O mundo mais inseguro
Tensão geopolítica eleva riscos para a economia
Editorial
Folha de S. Paulo Helicóptero dos houthis, grupo rebelde iemenita, sobrevoa navio cargueiro britânico no mar Vermelho - Houthi Military Media - 20.nov.23/via REUTERS
Guerras, gasto
militar, protecionismo e eleição americana geram alerta; Brasil não deve contar
com cenário global favorável pela frente
O mundo vive
período de instabilidade geopolítica com poucos paralelos nos 79 anos desde o
fim da Segunda Guerra. Da Ucrânia a Gaza, conflitos e tensões se
multiplicam.
Tal cenário
impacta a dinâmica da economia mundial, calcada na globalização que atingiu
níveis inauditos na história com a ascensão chinesa bancada pelo Ocidente que
ora teme Pequim.
Estudo
apresentado no Fundo Monetário Internacional destaca a alta das restrições
de comércio entre países, que triplicaram a partir de 2019. O risco
geopolítico é o maior depois da irrupção do terror do 11 de Setembro de 2001.
No centro
dele, a volta do militarismo. Como disse na quinta (9) o ex-premiê e
hoje chanceler britânico David Cameron, o planeta é um lugar “mais perigoso
do que a maioria de nós jamais conheceu”.
Ele defendia
gastos militares da Otan, o clube liderado pelos Estados Unidos. Com efeito, o
dispêndio mundial em defesa decolou no ano passado, chegando a níveis recordes
no pós-guerra.
O crescimento
foi de 9%, segundo o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (Reino
Unido), que contabilizou US$ 2,2 trilhões destinados ao setor —algo
equivalente ao PIB do Brasil. Os EUA respondem por 41% disso.
A divisão do
mundo em blocos móveis, com Washington, Pequim e não alinhados à frente, ainda
não sugere o fim da globalização.
China e EUA
seguem entrelaçados, e o dólar ainda dita a finança global e mais de 80% das
transações internacionais, mesmo que sob questionamento crescente.
Mas as placas
tectônicas se mexem, e terremotos ocorrem. O próximo tem data marcada, em novembro,
quando a eleição americana poderá trazer de volta um campeão da turbulência,
Donald Trump, ou manter na Casa Branca um líder relutante acerca da erosão
atual, Joe Biden.
Tudo isso
atinge o Brasil, com sua
situação fiscal frágil e, agora, incertezas reforçadas quanto à autonomia
futura da política monetária. O dilema dos juros não é exclusividade local: os
EUA os têm mantido estáveis, enquanto a Europa tende a cortá-los.
Antes da atual
fase, o mundo moderno passou por um zênite de globalização na virada para o
século 20. Imperava a leitura de liberais como o britânico Norman Angell, que
em "A Grande Ilusão" (1910) sugeriu que uma guerra entre potências
seria inviável dada a conexão de suas economias.
Quatro anos depois, os canhões da Primeira Guerra Mundial o provaram
errado como profeta, mas preciso no diagnóstico: todos perderiam. Com os
perigos em alta, como a retórica nuclear de Vladimir Putin faz lembrar, o
vaticínio ganha ares ainda mais sombrios.
Fonte: Folha de S. Paulo – Editoriais – Domingo,12 de maio de 2024 – Pág. A2 – Internet: clique aqui (Acesso em: 13/05/2024).
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