«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

SEXO E CARREIRA, AS CHANTAGENS NO VATICANO ATRÁS DA RENÚNCIA DE BENTO XVI

CONCITA DE GREGORIO

Lutas de poder e dinheiro em um relatório secreto com os resultados de uma 
investigação sobre o Vatileaks entregue por três cardeais ao Papa.
Hipotiza-se, inclusive, sobre um lobby gay.
O documento passará às mãos do novo pontífice, o qual deverá ser
suficientemente "forte, jovem e santo"

"Nestes 50 anos aprendemos e experimentamos que o pecado original existe, se traduz sempre em pecados pessoais que podem tornar-se estruturas de pecado. Vimos que no campo do Senhor há sempre joio. Na rede de Pedro se encontram os peixes ruins".
(Papa Bento XVI em 12 de outubro de 2012 )

O Joio. Os peixes ruins. As "estruturas de pecado"
CARDEAL JULIAN HERRANZ - espanhol
É quinta-feira, 11 de outubro, dia de Santa Maria Desolada. É o dia no qual a Igreja recorda o papa João XXIII, cinquenta anos do início do Concílio [Vaticano II]. Bento XVI se aproxima da sacada e, aos jovens da Ação Católica reunidos na praça [São Pedro, no Vaticano], diz assim:
"Cinquenta anos atrás eu estava, como vocês, nesta praça, com os olhos voltados para o alto  observando e escutando as palavras repletas de poesia e bondade do Papa. Éramos, então, felizes. Cheios de entusiasmo, estávamos convencidos que devia vir uma nova primavera da Igreja". Breve pausa. Éramos felizes, no passado. "Hoje a alegria é mais sóbria, é humilde. Em cinquenta anos aprendemos que a fragilidade humana está presente também na Igreja". Que há o joio, existem os peixes ruins.

Ninguém compreendeu, naquela tarde de outubro. Os jovens na praça aplaudiram e choraram a recordação do papa João [XXIII]. Ninguém sabia que, dois dias antes, Bento XVI havia encontrado novamente o cardeal Julian Herranz, de 83 anos, espanhol da Opus Dei, encarregado por ele de presidir a comissão de investigação sobre aquilo que os jornais chamam de Vatileaks. O corvo, o vazamento de notícias, os papéis subtraídos do apartamento do Papa. 

Herranz atualizou Ratzinger com regularidade. Toda semana, em conversa reservada, de abril a dezembro. O Papa recebeu, com crescente apreensão, os resultados da investigação: dezenas e dezenas de entrevistas com bispos, cardeais e leigos. Na Itália e no exterior. Dezenas e dezenas de depoimentos relidos e assinados pelos entrevistados. As mesmas perguntas para todos, depois, entrevistas livres. Controles cruzados. Verificações. Um quadro do qual vinha emergindo uma rede de lobby que os três cardeais dividiram por proveniência de congregação religiosa, por origem geográfica. Os salesianos, os jesuítas. Os lígures, os lombardos. Enfim, naquele dia de outubro, o episódio mais escabroso. Uma rede transversal unida pela orientação sexual. Pela primeira vez a palavra homossexualidade foi pronunciada, lida em voz alta de um texto escrito, no apartamento de Ratzinger. Pela primeira vez foi digitada, mesmo que em latim, a palavra chantagem: "influentiam", Sua Santidade, chantagem indevida.


PETER SEEWALD - jornalista alemão
17 de dezembro de 2012, dia de São Lázaro. Os três cardeais entregam nas mãos do Pontífice o resultado de seu trabalho. São dois volumes de quase trezentas páginas. Duas pastas de capa dura, encadernadas em vermelho, sem título. Sob "segredo pontifício", são guardadas no cofre do apartamento de Ratzinger. Conhece-as, somente, além dele, quem as escreveu. Contêm um mapa exato do joio e dos peixes ruins. As "divisões no corpo eclesial que deturpam o rosto da Igreja", dirá o Papa quase dois meses depois na Homilia da Quarta-Feira de Cinzas. Foi naquele dia [17 de dezembro de 2013], com aqueles papéis sobre a mesa, que Bento XVI toma a decisão a longo tempo meditada. É naquela semana que encontra com o seu biógrafo, Peter Seewald, e, poucas horas depois de ter recebido os três cardeais, lhe diz "sou ancião, basta aquilo que fiz". Quase as mesmas palavras ditas naquela entrevista, depois publicada em Focus, que dirá em fevereiro no consistório pelos mártires de Otranto: "Ingravescente aetate" [trad. idade avançada]. "Nós somos um Papa ancião", já tinha aberto os braços muitas vezes, nos últimos meses, em conversas reservadas.

Portanto, naquela semana antes de Natal, o Papa toma a sua decisão. Com estas palavras, o cardeal Salvatore De Giorgi, um outros dos três investigadores que redigem a "Relationem" [trad.: relatório], presente no momento da renúncia, comenta: "Fez um gesto de força, não de fraqueza. Ele fez isso pelo bem da Igreja. Deu uma mensagem forte a todos  aqueles que estão no exercício da autoridade ou do poder e que se consideram insubstituíveis. A Igreja é feita de homens. O Pontífice viu os problemas e enfrentou-os  com uma iniciativa tanto inédita quanto clarividente". Assumiu sobre si a cruz, enfim. Não desceu dela, pelo contrário. Mas quem são "aqueles que se consideram insubstituíveis?". Ressoam as palavras do Angelus de domingo passado [17 de fevereiro]: é necessário "desmascarar as tentações do poder que instrumentalizam Deus para os seus próprios interesses".

A "Relationem", agora, está ali. Bento XVI a entregará nas mãos do próximo Papa, que deverá ser suficientemente forte, jovem e "santo" - prenunciou - para enfrentar o imenso trabalho que o espera. Está desenhada, naquelas páginas, uma geografia de "influências impróprias" que um homem muito próximo a quem as escreveu descreve assim: "Tudo gira entorno a não observância do sexto e do sétimo mandamento". Não cometer atos impuros. Não roubar. A credibilidade da Igreja sairia destruída pela evidência que os seus próprios membros violam o mandamento original. Estes dois pontos, especialmente. 


CARDEAL SALVATORE DE GIORGI - italiano
Vejamos o sexto mandamento, atos impuros. O Relatório é explícito. Alguns altos prelados sofrem "a influência externa" - nós diríamos a chantagem - de leigos aos quais são ligados por vínculos de "natureza mundana". São quase as mesmas palavras que havia utilizado monsenhor Attilio Nicora, na ocasião, na cúpula do Ior [Instituto para Obras Religiosas - vulgo "Banco do Vaticano"], nas cartas roubadas das secretas salas no princípio de 2012: aquela carta, posteriormente, publicada repleta de omissões para cobrir nomes. Muitos daqueles nomes e daquelas circunstâncias reaparecem no Relatório. Desde eventos remotos, como aquele do monsenhor Tommaso Stenico suspendido após uma entrevista que foi ao ar pela La 7 [TV italiana], na qual relatava encontros sexuais acontecidos no Vaticano. Reemerge a história dos cantores dos quais gostava de se cercar o Cavalheiro de Sua Santidade Angelo Balducci, segundo consta dos registros de uma investigação judicial. 

Os locais dos encontros. Uma casa de campo fora de Roma. Uma sauna em Quarto Miglio [uma localidade na área urbana de Roma]. Um centro de estética no centro [de Roma]. Os próprios cômodos do Vaticano. Uma residência universitária em Via di Trasone [uma rua de Roma], alugada para uma empresa privada e solicitada de volta pela Secretário de Estado Bertone, residência habitualmente utilizada como domicílio romano de uma arcebispo veronês. Menciona-se o centro "Priscilla", o qual, através de notícias da imprensa,  parece ser propriedade de Marco Simeon, o jovem de Sanremo que atualmente está na cúpula da Rai [Rádio e TV estatal italiana] e, anteriormente, indicado por monsenhor Viganò como o autor das notas anônimas sobre sua pessoa. Circunstâncias desmentidas pelos protagonistas aos jornais, mas aprofundadas e retomadas pelo Relatório com abundância de detalhes.
CARDEAL JOSEF TOMKO - eslovaco
Os três cardeais continuaram a trabalhar mesmo depois do dia 17 de dezembro passado. Chegaram até aos últimos fatos relativos ao Ior ["Banco do Vaticano"] - e aqui passamos ao sétimo mandamento - escutando os homens nos quais confia Tarcisio Bertone [Secretário de Estado do Vaticano], a começar de seu braço direito, o poderosíssimo monsenhor Ettore Balestrero, genovês, turma de 1966. Chegaram até a nomeação do jovem René Bruelhart para a direção da Aif, a autoridade financeira do Instituto [Ior].

O terceiro dos cardeais investigadores, Josef Tomko, é o mais ancião e, portanto, o mais influente da tríade. Ratzinger chamou-o para o serviço aos 88 anos. Eslovaco, foi na época de Woijtyla [Papa João Paulo II] o chefe da contraespionagem vaticana. Acompanhou, pessoalmente, a espinhosa questão das contribuições, inclusive econômicas, à causa polonesa como delegado pelas relações com a Europa Oriental. Depois do monsenhor Luigi Poggi, falecido em 2010, foi o último responsável por aquela que, ainda hoje, se chama a Entidade, o "Sodalitium pianum", antigamente, o serviço secreto vaticano formalmente desmontado por Bento XVI, ainda como cardeal Ratzinger. Porque os símbolos e os gestos, em São Pedro [Vaticano], contam bem mais que as palavras, observa quem é muito íntimo às liturgias vaticanas. No último dia de seu pontificado, Bento XVI receberá os três cardeais autores do Relatório em audiência privada. Imediatamente depois, ao lado de Tomko, verá os bispos e fiéis eslovacos em Santa Maria Maior [basílica de Roma]. A sua última audiência pública em 27 de fevereiro, dia de São Procópio o Decapolita, confessor. Depois, o conclave.

Tradução do italiano por Telmo José Amaral de Figueiredo


Fonte: laRepubblica.it - Esteri - 21 de fevereiro de 2013 - Internet: http://www.repubblica.it/esteri/2013/02/21/news/ricatti_vaticano-53080655/?ref=search
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Ior, assim a guerra do dinheiro
envenenou o Vaticano


CONCITA DE GREGORIO

Manobras obscuras e suspeitas de lavagem de dinheiro.
O comando das finanças da Santa Sé está, firmemente, nas mãos dos homens de Bertone.
Aqueles que se opunham à linha foram depostos.

"Tudo gira entorno à não observância do sexto e do sétimo mandamento. Não cometer atos impuros. Não roubar". Este é o núcleo do Relatório [latim: Relationem] que os três cardeais encarregados pelo Papa de investigar sobre o Vatileaks entregaram nas mãos do Pontífice em 17 de dezembro de 2012. O dossiê, dezenas e dezenas de entrevistas, delineia uma rede de relações unida por interesses econômicos, às vezes complicados por chantagem de cunho sexual. Ontem, La Repubblica descreveu os contornos das "influências externas" e das chantagens, hoje encara o coração da questão: o dinheiro. Aquilo que satisfaz as necessidades primárias. O dinheiro. A tentação do poder. Sétimo [mandamento]: não roubar. "Nas tentações está em jogo a Fé. Desejamos seguir o [nosso] eu ou Deus?", pergunta Bento XVI da sacada à multidão a emudecida de São Pedro [Vaticano]. Angelus, dia 17 de fevereiro, São Teodoro de Amasea [Bizâncio], soldado e mártir. O Pontífice, também, é um soldado. "Não temos medo de combater", diz. Indicativo presente [o tempo verbal usado]. Estamos combatendo agora. Nós, Papa.

"No Angelus de domingo faltavam somente os nomes e os sobrenomes. O ato de acusação em relação à estrutura de Poder que corrompe a Igreja era nítido", diz um cardeal que, por muitos anos, trabalhou nas finanças vaticanas, agora muito ancião para participar do Conclave. Recorda que, já em outubro [2012], o Pontífice havia dito que "os pecados pessoais tornam-se estrutura do pecado". A "estrutura do pecado" que o Relatório entregue a Bento XVI revela as articulações é, naturalmente, o Ior [em italiano: Istituto per le Opere di Religione - trad.:  Instituto para as Obras Religiosas]. O Instituto. O banco. De surpresa, o cardeal ancião ilumina, como numa parábola evangélica, um detalhe. "O senhor tem presente os cartões magnéticos do Vaticano? Escutou que, por dois meses, ficaram inutilizados? Bem, pode parecer uma minúcia, mas entre os motivos pelos quais os cartões magnéticos pararam de funcionar existem alguns que determinaram o Papa para o seu gesto". Comecemos pelos cartões magnéticos, então.
CARDEAL TARCISIO BERTONE - Secretário de Estado do Vaticano
No dia 1º de janeiro de 2013 os cartões magnéticos vaticanos pararam de funcionar. As transações, operadas pelo Deutsche Bank [Alemanha], foram bloqueadas pelo Banco Central italiano. O Vaticano, Estado extracomunitário [fora da União Europeia], tem uma "estrutura de supervisão e troca de informações inadequada", lê-se no texto da medida. Não respeita as normas contra a lavagem de dinheiro. A comissão encarregada, em 2011, de limpar o Ior, após seis meses de sua posse, foi deposta. Por quem? Pelo Secretário de Estado Tarcisio Bertone, que quis bloquear a troca de informações e a liberdade de inspeção. Ninguém é autorizado a olhar dentro das caixas do Ior. Exceto o próprio Bertone, entende-se com isso, o seu plenipotenciário monsenhor Balestrero e o diretor geral Cipriani, homem-chave de toda a questão. E, então, estamos em pleno Vatileaks. As cartas escritas pelo cardeal Attilio Nicora, chefe da Autoridade de Informações Financeiras (Aif), a Bertone e, para conhecimento, a Sua Santidade [Papa Bento XVI]. As cartas roubadas dos aposentos de Bento XVI. "Mas, não possuem um cofre no Vaticano?", indagou ao ministro Riccardi, o Patriarca de Moscou num recente encontro. Não sabia, o Patriarca, que quem fez sair as cartas estava, na realidade, fazendo uma cortesia ao papa Bento. Estava colocando em condições de combater. Vejamos a guerra qual é.


CARDEAL ATTILIO NICORA
Princípio de 2012. Nicora [cardeal] escreve a Bertone que a ideia de restringir as normas anti lavagem de dinheiro é uma péssima ideia. Naquele momento, trabalhava com ele para a reabilitação do Instituto, em várias tarefas e níveis, um grupo de banqueiros e juristas católicos, entre os quais, Gotti Tedeschi, presidente [do Ior], De Pasquale e Pallini da cúpula da Aif. Seis meses depois, a equipe é desmantelada. [Cardeal] Nicora não é confirmado no cargo. Pallini retorna ao sistema bancário italiano. De Pasquale assume outro encargo. No lugar de Gotti Tedeschi, assumie o posto de presidência ad interim o alemão Hermann Schmitz, alemão nascido no Brasil, ex-diretor executivo [CEO] do Deutsche Bank. As finanças vaticanas são controladas pelo Secretário de Estado. O delegado para as relações com o Ior, monsenhor Balestrero, é o seu pupilo. 

Os seus homens são o cardeal Giuseppe Versaldi, chefe da Prefeitura de Assuntos Econômicos (também ex-comissário do Idi - Istituto dermopatico dell'Immacolata, da congregação Filhas da Imaculada Conceição - de Roma, à beira da falência) e o savonense Domenico Calcagno, administrador do patrimônio da sé apostólica, a Apsa, com excelentes relações com Cipriani. Todas da Ligúria, Versaldi somente vercelense. Dá-se posse ao luxemburguês Renè Bruelhart. O argumento de que um banqueiro de um paraíso fiscal não seja apropriado para o combate à lavagem de dinheiro é recusado. Ascende à Aif [Autoridade de Informações Financeiras] a estrela do genro de Antonio Fazio [ex-presidente do Banco Central italiano], o jovem Di Ruzza. Brilha sobre todas a estrela do diretor geral do Ior Paolo Cipriani, homem de Geronzi, ex-diretor da filial do Banco di Roma de Via della Conciliazione [avenida em frente ao Vaticano]. Mesmo a geografia tem o seu porquê nesta história. Cipriani é o único a conhecer o que existe no ventre negro do Ior ["Banco do Vaticano"]. Gotti Tedeschi dirá aos juízes não conhecer os balanços. Os banqueiros leigos jamais tiveram acesso aos papéis. "Por aquilo que sabemos - diz um deles - no caixa do Ior poderia haver dinheiro de Bin Landen e di Riina [mafioso italiano influente]. Solicitamos os dados, não no-los forneceram jamais". 


CARDEAL GIUSEPPE VERSALDI
O macanismo é este. No Ior podem abrir contas correntes, que se chamam "fundos", somente religiosos, institutos religiosos e cidadãos do Vaticano. São cerca de 25 mil. Cada um deles, porém, pode delegar para operar suas contas quem quiser, sem limites no números de procurações e sem que exista registro dos representantes. Isto é: o pároco de Santa Severa, titular da conta, pode, em hipótese, delegar um homem de Provença para movimentar os capitais. Somente Cipriani sabe o sabe, diante da solicitação de verificação não há resposta. A resposta, a quem pediu para ver o elenco dos delegados, foi sempre "estamos informatizando o sistema". Portanto, é claro que qualquer um pode "lavar" o seu dinheiro no Ior. Da política à criminalidade, até o mundo das finanças. Fixemo-nos nos papéis do Relatório (Relationem). 
Falemos dos "ladrões de galinha".

Numa reunião no dia 13 de março de 2012, em San Rodrigo di Cordova, encontram-se na casa de Bertone Nicora,  chefe da autoridade de controle, os seus colaboradores leigos De Pasquale e Pallini, o diretor geral Cipriani e outros dirigentes. Controladores e controlados juntos. Cipriani e o seu vice Massimo Tulli estão sendo investigados devido a um movimento de 23 milhões [de Euro] operado pelo Credito Artigiano [banco italiano] e Banca del Fucino [outro banco italiano] para o JP Morgan [banco norte-americano]: dinheiro para o exterior que não se sabe da quem vem nem para quem vai. Uma das pessoas presentes sugere que "seria bom autorizar o judiciário investigar quatro casos menores, daríamos, assim, a impressão de começar a colaborar". Bertone e Balestrero se convencem disso. Os casos menores são padre Salvatore Palumbo da paróquia de San Gaetano, Emilio Messina da arquidiocese de Camerino, o catanes Orazio Bonaccorsi, padre Evaldo Biasini, chamado de "don Bancomat" [trad.: "padre cartão magnético"], e investigado no processo de Perugia sobre os "Grandes eventos da Proteção Civil". Tomemos um caso, aquele de padre Palumbo. São depositados no Ior, por uma filial do banco Barclays, 151 mil euros com o motivo "Doação para a restauração de convento". Deposita-os Giulia Timarco, com precedentes de fraude ao dano de seguradoras. A investigação apura que o dinheiro chegou até Timarco por meio de Simone Fazzari, embusteiro ligado a Ernesto Diotallevi, uma vez, homem de confiança de Pippo Calò nos tempos da quadrilha da Magliana, processado e absolvido pelo homicídio de Calvi. Fazzari obtém os 151 mil euros fraudando a Ina Assitalia [empresa de seguros]: simula um falso acidente com uma Ferrari de corrida. Estes são os ladrões de galinha, sob a sombra de Pippo Calò.


PAOLO CIPRIANI
Não consta que, até o momento, alguma colaboração ao judiciário tenha sido fornecida. A investigação sobre Cipriani e Tulli,  também envolvido Gotti Tedeschi, continua com fadiga.   No meio tempo, a fábrica de venenos vaticana faz circular os papéis relativos ao "buraco" de Don Paglia. Balestrero, sabe-se, é homem por demais estimado pelo ex-primeiro ministro Berlusconi. Paglia, ao contrário, é um expoente da "esquerda eclesiástica". No Relatório, fala-se de 18 milhões de débitos que o bispo acumulou na diocese de Terni: 15 milhões de débitos bancários para a reforma do patrimônio imobiliário, 3 milhões de empréstimos às paróquias. A estrutura de comando de Bertone [cardeal] deixa vazar informações que colocam no mesmo molde direita e esquerda vaticana: todos culpáveis nenhum culpado. No entanto, porém, o sistema bancário faz terra arrasada entorno ao Ior. As novas normas contra a lavagem de dinheiro de 2011, aquelas que o Instituto evitou, muito bem, assumir, impedem de trabalhar com o Vaticano. Está em dificuldade, até, Unicredit (ex-Capitalia, ex-Banca di Roma, para retornar a Geronzi) que sempre teve a delegação de emitir cheques pelo Ior

Nestas condições de opacidade, torna-se difícil. "Mesmo Bin Laden poderia ter dinheiro no Instituto". Até as máfias, mesmo a política de suborno (it.: tangenti), mesmo Finmeccanica [indústria bélica italiana] e Mps. Uma grande lavadora, o ventre obscuro dos interesses temporais. O dinheiro, o Poder. A "tentação a combater", dizia o Papa no Angelus, sem mencionar nomes e sobrenomes, mas quase. Um Papa ancião. O qual não tem forças para enfrentar, sozinho, uma estrutura de poder interna e externa ao Vaticano. Que tem somente um instrumento para lutar a batalha em nome de Deus, contra o eu. Aquela descrita no Angelus. Tem somente, como munição nesta guerra, a si mesmo.

Tradução do italiano por Telmo José Amaral de Figueiredo.

Fonte: laRepubblica.it - Esteri - 22 de fevereiro de 2013 - Internet: http://www.repubblica.it/esteri/2013/02/22/news/soldi_ior-53146070/?ref=HRER1-1

Um comentário:

  1. É tão complexa a administração, se não tiver o homem certo, então...

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