«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

NEM TUDO SE COMPRA


Jonas Rossi e Guilherme Rosa
Revista VEJA
edição 2296 - ano 45 - nº 47
21 de novembro de 2012

"Vender a virgindade e comprar o apoio de partidos políticos são duas atitudes que revelam em seus autores a mesma concepção utilitarista e rasa da vida. Uma deprecia a intimidade. A outra ultraja a democracia".
MICHAEL SANDEL - filósofo professor de Harvard (EUA)
[...] A espécie humana só começou a construir a civilização quando, conquistados o fogo, a agricultura e, posteriormente a escrita, aprendeu a conter o poder dos indivíduos. Foram esses freios que permitiram a constituição de famílias e clãs, que evoluíram para os estágios de tribo, cidade e estado na longa caminhada humana. Portanto, quando se discute hoje se tudo pode ser vendido e comprado, se a tudo é possível atribuir um preço, o que está em jogo são os freios éticos

No século IV antes de Cristo, o grego Aristóteles, refletindo a sabedoria de filósofos que o precederam, assentou a pedra fundamental da catedral de valores éticos e políticos que nos permite hoje condenar a compra de votos pelos mensaleiros do PT. Quase 2000 anos depois de Aristóteles, o alemão Immanuel Kant reagiria ao utilitarismo de Jeremy Benthan e afetaria seu discípulo Stuart Mill com a noção de que, para distinguirem o certo do errado, as pessoas têm a razão, que conecta cada uma delas ao conjunto da humanidade. Nesse contexto, o certo é o ato individual que, se repetido por toda a humanidade, a tornaria melhor. Kant, portanto, condenaria Ingrid Migliorini *.
[...]

O filósofo que ligou o alarme

O filósofo Michael Sandel é uma estrela em Harvard. Seu curso Justiça, que virou livro em 2009, já foi frequentado por mais de 15000 alunos, formou-se um fenômeno na internet. Sua primeira aula teve 4 milhões de visualizações no YouTube. No livro O que o Dinheiro Não Compra, ele discute os limites éticos do mercado. Sandel disse ao jornalista de VEJA Guilherme Rosa que os casos de Ingrid Migliorini e do mensalão são exemplos da aplicação da lógica de mercado em domínios em que ela deveria ficar ausente.

Eis a entrevista.

Em seu livro, o senhor faz uma distinção entre economia de mercado ema sociedade de mercado. Qual a diferença?

A economia de mercado é uma ferramenta valiosa e efetiva para organizar a atividade produtiva. Trouxe prosperidade e riqueza para diversas sociedades ao redor do mundo. Uma sociedade de mercado, no entanto, é diferente. Nela tudo está à venda. É um modo de vida no qual o pensamento econômico invade esferas a que ele não pertence.

O senhor acha que já vivemos nesse tipo de sociedade em que tudo se vende e tudo se compra, sem limites éticos?

Acho que é uma tendência que vem se desenvolvendo desde o começo da década de 80 do século passado. Hoje, muita gente tem no pensamento econômico como o único instrumento para atingir o bem público. O Freakonomics (livro lançado em 2005, de Steven Levitt e Stephen Dubner) é um símbolo da tentativa de explicar qualquer comportamento humano em termos puramente econômicos. Essa visão isoladamente é limitada e desconsidera os valores morais, as atitudes e as complexidades das relações humanas. Precisamos desafiar essa ideia. 0 mercado produz riquezas materiais, mas sua lógica não pode dominar todas as demais relações entre as pessoas, isso é empobrecedor.

Em que situações a lógica da economia de mercado pode se tornar perigosa para a sociedade?

Sempre que os mecanismos de mercado são introduzidos em esferas novas da vida, precisamos fazer duas perguntas. A primeira é se a escolha dos indivíduos envolvidos nas transações é realmente voluntária ou se existe um elemento de coerção. No caso da prostituição, precisamos questionar se a pessoa que vende seu corpo é desesperadamente pobre. Sua escolha pode não ser livre de verdade. A segunda pergunta deve ser sobre a degradação e a corrupção de certos valores. Alguém pode se opôr à prostituição dizendo que ela é intrinsecamente degradante. Ela tira o valor da sexualidade e torna a pessoa humana em um objeto, um instrumento de uso e lucro.

Por que o ato de estabelecer o preço de algo altera o seu valor?

Bem, esse é o ponto central de meu argumento. Muitos economistas acreditam que o mercado não altera a qualidade ou o caráter dos bens. Isso pode ser verdade se falamos de bens materiais como aparelhos de televisão ou carros. Mas o mesmo não ocorre quando nos referimos aos bens imateriais, como s relações familiares, amizades, cidadania, justiça, saúde, procriação e educação. Nessas áreas, usar a lógica do mercado pode alterar nossas atitudes em relação a esses bens. Acho absurdo que um estrangeiro possa se tornar cidadão americano apenas por ser rico o bastante para comprar a cidadania. Essa é uma realidade em nosso país.

Isso ajuda a explicar a repulsa ao leilão de virgindade realizado pela brasileira Ingrid Migliorini?

Sim, isso joga luz sobre a degradação envolvida nesse leilão. Essa história é uma ilustração chocante da nossa tendência de colocar uma etiqueta de preço em tudo. Outro exemplo dessa tendência é a compra de votos. Do ponto de vista da lógica do mercado, faz sentido alguém que não se importa com seu voto vendê-lo ao melhor comprador. Mas nós não deixamos isso acontecer, porque não encaramos o voto como propriedade privada, mas como um dever cívico que não deveria estar à venda.

Enquanto falamos, a mais alta corte do Brasil está julgando políticos governistas que compraram o apoio de partidos e parlamentares para aprovar projetos de interesse do governo no primeiro mandato do presidente Lula...

Você está falando do mensalão. Eu sei. Fiquei sabendo do caso quando visitei o Brasil em agosto. O fato de ele ter mobilizado tanto a opinião pública mostra que a população quer impor certos limites morais à influência que o dinheiro tem na política e na vida cívica. O mensalão é um exemplo dramático do dano causado quando o mercado é introduzido em áreas às quais não pertence. A reação à venda da virgindade e do voto ilustra a importância de termos um debate público sobre os limites morais do mercado. Precisamos discutir as circunstâncias em que a lógica de mercado efetivamente serve ao interesse público e os domínios dos quais ela deveria permanecer de fora.

Como podemos saber em quais áreas a lógica de mercado pode atuar por ser útil à sociedade?

É uma questão muito difícil, e eu acho que uma das razões para isso é que nas últimas décadas nós fomos muito relutantes em debater esse tema publicamente. Não podemos mais evitar a discussão sobre o significado dos valores morais e das circunstâncias nas quais eles se degradam. Todas as visões; sejam elas religiosas ou seculares, deveriam ser convocadas para um debate democrático e amplo sobre esse assunto. Sem dúvida, as respostas serão diferentes para a educação e para a saúde, para a vida privada e para a pública.

* Ingrid Migliorini é uma jovem brasileira de Santa Catarina, de 20 anos, que leiloou a sua virgindade pela internet e obteve o lance máximo de 780 000 dólares, o equivalente a 1,6 milhão de reais da parte de um japonês de 53 anos de idade. Para saber mais, acesse: http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI6253630-EI306,00-Catarina+tera+sua+vez+na+Australia+com+japones+de+anos.html

Fonte: Clipping - Seleção de Notícias - Ministério do Planejamento - 19/11/2012 - Internet: http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2012/11/19/ela-vendeu-a-virgindade-tudo-de-compra/

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