É o professor...
Como medir se o docente saber ensinar
Renata Cafardo
Jornalista especialista em educação
Estudo do “Todos pela Educação” analisou 5 mil questões das provas feitas em diversos Estados e capitais
Existe uma diferença entre conhecer o conteúdo para si e conhecer o conteúdo para ensinar, diz a pesquisadora Bárbara Born, referência em formação de professores. Estudo divulgado esta semana pelo Todos pela Educação mostra que o Brasil escolhe os professores para suas escolas públicas sem ter ideia se eles sabem ensinar.
Foram analisadas mais de 5 mil questões utilizadas em concursos públicos de redes de ensino dos últimos anos, de 23 Estados e 19 capitais. E só 3% das perguntas avaliavam o chamado conhecimento pedagógico do conteúdo, ou seja, as estratégias e práticas didáticas que os professores usam para que a criança aprenda.
As provas tinham 70% das suas perguntas sobre o conhecimento da Matemática ou da Língua Portuguesa (os concursos avaliados eram para dar aulas para essas áreas). Claro que é importante saber o que são “funções reais” ou a “ordem canônica da língua” - exemplos de perguntas destacadas no estudo - mas isso não é suficiente para avaliar um bom professor.
Ainda, de 6% a 9% da prova eram sobre legislações e 17% sobre conhecimento de teorias da Pedagogia e de diretrizes, como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Tudo isso tem sua importância na formação dos professores, mas o equilíbrio deveria ser outro.
A falta da prática nos cursos que formam
docentes nas faculdades ― corroborada pela pouca exigência de demonstrar
algo além da teoria quando procuram emprego ― já havia sido mostrada, em 2009,
por estudos da pesquisadora Bernardete Gatti. E
parece que pouco mudou desde então.
Ainda hoje se selecionam professores com exames que parecem
vestibulares, quando a maioria da prova deveria ser destinada a medir se os
docentes SABEM ENSINAR o que aprenderam.
Um exemplo está no concurso do Ceará, que questiona sobre como usar a Metodologia de Resolução de Problemas na aprendizagem de Matemática.
O estudo também mostrou que apenas quatro redes estaduais e cinco municipais do País já realizaram provas práticas para selecionar seus docentes. Além do exame objetivo, o professor dá uma aula sobre determinado tema para uma banca ou em vídeo gravado.
O Estado de São Paulo e a capital fizeram suas primeiras provas recentemente que tiveram a exigência de aulas em vídeos, além do Ceará, Mato Grosso, Paraná e cidades como Fortaleza e Recife. Apesar dos desafios de custo e organização, o modelo é usado em vários países e visto como crucial para uma seleção de professores realmente eficaz.
Este mês, o ministro da Educação, Camilo Santana, anunciou, ainda sem detalhes, uma prova nacional unificada para selecionar professores. A ideia foi bem recebida por especialistas, afinal é mais fácil modernizar uma prova só do que os milhares de concursos que ocorrem no Brasil.
Deixando a avaliação objetiva a cargo do Ministério da Educação (MEC) ― que pode usar o próprio Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) e a expertise em avaliação ― é possível unificar esforços e investimentos.
As redes poderiam focar em provas práticas complementares. E a seleção para professores no País teria alguma chance de conseguir avaliar se um professor tem o conhecimento da sua disciplina, as bases teóricas, mas principalmente se sabe as estratégias para transformar a vida das crianças por meio da aprendizagem.
Fonte: O Estado de S. Paulo – Educação/Colunas – Domingo, 1 de dezembro de 2024 – Pág. 18 – Internet: clique aqui (Acesso em: 03/12/2024).
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