar que não cabe a ele, tampouco à polícia, que, a rigor, recebe e vem recebendo algo como uma licença para matar.
Em todos os lugares em que a lógica bélica da "guerra ao crime" foi implementada, os resultados foram devastadores. É isso que estamos presenciando em São Paulo. Em vez de desativar a lógica da violência, essa lógica militarizada de gestão da ordem termina por acionar o ciclo infernal dos revides e vinganças, ao mesmo tempo que repõe agora, em pleno século 21, esse terreno que esfumaça, no limite, a diferença entre a lei e o crime.
* DANIEL HIRATA É PESQUISADOR DO NÚCLEO DE ESTUDOS DA CIDADANIA, CONFLITO E VIOLÊNCIA URBANA (NECVU-UFRJ); VERA TELLES É PROFESSORA DO DEPARTAMENTO DE SOCIOLOGIA DA USP.
Fonte: O Estado de S. Paulo - Supl. ALIÁS - Domingo, 18 de novembro de 2012 - Pg. J5 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,a-gramatica-belica-da-seguranca,961584,0.htm
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Sob o controle de quem?
FERNANDO SALLA
Líderes do crime estavam isolados, havia vagas no RDD, rebeliões tinham acabado... E veio a crise
O Brasil é mesmo um país surpreendente! Em 2006, quando a cidade de São Paulo foi terrivelmente abalada por atentados de variada natureza e um confronto entre criminosos e autoridades se desencadeou, acreditávamos que tínhamos passado pela pior crise da história da segurança pública do País. Naquele momento, um dos centros das atenções foi o sistema prisional paulista, de onde teriam partido as ordens para os ataques dos criminosos.
Mas eis que chegamos em 2012 e estamos no meio de mais uma crise na segurança pública em São Paulo que, não há a menor dúvida, é muito mais grave que a de 2006, a começar pela duração e amplitude. Ano eleitoral, julgamento do "mensalão", declaração do ministro da Justiça sobre as prisões brasileiras - só criaram um ambiente ainda mais efervescente em torno dessa grave crise.
Os componentes da atual crise parecem ter maior complexidade: disparam os números dos homicídios na cidade de São Paulo e região metropolitana e descem pelo ralo os exercícios explicativos com as variáveis estatísticas, com os indicadores socioeconômicos, com os indicadores das políticas de segurança como fatores decisivos para compreender o comportamento das taxas de homicídio; emergem como focos relevantes de análise para a compreensão da atual crise as dinâmicas do mundo do crime e as formas de repressão sobre ele.
Mas falar das dinâmicas da criminalidade no Brasil, e particularmente em São Paulo, significa falar também das prisões, pois ali os grupos criminosos nasceram e se fortaleceram e continuam a manter porosamente suas relações ilícitas para além dos muros. Talvez pouca atenção tenha se dado a esse grave aspecto que diz respeito às falhas das autoridades em conduzir adequadamente os espaços prisionais ao longo de décadas. Lógico que as coisas se tornaram mais graves num país que entre 2000 e 2010 dobrou a sua população carcerária (estamos atualmente com cerca de 500 mil presos).
O fato é que as prisões, nesta crise de 2012 em São Paulo, não eram o foco do debate, pois segundo as autoridades tudo estava sob controle: as lideranças dos grupos criminosos estão isoladas em presídios de segurança máxima, a penitenciária de Presidente Bernardes onde funciona o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) está com vagas disponíveis e não existem rebeliões no sistema, apesar da superlotação e das condições subumanas em dezenas de centros de detenção provisória e em penitenciárias.
Pois bem, de uma hora para outra, nos termos da cooperação entre o governo do Estado e o governo federal, surgem essas propostas de transferência de presos de São Paulo para presídios federais. Mas as lideranças das facções não estão já isoladas? Por que não mandá-las então para o RDD de Presidente Bernardes? O que está acontecendo com os esquemas de contenção dos grupos criminosos no sistema penitenciário paulista?
Parece que a proposta de transferência de alguns presos é uma satisfação para a opinião pública de que algo está sendo feito. Porém, na certeza de que tal intervenção deve ter pouca influência sobre o que é central na atual crise: a dinâmica do mundo do crime e como o sistema repressivo tem atuado sobre ele. Temos aqui o ponto crucial que não é enfrentado de forma robusta pelas autoridades desde que o País saiu do regime militar e tenta construir uma sociedade democrática. Nossas instituições voltadas para o controle social continuam a ser autoritárias, sem transparência, sem accountability. Reproduzem um padrão de punição largamente aceito na sociedade brasileira que se expressa tanto na indiferença em relação a cidadãos executados (quando pobres, moradores da periferia) quanto em relação ao destino dos milhares de presos provisórios e definitivos que abarrotam as prisões.
Policiais e agentes penitenciários têm sido vítimas diretas da criminalidade em São Paulo. Mas também indiretamente dos efeitos de décadas de autoridades omissas ou coniventes com a atuação daqueles agentes públicos que nem sempre está amparada pelos moldes legais. Desmandos, corrupção, arbitrariedades, truculência desencadeiam "relações perigosas" com o mundo do crime e comprometem a capacidade de todos aqueles dispostos a conduzir corretamente as suas tarefas, o seu trabalho no policiamento ou no interior das prisões.
Quando organizações da sociedade civil, como a Comissão Teotônio Vilela, começaram a visitar prisões e manicômios em 1983 - 30 anos atrás! - e traziam a público os horrores que ali encontravam; quando chamavam, desde aquela época, a atenção da sociedade para a necessidade de colocar as agências de controle social sob os trilhos rigorosos da legalidade que a redemocratização cultivava, lançavam alguns dos principais desafios políticos e institucionais para a área da segurança pública que o País não conseguiu, até agora, equacionar.
Se não é ocioso, é pelo menos cansativo ouvirmos autoridades despejando seus argumentos umas contra as outras. Para todos os que perderam amigos ou familiares assassinados, para todos os que são vítimas de uma criminalidade que se amplia e para aqueles que têm que pagar suas dívidas com a sociedade em nossas prisões, tais argumentos têm sido irrelevantes.
* FERNANDO SALLA É PESQUISADOR SÊNIOR DO NÚCLEO DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO.
Fonte: O Estado de S. Paulo - Supl. ALIÁS - Domingo, 18 de novembro de 2012 - Pg. J6 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,sob-o-controle-de-quem,961586,0.htm

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