Horror de polícia, polícia do horror!

 O horror na PM paulista não são casos isolados 

Thiago Amparo

Advogado, é professor de Direito Internacional e Direitos Humanos na FGV Direito SP. Doutor pela Central European University (Budapeste) 

RESPONSÁVEIS PELA BRUTALIDADE POLICIAM EM SÃO PAULO: da esquerda para a direita, comandante-geral da PM paulista Coronel Cássio Araújo de Freitas; governador Tarcísio de Freitas; e secretário estadual de segurança pública Guilherme Derrite

A crescente barbárie policial possui nome Tarcísio e sobrenome Derrite

É preciso ir além do horror estomacal que qualquer ser humano privado de sociopatia sente ao ver policiais jogando um homem de uma ponte ou atirando nas costas de outro a sangue frio. Os responsáveis pelo descontrole do uso da força policial revelado com brutalidade pelos dois casos na zona sul de São Paulo, em apenas 24 horas, possuem nome e sobrenome; são eles, Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, e Guilherme Derrite, secretário de segurança pública.

O mínimo decente a se fazer seria demitir Derrite e afastar o comando da Polícia Militar paulista; ...

... resta saber se Tarcísio prefere – seja por extremismo ideológico, seja por conivência – que a marca de sua gestão em segurança pública permaneça a da incompetência brutal. 

Logo após o caso do homem atirado da ponte, o tedioso roteiro de desculpas insinceras foi posto em marcha, mostrando que o treinamento de mídia do comando do governo estadual e da polícia está armado e apontado para justificar o absurdo. Foi “um erro emocional”, afirmou o comandante-geral da Polícia Militar de São Paulo, o coronel Cássio Araújo de Freitas, como se o policial tivesse tropeçado ao jogar de maneira fria e calculista o homem da ponte. Apenas por essa fala, o coronel deveria perder o cargo, se sobrasse alguma decência ao governador. Foi uma “ação isolada”, afirmou o secretário Derrite; os dois casos devem ser “investigados e rigorosamente punidos”, complementou o governador Tarcísio. Qualquer pessoa letrada no histórico recente da polícia militar sabe que ambas as falas são, por falta de eufemismo, mentira. 

Fatos escabrosos envolvendo a polícia de Tarcísio

Sob Tarcísio-Derrite:

* um delator do PCC foi executado em plena luz do dia no maior aeroporto do país enquanto, horas depois, o secretário festejava com policiais na praia de Maresias;

* Ryan da Silva Andrade Santos, um menino de 4 anos, foi executado em Santos enquanto brincava na rua e policiais tumultuaram seu velório;

* as operações Escudo e Verão mataram mais de 90 na Baixada Santista;

* o ouvidor das polícias vive sob ameaça de morte; e

* as mortes por agentes das forças de segurança paulistas cresceram 78% se comparados os oito primeiros meses deste ano com o ano passado (2 a cada 3 vítimas são negras).

Casos de abusos policiais são resultado da política de Tarcísio-Derrite que são capazes de rifar a própria instituição policial, envergonhando a parcela bem treinada de seus agentes, para o seu ganho político duvidoso a curto prazo. 

Não dá para chamar a crescente barbárie policial de ação isolada perpetuada por maçãs podres da corporação ao mesmo tempo em que, desde o primeiro dia no governo, a única política de segurança pública implementada por Tarcísio-Derrite consiste em plantar árvores já podres que geram como fruto a impunidade desenfreada de PMs por mortes no estado. Não dá para acreditar que Derrite ou Tarcísio defendam qualquer investigação e punição de policiais quando, na prática, criam obstáculos para o uso de câmeras policiais na corporação. 

O uso de câmeras, como esta, nos uniformes da Polícia Militar, certamente, seria uma maior garantia de procedimentos dentro do padrão esperado

O que fazer?

O mínimo decente a se fazer seria exigir a ampliação do uso do equipamento, o fortalecimento da ouvidoria de polícia, e a independência das investigações pela corregedoria da polícia e Ministério Público. 

Quem empurrou o homem da ponte foi o cheque em branco emitido pela dupla Tarcísio-Derrite para quem a única política de segurança pública que sabem vender é policial executando civis. 

Fonte: Folha de S. Paulo – Cotidiano/colunas e blogs – Quarta-feira, 4 de dezembro de 2024 – Pág. A36 – Internet: clique aqui (Acesso em: 04/12/2024). 

Brutalidade como política de segurança 

Editorial

Jornal «O Estado de S. Paulo» 

GUILHERME DERRITE em seu tempo de Rota: orgulhoso por excesso de mortes em seu nome

Tarcísio já avisou que não demitirá Derrite, mas deveria, pois o secretário, afastado da Rota por excesso de violência, é naturalmente incapaz de refrear a selvageria de PMs

A propósito do caso de um policial militar (PM) que jogou um suspeito de uma ponte, caso flagrado num vídeo que chocou o Brasil, o secretário de Segurança de São Paulo, Guilherme Derrite, declarou: “Não vamos tolerar nenhum tipo de desvio de conduta de nenhum policial no Estado de São Paulo”. Considerando que o próprio Derrite foi afastado da Rota, a elite da Polícia Militar, por desvio de conduta (em suas próprias palavras, “porque eu matei muito ladrão”), é muito difícil acreditar na advertência do secretário. Ao contrário: ao que parece, a julgar pelos diversos casos de violência policial documentados em imagens revoltantes nos últimos dias, e também pelo aumento considerável da letalidade da PM em São Paulo, a conduta esperada dos policiais paulistas pelo secretário de Segurança talvez seja a de tratar suspeitos como bandidos – ou, pior, como seres sub-humanos, que não merecem nem direitos nem respeito e podem ser jogados de pontes como objetos inanimados. 

Sendo assim, e não há razão para acreditar que não seja, ...

... é o caso de perguntar por que motivo o sr. Derrite continua à frente da Secretaria da Segurança de São Paulo.

Pior: não apenas continua, como, mesmo diante da comoção causada pelas imagens de truculência policial, consta que o sr. Derrite já está sendo cogitado como candidato ao governo do Estado ou ao Senado. Ou seja, julgam, ele e seus padrinhos políticos, que a violência desenfreada da PM lhe dará votos para cargos majoritários, tendo em vista que a segurança pública é a preocupação número um de muitos eleitores, como ficou claro na recente eleição municipal. 

Imagem de policial militar jogando o entregador Marcelo de uma ponte, na zona sul de São Paulo. O policial já havia assassinado um homem com 12 tiros em caso arquivado

Não parece haver motivo, portanto, para que o sr. Derrite puna maus policiais como ele um dia foi. O secretário que afetou indignação com os evidentes desvios de conduta de policiais retratados em imagens é o mesmo que celebrou o “sucesso” de operações policiais que deixaram dezenas de mortos na Baixada Santista desde o ano passado e que são alvo de diversas denúncias de abusos. 

A solução, portanto, não é afastar um punhado de policiais que deram o azar de ser flagrados em imagens revoltantes.

A solução é afastar o secretário de Segurança que estabeleceu a truculência como método – e que por isso mesmo não gosta das câmeras nos uniformes da polícia.

Os policiais militares não podem continuar a ter como chefe e inspiração um ex-PM que se orgulha de ter matado muitos suspeitos e que considera “vergonhoso” um policial que não tenha “três ocorrências” de suspeitos mortos a tiros no currículo. 

Mortes como se houvesse guerra! 

Infelizmente, contudo, o governador Tarcísio de Freitas já informou que não pretende demitir o sr. Derrite, considera que os casos em questão são apenas “exceções” e convidou a sociedade a ver os números da segurança pública sob esta administração para justificar sua decisão. De fato, conforme as mais recentes estatísticas, houve queda nos índices de homicídio, roubos e furtos, mas houve aumento de latrocínios e de lesão corporal seguida de morte. De todo modo, nenhum desses dados indica alguma tendência, nem de alta nem de baixa. Já o número de mortos pela polícia disparou:

a PM matou 496 pessoas entre janeiro e setembro, o maior índice desde 2020.

Há aí, portanto, um padrão – mas o próprio governador paulista já disse, em outra ocasião, que não está “nem aí” para as denúncias de abusos policiais. 

Cada dia que o sr. Guilherme Derrite continuar à frente da Secretaria da Segurança Pública sinalizará à sociedade que, para o atual governo de São Paulo, vale tudo em nome de um suposto combate ao crime, até mesmo jogar um suspeito de uma ponte durante uma abordagem policial de rotina, matar uma criança de 4 anos durante uma suposta troca de tiros com criminosos, desferir um tiro fatal à queima-roupa em um estudante que deu um tapa no retrovisor de uma viatura ou executar outro suspeito com 11 tiros nas costas porque ele teria furtado pacotes de material de limpeza em um supermercado. 

Fonte: O Estado de S. Paulo – Notas e Informações – Quinta-feira, 5 de dezembro de 2024 – Pág. A3 – Internet: clique aqui (Acesso em: 05/12/2024).

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