«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 31 de março de 2020

A incompetência americana

Qualquer semelhança não é mera coincidência

Fareed Zakaria
Colunista do jornal norte-americano
“The Washington Post”

Os Estados Unidos terão o pior surto de covid-19 entre os países ricos
devido à ineficácia do governo
FAREED ZAKARIA
Autor deste artigo

Quando uma crise atinge os Estados Unidos, o instinto geral do país é pegar a bandeira e desejar o melhor para seus líderes. É provavelmente por isso que o presidente Donald Trump tem visto seus índices de aprovação crescerem, mesmo depois de ter tido uma abordagem atrasada e vacilante contra a pandemia. Mas, em algum momento, nós, americanos, devemos olhar os fatos e reconhecer uma realidade desconfortável. Os Estados Unidos estão a caminho de ter o pior surto de coronavírus entre os países ricos, principalmente devido à ineficácia de seu governo. Essa é a nova face do excepcionalismo americano.

Os Estados Unidos já têm o maior em número de casos de covid-19 no mundo, superando até a China. A primeira linha de defesa contra a doença é o teste. Nessa métrica-chave, a experiência nos Estados Unidos foi um fiasco: começamos tarde, usando um teste defeituoso e nunca nos recuperamos completamente desse primeiro momento.

A mentira como método

A afirmação de Trump de que “qualquer pessoa que queira fazer um teste pode fazê-lo” é uma farsa cruel. O acesso aos testes continua muito pior do que nos países mais desenvolvidos. Sua afirmação de que os Estados Unidos testaram mais pessoas do que a Coreia do Sul não faz sentido, porque não leva em conta que a Coreia do Sul tem um sexto da população americana.

Proporcionalmente, a Coreia do Sul fez cinco vezes mais testes que os Estados Unidos, se compararmos até a última quarta-feira. Mas esqueça a Coreia do Sul. A Itália, um país que não é conhecido pelo bom funcionamento de seu governo, proporcionalmente, testou quatro vezes mais que os Estados Unidos.

Os Estados Unidos têm escassez de tudo – respiradores pulmonares, máscaras, luvas, aventais – e nenhum sistema de emergência nacional para fornecer novos suprimentos rapidamente. O governador de Nova York, Andrew Cuomo, diz que seu Estado precisará de 40 mil leitos para tratamento intensivo. Tem apenas 3 mil. Isso significa que muitos pacientes morrerão simplesmente porque não terão acesso aos cuidados disponíveis em circunstâncias normais.

Nem completamos três semanas direito dessa pandemia e os profissionais de saúde estão reutilizando máscaras, costurando as suas em casa e implorando por doações. Em um ensaio cáustico na revista The Atlantic, Ed Wong escreve:

Sem rumo, de olhos vendados, letárgico e descoordenado, os Estados Unidos lidaram mal com a crise da covid-19 em um nível substancialmente pior do que aquele que todo especialista em saúde com quem falei temia”.

As causas desse colapso

Por que isso aconteceu? É fácil culpar Trump, e o presidente foi incompetente desde o início. Mas há uma história muito maior por trás desse fiasco. Hoje, os Estados Unidos estão pagando o preço:
* pela redução de financiamentos do governo,
* politização de órgãos independentes,
* fetichização do controle local e
* degradação e depreciação dos funcionários e burocratas do governo.
[Nossa! Como tudo isso se parece com o Brasil!]

Nem sempre foi assim. Historicamente, os Estados Unidos valorizavam o governo limitado, mas eficaz. Em O Federalista, Alexander Hamilton escreveu: “Um governo mal executado, o que quer que seja em teoria, deve ser, na prática, um mau governo”. Franklin Roosevelt criou a burocracia federal moderna, que era surpreendentemente enxuta e eficiente.

Nas últimas décadas, à medida que o escopo do governo aumentou, a burocracia passou fome e se tornou cada vez mais disfuncional. Na década de 1950, o porcentual de funcionários civis federais, em comparação ao emprego total, estava acima de 5%. Hoje, caiu para menos de 2%, apesar de uma população duas vezes maior e um PIB sete vezes maior (ajustando a inflação).

Os órgãos federais não têm funcionários suficientes, mas são sobrecarregados com montanhas de regulamentos, mandatos e regras politizadas, dando às autoridades pouco poder e arbítrio. As regras complicadas e a burocracia da FDA, entidade responsável pela avaliação e regulamentação de alimentos e medicamentos – que se mostraram um grande problema neste caso –, são apenas um exemplo entre centenas.
Donald Trump looks to defuse coronavirus threat and boost markets ...
DONALD TRUMP
Presidente dos Estados Unidos e, ao lado esquerdo dele, o vice-presidente Mike Pence

Acadêmico que há muito estuda esse tópico, Paul Light, observa que, sob John Kennedy, os departamentos do gabinete tinham 17 “camadas” de hierarquia. Quando Trump assumiu, havia impressionantes 71 camadas. Ambas as partes contribuíram para o problema, tornando o governo federal uma caricatura de ineficiência burocrática.

A maioria dessas disfunções é replicada em nível estadual e local com suas instituições menores. O desafio de criar uma estratégia nacional é complicado pela realidade de que o verdadeiro poder da saúde pública reside em 2.684 sistemas estaduais, locais e tribais, cada um zelosamente protegendo sua independência. Gostamos de celebrar o federalismo americano como o florescimento da democracia local. Mas essa colcha de retalhos louca de autoridade está se revelando um pesadelo ao enfrentar uma pandemia que não conhece fronteiras, e onde qualquer local com uma resposta fraca permitirá que a infecção se espalhe para outros lugares. O que acontece nas praias da Flórida não fica nas praias da Flórida.

É fácil usar a desculpa de que os Estados Unidos não podem refletir como um espelho a ditadura da China. Os governos que estão lidando com essa pandemia de forma eficaz também incluem democracias como Coreia do Sul, Taiwan e Alemanha. Muitas das melhores práticas empregadas em lugares como Cingapura e Hong Kong não são tirânicas, mas inteligentes:
* testes,
* rastreamento de contatos e
* isolamento.

Mas todos esses lugares têm governos bem financiados, eficientes e receptivos. No mundo de hoje, com problemas que atravessam fronteiras na velocidade da luz, “governo bem executado” é o que torna um país verdadeiramente excepcional.

Traduzido do inglês por Romina Cácia.

Fonte: O Estado de S. Paulo – Internacional / Artigo – Especial “Pandemia do Coronavírus” – Segunda-feira, 30 de março de 2020 – Página A6 – Internet: clique aqui.

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