O exemplo de José Mindlin
JOSÉ MINDLIN - empresário e bibliófilo |
O Estado de S. Paulo
Os cerca de 60 mil volumes doados pela família do bibliófilo José Mindlin à Universidade de São Paulo (USP) finalmente estão acomodados em um edifício construído para esse fim no câmpus do Butantã. A Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin [veja foto abaixo] é um raro exemplo de generosidade num país em que profissionais e empresários bem-sucedidos não têm o hábito de "devolver" à sociedade parte da riqueza que acumularam. Mas é também um caso paradigmático das imensas dificuldades que filantropos como Mindlin, que não viveu para ver seu sonho realizado, enfrentam para fazer doações a universidades no Brasil.
Para conseguir entregar seus livros à USP, Mindlin teve de travar nada menos que oito anos de luta contra a burocracia:
- Primeiro, ele foi informado de que teria de pagar 15% de imposto sobre a diferença entre o valor declarado das obras e o de mercado. Como era uma exorbitância, o empresário decidiu criar uma fundação para ficar com os livros.
- No entanto, Mindlin soube que, ao transferir sua coleção para a sua própria fundação, teria de pagar um imposto de 4%.
- Somente quando a legislação foi alterada para isentar de impostos a doação de livros é que Mindlin conseguiu, enfim, doar seus preciosos volumes à USP.
Além do zelo burocrático e da incidência de tributos, outro fator que concorre para dificultar a filantropia e as doações para universidades no Brasil é cultural. Há quem considere que a educação pública é responsabilidade exclusiva do Estado, e há os que argumentam que existe sempre o risco de ocorrer desvio ou mau uso do dinheiro doado.
BIBLIOTECA BRASILIANA GUITA E JOSÉ MINDLIN Câmpus Butantã da USP - São Paulo |
Um episódio recente na Faculdade de Direito do Largo São Francisco foi didático a esse respeito. A faculdade atraiu doações de R$ 2 milhões para reformar duas salas de aula e, em troca, aceitou batizá-las com o nome dos doadores. Alunos e professores se revoltaram e as placas não foram colocadas. Para cumular o episódio de absurdos, um dos doadores entrou na Justiça para reaver seu dinheiro, já que a prometida homenagem não foi realizada - ou seja, não se tratava de doação, mas de compra do direito de batizar uma sala de aula.
Nos EUA, bilionários costumam doar parte considerável de sua fortuna para financiar universidades e pesquisas. Um dos casos mais significativos foi o de Warren Buffett, que entregou 85% de seus US$ 44 bilhões à Fundação de Bill Gates, que ajuda escolas públicas. Exemplos como esse mostram a distância que o Brasil ainda tem de percorrer para rivalizar com países em que a filantropia é parte da mentalidade, e não fruto da abnegação de uns poucos empresários, como José Mindlin.
Fonte: O Estado de S. Paulo - Notas & Informações - Domingo, 17 de fevereiro de 2013 - Pg. A3 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-exemplo-de-jose-mindlin-,997918,0.htm
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