Solenidade da SSma. Trindade – Ano B – Homilia

 Evangelho: Mateus 28,16-20 

Frei Alberto Maggi *

Padre e biblista italiano dos Servos de Maria (Servitas) 

Convidados a fazer a plena experiência do amor do Pai, do Filho e do Espírito Santo

Na solenidade da Santíssima Trindade, a liturgia apresenta-nos os últimos cinco versículos do Evangelho de Mateus, cinco versículos nos quais o evangelista resume toda a sua narrativa. 

Mateus 28,16a:** «Naquele tempo, os onze discípulos foram para a Galileia...»

Logo de início, o evangelista deixa claro que os discípulos já não são doze, por quê? Quem está faltando? Judas está desaparecido, mas não porque traiu Jesus, Pedro também negou Jesus e, ainda assim, ele está ali. Por que Judas está desaparecido? Jesus havia dito: “Vós não podeis escolher/servir a Deus e a Mamom” (Mt 6,24), isto é, o dinheiro. Judas fez a sua escolha, escolheu o dinheiro e destruiu-se a si mesmo. 

Mateus 28,16b: «... ao monte que Jesus lhes tinha indicado.»

Jesus jamais havia indicado alguma montanha na Galileia. De fato, há um convite três vezes, duas vezes de Jesus e uma vez do anjo, aos discípulos para irem e subirem à Galileia para encontrarem o Cristo ressuscitado, porém, nunca foi mencionado um lugar específico, muito menos uma montanha. Por que o evangelista não diz aqui “uma” montanha, afinal a Galileia é uma região montanhosa, mas diz sobre “a montanha”, com o artigo definido, portanto uma montanha que se conhece? Qual é esta montanha? A expressão montanha, neste evangelho, apareceu para a montanha das bem-aventuranças (cf. Mt 5,1). O que o evangelista está dizendo e que é válido também para nós? A experiência do Cristo ressuscitado não foi um privilégio concedido, há dois mil anos atrás, a um pequeno grupo de pessoas, mas uma possibilidade para todos os crentes de todos os tempos. Como se faz isso? Basta ir à Galileia, à “montanha” das Bem-aventuranças, isto é, acolher a mensagem de Jesus resumida e formulada nas Bem-aventuranças, que têm este significado: preocupai-vos com o bem dos outros, permitindo que Deus, como Pai, cuide de vocês e nisso vocês farão a experiência visível de Deus. 

Mateus 28,17: «Quando viram Jesus, prostraram-se diante dele. Ainda assim alguns duvidaram.»

Então eles vão para esta montanha específica, é a montanha das bem-aventuranças. Ao verem Jesus, “prostraram-se diante dele”, portanto veem plenamente a condição divina nele. No entanto, “alguns duvidaram”. Mas do que eles duvidam? Não duvidam que o veem porque o viram, de fato, não duvidam da sua ressurreição porque se prostraram. Do que eles duvidam? Foram os discípulos que disseram: “Estamos prontos para morrer por você” (cf. Mt 26,35), contudo, assim que viram os guardas fugiram, todos o abandonaram, negaram-no e não sabem se são capazes de atingir este nível de vida passando pela morte e perseguição. Eis do que eles duvidam: eles não duvidam de Jesus, mas duvidam de si mesmos. A mesma palavra ― duvidar ― aparece mais uma única vez no evangelho, quando Jesus convidou Pedro a andar sobre as águas e ele começou a afundar e Jesus o repreendeu: “Homem fraco na fé, por que duvidaste?” (Mt 14,31). 

Mateus 28,18: «Então Jesus aproximou-se e falou: “Toda a autoridade me foi dada no céu e sobre a terra.»

Pois bem, Jesus vai ao encontro das fraquezas, das fragilidades dos seres humanos, esse é o significado de “Jesus aproximou-se”. No início do Evangelho, foi o diabo quem ofereceu o poder ao Senhor através da adoração do poder (cf. Mt 4,8-9), ora Jesus mostra que alcançou a condição divina não através do poder, mas através do dom de si mesmo, do amor

Mateus 28,19: «Portanto, ide e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo...»

A estes discípulos imperfeitos, que ainda não entenderam muito, ligados à ideia da restauração do reino de Israel, que não compreenderam a universalidade do Reino de Deus, que se mostraram incapazes de resistir ao teste, Jesus, aceitando-os como são, diz: “ide e fazei discípulos meus todos os povos”. Jesus não faz um curso de aperfeiçoamento para eles, por quê? Ele não precisa de pessoas perfeitas, mas de pessoas assim, com suas fraquezas. Paulo escreve, em uma de suas cartas, que temos esse tesouro em vasos frágeis (cf. 2Cor 4,7), portanto a força da mensagem do Senhor é o que conta, mesmo na fraqueza e fragilidade das pessoas. Então Jesus envia-os para fazer discípulos a todas as nações pagãs, isto é, “todos os povos”, “batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”. Não é uma fórmula litúrgica. Jesus convidou os discípulos a segui-lo para se tornarem pescadores de homens e salvá-los daquilo que possa levá-los à morte. Agora, os convida a dar-lhes o que comunica a vida. “Batizar”, o verbo significa imergir: fazer com que vivam a plena experiência do amor do Pai, do Filho e do Espírito Santo, a plena realidade, a plenitude de Deus. 

Mateus 28,20: «... e ensinando-os a observar tudo o que vos ordenei! Eis que eu estarei convosco todos os dias, até ao fim do mundo”.»

A única vez que se fala de mandamentos, de algo ordenado por Jesus, é justamente na explicação das bem-aventuranças. Portanto, Jesus não nos convida a anunciar uma doutrina, mas a fazer aprender, a fazer aprender uma prática que é a das bem-aventuranças: cuidar do bem dos outros para permitir que Deus, como Pai, cuide dos seus. Pois bem, se existe isto, e aqui está a grande garantia de Jesus: “Eis que eu estarei convosco”. Desde o início do Evangelho, Jesus foi definido como o “Deus conosco” (Mt 1,23), um Deus que não se deve procurar, mas acolher e ir com ele e como ele na direção dos outros: “Eis que eu estarei convosco todos os dias, até ao fim do mundo”, ou melhor, até ao fim dos tempos. Não é um prazo de validade, mas uma qualidade de presença: se a comunidade se compromete com Jesus e como Jesus a ser bem-aventurança e proclamar essas bem-aventuranças, pode ter a certeza de que o Senhor a acompanha e potencializa a sua atividade. 

* Traduzido e editado do italiano por Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo.

** Os textos bíblicos citados foram extraídos do: Sagrada Congregação para o Culto Divino. Trad. CNBB. Palavra do Senhor I: lecionário dominical A-B-C. São Paulo: Paulus, 1994. 

Reflexão Pessoal

Pe. Telmo José Amaral de Figueiredo 

«Você vê a Santíssima Trindade, se você vê o amor (Deus é ágape).»

(Santo Agostinho: 354-430 ― bispo, teólogo, filósofo e Doutor da Igreja)

A melhor e maior notícia que a solenidade de hoje da Santíssima Trindade nos traz é justamente esta: Deus é Trindade, por isso, ele é um mistério de amor. Em sua mais profunda intimidade, Deus é amor, acolhida e ternura! Isso, à primeira vista, pode parecer óbvio e já sabido! 

No entanto, retrocedendo aos tempos antigos, antes de Cristo, o Deus ou os deuses que eram venerados e cultuados não tinham quase nada a ver com amor, acolhimento, ternura e misericórdia. Pelo contrário, o costume era ressaltar as qualidades de “todo-poderoso” e “eterno”. A descrição da divindade, muitas vezes, se identificava com autoritarismo, tirania, castigo, violência etc. No entanto, o Deus de Jesus, o Deus que ele nos revela não tem nada a ver com essas imagens divinas! 

A mudança que Jesus realiza é imensa: de um Deus considerado como PODER, a um Deus adorado alegremente como Amor! Isso tudo é consequência de nosso Deus ser Trino e não único e não sozinho! Sendo Trino, Deus se revela como comunhão: Deus, o Pai, nos ama tanto, que nos enviou seu Filho, Jesus, para que, pela força do Espírito Santo, possamos alcançar nossa própria humanidade, a qual reside na bondade, na ternura na fraternidade! Conforme observa José María Castillo, “necessitamos de Deus. Necessitamos desse Deus... No carinho mútuo, nós o encontramos”. Uma fé fundamentada nesse Deus Uno e Trino muda tudo! Muda a pessoa que crê e, por conseguinte, mediante o seu testemunho de amor e misericórdia, muda o ambiente ao seu redor, também. 

Mas Deus não é onipotente? Ele não tem o máximo poder? Ele não é o senhor de tudo e de todos? A essas interrogações somente cabe uma resposta, aquela dada pela vida e pregação de Jesus de Nazaré:

«É o amor de Deus que é onipotente. Deus não pode fazer tudo. Deus só pode fazer o que o amor infinito pode. E sempre que esquecemos disso e saímos da esfera do amor, criamos um Deus falso, uma espécie de ídolo estranho que não existe» (J. A. Pagola).

Deus é só Amor e não pode fazer outra coisa a não ser amar-nos! Nisso se resume o mistério da Trindade. 

Oração após a meditação do Santo Evangelho 

«Senhor, Deus todo-poderoso, eterno e inefável, sem fim nem princípio, Deus que confessamos uno na Trindade e trino na unidade, só a ti adoro, louvo, bendigo, glorifico. A ti, misericordioso e bondoso, dou graças por me libertares da noite da infidelidade e do erro e me permitires tornar-me participante da tua graça. Por favor, Senhor, completa a obra de tua misericórdia que começaste em mim. Concede-me sempre pensar, falar e agir como quiseres; guarda-me em todos os lugares com seu amor gratuito e deixe-me, embora indigno e miserável, chegar à tua visão. Amém.»

(Fonte: Alcuino, De psalmorum usu liber I; PL 101, 468. In: Santissima Trinità: orazione finale. In: CILIA, Anthony O.Carm [a cura di]. Lectio Divina sui vangeli festivi: per l’anno liturgico A. Leumann [TO]: Elledici, 2010, p. 316)

Fonte: Centro Studi Biblici “G. Vannucci”– Videomelie e trascrizioni – Domenica di Pentecoste – 30 maggio 2021 – Internet: clique aqui (Acesso em: 15/05/2024).

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