«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sábado, 17 de março de 2012

4º Domingo da Quaresma - Ano "B" - Homilia

Evangelho: João 3,14-21

José Antonio Pagola

OLHAR O CRUCIFICADO


O evangelista João nos fala de um estranho encontro de Jesus com um importante fariseu, chamado Nicodemos. Segundo o relato, é Nicodemos quem toma a iniciativa e vai até Jesus “de noite”. Intui que Jesus é “um homem vindo de Deus”, mas move-se entre trevas. Jesus irá conduzindo-o até à luz.


Nicodemos representa no relato todos aqueles que procuram sinceramente encontrar-se com Jesus. Por isso, em certo momento, Nicodemos desaparece de cena e Jesus prossegue o seu discurso para concluir com um convite geral a não viver nas trevas, mas a procurar a luz.


Segundo Jesus, a luz que pode iluminar tudo está no Crucificado. A afirmação é atrevida: “Tanto amou Deus ao mundo que entregou o seu Filho único para que não pereça nenhum dos que creem nele, mas que tenham a vida eterna”. Poderemos ver e sentir o amor de Deus nesse homem torturado na cruz?


Habituados, desde criança, a ver a cruz por toda a parte, não aprendemos a olhar o rosto do Crucificado com fé e com amor. O nosso olhar distraído não é capaz de descobrir nesse rosto a luz que poderia iluminar a nossa vida nos momentos mais duros e difíceis.
Contudo, Jesus nos envia, a partir da cruz, sinais de vida e de amor.


Nesses braços estendidos que já não podem abraçar as crianças, e nessas mãos cravadas que não podem acariciar os leprosos nem bendizer os doentes, está Deus com os seus braços abertos para acolher, abraçar e sustentar as nossas pobres vidas, quebradas por tantos sofrimentos.


Através desse rosto apagado pela morte, por meio desses olhos que já não podem olhar com ternura os pecadores e prostitutas, a partir dessa boca que não pode gritar a sua indignação pelas vítimas de tantos abusos e injustiças, Deus revela-nos o seu “amor louco” pela humanidade.


“Deus não mandou o seu Filho ao mundo para julgar o mundo, mas para que o mundo se salve por ele”. Podemos acolher a esse Deus e podemos rejeitá-lo. Ninguém nos força. Somos nós os que temos de decidir. Mas “a Luz já veio ao mundo”. Por que tantas vezes rejeitamos a luz que nos vem do Crucificado?


Ele poderia pôr luz na vida mais desgraçada e fracassada, mas “o que age mal... não se aproxima da luz para não se ver acusado pelas suas obras”. Quando vivemos de forma pouco digna, evitamos a luz porque nos sentimos mal perante Deus. Não queremos olhar o Crucificado. Pelo contrário, “o que realiza a verdade, se aproxima da luz”. Não foge para a escuridão. Não tem nada para ocultar. Procura com o seu olhar o Crucificado. Ele o faz viver na luz.


DESPEDIDA DIFERENTE

“Para que tenham vida eterna” (Jo 3,14-21)


Os médicos não ocultaram a verdade. O diálogo que manteve com um deles, ao despertar da operação, foi breve, porém claro: “Você pôde fazer algo?” “Não.” “Será doloroso?” “Não necessariamente.” “Será um processo longo?” “Não.” A partir desse momento, Antônio sabia que lhe faltava pouco tempo de vida.


Não é fácil falar com um homem que já conhece seu fim. Tudo se torna mais sério. Não se pode conversar superficialmente sobre qualquer coisa. Com Antônio foi diferente. Era ele quem falava com tranquilidade de sua morte já próxima. “José, agora tenho que viver o que tantas vezes falei aos outros.” Quando entrei em sua residência, estava acompanhando no televisor a transmissão da missa dominical, porém eu o via, já, com olhos diferentes: “Os cristãos dizem muitas coisas. O importante não é falar, mas crer.”


Os médicos acertaram em seu prognóstico. A vida de Antônio se foi apagando em poucas semanas. Chegado o momento, ele quis receber o sacramento da unção e despedir-se desta vida confessando sua fé no Deus vivo de Jesus Cristo. Dificilmente esquecerei a tarde desse sete de fevereiro. Antônio, deitado sobre o leito; ao seu redor, seus familiares, amigos e sacerdotes. Aquilo não era uma rito forçado, realizado de forma precipitada e nervosa nos últimos instantes. Era uma celebração profunda de fé em que todos oravam e cantavam acompanhando ao enfermo.


Ao começar a liturgia, Antônio nos fez um gesto para que o escutássemos e, com voz já bastante apagada, foi recordando momentos obscuros de sua vida e momentos cheios de luz. Deu graças a Deus e pediu perdão. Com palavras muito meditadas, sem dúvida, disse assim: “Sou um pecador, porém um pecador que crê em Deus e que pede seu perdão.” Ele vivenciava cada gesto com fé intensa. Ao final, quis dar a cada um de nós o abraço da paz. Era difícil conter as lágrimas. Somente ele nos olhava com agradecimento e paz. 


Terminada a celebração, quis ficar sozinho em sua residência. Necessitava estar a sós com Deus. Quando me aproximei para despedir-me, lhe pedi que me deixasse escrever, um dia, sobre o que vivi naquela tarde junto a ele. Então eu percebi quão inapropriadas eram minhas palavras. Antônio já não pensava nesta vida; seu coração estava noutro lugar: “Faça o que quiseres. Eu não estarei aqui.” 


Hoje, são pouco aqueles que morrem assim. Em geral, enfermos, familiares e amigos preferimos enganar-nos uns aos outros. Não nos atrevemos ajudar o enfermo a viver o final de sua vida sustentado pela consolação da fé em Deus. Podemos, sem dúvida, justificar de muitas maneiras nossa atitude. Por outro lado, a trajetória de cada pessoa é diferente. Porém, às vezes, esquecemos que a fé não é somente para orientar esta vida, mas “para que todo aquele que crê nEle tenha a vida eterna” (Jo 3,16). Eu gostaria de despedir-me deste mundo como este jovem pároco!


DEUS É DE TODOS


Poucas frases foram tão citadas quanto esta que o evangelho de João põe na boca de Jesus. Os autores veem nela um resumo do núcleo essencial da fé, tal como se vivia entre não poucos cristãos nos inícios do segundo século: “Tanto amou Deus ao mundo, que entregou seu Filho único.”


Deus ama o mundo inteiro, não somente aquelas comunidades cristãs às quais chegou a mensagem de Jesus. Ama todo o gênero humano, não somente à Igreja. Deus não é propriedade dos cristãos. Não pode ser apropriado por nenhuma religião. Não cabe em nenhuma catedral, mesquita ou sinagoga.


Deus habita em todo ser humano, acompanhando cada pessoa em suas alegrias e desgraças. Não deixa ninguém abandonado, pois tem seus caminhos para encontrar-se com cada um, sem que tenha que seguir, necessariamente, aqueles que nós lhe marcamos. Jesus o via cada manhã “fazendo com que o sol se levante sobre bons e maus”. 


Deus não sabe nem quer nem pode fazer outra coisa que amar, pois é amor no mais íntimo de seu ser. Por isso, diz o evangelho, que enviou seu Filho, não para “condenar o mundo”, mas para que “o mundo se salve por meio dele”. Ama o corpo como a alma, e o sexo tanto quanto a inteligência. A única coisa que deseja é ver já, desde agora e para sempre, a Humanidade inteira desfrutando de sua criação.


Este Deus sofre na carne dos famintos e humilhados da Terra; está nos oprimidos defendendo sua dignidade, e nos que lutam contra a opressão, animando seu esforço. Está sempre em nós para “procurar e salvar” o que nós estragamos e deixamos perder.


Deus é assim. Nosso maior erro seria esquecê-lo. Mais ainda. Fechar-nos em nossos preconceitos, condenações e mediocridade religiosa, impedindo as pessoas de cultivar esta fé primeva e essencial. Para que servem os discursos dos teólogos, moralistas, pregadores e catequistas se não tornam a vida mais bela e luminosa recordando que o mundo está envolto, pelos quatro lados, pelo amor de Deus?

Tradução de: Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

Fonte: MUSICALITURGICA.COM - 14/03/2012 - 09h35 - Internet: http://www.musicaliturgica.com/0000009a2106d5d04.php

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