Quanto mais burro, melhor

 Livro explica como a ignorância se tornou vantagem eleitoral

 Lúcia Guimarães

Jornalista – Nova York 

ANDY BOROWITZ e a foto da capa de seu último livro

Exemplos não faltam nos Estados Unidos e no Brasil

Quem pensava que América do Sul era o nome de um país?

Quem descreveu o continente africano como uma nação?

Quem disse que o aquecimento global era uma invenção da China para destruir a competitividade da indústria americana?

Foram três republicanos que tiveram o dedo no botão nuclear —pela ordem de asneira, Ronald Reagan, George W. Bush e Donald Trump

Todos os países têm sua história de políticos palermas que divertem. Mas chega um momento em que a gargalhada é interrompida pelo medo do estrago que os poderosos e estúpidos são capazes de fazer

Um livro lançado nesta semana nos Estados Unidos examina a evolução da atual safra de governantes asininos. O humorista Andy Borowitz é o autor de “Profiles in Ignorance, How America’s Politicians Got Dumb and Dumber” (tradução: Perfis em ignorância, como os políticos americanos se tornaram mais e mais estúpidos). O livro é um exame forense e 100% factual da versão recente da tradição anti-intelectual, um aspecto conhecido da história americana. 

RONALD REAGAN governou os Estados Unidos de 1981 a 1989

Borowitz acha que o pioneiro moderno do boçal estelar, há 50 anos, foi Reagan, o ator de filmes B cuja ignorância era tão gritante que sua campanha para governador da Califórnia, em 1966, contratou psicólogos de uma universidade para treiná-lo como um animal de laboratório. Acostumado a decorar falas em filmes, Reagan aprendeu a repetir o que seus instrutores escreviam em fichas e venceu a eleição por mais de 1 milhão de votos

O assessor de campanha responsável pelo banho de fatos em Reagan fracassou quando foi convocado a fazer o mesmo pelo então senador Dan Quayle, em 1984. A colunista texana Molly Ivins acompanhou Quayle em campanha e concluiu que o vice escolhido para a chapa de George Bush pai era mais estúpido do que parecia. “Se você implantar o cérebro de Dan Quayle numa abelha, ela começa a voar em marcha à ré”, declarou. 

Reagan e Quayle, escreve Borowitz, representam o primeiro de três estágios da incultura na política: o ridículo, um saudoso período em que líderes podiam ficar envergonhados por dizer besteira. 

GEORGE W. BUSH governou os Estados Unidos de 2001 a 2009

O segundo estágio —a aceitação— tem como patrono George W. Bush. Ele achava que sua idiotice era benigna e o aproximava do povão. Bush se orgulhava de revelar que não abrira um livro quando estudava na Universidade Yale. Em 2000, a campanha do republicano espalhou um slogan —"George Bush está concorrendo à Presidência, não a uma vaga em quiz show"— sugerindo que seu adversário, o relativamente pomposo ambientalista Al Gore era quem ficava em desvantagem por ser culto. 

Bush mostrou o poder do despreparo intelectual de provocar morte em massa. Dias depois de invadir o Iraque, ele recebeu uma delegação de iraquianos no Salão Oval e, pela primeira vez, ouviu falar que havia xiitas e sunitas* no país. Perplexo, exclamou: “E eu pensava que os iraquianos eram muçulmanos!”. 

JAIR BOLSONARO & DONALD TRUMP

O terceiro estágio da ignorância é a celebração, que assola tanto Washington quanto Brasília. Trump, conclui Borowitz, é profundamente ignorante, mas exibe, como o parvo capitão do Planalto, o que psicólogos chamam de “ilha de competência”: a capacidade de atrair a atenção proferindo estrumes verbais. No atual estágio, um doutorado em Harvard, como o exibido por trumpistas republicanos, não é impedimento para tentarem convencer eleitores a tomar remédio de cavalo para a Covid. 

O único antídoto para a nossa era de obscurantismo é votar

N O T A

* Os muçulmanos sunitas e xiitas compartilham as crenças e os artigos de fé islâmicos mais fundamentais e são os dois principais grupos dentro do ISLAMISMO. Contudo, eles possuem algumas distinções espirituais e políticas. Xiitas são um grupo muçulmano que acredita que Maomé deveria ser sucedido de forma hierárquica, por seu genro Ali. A etimologia do nome xiita provém de “Shiat Ali”, que significa “partido de Ali”. De fato, os xiitas defenderam que o verdadeiro sucessor de Maomé deveria ser Ali Bin Abi Talib, genro de Maomé. Para os xiitas os livros sagrados são o Alcorão e a Sharia (Lei Islâmica). Representam cerca 10% dos muçulmanos existentes no mundo. O Irã é o país mais representativo da presença dos xiitas. Sunitas são um grupo de muçulmanos que acredita que após Maomé, o novo representante deveria ser eleito pela comunidade de fiéis. A etimologia do nome sunita provém de “Ahl al-Sunnah”, que significa “pessoas da tradição”. O livro da Suna recolhe os ditos e preceitos deixados por Maomé. Os livros sagrados dos sunitas são o Alcorão, a Sharia e a Suna. Os sunitas representam 90% dos muçulmanos existentes atualmente. A Arábia Saudita é o país mais representativo da presença sunita. 

Fonte: Folha de S. Paulo – Mundo/Coluna – Quinta-feira, 15 de setembro de 2022 – Pág. A16 – Internet: clique aqui (Acesso em: 16/09/2022 – às 08h30).

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