TELEFONIA CELULAR DESAGRADA BRASILEIROS
Insatisfação Escondida
Adriano Ceolin
A Anatel atende a pedido das operadoras e omite uma parte da pesquisa que mede a satisfação dos usuários de telefonia
ROBERTO PINTO MARTINS - Anatel |
Aferir a qualidade do serviço de telefonia, principalmente a celular, é uma tarefa simples, de certo modo. Em algumas cidades, basta tentar manter uma conversa superior a dois minutos ou acessar uma página da internet. O veredicto é imediato. A Anatel, a agência reguladora cuja função é zelar pela qualidade das telecomunicações no país, gastou no ano passado 5,3 milhões de reais para medir cientificamente o grau de satisfação dos usuários. E constatou o óbvio: os brasileiros não estão nada contentes.
Num universo de 200 000 entrevistados, apenas 29,5% afirmaram estar satisfeitos com o serviço de telefonia móvel pós-paga, por exemplo. Na telefonia fixa, o número é um pouco melhor: 43,6% elogiaram suas respectivas operadoras. A pesquisa foi divulgada há três semanas.
O que ninguém ficou sabendo é que a parte mais interessante do trabalho foi providencialmente escondida: a constatação de que o índice de insatisfação dos brasileiros com os serviços de telefonia aumentou consideravelmente. E foi escondido pela Anatel atendendo a um pedido das operadoras.
Os dados à disposição da agência mostram que, nos últimos dez anos, ao contrário do que muitos gostariam de reconhecer, o mercado de telefones fixos e celulares cresceu no sentido inverso da qualidade do serviço. Os usuários de hoje estão mais insatisfeitos com o atendimento, os preços e a qualidade dos serviços do que estavam há uma década. É uma informação que pode ajudar a agência reguladora a orientar suas políticas em benefício do cidadão. Mas, ao que parece, os interesses nem sempre coincidem.
O conluio para omitir os dados se deu numa reunião em 10 de abril, na sede da Anatel, em Brasília. O superintendente de controle de obrigações da agência, Roberto Martins, encontrou-se com trinta representantes de empresas de telefonia. Tão logo os dados comparativos da pesquisa foram apresentados, ouviram-se os primeiros apelos. “A comparação é muito perigosa. Vamos dizer que ela é muito política. A primeira coisa que os nossos nobres deputados vão falar é que o serviço piorou”, disse Raimundo Duarte, gerente de assuntos regulatórios da Claro. No comando da reunião, Martins, em vez de defender os usuários, concordou com as operadoras. No dia da apresentação da pesquisa, nada foi mencionado sobre o quadro comparativo 2002-2012. Procurado, Martins foi enfático: “As operadoras não apitam nada”. Apitam mais alto do que se imagina. Avisado de que a combinação havia sido descoberta, o presidente da Anatel, João Rezende, tentou minimizar o estrago e marcou uma nova divulgação dos dados para esta segunda-feira, em São Paulo — desta vez, espera-se, de maneira honesta, transparente.
A SATISFAÇÃO CAIU
Índice de satisfação dos usuários (de 0 a 100)
Fonte: Revista VEJA - Edição 2320 - Ano 46 - Nº 19 - 8 de maio de 2013 - Pg. 69 - Edição impressa.
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