«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Punir Assad é razão legítima?

JOSHUA KEATING*
SLATE MAGAZINE

Há quem questione a ideia de ir à guerra por vingança
David Luban - professor de Direito (EUA)

"Punir Assad pelo uso de armas químicas com ataques aéreos", defendem os editores da Bloomberg News. "Obama quer punir Assad, e não vencer a guerra civil síria", explica o Washington Post. "EUA estudam planos para punir Assad", segundo o Wall Street Journal. A Reuters diz que o ataque iminente será uma "punição pela ofensiva com armas químicas da semana passada atribuída ao governo do presidente Bashar Assad".

Parece garantido que se os Estados Unidos e seus aliados começarem a lançar mísseis na Síria nas próximas horas, isso será motivado menos por um objetivo estratégico do que para punir Assad por uma violação do direito internacional e da decência comum, e para dissuadi-lo de fazer de novo. Evidentemente, neste momento há poucas pessoas no planeta mais merecedoras de punição do que ele, mas a ideia de usar força militar para esse fim parece estar sendo curiosamente mal examinada. Apesar do elemento de ultraje moral presente na maioria das guerras, a punição de transgressões não é normalmente considerada base legal para o uso de força militar.

O professor da Faculdade de Direito de Georgetown (e ex-colaborador de Slate) David Luban retraçou a história da ideia de guerra como punição num artigo de 2011. Ele remonta a ideia de punição - distinta de vingança - como uma base legítima para a guerra a Santo Agostinho, que escreveu: "Como regra, guerras justas são definidas como aquelas que vingam danos, quando a nação ou cidade contra a qual se está guerreando negligenciou punir os erros cometidos por seus cidadãos ou devolver algo que foi injustamente tomado".

Essa noção já foi comum entre filósofos e teólogos e não se limitou aos católicos. Tome-se Martin Luther King, que perguntou: "O que mais é a guerra se não a punição da injustiça e do mal". Grotius, um dos primeiros teóricos do direito internacional, aceitava que "guerras são geralmente iniciadas para o fim de executar punições", embora não o aprovasse exatamente.

As coisas mudaram com a ascensão do Estado-nação e o conceito de soberania do Estado. "Uma guerra de punição entre Estados é inconcebível, pois não pode haver relação de superior para inferior entre eles", escreveu Kant. O direito internacional do século 20, tal como expresso pela Carta da ONU, permite o uso de força militar para fins de "autodefesa individual ou coletiva". Obviamente, muitos países com frequência esticam essa norma ou a ignoram pura e simplesmente.

Mas apesar de as normas legais internacionais poderem ter se afastado, na sua evolução, da ideia de guerra como punição, os próprios dirigentes frequentemente a invocam. Durante o bombardeio da Inglaterra na 2.ª Guerra, Winston Churchill prometeu ao público britânico: "Daremos aos alemães a medida, e mais que a medida, que eles nos deram". Em seu livro de memórias, George W. Bush recorda de que após os ataques de 11 de Setembro, seu sangue "estava fervendo". "Nós descobriríamos quem fizera aquilo e acabaríamos com eles."

Bush não estava sozinho. Outros estudos argumentaram que o apoio público às duas guerras contra o Iraque de Saddam Hussein estava ligado a um "efeito de punibilidade moral" - o simples desejo de punir um malfeitor. Obviamente, essas guerras foram publicamente justificadas com base na segurança nacional, embora se pudesse argumentar que as evocações frequentes do 11 de Setembro pelo governo Bush durante os preparativos para a Guerra do Iraque visavam a explorar o desejo de retaliação do público.

Luban observa que as ideias modernas de direitos humanos e a legitimidade da intervenção humanitária trazem elementos novos a essa questão. Intervenções podem ser tecnicamente justificadas pela "responsabilidade de proteger" e a prevenção de novos estragos, mas quanto ao grau com que o público do país interventor as apoia, o desejo de punir os que cometem atrocidades também entra em jogo.

No fim, Luban não vê a punição de violações dos direitos humanos como uma justificativa aceitável para a guerra, pedindo que os leitores imaginem um cenário em que um juiz de Tribunal Penal Internacional sentencie um país à guerra. Podemos nos empenhar para ver líderes como Charles Taylor ou Slobodan Milosevic (ou Bashar Assad) serem julgados e punidos por seus crimes, mas uma ação militar coloca questões mais difíceis. O argumento seguinte parece particularmente aplicável ao conflito atual: 


"A guerra é um instrumento cego. Apesar da conversa fiada sobre ataques 'cirúrgicos' e ataques 'precisos', o fato é que a guerra causa danos em povoados, cidades e territórios inteiros. Guerras são equivalente a desastres naturais como enchentes e furacões, e mesmo a guerra mais discriminada destrói tudo aquilo que toca. Assim, se a guerra é punição retaliatória, precisamos reconhecer que ela é uma punição coletiva, uma punição corporal realmente coletiva."

O artigo também faz uma distinção entre punição e represália, que é definida como "ataques militares em outras circunstâncias ilegais para aplicar o cumprimento das regras de guerra quando o adversário as viola" e é considerada aceitável pelo direito internacional em circunstâncias estritamente definidas. Ainda não ouvimos a defesa completa do governo americano para uma intervenção (na Síria), mas ela provavelmente se concentrará mais na dissuasão de futuros ataques químicos do que numa resposta aos que já ocorreram.
Joshua Keating - jornalista

Obama provavelmente não empregará a palavra "punição" quando defender o caso da guerra ao público americano, mas como não foram feitas exigências de Assad - ninguém está sugerindo que se ele entregue suas armas químicas e vier para a mesa de negociações nos próximos dia, a coisa toda será abortada - isso certamente parece uma punição por abuso flagrante de direitos humanos e por cruzar a "linha vermelha" que Obama especificou no ano passado. Quer se concorde ou não com Luban, trata-se de uma ideia mais radical do que eu creio que as pessoas percebem.

TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK.

* É jornalista norte-americano.

Fonte: O Estado de S. Paulo - Internacional/Visão Global - Sábado, 31 de agosto de 2013 - Pg. A16 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,punir-assad-e--razao-legitima-,1069697,0.htm

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