Liderança para os tempos de hoje
Não adianta ser um grande líder em resultados com baixa inteligência emocional
Jayanne Rodrigues
Jornalista
Entrevista com: Ana Guimarães
Diretora de recrutamento executivo da Robert Half ANA GUIMARÃES
As habilidades emocionais devem
seguir como fatores decisivos na seleção de profissionais para cargos do alto
escalão
Competências técnicas ou emocionais: o que pesa mais na hora de selecionar uma liderança? Para a diretora de recrutamento executivo da Robert Half, Ana Guimarães, as soft skills (habilidades comportamentais) são fatores decisivos na seleção de profissionais do alto escalão. Embora não sejam novidade, essas competências se tornaram indispensáveis e são avaliadas com rigor nos processos seletivos para posições executivas. Em alguns casos, a ausência pode até ser um fator eliminatório.
“Não adianta um executivo ser um grande líder em resultados, mas
ter baixa inteligência emocional e acabar comprometendo a autoestima
do time. Da mesma forma, a comunicação é crucial. Não adianta o resultado
ser altíssimo se a gestão desse líder é baseada no medo ou em ameaças”,
afirma a headhunter em entrevista ao Estadão.
Além da relevância das competências emocionais, Ana Guimarães observa que as hard skills (habilidades técnicas), voltam a ser um requisito central para cargos executivos, principalmente em áreas mais técnicas, como finanças e tecnologia.
Confira trechos da entrevista:
Como
você avalia o atual cenário de recrutamento para posições C-Level em termos de
habilidades emocionais?
Ana Guimarães: Quando falamos sobre habilidades
emocionais no âmbito dos executivos, percebo que eles enfrentam desafios que
vão muito além do conhecimento técnico. Não basta dominar áreas como vendas,
finanças, compliance ou gestão de riscos. Eles também precisam de competências
emocionais.
Nas entrevistas, sempre procuro explorar essas habilidades.
A primeira é a [a] inteligência emocional.
É fundamental entender como o executivo lida com sua equipe no dia a dia porque
isso impacta profundamente nas entregas.
Outra habilidade é a [b] comunicação
assertiva. O executivo deve ser capaz de transmitir mensagens de forma
clara e objetiva e, ao mesmo tempo, de maneira inspiradora.
A terceira habilidade é a [c] liderança
adaptativa. Um líder adaptativo tem a capacidade de gerenciar mudanças
organizacionais com agilidade e eficiência.
É comum que um executivo receba uma orientação do conselho
em um dia e, no seguinte, precise lidar com uma decisão totalmente diferente.
Esse tipo de líder consegue se ajustar rapidamente e implementar
ações sem causar impactos negativos no time.
Por fim, temos a [d] tomada de decisão ética. Pode parecer óbvio, mas equilibrar resultados financeiros com princípios éticos e os pilares do ESG (ambiental, social e governança) nem sempre é simples. Como o líder equilibra as entregas com essas características?
Por que
essas habilidades se tornaram essenciais no dia a dia das empresas?
Ana Guimarães: Quando a gente olha para um modelo de
contratação e avaliação de executivos, precisamos sair do lugar-comum. Esse
lugar-comum muitas vezes foca apenas em avaliar nível de entrega, conhecimento
técnico e reconhecimento em gestão.
Claro, são pontos essenciais, mas há outros aspectos, como soft
skills, que acabam sendo mais importantes e mais destacadas no processo de
entrevista.
A liderança adaptativa é outro ponto essencial. Um bom
executivo precisa ser capaz de olhar para a rentabilidade e para indicadores
como o Ebitda (utilizado para avaliar a situação financeira de uma empresa),
mas também de se adaptar rapidamente a mudanças. A falta dessa
adaptabilidade pode impactar negativamente o crescimento e o andamento da
empresa no longo prazo.
Outro aspecto relevante é a questão do ESG. As empresas têm
adotado ações e se adaptado a esse contexto, e é fundamental que o executivo
esteja alinhado com essas demandas.
É importante olhar para esses quatro pilares: liderança, adaptabilidade, inteligência emocional e alinhamento com ESG. Esses fatores vão além do lugar-comum de ser um líder que entrega resultados. Eles ajudam a entender o que realmente impulsiona os resultados, objetivos e sustenta o sucesso no longo prazo.
Diante
da importância das habilidades emocionais nos processos seletivos para
executivos, como a alta liderança pode aprimorar esses atributos?
Ana Guimarães: É uma combinação. É como se fosse a
volta das hard skills integradas com as soft skills. O que isso
quer dizer? Apesar da ênfase nas competências comportamentais, toda a parte
técnica também volta a ser um ponto central de exigência para os cargos
executivos, principalmente em áreas mais técnicas, como finanças e tecnologia.
Em um primeiro momento, a adaptação precisa ser mais voltada
para o fortalecimento das competências técnicas. Uma vez que as habilidades
técnicas estão consolidadas, surge a questão: que tipo de suporte, treinamento
ou material disponível no mercado pode integrar as tendências das hard
skills com o desenvolvimento das soft skills de forma personalizada
para cada executivo?
As hard skills são mais fáceis de identificar de
maneira generalista, enquanto as soft skills são altamente
individualizadas. Por exemplo, minha habilidade comportamental é diferente
da sua, que é diferente da de outra pessoa. Mas podemos compartilhar uma
característica em comum, como a habilidade de comunicação. Mesmo assim, as soft
skills acabam variando entre as pessoas.
Uma vez que os aspectos técnicos estejam bem ajustados, é preciso trabalhar o que não se aprende em um curso técnico: lapidar as soft skills. O papel do RH se torna crucial para entender, individualmente, quais são as necessidades de cada executivo e promover treinamentos adequados para atender a essas demandas.
Como
vocês identificam essas habilidades durante o processo seletivo para uma
posição executiva?
Ana Guimarães: As entrevistas por competência também
fazem parte do processo de avaliação de executivos. A forma como realizamos
essa avaliação está diretamente alinhada aos valores do meu cliente. Se meu
cliente tem determinados valores, e ele busca soft skills específicas,
como integrar isso?
Na prática, por exemplo, se estou buscando um diretor
comercial para um banco de investimentos, esse diretor precisa ter uma carteira
de clientes e um bom relacionamento com o mercado. Além disso, ele precisa
ser resistente à pressão por resultados, saber lidar com feedbacks e
ter uma certa resiliência.
Essas são perguntas abertas, que geram respostas mais
subjetivas do que objetivas, como um simples “sim” ou “não”.
Dessa forma, forçamos o executivo a detalhar um pouco mais o
cenário:
* como ele resolve o problema,
* como entrega o resultado,
* como origina novos negócios,
* se por meio de trabalho corpo a corpo,
* se usa sistemas de inteligência
artificial para agendar visitas etc.
Assim, começamos a perceber melhor as soft skills dele.
O
perfil da liderança mudou nos últimos anos devido à crescente demanda por
habilidades técnicas e emocionais?
Ana Guimarães: Acredito que o perfil de liderança
evoluiu em resposta a um cenário atual que exige adaptações e novas tendências.
Quais são essas tendências?
A transformação digital, por exemplo, exige que os
executivos interajam obrigatoriamente com inovações tecnológicas em suas áreas.
Além de integrar essas inovações, eles precisam garantir que a estratégia
tecnológica esteja claramente alinhada aos objetivos de negócios.
Quanto aquele sistema pode contribuir para o crescimento
sustentável da área em X anos? Por que investir naquele sistema, que representa
um gasto de X milhões para a empresa? Essa entrega é fundamental.
Voltando à governança e sustentabilidade,
outra tendência que não é mais uma escolha, mas uma exigência do mercado: como
o executivo aplica isso em sua gestão?
Por fim, a liderança
humanizada, que busca o equilíbrio entre desempenho, entrega e
bem-estar.
Como um líder consegue entregar ótimos resultados sem que seu
time sofra de burnout ou precise acionar o RH por estresse ou momentos de
fragilidade?
Essa é uma habilidade extremamente competitiva.
Não estou dizendo que não exista, mas ao longo do ano, vemos as pessoas estressadas, o que está totalmente correlacionado com a forma como o líder lida com a pressão que recebe e como a distribui para sua equipe.
Fonte: O Estado de S. Paulo – Economia & Negócios – Sua Carreira – Sábado, 14 de dezembro de 2024 – Pág. B7 – Internet: clique aqui (Acesso em: 17/12/2024).
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